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A autoria: uma análise a partir das normas documentárias brasileiras

The authorship: an analysis based on Brazilian documentary standards

Resumo

Aborda a autoria na normalização de documentos brasileiros, especificamente através das normas do Comitê Brasileiro de Informação e Documentação da Associação Brasileira de Normas Técnicas. Tem como objetivos apresentar e refletir sobre os conceitos de autoria; analisar e comparar as orientações normativas sobre a autoria; e refletir sobre as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas e a questão autoral. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, documental e comparativa, com base nas normas publicadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. Sendo assim, a análise possui dois aspectos: o primeiro com relação à definição e à estrutura do documento, onde se explica o que cada norma apresenta sobre o elemento autoria, e o segundo com relação às orientações sobre a descrição da autoria no documento. Por fim, as normas apresentam a relação entre seu conceito e o lugar da autoria nas publicações, assim como revelam a importância que é atribuída à autoria na elaboração e citação de documentos.

Palavras-chave
Autor entidade; Autores pessoais; Normas bibliográficas; Normas nacionais; Normalização

Abstract

It addresses authorship in the standardization of Brazilian documents, specifically through the norms of the Brazilian Committee of Information and Documentation by the Brazilian National Standards Organization. It aims to present and reflect on the concepts of authorship, analyze and compare the normative guidelines regarding authorship, and reflect on the Brazilian National Standards Organization norms and the authorial issue. It is a bibliographic, documentary and comparative research, based on the norms published by the Brazilian National Standards Organization. Therefore, the analysis possesses two aspects: the definition and structure of the document, where it is explained what each norm presents about the element of authorship, and the guidelines for describing authorship in the document. Finally, the norms present the relationship between their concept and the place of authorship in documents, as well as revealing the importance that is attributed to authorship in the elaboration and citation of documents.

Keywords
Corporate authors; Personal authors; Bibliographic standards; National standards; Standardisation

Introdução

Este artigo aborda a questão da autoria, especificamente das normas documentárias brasileiras, estabelecidas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). As normativas são importantes em muitas áreas do conhecimento e existem diversos órgãos responsáveis por sua elaboração, evidenciando assim o valor dessa prática. Ao fazer uso das normas na elaboração de um documento, ele se torna mais acessível, pois segue padrões, e, por meio deles, é possível identificar as informações que determinam a tipologia documental. Assim, o conhecimento de um indivíduo, contido nesses documentos, é passível de ser disseminado.

Considerando que o fazer bibliotecário está aliado a normas e padrões, o objetivo geral deste estudo é analisar como a questão autoral é abordada nos documentos, a partir das normativas brasileiras, especificamente as normas de documentação vigentes, elaboradas pelo Comitê Brasileiro de Informação e Documentação (CB-14), da ABNT. Isso se dará por meio dos seguintes passos: apresentar os conceitos de autoria e refletir sobre eles; analisar e comparar as orientações normativas sobre a autoria e refletir sobre as normas da ABNT e a questão autoral.

Questão autoral e as normas

Para compreender melhor a importância da autoria, é necessário contextualizar como esse aspecto tornou-se importante para a sociedade e o porquê de hoje existirem regras para o seu estabelecimento. Quando se estuda essa temática, sempre surgem questões sobre a autoria, como: Quem é esse autor? Qual sua função? Qual a sua importância na representação e identificação do documento? Para responder essas questões autorais, recorreu-se a autores como Foucault (2009)Foucault, M. O que é um autor? In: Foucault, M. Estética: literatura e pintura, música e cinema. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009. p. 264-298., Barthes (1988)Barthes, R. O rumor da língua. São Paulo: Brasiliense, 1988. e Chartier (1998Chartier, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador: conversações com Jean Lebrun. São Paulo: Ed. da UNESP, 1998., 2012)Chartier, R. Autoria e história cultural da ciência. Rio de Janeiro: FAPERJ: Azougue, 2012..

