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A INSERÇÃO DA UNIVERSIDADE NO QUADRILÁTERO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA

LA INSERCIÓN DE LA UNIVERSIDAD EN EL CUADRILÁTERO DE LA EDUCACIÓN EN ENFERMERÍA: RELATO DE LA EXPERIENCIA

Resumos

A Educação Permanente em Saúde tem sido reconhecida como importante dimensão da gestão do sistema de saúde do Brasil, com o propósito garantir aos sujeitos envolvidos o apoio necessário à efetivação de seus princípios e diretrizes. Este relato se propõe a apresentar a experiência de uma universidade pública na articulação junto a uma Comissão Permanente de Integração Ensino-Serviço, por meio do envolvimento do curso de enfermagem. São claros os benefícios no que se refere a maior aproximação da academia com as demandas regionais e a possibilidade de envolver discentes e docentes de enfermagem em atividades de pesquisa e extensão. Os desafios estão relacionados à pouca adesão dos representantes dos segmentos que fazem parte da Comissão, sobretudo, do controle social. Dentre as demandas futuras sugerem-se ações voltadas à avaliação dos processos de Educação Permanente em Saúde e investimentos no desenvolvimento e consolidação dessa política em nível regional.

Educação continuada; Ensino; Educação em enfermagem; Formação de recursos humanos


La Educación Permanente en Salud es una dimensión importante de la gestión del sistema de salud de Brasil, que objetiva asegurar a las personas involucradas, el apoyo necesario para la efectividad de sus principios. Este relato tiene como objetivo presentar la experiencia de una universidad pública en conjunto con una Comisión Permanente para la Enseñanza e Integración a través de la participación del curso de enfermería. Son claras las ventajas con respecto a la aproximación de la universidad con las demandas regionales y la capacidad de involucrar a los estudiantes y profesores de enfermería en la investigación y la extensión docente. Los desafíos están relacionados con el déficit de adherencia de los representantes de los sectores que forman parte de la Comisión, en especial de control social. Entre las futuras demandas son acciones sugeridas para la evaluación de los procesos de Educación Permanente en Salud y la inversión en el desarrollo y la consolidación de esta política a nivel regional.

Educación continua; Enseñanza; Educación en enfermería; Formación de recursos humanos


Continuous Health Education has been recognized as an important dimension of the management of the Brazilian health system, with the purpose of ensuring that the individuals involved receive the necessary support to ensure the effectiveness of its principles and guidelines. This report presents the experience of a public university participating in a Permanent Commission for Education-Service Integration through the involvement of a nursing program. Clear benefits arise from greater proximity between the university and regional demands and the ability to engage students and professors in nursing research and extension efforts. The challenges are related to poor adherence of the representatives of the segments that are part of the Commission, especially concerning social control. Among the future requirements suggested are actions that evaluate the processes of Continuous Health Education and investment in the development and consolidation of this policy at the regional level.

Education, continuing; Teaching; Education, nursing; Human resources formation


INTRODUÇÃO

Na esfera dos avanços provocados pela 8a Conferência Nacional de Saúde, em 1986, no Brasil, um dos mais importantes foi o conceito ampliado de saúde, cujas discussões decorrentes resultaram na criação do Sistema Único de Saúde (SUS). Tendo a Atenção Básica à Saúde (ABS) como eixo principal para acolher às necessidades de saúde dos brasileiros, propostas alternativas visando à mudança de paradigma entraram em pauta, dentre elas, a Estratégia Saúde da Família (ESF), considerada elemento central da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB). Trata-se de uma estratégia para o fortalecimento e organização desse nível de atenção à saúde no Brasil e tem como foco a atuação junto às famílias em seu território, favorecendo a ampliação do acesso e a reorientação das práticas na direção da interdisciplinaridade, da integralidade e da Promoção da Saúde. A ESF propõe a mudança na concepção do processo saúde-doença, distanciando-se do modelo tradicional de oferta de serviços voltados para a doença e investindo em ações que articulam a saúde com condições e qualidade de vida.11. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento da Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília (DF): MS; 2012.

