Acessibilidade / Reportar erro

Concílio de Aquileia de 381: propagação da fé nicena e da unidade imperial pela pena de Ambrósio, bispo de Milão

RESUMO

Neste artigo, detemos nossas análises nos argumentos elaborados por Ambrósio, bispo de Milão, para fortalecer a fé nicena imperial imediatamente após o Concílio de Aquileia, do ano de 381. Sugerimos que tais argumentos também sustentavam a unidade em torno da figura imperial. Para responder aos nossos questionamentos, examinamos três cartas redigidas por Ambrósio: Epistolae extra collectionem 4 (10), 5 (11) e 6 (12). Observamos que, embora todas essas cartas tenham sido encaminhadas aos três imperadores romanos - Graciano, Valentiniano II e Teodósio - o bispo dirigia-se especialmente a Graciano. Afinal, este era o imperador a quem o milanês se vinculava diretamente. Ambrósio almejava, nos territórios romano-ocidentais, uma sociedade cristã-nicena conduzida especialmente por Graciano, augusto que tinha sua sede em Milão. Uma proximidade que alimentou uma interessante aliança entre o poder temporal, encarnado em Graciano, e o poder espiritual administrado por Ambrósio.

Palavras-chave:
Concílio de Aquileia; ortodoxia; poder temporal; poder espiritual; Trindade.

ABSTRACT

This paper analyzes the arguments developed by Ambrose, bishop of Milan, to fortify the Nicene faith immediately after the Council of Aquileia, in 381. It suggests such arguments also support the unit around the imperial figure. To answer our questions, we examined three letters written by Ambrose: Epistolae extra collectionem4 (10), 5 (11) and 6 (12). Although all these letters have been sent to three roman emperors - Gratian, Valentinian II, and Theodosius - we realized that the bishop wrote more specifically for Gratian, to whom the Milanese bishop was directly connected. In the roman-western territories, Ambrose yearned for a Christian-Nicene society driven specifically by Gratian, who headquartered in Milan. Such closeness fueled an interesting alliance between the temporal power, personified in Gratian, and the spiritual power exercised by Ambrose.

Keywords:
Council of Aquileia; Orthodoxy; Temporal power; Spiritual power; Trinity.

RESUMEN

Este artículo analiza los argumentos desarrollados por Ambrosio, obispo de Milán, para fortalecer la fe nicena imperial inmediatamente después del Concilio de Aquilea, en el año de 381. Se sugiere que tales argumentos también sostenían la unidad alrededor de la figura imperial. Para responder a las nuestras cuestiones, examinas tres cartas redactadas por Ambrosio: Epistolae extra collectionem 4 (10), 5 (11) e 6 (12). Observamos que, aunque todas estas cartas hayan sido direccionados a los tres imperadores romanos - Graciano, Valentiniano II y Teodosio -, el obispo hablaba especialmente a Graciano. Al cabo, este era el imperador a quién el milanés estaba directamente vinculado. En los territorios romanos occidentales, Ambrosio deseaba establecer una sociedad cristiana-nicena conducida especialmente por Graciano, cuya sede era Milán. Esta proximidad ha alimentado una interesante alianza entre el poder temporal, representado por Graciano, y el poder espiritual, ejercido por Ambrosio.

Palabras clave:
Concilio de Aquilea; ortodoxia; poder temporal; poder espiritual; Trinidad.

Introdução

Neste artigo, tratamos de um século IV em que o império dos romanos estava marcado por várias ameaças ao imperium (poder de mando) dos augustos: dentro de seus territórios, os governantes tinham que lidar, especialmente, com confrontações entre grupos religiosos e com as tentativas de usurpação de seu poder; em suas fronteiras, tribos estrangeiras exigiam a inserção no mundo romano, por vezes, através da assinatura de pactos (foedus); outras vezes, mediante batalhas. Lembremos, por exemplo, que, no ano de 382, Teodósio negociou uma paz com líderes godos e alanos. Tal pacto permitiu que o augusto reconstruísse o exército romano vencido na batalha de Adrianópolis em 378, enfrentamento que levara o então imperador da pars orientalis, Valente, à morte.

Portanto, era entre essas animosidades que os romanos, fossem eles líderes governamentais, eclesiásticos, funcionários civis, militares, comerciantes e tantas outras pessoas, viviam e planejavam seus dias.

Neste contexto, os imperadores tinham a necessidade de manter uma extensa e diversificada base de apoio formada pelas elites militar, religiosa, senatorial e por funcionários civis. Observamos que, durante o século IV, o fortalecimento do cristianismo como religião oficial do império dos romanos fez com que líderes dessa crença se integrassem à elite religiosa e passassem a auxiliar na sustentação do poder dos augustos romanos.

Em sua Historia Ecclesiastica, Hermas Sozomeno alude à educação cristã-nicena recebida por Teodósio de seus pais. Ao chegar a Tessalônica, como imperador, recebeu do bispo Ascolio instruções mais apropriadas sobre esta fé e foi batizado por este sacerdote. A partir de então, nas terras romano-orientais, com a especial colaboração de Ascolio, Teodósio integrou os ideais da unidade da Trindade à sustentação de seu poder.1 1 SOZOMENUS. H. E. VII, 4-5 Concomitantemente a esta aliança entre poder temporal e espiritual ocorrida em terras orientais, nos territórios da pars occidentalis, o imperador Graciano promoveu vinculações semelhantes com Ambrósio, bispo de Milão. No ano de 381, este governante convocou um concílio na cidade de Aquileia que ofereceu a Ambrósio e aos demais líderes nicenos a oportunidade de asseverar os dogmas do Concílio de Niceia de 325. Perguntamo-nos, então, quais foram os argumentos utilizados pelo sacerdote milanês para corroborar a fé nicena imediatamente após o concílio de 381? Sugerimos que, enquanto a unidade da Trindade Divina era reforçada, também se propagava a unidade em torno da figura imperial. Especialmente o imperium de Graciano ganhou luzes. Para responder ao nosso questionamento, selecionamos três cartas de autoria ambrosiana: Epistolae extra collectionem 4 (10), 5 (11) e 6 (12).

Notamos que, tanto nas terras romanas ocidentais como nas orientais, formatavam-se, então, alianças bastante propícias tanto para a propagação do niceísmo, que passava a ser anunciado sob a chancela do poder temporal supremo, como para a manutenção da preeminência do imperium dos augustos em seus respectivos territórios e frente aos perigos que vinham de fora de seus limites. A unidade e a supremacia do imperium, centradas na preservação da ordem social terrena, passavam a ter paralelo com a unidade da Trindade divulgada no primeiro Concílio de Niceia e reforçada por Ascolio, Ambrósio e por tantos outros significativos indivíduos que propagavam este discurso.

Esta vinculação entre poder temporal e poder sagrado estava afiançada nas mais longínquas tradições romanas. O que dizer do título de pontifex maximus2 2 Os pontífices eram responsáveis por controlar as ações da lei. Seu número modificou-se demasiadamente ao longo da Antiguidade romana. Acima de todos os pontífices, estava o pontifex maximus. Como principal figura religiosa das crenças politeístas romanas, ele tinha poderes de vida e de morte sobre as vestais e era sua atribuição elaborar o calendário. Conforme a etimologia, pontifex era aquele que “fazia pontes”, ou seja, era responsável por construir o caminho religioso do império. carregado pelo augusto desde Otávio (24 a.C.-14 d.C.) até Graciano, no século IV d.C.? Ou ainda da associação de Otávio a Apolo? De Diocleciano (284-305) a Júpiter? Contudo, a partir de Constantino (306-337), este poder sagrado, antes representado por várias divindades e defendido por religiosidades distintas, passou a ganhar ares homogêneos, baseado nos dogmas do credo niceno.

Todavia, devemos deixar de lado a ideia convencional de que com Constantino o niceísmo triunfou definitivamente sobre as demais crenças cristãs ou não cristãs. Ressaltamos que esta assimilação do poder sagrado com características nicenas ao poder temporal ocorreu paulatinamente. Esta reelaboração esteve imersa em processo de formatação da própria identidade cristã-nicena ocorrida entre episódios de defesa e de reprovação desta crença religiosa pelos imperadores romanos. Lembremos, por exemplo, que o filho de Constantino, Constâncio II (337-361), era defensor dos ideais cristãos-arianos, assim como posteriormente foi Valente (364-378). Juliano (360/361-363), educado como cristão, foi chamado de apóstata por pautar seu governo nos ideais neoplatônicos de Porfírio (234-301/305) e de Jâmblico (250-330). Tratamos, portanto, de um período em que a própria noção de ortodoxia nicena era construída em um processo que congregava avanços e recuos.

Com a morte de Valente, em 378, o império dos romanos passou a contar com dois imperadores cristãos nicenos: Graciano, na pars occidentalis; e Teodósio, responsável pela pars orientalis. Nesta conjuntura, Graciano compartilhava o imperium das terras romano-ocidentais com seu irmão Valentiniano II. Este, um menino de quatro anos, influenciado pelas noções arianas patrocinadas por sua mãe, Justina.