Com o advento da tecnologia, é bastante discutido o papel do autor (Martins, 2012Martins, B. C. Autoria em rede: um estudo dos processos autorais interativos de escrita nas redes de comunicação. 2012. 155 f. Tese (Doutorado em Ciência da Comunicação) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27154/tde-31082012-103436/pt-br.php. Acesso em: 7 out. 2016.
http://www.teses.usp.br/teses/disponivei...
). Identificar o responsável por uma determinada obra é de suma importância para atribuir confiabilidade ao conhecimento contido em um documento. No meio acadêmico, não só o autor do texto garante a confiabilidade, mas também os autores que ele citou para escrever sobre aquele assunto (ou seja, as referências bibliográficas), bem como a instituição à qual está vinculado. Essa identificação do autor, no entanto, nem sempre foi importante; a questão autoral foi se modificando com o tempo.

Autor é “[...] aquele que cria ou produz (apenas por faculdade própria)” (Autor, c2021Autor. In: Dicionário Priberam de Língua Portuguesa. [S. l.]: Priberam Informática, c2021. Disponível em: https://www.priberam.pt/dlpo/autor. Acesso em: 21 maio 2021.
https://www.priberam.pt/dlpo/autor...
, online3 3 Adota-se o termo “online” para documentos não paginados disponíveis em páginas eletrônicas. A NBR 10520 orienta que, para citações diretas, o número da página deve ser inserido na chamada da fonte; porém, um documento em página eletrônica não possibilita essa identificação. ); ou seja, o responsável por aquela manifestação em forma de livro, música, documento. De acordo com o Dicionário de Biblioteconomia e Arquivologia, autor é a “[...] pessoa física, individual ou coletiva, ou a pessoa jurídica (Estado, governo, entidades coletivas e similares) que se responsabiliza pelo conteúdo de uma obra” (Autor, 2008Autor. In: Cunha, M. B.; Cavalcanti, C. R. O. Dicionário de biblioteconomia e arquivologia. Brasília: Briquet de Lemos/Livros, 2008. p. 39., p. 39). Assim, o ele deixa de ser compreendido como um único indivíduo, dando-se abertura para entidades e instituições desempenharem essa função.

Em seu texto intitulado “A morte do autor”, de 1968, Roland Barthes desmitifica a importância da autoria, trazendo a escrita para um nível de maior destaque, falando da “morte” do autor. Para Barthes (1988)Barthes, R. O rumor da língua. São Paulo: Brasiliense, 1988., o autor é um personagem moderno produzido pela sociedade na medida em que se descobriu o prestígio da pessoa humana. E foi o capitalismo que deu ainda mais importância ao autor, na questão da literatura, tendo grande evidência nos manuais da história literária, que apresentam o autor como um mero costureiro, por assim dizer, que junta retalhos, partes de outros textos para criar um novo.

Um ano após Roland Barthes em 1968, Michel Foucault, em sua palestra para a Sociedade Francesa de Filosofia em 1969, disserta sobre o tema “O que é um autor?”, discutindo as funções desse: seu nome; relação de apropriação; relação de atribuição e posição de atribuição. Assim, é possível entender que o autor tem sim uma importância e qual é a sua relação com a obra produzida. Para Foucault, a noção de autor está associada à obra, e identificar o nome do autor é um modo de caracterizar um discurso.

A identificação do autor de um documento é importante tanto na questão da confiabilidade e da veracidade da obra, quanto na atribuição dessa obra a uma pessoa – o que nem sempre acontecia. Antigamente, as obras não levavam os nomes de seus autores, e sim dos editores, os quais, na maioria das vezes, compravam o manuscrito do autor e publicavam (Chartier, 2012Chartier, R. Autoria e história cultural da ciência. Rio de Janeiro: FAPERJ: Azougue, 2012.).