Nos anos 2000 houve grande expansão do número de equipes da ESF e, no intuito de atender às diretrizes operacionais do SUS, gestores municipais buscaram iniciativas voltadas à Educação Permanente em Saúde (EPS), com o propósito de direcionar a formação dos profissionais das equipes para essa lógica de atenção resolutiva, que considera o ambiente e o modo de viver da comunidade e que atenta para a qualidade dos serviços. Tais investimentos implicam em reafirmar os princípios constitucionais estabelecidos para o SUS, quais sejam: a universalidade do acesso, a equidade e a integralidade das ações.22. Haddad AE, Brenelli SL, Passarella TM, Ribeiro TCV. Política Nacional de Educação na Saúde. Rev Baiana Saúde Pública. 2008 Out; 32(1):98-114. Sendo assim, os projetos de mudanças na formação dos profissionais apontam para a necessidade de um novo perfil, que absorva as transformações no mundo do trabalho e as novas competências humanas pretendidas na saúde, contrapondo-se à lógica do modelo hegemônico de formação biologicista, fortemente reforçado desde a década de 1960 nos países americanos e que está centrado na doença e no atendimento hospitalar.33. Kemp A, Edler FC. A reforma médica no Brasil e nos Estados Unidos: uma comparação entre duas retóricas. Hist Cienc Saúde Manguinhos. 2004 Set-Dez; 11(3):569-85.

Com a gradativa consolidação do SUS e a determinação constitucional de manter sob competência do Sistema a ordenação da formação dos recursos humanos na saúde, os Ministérios da Saúde (MS) e da Educação (MEC) brasileiros assumem em parceria, estratégias para condução dos processos de formação e qualificação profissional na saúde e que envolvem o ensino formal e a EPS.22. Haddad AE, Brenelli SL, Passarella TM, Ribeiro TCV. Política Nacional de Educação na Saúde. Rev Baiana Saúde Pública. 2008 Out; 32(1):98-114.

Com o propósito de superar as concepções tradicionais de educação na área da saúde, os ministérios apresentam, em novembro de 2003, e instituem, em fevereiro de 2004, por meio da Portaria n. 198/04, a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS), como uma proposta de ação estratégica que objetiva contribuir para transformar e qualificar as práticas de saúde, a organização das ações e dos serviços, os processos de formação e as práticas pedagógicas, com vistas ao desenvolvimento dos trabalhadores da saúde. A implementação da PNEPS implica em trabalho intersetorial, capaz de articular o desenvolvimento individual e institucional, as ações, os serviços, a gestão e a atenção à saúde.44. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente em saúde - Polos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004.-5. Nesta direção, a atual PNEPS, reformulada em 2007, mediante a Portaria n. 1996/07, prevê que, para dar conta das peculiaridades e desigualdades do país, são necessárias estratégias de integração ensino-serviço, com maior comprometimento do setor saúde e do setor educação, dos trabalhadores do SUS, pesquisadores, docentes e estudantes, com o objetivo de construir uma política nacional de formação e desenvolvimento para os profissionais, condizentes com as diretrizes e princípios desse novo modelo assistencial.66. Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS n. 1.996, de 20 de agosto de 2007. Dispõe sobre as diretrizes para a implementação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e dá outras providências. Brasília (DF): MS; 2007.

A EPS é compreendida como aprendizagem no trabalho, mediante a incorporação do aprender e do ensinar ao cotidiano das organizações e ao processo laboral, de modo a garantir a aprendizagem significativa e a possibilidade de transformar as práticas profissionais. Para esse feito, ancora-se nos problemas enfrentados na realidade e considera os conhecimentos e as experiências prévias dos sujeitos, por meio da problematização do processo de trabalho, tendo em conta que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde dos sujeitos e populações.66. Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS n. 1.996, de 20 de agosto de 2007. Dispõe sobre as diretrizes para a implementação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e dá outras providências. Brasília (DF): MS; 2007. Os processos de formação/qualificação requerem, portanto, ações no âmbito da organização do trabalho, da interação com redes de gestão e de serviços de saúde, e do controle social no setor, em consonância com o SUS e de acordo com as necessidades reais da população.