Em Milão, sede da corte imperial e da eclésia ambrosiana, noções cristãs arianas e nicenas concorriam para ganhar espaços nos círculos de poder e angariar novos crentes. Imerso neste cenário, o papel de Graciano como defensor dos ideais nicenos mereceu destaque. A seu lado, Ambrósio esclarecia e fortalecia a ortodoxia nicena e, ao mesmo tempo, auxiliava o governante temporal a legitimar seu poder pela via do poder espiritual.

Por um lado, o sacerdote milanês incrementava as bases do poder imperial com suas teorias de unidade e de universalidade. Tais elementos engrandeciam a prática do poder do augusto. Por outro lado, Graciano garantia a Ambrósio os espaços e meios para a divulgação da crença nicena, a qual, passo a passo, era delineada como ortodoxa.3 3 É importante notarmos que o termo ortodoxia carrega em si julgamentos de determinados grupos. Neste ensejo, de acordo com Caroline Humfress ortodoxia e heresia devem ser entendidas pelos historiadores como “conceitos performáticos”, ou seja, termos envolvidos pelas regras sociais sob as quais eram definidos. No século IV, a ortodoxia passou a designar a correta crença apoiada em Cristo, reconhecida como verdadeira. Por outro lado, a heresia recebeu ares de errada e de desviante, dividida em muitas seitas, era delineada como mentirosa e fraudulenta. Evidentemente, o papel social atribuído ao herege não foi produzido por ele, por isso a heresia deve ser entendida em um “espaço discursivo”. Neste contexto de definições identitárias, toda seita cristã, com exceção dos maniqueístas, requereram para si a alcunha de “cristianismo verdadeiro”. In: HUMFRESS, Caroline. Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity. Nova York: Oxford University Press, 2007, p. 220-222.

Neste artigo, discorreremos sobre a parceria entre poder temporal e poder espiritual desenvolvida nos territórios romano-ocidentais em 381, ano de importantes reuniões eclesiásticas que retomaram a proteção do credo niceno: Concílio de Constantinopla e Concílio de Aquileia, convocados respectivamente por Teodósio e por Graciano.

A ortodoxia de um cristianismo niceno defendido por Ambrósio

Na obra Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity, Caroline Humfress analisa detalhadamente a influência dos concílios eclesiásticos na elaboração da legislação romana, especialmente aquela reunida no Código Teodosiano. Em contrapatida, a autora também demonstra que os primeiros escritores judeus e cristãos emprestavam os principais termos da legislação romana para aplicá-los metaforicamente e expandir seus dogmas. Neste contexto de apropriações, na era pós-constantiniana é possível percebermos o estabelecimento de um “sistema legal” dentro da instituição eclesiástica, no qual bispos atuavam em resposta a eventos particulares, como casos de sucessão clerical e questões sobre os bens monásticos. Neste caminho, os concílios eclesiásticos romanos e suas decisões devem ser entendidos como parte de um processo de elaboração de coleções de “leis canônicas”.4 4 Ibidem, p. 145-146; p. 203-205.

Nesta interação entre universo jurídico e eclesiástico, notamos que as disputas nos tribunais legais ou intermediadas pelos imperadores criaram um novo caminho para definir os termos da ortodoxia e do que seriam considerados paganismo e heresia.

Amparada em várias elaborações discursivas, no século IV, a ortodoxia passou a designar a crença correta apoiada na Trindade cristã-nicena, reconhecida como verdadeira. Por sua vez, a heresia recebeu ares de errada e de fraudulenta; dividida em muitas seitas, era delineada como mentirosa. Sabemos, todavia, que esta caracterização não foi produzida a partir do cerne destes agrupamentos heterodoxos, eram, sim, distinções levadas a cabo por construções retóricas daqueles que se abrigavam sob a alcunha de ortodoxos.

Um passo significativo para corroborar as elaborações favoráveis ao credo niceno ocorreu em 27 de fevreiro de 380, com a promulgação do Edito de Tessalônica.5 5 No século V, este edito foi compilado no Código Teodosiano sob o título de constitutio XVI, 1, 2. Assinado por Graciano, Valentininano II e Teodósio - mas, atenção, emitido de uma cidade romano-oriental - este edito definiu que os seguidores do credo niceno receberiam a designação “católicos” (ou seja, universais), aos demais, caberia a alcunha de heréticos.6 6 C.Th. XVI, 1, 2.

Lembremos que a existência de uma lei não significava que o ato desautorizado tenha sido eliminado do cotidiano daquela sociedade. Todavia, a regra manifestava a preocupação imperial com essas ações e, acima de tudo, com a reprodução dessas atitudes. No caso da formatação do niceísmo como um discurso ortodoxo, as inquietações que provocavam a promulgação de um edito eram geradas pelos comportamentos tidos como heréticos e a correção dessas condutas viria com a adoção dos ideais nicenos.

Certamente as noções apregoadas pelos bispos Ascolio e Ambrósio e a própria vinculação desses indivíduos ao poder imperial influenciaram a elaboração de constituições como esta. Todavia, sabemos que a defesa por parte do poder temporal de determinadas questões teológicas estava também ligada a problemas sociopolíticos.

Naquele momento, Graciano desenvolvia seguidas batalhas contra os godos, os quais professavam o cristianismo ariano, difundido entre essas tribos por Úlfila, conhecido como “apóstolo dos godos”. Certamente, apresentar a crença nicena como a religião correta asseverada pelo Deus uno era mais um diferencial entre a ciuilitas (“civilidade”) dos romanos e a ferocitas dos estrangeiros. As campanhas de Graciano recebiam a proteção de um Deus que vinha ganhando espaço entre as sociedades romanas. Mais que um elemento retórico, o amparo Divino e a defesa da crença nicena angariavam súditos para o augusto. Uma conjuntura que engrossava as fileiras dos exércitos de Graciano e, ao mesmo tempo, colocava ao lado do augusto indivíduos dedicados a organizar e sustentar as teorias políticas imperiais, legitimando prática e teoricamente o exercício do imperium de Graciano.

Ambrósio mencionou que, naquele contexto, a fé nicena vinha ganhando notoriedade, motivo que levou Graciano a desejar ser devidamente instruído pelo sacerdote milanês a respeito dessas diretrizes: “Por conta da valorização, Graciano quis aprender sobre a fé louvada por Ambrósio, ele foi verdadeiramente humilde [para aprender].”7 7 AMBRÓSIO. De fide I, prologus: “Gratianum ob ardorem discendae fidei laudat Ambrosius, semet vero deprimit”.

Seguramente questionaríamos essa “valorização” nicena se ela fosse encotrada apenas nesse discurso episcopal. Entretanto, casos práticos de outros líderes cristãos partidários às ideias da consubistancialidade divina ganhavam visibilidade perante várias comunidades e esses indivíduos passavam a integrar o círculo de poder temporal, tanto em terras orientais como nas ocidentais - situação que não excluía desse universo agentes que professavam outras crenças. Bispos como Ascolio, Basílio de Cesareia, Gregório de Nancianzo e Gregório de Nissa auxiliavam a assegurar a ortodoxia nicena nos territórios orientais, enquanto Ambrósio, Libério, Dâmaso, entre outros, garantiam a validade desses ideais nos territórios ocidentais.

Deste modo, a afirmação ambrosiana destacada anteriormente certificava um movimento sociopolítico favorável àquela crença. Evidentemente, quando algo vinha sendo apreciado, isto se tornava no mínimo curioso aos olhos do imperador. Como chefe supremo do poder temporal, ele deveria conhecer as novidades para lidar com elas. Não é surpresa que Graciano desejasse “aprender” sobre aquela fé. Uma ansiedade condizente com seu papel imperial, mas não só, lembremos que ele era cristão e, aos moldes de seu pai, Valentiniano I, niceno.

Acrescentamos, ainda, que, ao anunciar a valorização do niceísmo através de palavras grafadas e faladas, Ambrósio concedia ainda mais notoriedade a esta fé e alimentava a conversão de novos fiéis. Afinal, qual súdito leal não gostaria de seguir os caminhos de seu imperador e ser agraciado no além-vida? Se até Graciano desejava conhecer a fé de Ambrósio, por que os demais romanos não fariam o mesmo? Portanto, o dia a dia daquela sociedade concedia ao milanês conteúdo para suas elaborações discursivas. E estas, por sua vez, animavam a prática dos romanos. Teoria e prática nutriam-se mutuamente, exibindo Graciano como o defensor temporal da religião tida como correta e Ambrósio como o verdadeiro tutor sobre este assunto.

Os inúmeros concílios “ecumênicos”,8 8 Do grego οἰκουμένη (mundial). promovidos ao longo do século IV, comprovam o quanto era difícil estabelecer uma clara distinção entre uma doutrina tida como a oficial pelo imperium e os outros cristianismos. Percebemos, portanto, a necessidade iminente da elaboração de tratados teológicos que tentassem esclarecer essas diferenças e que, concomitantemente, buscassem estabelecer os limites entre as religiões. Um processo levado a cabo através da alteridade, do olhar sobre o outro. Analisavam-se as variantes ao passo que se construíam identidades.

É neste cenário de conflitos constantes contra os godos arianos, de valorização da fé cristã nicena e de identificação e edificação de religiões que Graciano solicitou a Ambrósio a elaboração de um livro que explicasse a crença defendida pelo milanês. O fruto desse requerimento imperial foi o tratado De fide (Sobre a fé). Os dois primeiros livros dessa obra foram escritos, provavelmente, entre 378 ou 380. Produto de uma segunda exigência de Graciano, os outros três livros foram redigidos entre 380 e 383.