No Brasil, a Lei n°9.610, de 19 de fevereiro de 1998, regula o direito autoral, definindo, em seu art. 11, o autor como sendo “pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica”, e ainda completa, no art. 14, dizendo que ele “[...] é titular de direitos de autor quem adapta, traduz, arranja ou orquestra obra caída no domínio público, não podendo opor-se a outra adaptação, arranjo, orquestração ou tradução, salvo se for cópia da sua” (Brasil, 1998Brasil. Lei no 9610, de 19 de fevereiro de 1998: altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Brasil: Presidência da República, 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9610.htm. Acesso em: 21 maio 2021.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Lei...
, online). A referida lei dispõe ainda sobre os direitos não só do autor, no modo intelectual da obra, mas também de outros profissionais que lidam com o texto, como o tradutor, o adaptador e o organizador.

A importância e a evolução do estabelecimento e da identificação da autoria, nos documentos, além de fundamentada pela legislação (para fins de direito autoral), é orientada por normativas. Portanto, as normas documentárias que norteiam a representação da autoria são importantes para os autores, tanto para os citados quanto para aqueles que os citam: para os autores citados, há a garantia de reconhecimento de seus direitos e geração de indicadores, como o Índice H, e, para os que citam corretamente, há a garantia de não serem acusados de plágio.

A questão da autoria tem um lugar de destaque na atualidade, pois buscam-se maneiras internacionais de se identificar exclusivamente um autor. É o caso do International Standard Name Identifier (ISNI), um número global certificado pela International Organization for Standardization (ISO) para “identificar os milhões de contribuintes criativos”4 4 “ISNI is the ISO certified global standard number for identifying the millions of contributors to creative works”. (International Standard Name Identifier, [2021]International Standard Name Identifier. About ISNI. London: ISNI International Agency, [2021]. Disponível em: http://www.isni.org/. Acesso em: 21 maio 2021.
http://www.isni.org/...
, online, tradução nossa).

Há também o ResearcherID, uma ferramenta que tem como objetivo solucionar a ambiguidade dentro da área acadêmica. Nessa ferramenta, cada membro realiza um cadastro e a ele é atribuído um número identificador único que permite construir perfis de seus trabalhos acadêmicos, gerir listas de publicações, rastrear as citações e evitar erros na identificação da autoria. Além disso, o ResearcherID é integrado com a Web of Science, padronizando e identificando os autores nele cadastrados (Researcher ID, c2015Researcher ID. Home. [S.l.]: Web of Science Group, c2015. Disponível em: http://www.researcherid.com/Home.action. Acesso em: 10 out. 2016.
http://www.researcherid.com/Home.action...
)5 5 Optou-se por utilizar o nome da ferramenta com caixas alta e baixa para melhor identificação, ao invés de usar RESEARCHERID, todo em caixa alta. .

Existem várias maneiras de se identificar e padronizar a autoria; ou seja, normalizar o elemento autoria diante da quantidade de informações produzidas no menor espaço de tempo. Ao estabelecer outras formas de normalizar o autor, considera-se as normas documentárias brasileiras elaboradas pela ABNT que serão analisadas na presente pesquisa, pois:

As normas técnicas objetivam a normalização e padronização de produtos e serviços disponíveis no mercado visando, fundamentalmente, a qualidade. A expedição de uma norma técnica é resultado de um processo indicativo de características de produtos e serviços e aferem, a estes, qualidade e confiabilidade, agregando em seu conteúdo as necessidades das comunidades científica, industrial e comercial

(Crespo; Rodrigues, 2011Crespo, I. M.; Rodrigues, A. V. F. Normas técnicas e comunicação cientifica: enfoque no meio acadêmico. Revista Digital de Biblioteconomia & Ciência da Informação, v. 9, n. 1, p. 36-55, 2011. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rdbci/article/view/1918. Acesso em: 20 maio 2021.
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
, p. 39).