A Portaria que revisou e estabeleceu novas diretrizes e estratégias para a implementação da PNEPS, de modo a adequá-la às diretrizes operacionais do SUS, define que a condução regional da Política se dará por meio dos Colegiados de Gestão Regional. Estes são compostos por gestores municipais da saúde, em determinada região e a partir de novos decretos, foram nomeados Comissões Intergestores Regionais (CIRs).77. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Decreto no 7.508, de 28 de junho de 2011: regulamentação da Lei n. 8.080/90. Brasília (DF): MS; 2011. As CIRs contam ainda, com a participação das Comissões Permanentes de Integração Ensino-Serviço (CIESs), instâncias previstas no regulamento, que participam da formulação, execução, acompanhamento e avaliação de ações da EPS. As CIESs como instâncias intersetoriais e regionais, deverão ser compostas pelos gestores de saúde, gestores de educação, trabalhadores do SUS, instituições de ensino com cursos na área da saúde, por meio de seus distintos segmentos e movimentos sociais ligados à gestão das políticas públicas de saúde e do controle social no SUS.66. Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS n. 1.996, de 20 de agosto de 2007. Dispõe sobre as diretrizes para a implementação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e dá outras providências. Brasília (DF): MS; 2007.

Autores88. Ceccim RB, Feuerwerker L. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Rev Saúde Coletiva. 2004; 14(1):41-65. enfatizam que do conceito e consolidação deste "quadrilátero da formação" (ensino, gestão, atenção, controle social) dependerá a qualidade da formação, a qual resulta da apreciação de critérios de relevância para o desenvolvimento tecnoprofissional, o ordenamento da rede de atenção e a alteridade com os usuários.

O Estado de Santa Catarina, atendendo ao Plano Diretor de Regionalização (PDR) 2002 e a Portaria n. 1.996/07, desenvolveu um processo de recomposição das CIESs, tendo em conta a construção já desenvolvida a partir dos Polos de Educação Permanente, estruturados a partir de 2004, como processos orientados para os objetivos da PNEPS. Assim, as comissões se reorganizaram, contando com membros remanescentes dos Polos, sendo reconhecidas, atualmente, 16 CIESs, organizadas em torno dos 16 CIRs, implantados no processo de reorientação descentralizada da gestão colegiada do SUS, conforme preconiza o Pacto pela Saúde.99. Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS n. 399/06, de 22 de fevereiro de 2006. Divulga o Pacto pela Saúde 2006 - Consolidação do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do referido Pacto. 2006. Disponível em: http://www.saude.gov.br/sgtes
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-1010. Santa Catarina (SC). Plano Estadual de Educação Permanente em Saúde Santa Catarina 2010/2013. 2011. Disponível em: http://portalses.saude.sc.gov.br/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=407&Itemid=82 Acesso em: 28 jan. 2014
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A gestão da PNEPS em SC tem sido coordenada em âmbito estadual por meio da Diretoria de Educação Permanente em Saúde, que tem uma Divisão de Educação Permanente com essa atribuição específica. Durante o II Seminário Estadual de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde, que ocorreu no mês de agosto de 2010, foi instituída a CIES Estadual, estruturada com regimento próprio e uma agenda de reuniões mensais. A CIES Estadual é um espaço de troca de experiências e decisões relativas às ações de EPS entre as 16 CIESs que compõem o nível estadual. Fazem parte da CIES Estadual os articuladores das 16 CIESs, técnicos da Secretaria de Estado da Saúde, representantes das Escola de Saúde Pública, Escola de Formação em Saúde (EFOS), Técnica de Blumenau, das Universidades, representante do Conselho Estadual de Saúde, do Conselho Estadual de Educação e do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS).1010. Santa Catarina (SC). Plano Estadual de Educação Permanente em Saúde Santa Catarina 2010/2013. 2011. Disponível em: http://portalses.saude.sc.gov.br/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=407&Itemid=82 Acesso em: 28 jan. 2014
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Nessa perspectiva, este relato se propõe a apresentar a experiência de uma universidade pública, com representação junto à CIES da Macrorregião Oeste de Santa Catarina, na participação e articulação da Comissão, entre os anos de 2011 e 2013, a fim de compartilhar a vivência, contribuir com sua divulgação e com a construção de material de consulta para gestores (do ensino e do serviço), profissionais da área da saúde, Instituições de Ensino Superior (IESs) com cursos na área e comunidade em geral.