Neste mesmo contexto, no ano de 381, em Constantinopla e em Aquileia, dois importantes concílios eclesiásticos foram realizados com o intuito de reforçar a validade do credo estabelecido em Niceia, em 325.

McLynn indicou-nos que no verão de 380, quando Graciano chegou a Sirmium para continuar seus enfrentamentos contra os godos, declarou que no ano seguinte seria convocado um concílio em Aquileia, na Itália.9 9 MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital. Berkeley: University of California Press, 1994, p. 112. Percebemos a multiplicidade da vida: assuntos de guerra, de religião e sociais integravam-se no momento deste anúncio. O imperador encaminhava-se a um novo combate. No entanto, fez questão de manifestar sua preocupação com assuntos religiosos.

Lembremos a importância que as elites religiosas tinham para a sustentação do poder imperial. Além disso, os contantes conflitos entre grupos nicenos, hereges e não cristãos perturbavam a ordenação sociopolítica e econômica. Em um cenário tão agitado, o augusto não poderia deixar de lado os problemas sociais e religiosos para dedicar-se exclusivamente ao combate militar. Sua casa deveria estar organizada para que seu imperium fosse preservado. Ao cuidar dos seus súditos Graciano angariava apoio para sustentar seu imperium perante estrangeiros, possíveis usurpadores e inclusive perante Valentiniano II e Teodósio que, embora fossem seus colegas de imperium, estavam sempre preparados para ampliar o ancalce de seus poderes.

Pouco antes da assembleia em Aquileia, em julho de 381, tinha ocorrido o segundo concílio universal, desta vez, em Constantinopla, convocado por Teodósio.10 10 O primeiro concílio universal foi o de Niceia, em 325 — uma cidade dos territórios romano-ocidentais. Em 381, temos um concílio realizado na parte oriental do império dos romanos. A seguir, destacamos parte das decisões desta reunião em benefício do credo niceno nos territórios orientais:

Ordenamos que em breve todas as igrejas (ecclesias) sejam entregues aos bispos, os quais confessam a majestade da mesma glória, em um só, juntas as virtudes do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o brilho da unidade, sem fazer a divisão profana dissonante, em defesa da ordenação das pessoas e da unidade da divindade (divinitatis unitate) [...].11 11 C.Th. XVI, 1, 3: “Episcopis tradi omnes ecclesias mox iubemus, qui unius maiestatis adque virtutis patrem et filium et spiritum sanctum confitentur eiusdem gloriae, claritatis unius, nihil dissonum profana divisione facientes, sed trinitatis ordinem personarum adsertione et divinitatis unitate [...]”. (Tradução da autora.)

Observamos que as diretrizes do primeiro Concílio de Niceia ganhavam novo fôlego naquele ambiente. Este edito de 381 reconhecia que Deus, Jesus e o Espírito Santo constituíam a “divinitatis unitas” - expressão redigida no singular, dando ênfase à consubstancialidade estabelecida em 325. Além disso, os espaços de culto deveriam ser confiados aos bispos nicenos - ressaltamos, aqueles já denominados católicos (ou seja, universais) pelo Edito de Tessalônica de fevereiro de 380. Desta maneira, as diretrizes nicenas, bem como os bispos responsáveis por sua divulgação, tinham seu brilho enaltecido entre os romanos e seus espaços de atuação passaram a ser garantidos pela constitução imperial. Mais um passo significativo para a construção de um discurso que se formatava como ortodoxo (correto).

Assim como Teodósio reforçara a validade do credo niceno nos territórios romano-orientais, especialmente com o Edito de Tessalônica e com o Concílio de Constantinopla, desde 380, em Sirmium, Graciano mobilizava-se para fazer o mesmo na parte ocidental do império ao promover o Concílio de Aquileia. Dois augustos e dois concílios realizados em cidades tão distantes do império dos romanos? E ainda, em meses tão próximos um do outro? De maio a julho os bispos estariam em Constantinopla e no início de setembro as deliberações em Aquileia já chegavam ao fim.

Mais do que uma ação conjunta em prol da crença nicena, percebemos nessas convocatórias imperiais processos concorrentes em que ambos os augustos desejam colocar-se como protetores seculares dos desejos Divinos. Uma aspiração comum de poderosos fiéis cristãos nicenos? Podemos, sim, contar com esta hipótese. Afinal, os sentimentos compõem parte essencial da vida. Mas são “uma parte” dela. Na esfera da vida referente aos jogos de poder, ao portar-se como defensor daquela crença que vinha ganhando cada vez mais adeptos nas distintas camadas socias, o imperador ampliava o alcance de seu poder, assegurava sua utilidade pública e mantinha sua posição de supremacia perante os romanos, elementos que certamente diminuíam os anseios usurpatórios de seus inimigos.

É neste contexto de disputas imperiais pela proteção da crença nicena que Escribano Paño menciona a competição entre Graciano e Teodósio pela Ilíria, uma região estratégica para a defesa do império e rica em recursos econômicos e humanos. Além de lutarem entre si para dominarem aquela região, esses imperadores ainda enfrentaram os godos, que também desejavam aqueles territórios. Este contexto de disputas imperiais promoveu a promulgação de constituições pró-nicenas; medidas que delineavam os augustos como benfeitores de Ilíria, pois afastariam dos romanos as ameaças estrangeiras e as hereges. Tais atitudes engrandeciam ambos os governantes, mas não eram executadas em parceira. Essas ações exaltavam o poderio de cada imperador e sua capacidade de administrar a região.12 12 ESCRIBANO PAÑO, María Victoria. Graciano, Teodosio y el Ilírico: la constitutio Nullus (locus) ­haereticis (C.Th. 16, 6, 6. 381). Revue internationale des droits de l’antiquité, n. 51, p. 133-166, 2004, p. 137-138; p. 144-145.

Elaborações ambrosianas a partir do Concílio de Aquileia de 381

A mobilização dos imperadores romanos e a frutífera legislação deles emanada comprovam-nos que o engrandecimento em torno dos princípios nicenos não eram apenas desejos e especulações teológicas levadas a cabo por Ambrósio. Os discursos episcopais tinham abrigo em concílios convocados pelos augustos ocidental e oriental e nas realidades sociais, políticas, culturais e religiosas daquele momento. Concomitantemente, as palavras do milanês forneciam bases teóricas que amparavam o exercício do poder desses governantes, especialmente de Graciano - a quem estava vinculado - e esclareciam aos imperadores e aos demais receptores daquelas mensagens diretrizes fundamentais do niceísmo que se configurava como ortodoxia naquele processo.

Verificamos que na pars occidentalis, o desempenho de Ambrósio como bispo de Milão e como aquele que estava próximo do círculo de poder imperial fez dele um indivíduo bastante ativo na reunião em Aquileia. Na ocasião deste concílio, houve a exaltação dos princípios nicenos e a deposição dos bispos homoeans13 13 Os homoeans pregavam que Jesus era constituído de uma substância similar a seu Pai (homoean, ou seja, de substância semelhante), mas que Ele não era da mesma substância de seu Pai. Tal proposição opunha-se a noção homoousian (ou seja, a noção da consubstancialidade), salvaguardada no Concílio de Niceia de 325. Palladio e Secundiano de suas cátedras em Ratiaria (atual Arcar) e Singidumum (atual Belgrado), respectivamente. No início do século XX, o teólogo Frederick Homes Dudden considerou este concílio como “a vitória do catolicismo sobre o arianismo”14 14 DUDDEN, Frederick Homes. The life and times of St. Ambrose. v. I. Oxford: The Clarendon Press, 1935, p. 205. . Um ponto de vista excessivo, sob nosso entendimento.

Certamente aquelas disposições conciliares marcaram “uma vitória” importante para os defensores da fé cristã-nicena, todavia, não foi “a vitória” decisiva, afinal, sabemos que os conflitos entre diversos grupos arianos e nicenos continuaram a fazer parte do cotidiano de Ambrósio e de outros personagens. Se realmente as reuniões eclesiásticas de 381 tivessem colocado um ponto final nas heresias arianas do século IV, Ambrósio não necessitaria responder aos enfrentamentos dos arianos homoianos nos seus últimos três livros do De fide, nem Gregório de Nissa despenderia esforços na escrita de seu Contra Eunômio, também redigido entre 380 e 383, como as obras do milanês.

Sabemos que toda esta elaboração escrita e as ações executadas em prol do niceísmo muitas vezes não tiveram resultado imediato. Evidenciamos, sim, que Ambrósio tinha sua autoridade engrandecida pouco a pouco, devido a suas vinculações, aos serviços oferecidos ao império dos romanos - especialmente à comunidade milanesa - e a suas pregações. Todavia, desejava que suas elucidações sobre fé nicena ganhassem notoriedade não somente no presente, mas também no futuro. Por isso, escrevia. Seu apreço ao texto escrito demonstra-nos que ele redigia com o intuito de que a verdade nicena fosse registrada e propagada.