Ao compreender que a normalização é um importante fator para difundir informação e que a autoria está diretamente ligada a essa prática, é necessário relacioná-la com o meio acadêmico, pois é nesse espaço que se inicia interação com a normalização, já que a universidade é um ambiente gerador do conhecimento, que se utiliza das:

[...] normas técnicas em seus diversos âmbitos, nas disciplinas curriculares, na pesquisa, nos laboratórios, aplicadas na padronização de toda uma gama de documentos tais como: monografias, teses, dissertações, artigos científicos, livros, capítulos de livros, trabalhos apresentados em eventos, relatórios, projetos etc., permitindo, também, padronizar as peculiaridades das diferentes áreas do conhecimento

(Crespo; Rodrigues, 2011Crespo, I. M.; Rodrigues, A. V. F. Normas técnicas e comunicação cientifica: enfoque no meio acadêmico. Revista Digital de Biblioteconomia & Ciência da Informação, v. 9, n. 1, p. 36-55, 2011. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rdbci/article/view/1918. Acesso em: 20 maio 2021.
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
, p. 37).

A partir disso, é possível relacionar a normalização com a comunicação científica, pois ela está vinculada com a produção e a transmissão de conhecimento e faz parte do desenvolvimento da ciência.

No decorrer da vida acadêmica, depara-se com diferentes formas de comunicação da informação, sendo a mais recorrente o trabalho acadêmico, que, por assim dizer, é uma publicação científica. E a “[...] publicação científica assume variadas formas e utiliza diversos canais. Quando registrada em veículos formais, como livros, periódicos ou meios eletrônicos, produz a literatura científica, [...]” (Müeller, 1995 apud Rodrigues; Lima; Garcia, 1998, p. 148). Por fazer parte desse meio, é necessário o uso das normas e dos padrões técnicos.

De acordo com Rodrigues, Lima e Garcia (1998)Rodrigues, M. E. F.; Lima, M. H. T. F.; Garcia, M. J. O. A normalização no contexto da comunicação científica. Perspectivas em Ciência da Informação, v. 3, n. 2, p. 147-156, 1998. Disponível em: https://www.brapci.inf.br/_repositorio/2010/11/pdf_33a3cde8ee_0012658.pdf. Acesso em: 19 maio 2021.
https://www.brapci.inf.br/_repositorio/2...
, para que haja ciência, é fundamental a comunicação, a circulação e o intercâmbio de ideias; portanto, cabe ao cientista comunicar adequada e amplamente o produto de seu trabalho para que a ciência aconteça. Assim, estabelece-se uma relação direta entre o uso de normas e a organização e eficácia do trabalho intelectual, pois as normas servem como suportes para padronização dos meios de expressão e comunicação no âmbito científico.

No Brasil, a ABNT é a instituição responsável por elaborar regulamentações em âmbito nacional e disponibilizar normas internacionais que se adequem às situações do país, sendo uma entidade privada e sem fins lucrativos. A seleção das normativas e as etapas desta pesquisa serão apresentadas a seguir.

Procedimentos Metodológicos

Por ser este um trabalho que se propõe a analisar as normativas propriamente ditas, trata-se também de uma pesquisa documental, que tem como fonte:

[...] documentos no sentido amplo, ou seja, não só de documentos impressos, mas sobretudo de outros tipos de documentos, tais como jornais, fotos, filmes, gravações, documentos legais. Nestes casos, os conteúdos dos textos ainda não tiveram nenhum tratamento analítico, são ainda matéria-prima, a partir da qual o pesquisador vai desenvolver sua investigação e análise

(Severino, 2007Severino, A. J. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São Paulo: Cortez, 2007., p. 122).

As normas estudadas fazem parte da ABNT, responsável pela elaboração das normas brasileiras, que trabalha em conjunto com órgãos internacionais de normalização. A partir dela, são produzidas diversas normativas para as mais variadas áreas, como química, aeronáutica, agricultura, têxtil e turismo, somando um total de 300 Comitês Técnicos (Associação Brasileira de Normas Técnicas, c2014Associação Brasileira de Normas Técnicas. Catálogo. Rio de Janeiro: ABNT, c2014. Disponível em: http://www.abnt.org.br/. Acesso em: 19 maio 2021.
http://www.abnt.org.br/...
). Como recorte, as normas aqui analisadas são as do Comitê Brasileiro de Informação e Documentação (CB-14), e estão diretamente ligadas à elaboração e à padronização de documentos, das quais o bibliotecário, no cotidiano dos serviços realizados, faz uso. Esse Comitê atua no campo da informação e da documentação, abrangendo “[...] as práticas relativas a bibliotecas, centro de documentação e informação, serviços de indexação, resumos, arquivos, ciência da informação e publicação” (Associação Brasileira de Normas Técnicas, c2014Associação Brasileira de Normas Técnicas. Catálogo. Rio de Janeiro: ABNT, c2014. Disponível em: http://www.abnt.org.br/. Acesso em: 19 maio 2021.
http://www.abnt.org.br/...
, online).