Contextualizando a Educação Permanente em Saúe no Oeste de Santa Catarina

Em Santa Catarina, o processo de implementação do Plano de Desenvolvimento Regional (PDR) de 2008 mostrou a necessidade de revisão das CIRs e, atualmente, o Estado está constituído por 16 CIRs e 15 CIESs, abrangendo todas as macrorregiões de saúde e,consequentemente, todas as cidades do estado. A função de coordenação e condução da PNEPS no âmbito dos Estados é uma responsabilidade das Secretarias Estaduais de Saúde, as quais, em Santa Catarina, contam com o apoio das Secretarias de Estado do Desenvolvimento Regional (SDRs).55. Ferraz F. Contexto e processo de desenvolvimento das Comissões Permanentes de Integração Ensino-Serviço: perspectiva dos sujeitos sociais pautada na concepção dialógica de Freire [tese]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós Graduação em Enfermagem; 2011.

Com o processo de regionalização, proposto pelo MS, a Região de Saúde consiste em uma base territorial de planejamento da atenção à saúde, a ser definida pela Secretaria Estadual de Saúde, de acordo com algumas especificidades locais.1111. Ministério da Saúde (BR). Portaria n. MS/GM 95, de 26/01/01. Norma Operacional da Assistência à Saúde - NOAS-SUS 01/01 - Regionalização da assistência à saúde: aprofundando a descentralização com equidade no acesso. Brasília (DF): MS; 2001. Neste contexto, a Macrorregião Oeste de Santa Catarina é formada por 26 municípios e regida por uma CIR, assessorada, no que tange à EPS, por uma CIES. As demandas de ações de educação permanente apresentadas pelos municípios que compõe essa Região da CIR e CIES devem ser organizadas, conforme previsto no Anexo II da Portaria GM/MS n. 1.996/07, a partir da elaboração de um Plano de Ações Regionais para Educação Permanente em Saúde (PAREPS).66. Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS n. 1.996, de 20 de agosto de 2007. Dispõe sobre as diretrizes para a implementação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde e dá outras providências. Brasília (DF): MS; 2007.

A CIES da Macrorregião, desde 2008, conta com um coordenador/articulador, membros representantes dos quatro segmentos (quadrilátero) de cada um dos 26 municípios que compõem a Macrorregião, além de representantes de organizações não governamentais, IES com cursos na área da saúde, associação de municípios, Gerências de Saúde e controle social. Inicialmente, a articulação era realizada por representante da Gerência de Saúde da SDR de Chapecó, município considerado polo da Macrorregião. A partir de 2011, a articulação passou a ser desempenhada por representante do segmento ensino, junto ao curso de enfermagem de uma universidade, e contou com uma vice-articuladora na SDR. Essa decisão ocorreu nas assembleias das instâncias, tendo em vista a integração ensino-serviço no desenvolvimento da Política de Educação Permanente. As atribuições das articuladoras da CIES consistem na organização e planejamento dessa Política em nível regional, atendendo ao PAREPS e outras demandas regionais.

As assembleias mensais da CIES ocorrem nos mesmos dias das reuniões da CIR e, durante as mesmas, são discutidas demandas de EPS, elaborados planejamentos para futuras iniciativas e avaliadas ações em desenvolvimento. Posteriormente, as discussões são levadas à CIR e são aprovados os encaminhamentos, conforme deliberação dos gestores de saúde locais.

As ações desenvolvidas e acompanhadas pela Comissão Permanente de Integração Ensino-Serviço: perspectivas e desafios