Da participação ambrosiana no Concílio de Aquileia, resultaram cinco cartas redigidas por ele em nome dos representantes nicenos presentes no concílio. Três delas foram encaminhadas para os imperadores dos territórios ocidentais e dos orientais, Graciano, Valentiniano II e Teodósio, e outras duas, apenas ao augusto oriental.15 15 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10); 5 (11); 6 (12); Ep. ex. coll. 9 (13); 8 (14). Como tema comum, o autor solicitava que os governantes reforçassem as decisões conciliares. Situação que nos demonstra a persistente relação entre elementos religiosos, políticos e jurídicos naquele momento.

Caroline Humfress recorda-nos que as disposições das reuniões eclesiásticas podiam adquirir força através das constitutiones imperiais. E um dos fatores que determinava o sucesso dessas petições era, sem dúvida, a estima individual do bispo que a solicitara.16 16 HUMFRESS, Caroline. Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity, op. cit., p. 208.

É neste contexto de interações entre resoluções canônicas, sistematização de dogmas religiosos, elaborações legislativas e políticas imperiais que devemos compreender essas missivas ambrosianas. Advertimos que, neste artigo, deteremos nossas análises sobre os documentos que tinham Graciano entre seus destinatários, pois, no que se referia aos territórios ocidentais do império, naquele momento, Ambrósio tinha este augusto como referencial, não Valentiniano II - tutorado por Justina, que professava ideais homoeans. Deste modo, prosseguimos nossas investigações sobre as Epistolae extra collectionem 4 (10), 5 (11) e 6 (12) de autoria ambrosiana.

Ademais de indicar os destinatários, os cabeçalhos dessas epístolas traziam consigo uma forte carga de valores morais cristianizados atribuídos aos governantes:

Imperadores clementíssimos e cristãos, e beatíssimos príncipes Graciano, Valentiniano e Teodósio, o santo Concílio de Aquileia concordou [com esta carta].17 17 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10): “Imperatoribus clementissimis et christianis, beatissimisque principibus Gratiano, Valentiniano et Theodosio, sanctum Concilium quod convenit Aquiliae.” (Tradução da autora.)

Imperadores clementíssimos, e príncipes cristãos, gloriosíssimos e beatíssimos Graciano, Valentiniano e Teodósio, o Concílio de Aquileia concordou.18 18 AMBRÓSIO. Ep, ex. coll. 5 (11): “Imperatoribus clementissimis, et principibus christianis, gloriosissimis ac beatissimis Gratiano, Valentinitno, et Theosdosio Concilium quod convenit Aquileiae.” (Tradução da autora.)

Imperadores clementíssimos e cristãos, e gloriosos, beatíssimos príncipes Graciano, Valentiniano e Teodósio, o santo Concílio de Aquileia concordou.19 19 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12): “Imperatoribus clementissimis christianisque, et gloriosos, beatissismque princibus Gratiano, Valentiniano, et Theodosio sanctum Concilium quod convenit Aquileiae.” (Tradução da autora.)

Notamos que algumas palavras apenas mudaram de posição nas frases, todavia, nos três casos, elas apresentavam a mesma imagem imperial para os três augustos. As qualidades de serem clementes, gloriosos, beatos e cristãos descreviam os príncipes, os líderes desejados e elaborados por Ambrósio em um discurso que procurava defensores para as ideias aprovadas no concílio. Em uma via de mão dupla, o autor exaltava a supremacia e as virtudes imperiais - construindo autênticos soberanos, cristãos, é fato -, enquanto almejava que estes governantes se imbuíssem desses valores para amparar a fé nicena.

Lembremos que o gênero epistolar exigia a observância de normas em sua escrita. Entre elas, a apresentação do destinatário era feita por alcunhas que o identificassem, normalmente, de forma positiva. Entretanto, o reconhecimento elaborado pelo bispo milanês, além de louvar os príncipes por suas virtudes, vinculava-os ao cristianismo. É interessante percebermos que todos os imperadores receberam tais denominações. Por isso, mais do que “uma pessoa imperial”, afirmamos que Ambrósio buscava edificar “uma figura imperial cristã”, uma instituição de poder temporal duradoura que favorecesse os princípios nicenos, banisse as heresias e que garantisse a tranquilidade na expansão da ortodoxia.

Naquele momento, tal instituição era representada por Graciano, Valentiniano II e Teodósio I, sendo o mais velho da dinastia valentiniana o imperador com quem o bispo mantinha relações mais estreitas até então. E, consequentemente, aquele para quem o milanês fazia seus pedidos e reportava suas reprovações de maneira mais direta. Em contrapartida, o sacerdote fortalecia a imagem de Graciano como líder dos romanos, inclusive perante os outros augustos.

Embora a Epistola extra collectionem 4 (10), escrita quando o bispo ainda estava em Aquileia, esteja endereçada aos três imperadores, percebemos que, de fato, o autor clamava pela atenção de Graciano. Já no segundo parágrafo dessa carta, Ambrósio expôs sua preocupação com a heresia ariana e solicitou que Graciano o ouvisse: “Então isso é completo em ti, mais clemente dos imperadores.”20 20 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 2: “Unde completum est in te, clementissime principum Gratiane.” Aqui, Graciano não era apenas um “imperador clemente”, mas, sim, “clementissime”, expressão redigida no superlativo. Portanto, na comparação entre os governantes, Graciano tinha sua clemência destacada com relação àqueles com quem dividia o imperium. E, ainda, era o nome de Graciano que Ambrósio grafara em sua missiva: não no cabeçalho, como exigiam as normas de correspondências entre um líder comunitário e os augustos, mas no corpo de seu texto.

Para Ambrósio, dois homens sintetizavam a oposição ao sínodo de Aquileia devido à profanação e às ímpias palavras (prefanis et impiis vocibus): Palladio e Secundiniano. Na epístola em questão, Ambrósio informou os augustos sobre a deposição desses dois indivíduos, levada a cabo em conformidade com as resoluções conciliares.21 21 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 1-2.

Neste ínterim, apelou-se à fidelidade (fide) e à glória (gloria) imperial,22 22 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 8. a fim de o governante - desejoso de manter-se fiel e glorioso - acatasse as decisões conciliares como válidas no universo sociopolítico romano. Ou seja, o bispo milanês e seus apoiadores necessitavam que as resoluções de Aquileia ganhassem o amparo e a corroboração do poder temporal para que fossem efetivadas. Desta maneira, o poder de imperium validaria as assertivas nicenas e garantiriam a esta crença o aval de verdadeira e universal. Lembremos, com esta crença, um ideal de unidade e de ordem eram propagados. Uma noção bastante interessante para resguardar a primazia de Graciano nos territórios romano-ocidentais sobre seu irmão, Valentiniano II, Teodósio e os possíveis usurpadores de seu imperium.

No parágrafo 23 desta mesma epístola o bispo aludia à clemência imperial (clementi vestra) para que as palavras dos “homens santos” (sanctos viros), “legados do concílio” (legatos concilii), fossem ouvidas em audiência:

Suplicamos a vossa clemência, portanto, que os legados do conselho, os homens santos, sejam dignos de vossa audiência e para que o retorno da demanda seja rápido, para que sejam efetivas as coisas que pedimos; de modo que recebeis vossa recompensa de nosso Senhor Deus Ungido, cujas eclésias purificastes de todos os desastres do sacrilégio.23 23 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 11: “Petimus igitur ut legatos concilii, sanctos viros aeque clementia vestra audire dignetur, et cum effectu eorum quae poscimus, maturius redire praecipiat; ut mercedem recipiatis a Domino Deo Christo, cujus ecclesias ab omni sacrilegorum labe purgastis.” (Tradução da autora.)

Com esta elaboração, o sacerdote milanês revestia os representantes das resoluções conciliares com oposto de embaixadores (legatos) e com a santidade. Uma construção retórica repleta de elementos legitimadores: as deliberações do concílio seriam anunciadas por sancti viri e legati, por isso, necessitavam ser obedecidas.

A tradicional função de legado - mensageiro, representante máximo de uma esfera de poder perante outro - acolheu o acréscimo da sacralidade. Logo, noções acasteladas por esses representantes de poder deveriam receber atenção e proteção imperial. Ainda em tempo, o bispo solicitou que tais mensageiros não só fossem ouvidos como também que eles tivessem uma pronta resposta (maturius redire) a suas demandas, situação que instaurava a comunicação entre aquelas pessoas consideradas sagradas e os soberanos do império dos romanos. Neste diálogo, por um lado, os imperadores, especialmente Graciano, teriam a função de legalizar os pleitos conciliares. Por outro lado, ao operar em favor das comunidades cristãs nicenas e eliminar os sacrilégios, os governantes receberiam as gratificações Divinas, ou seja, a ordenação de sua sociedade e a manutenção de seu poder.

Notamos que além da Epistola extra collectionem 4 (10), Ambrósio escreveu outras quatro cartas a respeito da reunião em Aquileia. Em todas elas, tanto os adjetivos positivos que revestiam aquela petição e aqueles que a faziam quanto o próprio requerimento para que as decisões conciliares fossem colocadas em prática pelo poder temporal eram temas recorrentes. O que nos sugere que tais assuntos e práticas eram aceitáveis para aquele cenário sociopolítico.