Por ser uma pesquisa documental, foi realizada uma busca, no catálogo da ABNT à procura das normas produzidas pelo CB-14 (vigentes, substituídas, canceladas, corrigidas). Com isso, foi recuperado um total de 140 diretrizes.

Como o intuito do estudo é verificar a questão da autoria atualmente, optou-se por analisar apenas as normas vigentes. Em janeiro de 2020, foram recuperados do catálogo da ABNT 34 documentos sobre o assunto, dos quais três tratavam-se de erratas e um era uma ementa – os quais não são considerados normas propriamente ditas. Dessa forma, o universo de pesquisa foi composto inicialmente por 30 normas em vigor elaboradas pelo CB-14 da ABNT.

Embora o resultado da busca no catálogo da ABNT, sob a responsabilidade do CB-14, tenha recuperado 30 normas, nem todas apresentavam os termos relacionados ao foco desta pesquisa. Por esse motivo, todas foram analisadas a fim de identificar quais termos ligados a autoria (como “autor”, “coautor”, “responsável”, “autor-entidade”, “autoria” e “responsabilidade”) estão presentes em cada norma.

Ao realizar essa etapa, chegou-se a 18 normas que trazem os termos ou outros termos relacionados a esta pesquisa, como o caso de “direito autoral”, que fala da proteção legal que o autor ou responsável tem sobre o documento, encontrado na Norma Brasileira (NBR) 6021, na NBR 6029 e na NBR 10525, sendo que a última contém somente esse termo, sem qualquer outra explicação como as demais.

Foi constatado que as normas que não apresentam os termos pesquisados são: NBR 5892:2019 (Norma para datar); NBR 6024:2012 (Numeração progressiva); NBR 6025:2002 (Revisão de originais); NBR 6028:2021 (Resumo); NBR 6032:1989 (Abreviação de títulos de periódicos); NBR 12676:1992 (Métodos para análise de documentos – determinação de assuntos e seleção de termos de indexação) e NBR ISO 2108:2006 (Número padrão internacional de Livro (ISBN)). Tendo em vista que essas normas não têm os termos buscados e nada que indique em seu texto a questão da autoria, foram então descartadas.

Em todas as normas, antes de se iniciar a estruturação de determinado documento, são apresentadas definições pertinentes para melhor entendimento da diretriz. A maioria dos termos são recuperados nessa seção da norma, mas as que não trazem a definição, têm o termo empregado na seção de estruturação, dando a entender que, ao utilizar a norma, o autor já possui conhecimento da utilização do conceito.

Nas NBR 6021, NBR 10520, NBR ISSO 30300 e NBR ISSO 30301, além de “autores”, há o termo “responsável”, que é secundário para a pesquisa, mas que identifica a responsabilidade do documento. Nessas normas, o termo faz parte de “instituição responsável pelo documento”, diferentemente de outras normas que utilizam os termos “entidade”, “autor-entidade”. Esses normalmente são usados para identificar a autoria ou a responsabilidade de uma instituição. Na NBR 10719, são utilizados tanto o termo “autor-entidade” quanto “responsável” para identificar a autoria de uma instituição. Isso também acontece nas NBR 6022, NBR 6023 e NBR 15437.