Desde 2011, a CIES participa ativamente do acompanhamento das "ações estruturantes interministeriais" desenvolvidas na Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó) e na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Essas ações configuram-se como dispositivos para a reordenação da formação na área da saúde, considerando a integração ensino-serviço, e objetivam a melhoria dos cursos na área da saúde, tendo em vista a adequação às Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e os princípios e diretrizes do SUS.22. Haddad AE, Brenelli SL, Passarella TM, Ribeiro TCV. Política Nacional de Educação na Saúde. Rev Baiana Saúde Pública. 2008 Out; 32(1):98-114.,1010. Santa Catarina (SC). Plano Estadual de Educação Permanente em Saúde Santa Catarina 2010/2013. 2011. Disponível em: http://portalses.saude.sc.gov.br/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=407&Itemid=82 Acesso em: 28 jan. 2014
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Neste sentido, no âmbito da CIES do Oeste catarinense, destaca-se o acompanhamento do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) e do Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde), desenvolvidos por meio da proposta integrada entre a Unochapecó e a Secretaria Municipal de Saúde deste município, além da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS), cujo curso de "Especialização Multiprofissional em Saúde da Família - Modalidade à Distância" se estende aos 26 municípios da região e outros do Estado de Santa Catarina. É perceptível, considerando-se as iniciativas dessas IESs, o engajamento dos estudantes no processo de educação permanente, ao desenvolverem o "aprender a aprender" centrado na aprendizagem ativa do sujeito e com foco em competências, evidências e solução de problemas da comunidade. Salienta-se, ainda, a diversificação dos cenários de prática e a inserção do estudante no SUS, já no início da sua formação, instigando-os a criar e a formular propostas com vistas à mudança e aprimoramento das reais condições de trabalho.1212. Ministério da Educação (BR). Resolução CNE/CES n. 1133 de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Enfermagem, Medicina e Nutrição. Diário Oficial da União, Brasília (DF); 2001.-1313. Kleba ME, Krauser IM, Vendruscolo C. O planejamento estratégico situacional no ensino da gestão em saúde da família. Texto Contexto Enferm. 2011 Jan-Mar; 20(1):184-93.

Em 2011, a CIES concluiu a primeira pesquisa avaliativa de um dos cursos desenvolvidos, o "Introdutório para Equipes de Saúde da Família", cujos resultados foram analisados por docentes e estudantes bolsistas do curso de enfermagem de uma universidade ativa na CIES, e encaminhados para publicação em periódico de circulação nacional. De maneira convergente com tal iniciativa, é válido destacar que a formação do enfermeiro, assim como a pesquisa nesta área de atuação profissional, tem sido caracterizada, ao longo dos últimos anos, por uma série de transformações na busca e qualificação de conhecimentos, gerando um crescimento intelectual na prática do cuidado. Isso se confirma com a própria mudança curricular dos cursos de Enfermagem, comprometidos em inserir disciplinas que enfoquem a pesquisa.1414. Silva LMS, Oliveira NRN, Frota MA, Fialho AVM. Pesquisa internacional em enfermagem: tendências temáticas e metodológicas. Rev Bras Enferm. 2008 Set-Out; 61(5):615-9.

Entre outras coisas, observou-se que, embora a metodologia do curso Introdutório, com base na problematização do cotidiano do serviço, pareça favorecer a incorporação dos conteúdos à prática laboral das equipes, faz-se necessário o desenvolvimento de outras pesquisas de cunho avaliativo, a fim de medir o seu impacto na qualificação do processo de trabalho. Esses achados, assim como a participação ativa das IESs nos processos de EPS, têm incentivado a realização de outras pesquisas, envolvendo docentes, estudantes e trabalhadores da saúde.

No ano de 2012, tendo como demanda a consolidação da Rede Cegonha, foram realizadas atividades de sensibilização para profissionais e gestores do SUS, no intuito de ampliar a qualidade do atendimento pré-natal, durante o parto e puerpério, na região.

Compreende-se a Rede Cegonha como uma estratégia do MS, operacionalizada pelo SUS, fundamentada nos princípios da humanização da assistência. A Rede procura melhorar o acesso e a qualidade do atendimento ao nascimento na rede pública de saúde, tendo como diretrizes, entre outras, a qualificação dos profissionais de saúde para uma atenção segura e humanizada, a criação de centros de gestante e do bebê, para a assistência à gravidez de alto risco e de casas de parto normal, com vistas à implementar as demandas do parto humanizado para os casos de baixo risco.1515. Carneiro RG. Dilemas antropológicos de uma agenda de saúde pública: programa Rede Cegonha, pessoalidade e pluralidade. Interface Comun Saúde Educ. 2013 Jan-Mar; 17(44):49-59.

Nessa perspectiva, e em consonância com as áreas eleitas pelo MS como prioritárias para intervenção do SUS, considerou-se essa iniciativa como uma das demandas importantes para processos de educação entre gestores e profissionais, tendo em conta o investimento do MS na melhora dos índices e qualificação/humanização desse tipo de atendimento. Em países em desenvolvimento, como o Brasil, um considerável número de mulheres evolui ao óbito por complicações na gestação, como as Doenças Hipertensivas Específicas da Gravidez (DHEG), fato que denuncia a falha na atenção à saúde.1616. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica Atenção ao Pré-natal de Baixo Risco. Brasília (DF): MS; 2012.