Recordamos, ainda, que o final do século IV, especialmente os anos 380 e 381, foi frutífero na promulgação de constituições a favor do ideal da consubstancialidade divina. Uma vez que os próprios imperadores haviam declarado em uma constitutio que acreditavam em “uma divindade única do Pai, do Filho e do Espírito em igual majestade” e que os povos governados por eles deveriam seguir a religião do “divino apóstolo Pedro”,24 24 C.Th. XVI, 1, 2 (fev. 380): “cunctos populos, quos clementiae nostrae regit temperamentum, in tali volumus religione versari, quam divinum petrum apostolum tradidisse romanis [...] ut secundum apostolicam disciplinam evangelicamque doctrinam patris et filii et spiritus sancti unam deitatem sub parili maiestate et sub pia trinitate credamus.” (Grifos meus.) a solicitação ambrosiana seria totalmente compreensível e admissível naquele momento.

Ainda no último parágrafo da Epistola extra collectionem 4 (10) o bispo relembrou que os destinatários tinham o apoio de Deus caso promovessem a paz em favor da comunidade cristã: “A reverência deve ser mostrada primeiro à comunidade católica, em seguida, então, feita às leis; para que vós, protegidos de Deus, triunfeis, quando considereis a paz e a tranquilidade da eclésia”.25 25 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 12: “reverentiam primum Ecclesiae catholicae, deinde etiam legibus vestris deferri jubeatis; ut et vos, Deo praesule, triumphetis, qui paci Ecclesiarum quietique consulitis.” (Tradução da autora.)

Mais uma vez, observamos que a proteção divina aos imperadores e os sucessos desses governantes estavam vinculados a ações benéficas, por eles patrocinadas, em prol da “comunidade católica” (ecclesia catholica). Um amparo e sucesso desejado principalmente a Graciano, denominado logo no início desta missiva. A elaboração discursiva que sujeitava a assistência de Deus ao dever dos governantes de patrocinar a “paz da eclésia” (pax ecclesiarum) foi retomada na Epistola extra collectionem 5 (11).26 26 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 4, 6.

Ainda no trecho anteriomente destacado, percebemos outro elemento discursivo bastante disseminado entre os autores cristãos: o respeito às leis divinas, ou seja, as normas que regiam as comunidades cristãs tinham primazia sobre as leis dos homens, embora estas também devessem ser cumpridas - depois das divinas, segundo a noção ambrosiana.

Na antiguidade romana, as leis amparavam a noção de liberdade (libertas). No século I a.C., Tito Lívio já afirmava que o povo romano livre vivia sob o império das leis, mais forte do que o dos homens.27 27 LIVIO, Tito. Historia de Roma desde su fundación II, 1,1. Notamos que, evidentemente, a libertas de Lívio era pensada e aplicada como uma virtude que havia sido criada após o fim da monarquia, na república romana, inserida em um contexto no qual verificamos a ausência de um poder monárquico (unitário). Já em época imperial, mesmo com o retorno de um poder individual reconfigurado, a essência da libertas era a observância das leis. Portanto, o homem livre somente existiria sob a lei, nunca sob o comando de vontades alheias.

O verdadeiro homem romano era livre porque vivia em conformidade com condutas normatizadas, longe das paixões que moviam a ferocitas do bárbaro e a tirania dos maus governantes. A libertas era outro tema bastante presente nos discursos de autores defensores e identificadores da romanidade.28 28 Embora entendamos que existiam diversas romanidades, os discursos identificadores buscavam singularizá-la, ao eliminar de suas elaborações pontos plurais e edificar elementos que promoviam a união de distintos grupos. Edificaram-se os romanos como portadores da liberdade, da ordem, das boas ações, das virtudes, noções estas vinculadas a civilitas. Aos estrangeiros, restava a barbárie e/ou a opção de serem resgatados pela civilidade romana.

A barbárie levava à servidão, os princípios romanos, à liberdade. Desde o antigo mundo grego debatia-se a oposição entre o “governo das leis” e o “governo dos homens”. Ao longo dos séculos, os escritores apropriaram-se de inúmeros juízos morais e políticos para construir discursos legitimadores de sua ideia, imputando ao primeiro a qualidade de “bom governo” e ao segundo, “mau governo”.

Portanto, lei e liberdade sustentavam uma dupla poderosa dentro da organização da sociedade romana. Todavia, em concordância com a noção cristã de que a eternidade vivida na cidade celeste era o objetivo máximo do indivíduo fiel, os preceitos divinos eram tidos como superiores aos terrenos. Na década de 1950, o jurista Biondi Biondi esclarece que aquelas leis eram genericamente chamadas de “religio ou fides catholica, de lex christiana, divina, catholica, sacrosancta” e, mais especificamente de Escritura Sagrada, Evangelho, doutrina e concílios. O doutor em direito romano notou ainda que a interseção entre os cânones conciliares e a legislação marcavam o encontro da lei divina com a lei humana.29 29 BIONDI, Biondi. Il diritto romano-cristiano. v. I. Milão: Giuffrè, 1952, p. 231-232.

Neste cenário, observamos os motivos de Ambrósio alegar que ambas as leis, divina e humana, deveriam ser respeitadas. Teoricamente, a observância das leis conduzia a sociedade dos romanos para a ordenação e para o bem comum. E uma vida vivida corretamente, sob os princípios nicenos e voltados ao bem comunitário, levava à vida eterna, no plano espiritual. Notamos que o bispo inseriu em sua defesa das leis - e da ordenação social romana - a importância dos preceitos do Deus cristão niceno, como convinha a um destacado religioso que erigia discursos legitimadores da ortodoxia nicena. Percebemos, então, que elementos etéreos, sentimentos e normas políticas faziam parte de uma trama discursiva voltada para a vida prática daquela sociedade.

Outro documento referente ao Concílio de Aquileia redigido por Ambrósio foi a Epistola extra collectionem 5 (11). Era um pedido para que os três imperadores se dissociassem formalmente de Ursino, candidato ao episcopado de Roma vencido por Dâmaso em 366. Foi um importante aliado dos arianos que, sob o ponto de vista de Ambrósio, “perturbou a comunidade de Milão, juntamente com Valente, com uma detestável assembleia”.30 30 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 3: “[...] quo turbare Mediolanensem Ecclesiam coetu detestabili moliebatur cum Valente.” (Tradução da autora.) Em conformidade com McLynn, o personagem Valente mencionado nesta carta era o clérigo homoean Iulianus Valens. MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital, op. cit., p. 381. A preocupação do bispo com a comunidade milanesa deveria chamar a atenção, especialmente, de Graciano, visto que a Itália estava sob o imperium deste augusto. Novamente, sugerimos que Ambrósio tinha este imperador como o principal destinatário desta carta.

O historiador cristão Sozomeno também aludiu a disputas e assassinatos cometidos por Ursino, clérigos e civis que o apoiavam.31 31 SOZOMENO. H.E. VI, 23. Ambrósio esclareceu que Ursino não era ariano, mas, sim, um aliado deste grupo. Em sua obra, McLynn apontou uma das possíveis motivações dessa aliança entre o homoean Valente e Ursino, quem, durante sua campanha para o episcopado de Roma, havia defendido os ideais do Concílio de Niceia e atacado a heresia ariana. Oito anos depois dessa candidatura, a união entre Valente e Ursino ocasionou transtornos e preocupações para a eclésia milanesa. E mesmo após estas agitações Ursino continuou a desfrutar o apoio de populares em Roma, o que incentivou o prefeito da cidade, em 381, a fazer um apelo em seu nome, a fim de que ele retornasse do exílio em Colônia.32 32 MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital, op. cit., p. 58-59.

Uma vez que a disputa episcopal da qual Ursino saiu perdedor ocorrera em Roma, perguntamo-nos por que Ambrósio citou transtornos para a comunidade milanesa? Encontramos algumas pistas sobre este fato na Historia Ecclesiastica de Sozomeno. Este autor elucidou-nos que, sob o episcopado de Dâmaso, muitas comunidades cristãs romano-ocidentais aderiram ao credo niceno e a defesa da unidade Trindade Divina, com exceção de Milão - com sé administrada por Auxêntio, até 374 -, da Gália e de Venetia (atual Veneza), onde os bispos seguiam dogmas similares aos de Ario.33 33 SOZOMENO. H.E. VI, 23.

Sendo assim, é bem provável que Milão tenha chamado a atenção de Valente e de Ursino devido a sua importância estratégica e porque ali encontravam um reduto homoean em terras romano-ocidentais, crença esta professada por Valente. Nesta cidade, conseguiriam o auxílio de uma voz de liderança: a voz do bispo ariano Auxêntio. Certo é que Ambrósio registrou sua preocupação com relação às atividades daqueles indivíduos em Milão e a coetânea movimentação favorável ao agitador Ursino certamente inquietava o bispo e seus aliados, situação que estimulou a redação da Epistola extra collectionem 5 (11).