Em uma pré-seleção, foram desconsideradas sete normas citadas anteriormente por não possuírem os termos “autor”, “autores”, “autoria”, “responsável”, “responsáveis”. Nessa subseção, as 18 normas foram novamente analisadas para verificar se realmente abordam a temática ou se simplesmente trazem o termo como complemento para outro maior que não condiz com o objetivo da pesquisa – o que se verificou na NBR 9578:1986, normativa de arquivos que não será considerada, pois, mesmo tendo o termo “autor”, não traz qualquer informação relevante sobre a autoria. O termo aparece apenas durante a definição de autógrafo. Nessa mesma lógica, outras cinco foram descartadas: NBR 6033:1989 (Ordem alfabética); NBR 6034:2004 (Índice); NBR 10518:2005 (Guias de unidades informacionais); NBR 10525:2005 (ISSN); NBR ISO 30300:2016 (Sistema de gestão de documentos de arquivo – Fundamentos e vocabulário) e NBR ISO 30301:2016 (Sistema de gestão de documentos de arquivo – Requisitos). Restaram, assim, 11 normas que realmente abordam o tema autoria e que compuseram, portanto, o universo da pesquisa:

  1. NBR 6021:2015 – Publicação periódica técnica e/ou científica.

  2. NBR 6022:2018 – Artigo de periódico impresso.

  3. NBR 6023:2018 – Referências.

  4. NBR 6027:2012 – Sumário.

  5. NBR 6029:2006 – Livros e folhetos.

  6. NBR 10520:2002 – Citações.

  7. NBR 10719:2015 – Relatório técnico e/ou científico.

  8. NBR 12225:2004 - Lombada.

  9. NBR 14724:2011 – Trabalhos acadêmicos.

  10. NBR 15287:2011 – Projeto de pesquisa.

  11. NBR 15437:2006 – Pôsteres técnicos e científicos.

Para a análise, seguiram-se as seguintes etapas: (1) todas as normas foram lidas na íntegra; (2) buscaram-se termos relacionados à autoria, a saber: “autor”, “coautor”, “responsável”, “autor-entidade”, “autoria”, “responsabilidade”; (3) verificou-se se os termos estavam acompanhados de uma definição ou se estavam apenas citados; e (4) as definições e as diretrizes das normas relacionadas à autoria foram comparadas.

Análise dos dados

Todas as normativas começam com uma seção denominada definições. Ao analisar as normas selecionadas, constatou-se que as definições não mudam muito de uma norma para outra. No caso das normativas NBR 10719, NBR 14724, NBR 15287 e NBR 15437, as definições, tanto para autor quanto para autor-entidade, estão no singular, levando a entender que só um sujeito pode ser o responsável, mesmo sabendo da possibilidade de indicar várias autorias. De modo diferente, a NBR 6022 e a NBR 6023 tratam das duas definições no plural.

A NBR 14724 e a NBR 15287 utilizam a palavra “trabalho” ao invés de “documento”, como as demais. Por serem normas muito utilizadas no meio acadêmico, pode ser que o termo adotado faça mais sentido nessas duas normas.

Ao verificar a NBR 6029, constatou-se que ela não traz a definição de nenhum dos tipos de autoria, o que causa estranhamento, pois a norma trata de livros e folhetos, documentos em que o autor está mais associado à sua função. Ao invés disso, traz o termo “crédito”, que é a indicação do detentor dos direitos da obra, que na maioria das vezes pode ser o autor. Nessa norma, é interessante observar que a diferença entre “apresentação” e “prefácio” está relacionada ao autor do texto. O prefácio é um texto escrito por outra pessoa. Caso não haja esse convite e o próprio autor escreva um texto de esclarecimento para seu livro, não seria um prefácio e sim uma apresentação. Nesse sentido, é a determinação do autor do texto que define se esse se enquadra em apresentação ou prefácio. O tipo de autoria, portanto, interfere na categorização do tipo de texto.

Nas NBR 6033, 6021 e 12225 também não consta a definição, mas elas falam do autor na estrutura do documento. Já a NBR 6021 traz a editora como responsável não pelo conteúdo intelectual, mas sim pela produção e distribuição. Para melhor sintetizar a questão da autoria nas normas encontradas, as definições estão compiladas no Quadro 1.

Quadro 1
Definições de autoria nas normas.