A 8a Semana de Enfermagem, em 2012, e a 9a Semana de Enfermagem, organizadas pela Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) - Núcleo Chapecó, em 2013, também tiveram a participação da CIES, em atenção à essa profissão que vem assumindo um lugar cada vez mais qualificado, em crescimento e inserida no processo de transformações nos diversos campos de atuação, na área da saúde.1717. Erdmann AL, Fernandes JV, Melo C, Carvalho BR, Menezes Q, Freitas R, et al. A visibilidade da profissão de enfermeiro: reconhecendo conquistas e lacunas. Rev Bras Enferm. 2009 Jul-Ago; 62(4):637-43.

Dentre os desafios identificados no processo de inserção da universidade no acompanhamento e coordenação das ações de EPS na Macrorregião, cumpre destacar a participação incipiente dos segmentos que representam o quadrilátero da EPS, sobretudo do controle social, nos 26 municípios que compõem a CIES, apesar dos inúmeros contatos e convites realizados. Isso se deve, possivelmente, ao fato de tratar-se de uma Política relativamente recente e a experiência mostra que é necessário um tempo de processamento e sensibilização dos atores envolvidos. Contudo, em estudos sobre conselhos de saúde,1818. Kleba ME. Descentralização do sistema de saúde no Brasil: limites e possibilidades de uma estratégia para o empoderamento. Chapecó (SC): Argos; 2005. como instâncias intersetoriais, favoráveis à construção social da cidadania e que favorecem o surgimento de sujeitos sociais preparados para exercer influência na gestão e produção de políticas e ações, evidencia-se a necessidade de um processo educativo contínuo, habilitando os sujeitos à exercerem com propriedade seu papel e sua autonomia. De maneira convergente com tais elucidações, na CIES emerge a demanda de ações educativas voltadas para os sujeitos que compõem o quadrilátero da EPS, no sentido de sensibilizá-los e prepará-los para o exercício de sua participação e corresponsabilização com essa Política.

Outra questão que vai ao encontro dessa perspectiva, tem a ver com as interpretações conceituais sobre educação permanente por parte dos sujeitos envolvidos na organização local da Política. É sabido que os processos educativos precisam ser dinâmicos e contínuos e promover avanços sociais, para além da capacitação das pessoas. Os programas de educação continuada limitam-se à reciclagem de conhecimentos específicos, cuja operacionalização acontece a partir de uma leitura geral dos problemas e temas a serem trabalhados, geralmente sob o formato de cursos.1919. Merhy EE, Feuerwerker LCM, Ceccim RB. Educación Permanente en Salud: una estrategia para intervenir en la micro-política del trabajo en salud. Cien Saúde Coletiva. 2006 Mai-Ago; 2(2):147-60. Já a lógica da educação permanente ancora-se em práticas descentralizadas, ascendentes e multiprofissionais, levando-se em conta as necessidades emanadas do processo de trabalhos das equipes de saúde.55. Ferraz F. Contexto e processo de desenvolvimento das Comissões Permanentes de Integração Ensino-Serviço: perspectiva dos sujeitos sociais pautada na concepção dialógica de Freire [tese]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós Graduação em Enfermagem; 2011.

O objetivo principal da educação permanente é a transformação efetiva das práticas e dos "nós críticos" identificados e enfrentados na atenção ou na gestão, o que possibilita a construção de estratégias contextualizadas e que promovem o diálogo entre as políticas gerais e a singularidade dos espaços e dos sujeitos. Tais pressupostos seguem as definições conceituais apresentadas pela Organização Pan-americana de Saúde (OPAS),2020. Lopes SRS, Piovesan ETA, Melo LO, Pereira MF. Potencialidades da educação permanente para a transformação das práticas de saúde. Cien Saúde Coletiva. 2007; 18(2):147-55. na década de 1980, e partem de práticas definidas por conhecimentos e relações de trabalho, elementos que fazem sentido para os sujeitos envolvidos e que, problematizados, podem promover transformações no processo laboral.44. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente em saúde - Polos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004.,88. Ceccim RB, Feuerwerker L. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Rev Saúde Coletiva. 2004; 14(1):41-65.,2020. Lopes SRS, Piovesan ETA, Melo LO, Pereira MF. Potencialidades da educação permanente para a transformação das práticas de saúde. Cien Saúde Coletiva. 2007; 18(2):147-55. As iniciativas da CIES da Macrorregião Oeste, via de regra, vêm se pautando em ações que podem ser classificadas como educação continuada, no formato de cursos e voltadas a desenvolver habilidades mais específicas.