Nesta missiva, além da oposição representada por Palladio e Secundiniano, o milanês mostrava-se aflito pela situação de Ursino:

Outra coisa aflige-nos muito, a qual, juntos consideramos, foi devidamente tratada; isso não podia se difundir por todo o corpo da eclésia e perturbar o universo todo. Embora frequentemente concordamos que Ursino não poderia rastejar sobre a vossa piedade [...] rogamos-lhes e findamos, se conduzais com dignidade, estimamos, não somente para prevenir acontecimentos futuros, mas também estremecidos com o pretérito, porque coisas já foram feitas por sua temeridade.34 34 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 2: “Aliud est quo magis angimur, de quo, quoniam convenimus, fuit rite tractandum; ne posset totum corpus Ecclesiae toto orbe diffusum, et universa turbare. Nam licet frequenter convenerimus Ursinum non potuisse obrepere pietati vestrae [...] deprecandos vos et obserando, si dignanter ducitis, aestimamus, non solum praecaventes futura, sed etiam praeterita, quae jam ipsius temeritate gesta sunt, perhorrescentes.” (Tradução da autora.)

Em nome dos participantes do Concílio de Aquileia, o bispo solicitava que os imperadores liderassem dignamente.35 35 Através da análise de trechos de obras de Cícero, Maria Helena da Rocha Pereira alegou que a dignitas estava mais associada à esfera política do que à moral, uma vez que tinha relação com o exercício de importantes cargos da res publica. Através dela, o agente mostrava nutrir sentimentos favoráveis com relação à administração romana. PEREIRA, Maria Helena da Rocha. II Parte: Ideias morais e políticas dos romanos. In: Estudos de história da cultura clássica. v. II. Cultura Romana, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 339-341. A virtude da dignidade (dignitas) exigia dos governantes ações favoráveis à administração pública. Sob o ponto de vista de Ambrósio, essas atuações deveriam impedir que Ursino praticasse suas “temeridades”.

O sacerdote milanês lembrou que as ações de Ursino eram baseadas na temeridade (temeritas), por isso, já tinham causado distúrbios na sociedade milanesa. Caso essas atitudes imprudentes se alastrassem, tomaria “todo o corpo da eclésia” e confundiria o “universo” (universus). Nessa afirmação, observamos novamente a vinculação da comunidade cristã-nicena, protegida por Ambrósio, ao termo “universal”, do grego, “católico”. Construção retórica que corroborava um discurso religioso a respeito da fé nicena, entendida como única, verdadeira, universal, ortodoxa. Uma unidade e uma universalidade que, quando voltadas à defesa do imperium, forneciam bases teóricas para a prática do poder dos augustos. Elementos que fomentavam a aliança entre o poder temporal e o poder espiritual em benefício de ambos. E, no caso específico de Ambrósio, aproximava-o cada vez mais de Graciano, a quem solicitava diretamente o cuidado com a eclésia milanesa; imperador para quem, simultaneamente a sua redação das epístolas sobre o Concílio de Aquileia, Ambrósio escrevia os últimos três livros do seu tratado De fide, a pedido do augusto.

Segundo o sacerdote milanês, o retorno daquele que atuava com temeridade - Ursino - ao seio da comunidade romana somente poderia provocar novos problemas. Por conseguinte, condicionou Ambrósio: “se conduzais com dignidade”. “Se” os imperadores conduzissem com dignidade, preveniriam os perigos gerados por aquele homem. No seu apelo aos governantes, o bispo tornou a dissociação de Ursino por parte dos imperadores uma condição de respeito ao imperium, ratificado pela dignitas.

Este preceito foi reforçado no parágrafo que finalizou a Epistola extra collectionem 5 (11): “Celebramos graças contínuas e ininterruptas a Deus Pai onipotente e a Cristo e Senhor Deus, quando (quo) isto for ordenado”.36 36 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 6: “Quo imperato, apud Deum omnipotentem Patrem, et Christum et Dominum Deum gratias jogi continuatione celebremus.” (Tradução da autora.) Mais uma vez, o autor impôs restrições às graças divinas: estas somente seriam alcançadas “quando” (quo) a solicitação dos participantes do Concílio de Aquileia, registrada pela pena ambrosiana, fosse atendida.

Por sua vez, a Epistola extra collectionem 6 (12) foi marcada por agradecimentos do bispo milanês aos governantes, uma vez que eles tinham devolvido a “paz e a concórdia” aos católicos:

Embora em cada uma de nossas igrejas quotidianamente celebramos com vigílias (excubias) ao nosso Deus, em favor de vosso império; ainda, reunidos como um, e acredito que nada há de mais bonito do que isso, damos graças ao nosso Deus onipotente em favor de vosso império e vossa paz e saúde, porque através de vós, a paz e a concórdia voltaram. (T.A.)37 37 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 2: “Qui licet per singula quasque ecclesias quotidianas apud Deum nostru pro imperio vestro celebremus excudias; tamen conducti in unum, quo munere nihil esse pulchrius opinamur, Deo nostro emnipotenti et pro imperio, et pro pace ec salute vestra gratias agimus, quos per vos nobis pax et concordia ita sit refusa.” (Tradução da autora.)

Neste trecho, Ambrósio parece estar aliviado por ter um momento de sossego dentre tantos episódios conflituosos. Ao longo desta carta, o milanês lamentou os muitos movimentos conduzidos por arianos contra os cristãos nicenos, tanto na pars occidentalis como na pars orientalis do mundo romano. Entre estas agitações, o autor destacou as “perseguições” (persecutiones varias)38 38 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 1. de Demófilo e de Lucio, bispos arianos de Constantinopla e de Alexandria, respectivamente.

Em sua Historia Ecclesiastica, Sozomeno informou-nos que o ariano Demófilo fora eleito bispo de Constantinopla, em 370, sob o imperium de Valente - lembremos, um governante que compartilhava desses ideais. Os seguidores das crenças nicenas, por sua vez, tinham escolhido como bispo Evagrio. Os arianos reagiram contra essa situação. Uma tropa armada enviada pelo augusto Valente atuou com o intuito de restaurar a ordem na cidade. Demófilo manteve-se na cátedra episcopal, enquanto a Evagrio restou o exílio.39 39 SOZOMENO. H. E. 6, 13.

Com relação a Lucio, Sozomeno ressaltou a perseguição deste bispo ariano aos monges do deserto do Egito. Advertiu que os monastérios daquela região eram, até então, administrados por homens santos, opositores da heresia de Ario. Ao receber a notícia de que as noções nicenas espalhavam-se por recantos nos quais a fé cristã até então era desconhecida, Lucio organizou um movimento de repressão aos católicos do Egito.40 40 SOZOMENO. H. E. 6, 20.

Essas agitações foram motivo de lástima na epístola ambrosiana. O sacerdote observou que por toda parte os “sagrados templos de Deus” (sacra Dei templa) foram retirados dos católicos pelos arianos.41 41 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 3. Todavia, a redação da carta mostrou que esses problemas tinham sido superados pela intervenção dos imperadores. O bispo esclareceu que “através de vós, a paz e a concórdia voltaram”, por isso, os augustos mereciam as graças divinas. Outra vez, percebemos a edificação retórica de que os imperadores eram abençoados por Deus ao trabalharem em prol da fé nicena.

Como benefício das ações imperiais, Ambrósio salientou o retorno da paz e da concórdia. Notamos, então, a utilização de outras duas virtudes: pax e concordia. A paz estava intrinsecamente ligada a felicitas e a fortuna. Conforme o historiador Manuel Rodríguez Gervás, esclarecemos que fortuna é um termo derivado de felicitas. Este era o símbolo máximo do apoio dos deuses ao imperador.42 42 RODRÍGUEZ GERVÁS, Manuel J. Propaganda política y opinión pública en los panegíricos latinos del bajo Imperio. Salamanca, Espanha: Ediciones Universidad de Salamanca, 1991, p. 79. Sob a virtude da concórdia, era possível a manutenção da ordenação social. Portanto, da afortunada aliança entre o soberano terreno e a divindade resultava a paz, motivação essencial do governante correto.

Em anuência com a elaboração ambrosiana, esses dois importantes valores voltaram a integrar aquele contexto a partir do momento em que os imperadores atuaram contra os hereges, eliminaram a perfídia (exclusa perfidia) e restituíram a fé e a concórdia para os católicos (catholicis fides et concordia est restituta).43 43 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 6. Portanto, observamos que a paz e a união entre imperadores e súditos somente poderiam ocorrer mediante essas ações. Do contrário, reinaria o caos, legado aos hereges - e também aos bárbaros.

Em nossas análises, seguimos as direções de Silvia Acerbi sobre a utilização do sagrado como um “dispositivo de consenso”, ou seja, como um instrumento de autodefesa, mas também de afirmação da ordenação social.44 44 ACERBI, Silvia. Concilio y propaganda eclesiástica en el siglo V: estrategias de persuasión y adquisición del consenso al servicio del poder episcopal. In: CASTAÑEDA BRAVO, Gonzalo; GONZÁLEZ SALINERO, Raúl (Eds.). Propaganda y persuasión en el mundo romano. Actas del VIII Coloquio de la Asociación Interdisciplinar de Estudios Romanos celebrados en Madrid (diciembre 2010). Madri; Salamanca: Signifer Libros, 2011, p. 296. As edificações retóricas registradas nessas três epístolas ambrosianas projetavam princípios ideológicos - políticos, religiosos e sociais - e exigiam a modificação de sentimentos e de atitudes, transformando ideias abstratas em práticas que deveriam orientar os comportamentos daquela sociedade.