Após análise das definições, começa-se a entender a importância da autoria nos documentos, mas quando a estrutura é examinada, entende-se o real lugar da autoria em cada tipo de publicação. É possível identificar que, dependendo do tipo de documental e da normativa, a autoria terá destaque e importância diferentes, às vezes com maior ênfase a quem elaborou o documento, a quem solicitou, a uma instituição como um todo ou a uma pessoa sozinha. Para melhor visualização dos diferentes locais, optou-se por elaborar o Quadro 2.

Quadro 2
Localização da autoria nas normas.

Nas normativas analisadas, a autoria, na capa ou folha de rosto, varia como primeiro ou segundo elemento a ser indicado. Em algumas, vem logo após o título. Em outras, há ênfase para a instituição à qual o documento está vinculado. Sendo assim, infere-se que, salvo exceções, a autoria é uma das primeiras indicações para se identificar um documento, constando sempre na capa, primeiro elemento de uma publicação que se tem contado, ou na folha de rosto, que é a fonte principal para obter informações sobre o documento.

Ressalta-se a importância da instituição como responsável pelo documento, pois, dependendo do vínculo, ela tem que ter mais destaque do que a pessoa que o elaborou. No caso de artigos de periódicos, ter vínculo institucional é muito importante, pois, além de oferecer status, atribui credibilidade ao autor.

Considerações Finais

A normalização está presente no cotidiano, seja nas coisas mais simples, como recomendações para construção de uma porta, até na construção de um navio. Sendo assim, pode-se afirmar que existem normas para todo o tipo de prática, instrumento ou objeto, obtendo-se um padrão e tornando as elaborações mais uniformes.

O presente estudo teve como objetivo analisar como a questão autoral é abordada nos documentos, a partir das normativas brasileiras elaboradas pelo CB-14 da ABNT. Algumas normas analisadas apresentaram a definição e o conceito de autor, outras não. Observa-se que, independentemente da presença desse conceito, o autor é um dos primeiros elementos a ser identificado nos documentos analisados, variando entre o primeiro e o segundo elementos, ocorrendo só uma vez como um dos últimos.

Cabe ressaltar que algumas normas regem a elaboração de uma publicação, como é o caso da NBR 14724, enquanto outras são destinadas à representação de um documento, como é o caso da NBR 6023. Nesse sentido, o conceito de autor se altera. Por exemplo: o autor presente na NBR 14724 é o responsável pelo trabalho de conclusão de curso, enquanto na NBR 6023, o autor é elemento da fonte citada e referenciada no texto. Enfim, a questão autoral pode ser muito debatida e interpretada em diferentes contextos.

Após todo esse percurso, verificou-se que a autoria, mesmo no contexto atual de documentos publicados na web – o que torna difícil a sua identificação –, ainda é um elemento essencial, que concede importância e relevância ao documento e assegura os direitos do autor sobre ele. A autoria, além de reconhecer o direito autoral e de propriedade em um momento com grande circulação de desinformação, passa a ser um elemento importante para verificação da veracidade e da trajetória do autor, respaldando seu conhecimento e gerando indicadores que resultam em critérios para recebimento de fomento, entre outros tipos de reconhecimento científico. Portanto, a representação da autoria cada vez mais assume um papel importante no meio científico.

Entende-se então que a pesquisa não se esgota aqui, e que existem outras normas a serem analisadas num futuro trabalho, a fim de entender, a nível mundial, como o elemento está inserido nesse contexto.

  • 3
    Adota-se o termo “online” para documentos não paginados disponíveis em páginas eletrônicas. A NBR 10520 orienta que, para citações diretas, o número da página deve ser inserido na chamada da fonte; porém, um documento em página eletrônica não possibilita essa identificação.
  • 4
    “ISNI is the ISO certified global standard number for identifying the millions of contributors to creative works”.
  • 5
    Optou-se por utilizar o nome da ferramenta com caixas alta e baixa para melhor identificação, ao invés de usar RESEARCHERID, todo em caixa alta.

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Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2022
  • Aceito
    11 Maio 2022
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