Apesar dos equívocos conceituais e da pouca participação dos membros que compõem a CIES, ficando a organização das práticas sob a responsabilidade de poucos atores realmente atuantes, gradativamente a Política de EPS está se tornando consistente nessa Macrorregião. Isso fica evidenciado nos momentos de reunião da CIR, nos quais é possível perceber a ampliação das pautas destinadas às questões relacionadas à EPS, bem como o apoio dos gestores as ações propostas. Acredita-se que a integração ensino-serviço é outro fator que está se consolidando como ponto favorável, no sentido de valorizar o sujeito (docente, trabalhador, gestor ou usuário) no processo de atenção e cuidado, com vistas à melhoria da qualidade da produção e atenção à saúde.

Vale salientar que, durante o período de articulação da CIES junto à universidade, houve utilização de uma pequena parte do recurso financeiro destinado pelo MS à Comissão, referente ao ano de 2012, em consequência do atraso na disponibilização, burocratização e da dificuldade de operacionalização da descentralização no repasse financeiro. Esse último evento sinaliza, entre outros, parte das dificuldades enfrentadas e a necessidade de maior valorização da Política, no que tange, especialmente, a sua operacionalização e desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consideram-se como aspectos positivos da Política de EPS na Macrorregião, as parcerias estabelecidas com os municípios e com a Secretaria de Estado, sobretudo, representada pela Gerência de Saúde da SDR de Chapecó, além da adoção do tema como relevante entre os gestores do serviço e do ensino na área da saúde. Como desafios, destaca-se a dificuldade de acolher demandas específicas dos diferentes municípios, de se estabelecer vínculos mais sólidos entre os setores que se fazem representar junto à Comissão, bem como a fragilidade dos investimentos no desenvolvimento da Política.

Em relação à experiência de articular a CIES junto à universidade, são claros os benefícios no que se refere a maior aproximação da academia com as demandas regionais e a possibilidade de envolver discentes e docentes de enfermagem em atividades de pesquisa e extensão relacionadas. Além disso, foi possível uma maior integração e parcerias com outras IES e cursos na área da saúde, em Chapecó e em outros municípios do Estado, reduzindo as distâncias geográficas, inclusive.

Dentre as demandas futuras para a CIES da Macrorregião Oeste do estado, sugerem-se ações voltadas à avaliação dos processos de EPS e investimentos na sua ampliação, desenvolvimento e consolidação, dentre elas, permanente sensibilização dos gestores quanto a sua participação, fomento da articulação de outros setores, especialmente do controle social, junto à CIES e fortalecimento da EPS em nível municipal.

Espera-se que a elucidação dessa Política entre os sujeitos que compõem o quadrilátero da EPS assuma lugar de destaque na agenda de gestão do SUS, pois se acredita que tomando o profissional da saúde como elemento central do cuidado à comunidade, será possível fortalecer a ABS e o Sistema de Saúde do Brasil.

Os avanços da PNEPS requerem, ainda, o efetivo apoio dos sujeitos e das instituições na consolidação dos espaços necessários para a formação e educação permanente. Isso se intensifica no alinhamento com as políticas e iniciativas federais que articulam a integração ensino-serviço e sua efetiva apropriação e monitoramento por parte das CIESs, nas diversas regiões de saúde do estado de Santa Catarina e do país.

REFERÊNCIAS

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    Kemp A, Edler FC. A reforma médica no Brasil e nos Estados Unidos: uma comparação entre duas retóricas. Hist Cienc Saúde Manguinhos. 2004 Set-Dez; 11(3):569-85.
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    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente em saúde - Polos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS; 2004.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    04 Set 2013
  • Aceito
    06 Mar 2014
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