Certamente, para que tais modelos se convertessem em consenso, a autoridade e o carisma daqueles que difundiam essas noções deveriam se destacar. Para tanto, exigia-se do locutor destrezas retóricas para elaborar um texto crível, habilidades com a oratória e um expressivo lugar social. Os dois primeiros pontos, Ambrósio cultivou desde sua infância, já seu papel de destaque na coletividade em que vivia foi construído paulatinamente, através de sua carreira civil e episcopal, amparadas em seus serviços em prol do imperium dos romanos e em discursos que legitimavam a auctoritas do sacerdote e o espaço do milanês junto aos círculos imperiais.

Ao encaminhar suas missivas aos três imperadores, Ambrósio cumpria sua função de bispo de Milão - cidade sede da corte de Graciano - e membro ativo do Concílio de Aquileia. Em contrapartida, esperava que os três augustos acolhassem suas argumentações e oferececem os meios para que elas fossem difundidas nos mais variados territórios romanos. Seguramente, o milanês podia desejar mais atenção do imperador que estava mais próximo de si: Graciano. E, em uma via de mão dupla, o poder espiritual de Ambrósio legitimava a unidade do imperium de Graciano nos territórios administrados por esse governante, enquanto este imperador assegurava aos discursos ambrosianos e a sua crença religiosa a reputação da ortodoxia.

Considerações finais

Observamos que entre os anos de 378 e 381 houve uma intensa produção jurídica que favoreceu a divulgação dos ideais nicenos como ortodoxos e universais. Atrelado a esta elaboração legislativa, a convocação de concílios por parte de Teodósio e de Graciano e os discursos redigidos sobre essas assembleias incrementaram as bases de sustentação da ortodoxia nicena. Enquanto nas terras romano-orientais o bispo Ascolio assistia o imperador Teodósio nas questões religiosas, nos territórios ocidentais do império coube ao bispo Ambrósio a tutoria de Graciano para esses assuntos.

Tais circunstâncias nos demonstram a existência de uma aliança entre poder temporal e poder espiritual que interferia na prática cotidiana da sociedade dos romanos. Editos imperais, concílios eclesiásticos e pregações patrocinadas pelos augustos exaltavam a superioridade do credo niceno e convidavam as pessoas a aderirem a esta causa. Em contrapartida, o favorecimento oferecido pelos augustos aos ideais nicenos engrossavam a base de apoio imperial com líderes sociopolíticos e religiosos defensores desta crença. Neste artigo, analisamos de que maneira Ambrósio, bispo de Milão, atuou para corroborar a fé nicena e a utilidade do poder imperial no contexto imediatamente posterior ao Concílio de Aquileia, realizado no ano de 381.

As três cartas escritas por Ambrósio em nome dos participantes desse concílio reuniam as virtudes da clemência, da glória, da paz, da dignidade e da concórdia, todas tradicionalmente pertencentes ao espaço greco-latino, na defesa da pax ecclesiarum45 45 AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 12. e das leis divinas. Igualmente, as argumentações ali dispostas tendiam a transformar os governantes do imperium dos romanos em imperadores cristãos e beatos. Percebemos, pois, que elementos comuns à paideia daquele contexto recebiam novas significações para acastelar uma sociedade cristã-nicena ansiosa por identidades e por ocupar um lugar de destaque no mundo romano. Nesta ocasião, estereótipos foram divulgados e recebidos; seguramente, foram rebatidos por muitos, mais um sinal de que foram admitidos, pois suscitaram respostas. Tais estereótipos agem como simplificadores de uma realidade múltipla e nos permitem compreender o tipo de comunidade que se desejava erigir. Neste caso, Ambrósio buscava, nos territórios romano-ocidentais, uma sociedade cristã-nicena conduzida especialmente por Graciano, o augusto com quem possuía importantes laços.

Documentos

  • AMBRÓSIO. Epistolae Prima Classis: Textos latinos disponíveis em: < Epistolae Prima Classis: Textos latinos disponíveis em: http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_Epistolae_Prima_Classis,_MLT.pdf >. Acesso em: 1 maio 2016.
    » http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_Epistolae_Prima_Classis,_MLT.pdf
  • AMBRÓSIO. Epistolae Secunda Classis: Textos latinos disponíveis em: < Epistolae Secunda Classis: Textos latinos disponíveis em: http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_Epistolae_Secunda_Classis,_MLT.pdf >. Acesso em: 5 maio 2014.
    » http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_Epistolae_Secunda_Classis,_MLT.pdf
  • AMBRÓSIO. De excessu fratris; De obitu Valentiniani Consolatio; De Obitu Theodosii Oratio: Discursos consolatorios. Introducción, traducción y notas de Agustín López Kindler. Texto latino y castellano. Madri: Editorial Ciudad Nueva, 2011.
  • AMBRÓSIO. De fide: Sobre la fe. Introducción, traducción y notas de Secundino García. Madri: Editorial Ciudad Nueva , 2009.
  • AMBRÓSIO. De fide. Texto latino disponível em: < Texto latino disponível em: http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_De_Fide_Ad_Gratianum_Augustum_Libri_Quinque,_MLT.pdf >. Acesso em: 12 jan. 2014.
    » http://www.documentacatholicaomnia.eu/02m/0339-0397,_Ambrosius,_De_Fide_Ad_Gratianum_Augustum_Libri_Quinque,_MLT.pdf
  • AGOSTINHO. A cidade de Deus. v. I e II. Introdução de Emmanuel Carneiro Leão; tradução de Oscar Paes Leme. Petrópolis-RJ: Vozes; São Paulo: Federação Agostiniana Brasileira; Bragança Paulista-SP: Editora Universitária São Francisco, 2012. (Vozes de Bolso)
  • AGOSTINHO. De civitate Dei. Texto latino disponível em: <http://www.augustinus.it/latino/cdd/index2.htm>. Acesso em: 19 out. 2014.
    » http://www.augustinus.it/latino/cdd/index2.htm
  • Codex Theodosianus. Disponível em: <Disponível em: http://www.thelatinlibrary.com/theodosius.html >. Acesso em: 1o maio 2016.
    » http://www.thelatinlibrary.com/theodosius.html
  • LIEBESCHUETZ, J. H. W. G. Ambrose of Milan: Political Letters and Speeches. Translated with an introduction and notes by J. H. W. G. Liebeschuetz with the assistance of Carole Hill. 2. ed. Series Translated Texs for Historians. Liverpool: Liverpool University Press, 2010.
  • PLATÃO. A República. Livros I, VII. Tradução para o idioma português de Pietro Nassatti. 7. reimpr. São Paulo: Martin Claret, 2009.
  • SOZOMENO. Ecclesiastical History: A History of the Church in Nine Books, from 324 to 440. v. 1 of 9 (Classic Reprint Series). Londres: Forgotten Books, 2012. (SOZOMENUS. Historia Ecclesiastica.)
  • LIVIO, Tito. Historia de Roma desde su fundación. Libros I-III. Introducción general de Ángel Sierra. Traducción y notas de José Antonio Villar Vidal. Madri: Editorial Gredos, 1990.

Bibliografia

  • ACERBI, Silvia. Concilio y propaganda eclesiástica en el siglo V: estrategias de persuasión y adquisición del consenso al servicio del poder episcopal. In: CASTAÑEDA BRAVO, Gonzalo; GONZÁLEZ SALINERO, Raúl (Eds.). Propaganda y persuasión en el mundo romano. Actas del VIII Coloquio de la Asociación Interdisciplinar de Estudios Romanos celebrados en Madrid (diciembre 2010). Madri; Salamanca: Signifer Libros, 2011.
  • BIONDI, Biondi. Il diritto romano-cristiano. v. I. Milão: Giuffrè, 1952.
  • DUDDEN, Frederick Homes. The life and times of St. Ambrose. v. I. Oxford: The Clarendon Press, 1935.
  • ESCRIBANO PAÑO, María Victoria. Graciano, Teodosio y el Ilírico: la constitutio Nullus (locus) haereticis (C.Th. 16, 6, 6. 381). Revue internationale des droits de l’antiquité, n. 51, p. 133-166, 2004.
  • HUMFRESS, Caroline. Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity. Nova York: Oxford University Press, 2007.
  • MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital. Berkeley: University of California Press, 1994, p. 111.
  • PEREIRA, Maria Helena da Rocha. II Parte: Ideias morais e políticas dos romanos. In: Estudos de História da Cultura Clássica. v. II. Cultura Romana. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 319-421.
  • RODRÍGUEZ GERVÁS, Manuel J. Propaganda política y opinión pública en los panegíricos latinos del bajo Imperio. Salamanca, Espanha: Ediciones Universidad de Salamanca, 1991.
  • SCHAFF, Philip. Ambrose: Selected Works and Letters. Translated by Philip Schaff. Grand Rapids, MI-USA: Christian Classics Ethereal Library, 2004.
  • 1
    SOZOMENUS. H. E. VII, 4-5
  • 2
    Os pontífices eram responsáveis por controlar as ações da lei. Seu número modificou-se demasiadamente ao longo da Antiguidade romana. Acima de todos os pontífices, estava o pontifex maximus. Como principal figura religiosa das crenças politeístas romanas, ele tinha poderes de vida e de morte sobre as vestais e era sua atribuição elaborar o calendário. Conforme a etimologia, pontifex era aquele que “fazia pontes”, ou seja, era responsável por construir o caminho religioso do império.
  • 3
    É importante notarmos que o termo ortodoxia carrega em si julgamentos de determinados grupos. Neste ensejo, de acordo com Caroline Humfress ortodoxia e heresia devem ser entendidas pelos historiadores como “conceitos performáticos”, ou seja, termos envolvidos pelas regras sociais sob as quais eram definidos. No século IV, a ortodoxia passou a designar a correta crença apoiada em Cristo, reconhecida como verdadeira. Por outro lado, a heresia recebeu ares de errada e de desviante, dividida em muitas seitas, era delineada como mentirosa e fraudulenta. Evidentemente, o papel social atribuído ao herege não foi produzido por ele, por isso a heresia deve ser entendida em um “espaço discursivo”. Neste contexto de definições identitárias, toda seita cristã, com exceção dos maniqueístas, requereram para si a alcunha de “cristianismo verdadeiro”. In: HUMFRESS, Caroline. Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity. Nova York: Oxford University Press, 2007, p. 220-222.
  • 4
    Ibidem, p. 145-146; p. 203-205.
  • 5
    No século V, este edito foi compilado no Código Teodosiano sob o título de constitutio XVI, 1, 2.
  • 6
    C.Th. XVI, 1, 2.
  • 7
    AMBRÓSIO. De fide I, prologus: “Gratianum ob ardorem discendae fidei laudat Ambrosius, semet vero deprimit”.
  • 8
    Do grego οἰκουμένη (mundial).
  • 9
    MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital. Berkeley: University of California Press, 1994, p. 112.
  • 10
    O primeiro concílio universal foi o de Niceia, em 325 — uma cidade dos territórios romano-ocidentais. Em 381, temos um concílio realizado na parte oriental do império dos romanos.
  • 11
    C.Th. XVI, 1, 3: “Episcopis tradi omnes ecclesias mox iubemus, qui unius maiestatis adque virtutis patrem et filium et spiritum sanctum confitentur eiusdem gloriae, claritatis unius, nihil dissonum profana divisione facientes, sed trinitatis ordinem personarum adsertione et divinitatis unitate [...]”. (Tradução da autora.)
  • 12
    ESCRIBANO PAÑO, María Victoria. Graciano, Teodosio y el Ilírico: la constitutio Nullus (locus) ­haereticis (C.Th. 16, 6, 6. 381). Revue internationale des droits de l’antiquité, n. 51, p. 133-166, 2004, p. 137-138; p. 144-145.
  • 13
    Os homoeans pregavam que Jesus era constituído de uma substância similar a seu Pai (homoean, ou seja, de substância semelhante), mas que Ele não era da mesma substância de seu Pai. Tal proposição opunha-se a noção homoousian (ou seja, a noção da consubstancialidade), salvaguardada no Concílio de Niceia de 325.
  • 14
    DUDDEN, Frederick Homes. The life and times of St. Ambrose. v. I. Oxford: The Clarendon Press, 1935, p. 205.
  • 15
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10); 5 (11); 6 (12); Ep. ex. coll. 9 (13); 8 (14).
  • 16
    HUMFRESS, Caroline. Ortodoxy and the Courts in Late Antiquity, op. cit., p. 208.
  • 17
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10): “Imperatoribus clementissimis et christianis, beatissimisque principibus Gratiano, Valentiniano et Theodosio, sanctum Concilium quod convenit Aquiliae.” (Tradução da autora.)
  • 18
    AMBRÓSIO. Ep, ex. coll. 5 (11): “Imperatoribus clementissimis, et principibus christianis, gloriosissimis ac beatissimis Gratiano, Valentinitno, et Theosdosio Concilium quod convenit Aquileiae.” (Tradução da autora.)
  • 19
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12): “Imperatoribus clementissimis christianisque, et gloriosos, beatissismque princibus Gratiano, Valentiniano, et Theodosio sanctum Concilium quod convenit Aquileiae.” (Tradução da autora.)
  • 20
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 2: “Unde completum est in te, clementissime principum Gratiane.”
  • 21
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 1-2.
  • 22
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 8.
  • 23
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 11: “Petimus igitur ut legatos concilii, sanctos viros aeque clementia vestra audire dignetur, et cum effectu eorum quae poscimus, maturius redire praecipiat; ut mercedem recipiatis a Domino Deo Christo, cujus ecclesias ab omni sacrilegorum labe purgastis.” (Tradução da autora.)
  • 24
    C.Th. XVI, 1, 2 (fev. 380): “cunctos populos, quos clementiae nostrae regit temperamentum, in tali volumus religione versari, quam divinum petrum apostolum tradidisse romanis [...] ut secundum apostolicam disciplinam evangelicamque doctrinam patris et filii et spiritus sancti unam deitatem sub parili maiestate et sub pia trinitate credamus.” (Grifos meus.)
  • 25
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 12: “reverentiam primum Ecclesiae catholicae, deinde etiam legibus vestris deferri jubeatis; ut et vos, Deo praesule, triumphetis, qui paci Ecclesiarum quietique consulitis.” (Tradução da autora.)
  • 26
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 4, 6.
  • 27
    LIVIO, Tito. Historia de Roma desde su fundación II, 1,1.
  • 28
    Embora entendamos que existiam diversas romanidades, os discursos identificadores buscavam singularizá-la, ao eliminar de suas elaborações pontos plurais e edificar elementos que promoviam a união de distintos grupos.
  • 29
    BIONDI, Biondi. Il diritto romano-cristiano. v. I. Milão: Giuffrè, 1952, p. 231-232.
  • 30
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 3: “[...] quo turbare Mediolanensem Ecclesiam coetu detestabili moliebatur cum Valente.” (Tradução da autora.) Em conformidade com McLynn, o personagem Valente mencionado nesta carta era o clérigo homoean Iulianus Valens. MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital, op. cit., p. 381.
  • 31
    SOZOMENO. H.E. VI, 23.
  • 32
    MCLYNN, Neil B. Ambrose of Milan: Church and Court in a Christian Capital, op. cit., p. 58-59.
  • 33
    SOZOMENO. H.E. VI, 23.
  • 34
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 2: “Aliud est quo magis angimur, de quo, quoniam convenimus, fuit rite tractandum; ne posset totum corpus Ecclesiae toto orbe diffusum, et universa turbare. Nam licet frequenter convenerimus Ursinum non potuisse obrepere pietati vestrae [...] deprecandos vos et obserando, si dignanter ducitis, aestimamus, non solum praecaventes futura, sed etiam praeterita, quae jam ipsius temeritate gesta sunt, perhorrescentes.” (Tradução da autora.)
  • 35
    Através da análise de trechos de obras de Cícero, Maria Helena da Rocha Pereira alegou que a dignitas estava mais associada à esfera política do que à moral, uma vez que tinha relação com o exercício de importantes cargos da res publica. Através dela, o agente mostrava nutrir sentimentos favoráveis com relação à administração romana. PEREIRA, Maria Helena da Rocha. II Parte: Ideias morais e políticas dos romanos. In: Estudos de história da cultura clássica. v. II. Cultura Romana, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 339-341.
  • 36
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 5 (11), 6: “Quo imperato, apud Deum omnipotentem Patrem, et Christum et Dominum Deum gratias jogi continuatione celebremus.” (Tradução da autora.)
  • 37
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 2: “Qui licet per singula quasque ecclesias quotidianas apud Deum nostru pro imperio vestro celebremus excudias; tamen conducti in unum, quo munere nihil esse pulchrius opinamur, Deo nostro emnipotenti et pro imperio, et pro pace ec salute vestra gratias agimus, quos per vos nobis pax et concordia ita sit refusa.” (Tradução da autora.)
  • 38
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 1.
  • 39
    SOZOMENO. H. E. 6, 13.
  • 40
    SOZOMENO. H. E. 6, 20.
  • 41
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 3.
  • 42
    RODRÍGUEZ GERVÁS, Manuel J. Propaganda política y opinión pública en los panegíricos latinos del bajo Imperio. Salamanca, Espanha: Ediciones Universidad de Salamanca, 1991, p. 79.
  • 43
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 6 (12), 6.
  • 44
    ACERBI, Silvia. Concilio y propaganda eclesiástica en el siglo V: estrategias de persuasión y adquisición del consenso al servicio del poder episcopal. In: CASTAÑEDA BRAVO, Gonzalo; GONZÁLEZ SALINERO, Raúl (Eds.). Propaganda y persuasión en el mundo romano. Actas del VIII Coloquio de la Asociación Interdisciplinar de Estudios Romanos celebrados en Madrid (diciembre 2010). Madri; Salamanca: Signifer Libros, 2011, p. 296.
  • 45
    AMBRÓSIO. Ep. ex. coll. 4 (10), 12.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2017

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2016
  • Aceito
    05 Set 2016
Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro Largo de São Francisco de Paula, n. 1., CEP 20051-070, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21) 2252-8033 R.202, Fax: (55 21) 2221-0341 R.202 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: topoi@revistatopoi.org