RESUMO
O artigo pretende analisar a experiência da fazenda Volkswagen (1973-1986), uma iniciativa de uma grande propriedade rural estabelecida no Sudeste do Pará durante a ditadura para criação extensiva de gado bovino. Para tratar do projeto, utilizamos documentos recentemente disponibilizados pela Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudani) acerca do empreendimento. Para analisar o episódio, dialogamos com a bibliografia que trata da responsabilidade empresarial pelas violações cometidas durante as ditaduras sul-americanas, destacadamente os trabalhos de Ricardo Rezende Figueira, José de Souza Martins, Benjamin Buclet, Antoine Acker e Juan Pablo Bohoslavsky. A partir da análise da documentação da Sudam, verificamos que há comprovação de elevada devastação ambiental, contratação de agentes que empregavam trabalho escravo e farta injeção de recursos públicos na fazenda, fazendo o projeto representativo do processo de modernização truculenta do capitalismo brasileiro durante a ditadura.
Palavras-chave
Volkswagen; ditadura brasileira; Amazônia; responsabilidade empresarial; trabalho escravo
ABSTRACT
This article analyzes the experience of the Volkswagen Farm (1973-1986), an initiative of a large rural property established in Southeast Pará during the Brazilian dictatorship for extensive cattle raising. It is based on documents about the project that the Superintendency for the Development of the Amazon (Sudam) recently made available. To analyze the episode, we dialogue with the scholarship dealing with corporate responsibility for violations committed during South America’s dictatorships in the second half of the twentieth century, notably the work of Ricardo Rezende Figueira, José de Souza Martins, Benjamin Buclet, Antoine Acker, and Juan Pablo Bohoslavsky. The analysis of Sudani’s documentation verified that the Volkswagen Farm caused severe environmental devastation, used hiring agents who employed slave labor, and relied on an abundant injection of public resources, making the project representative of the truculent modernization process of Brazilian capitalism during the dictatorship.
Keywords
Volkswagen; Brazilian Dictatorship; Amazon; Corporate Responsibility; Slavery
RESUMEN
El artículo pretende analizar la experiencia de la hacienda Volkswagen (1973-1986), una iniciativa de una grande propiedad rural establecida en el Sureste de Pará durante la dictadura para la ganadería extensiva. Para tratar del proyecto, utilizamos de documentos recientemente disponibles por la Superintendencia de Desenvolvimiento de la Amazonia (Sudam) acerca de la iniciativa. Para analizar el episodio, dialogamos con la bibliografía que trata de la responsabilidad empresarial por las violaciones cometidas durante las dictaduras suramericanas, destacando los trabajos de Ricardo Rezende Figueira, José de Souza Martins, Benjamin Buclet, Antoine Acker e Juan Pablo Bohoslavsky. A partir del análisis de los documentos de Sudam, verificamos que hay una comprobación de elevada devastación ambiental, contratación de gestores que empleaban trabajo esclavo y alta inyección de recursos públicos en la hacienda, haciendo el proyecto representativo del proceso de modernización truculenta del capitalismo brasileño durante la dictadura.
Palabras Clave
Volkswagen; dictadura brasileña; Amazonia; responsabilidad empresarial; trabajo esclavo
Em maio de 2022, a Volkswagen do Brasil foi acionada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) para prestar esclarecimento em audiência pública acerca da denúncia de uso de trabalho escravo em fazenda que ela possuía no Pará durante a ditadura. A primeira audiência foi marcada para o mês de junho e uma segunda para setembro. A empresa era acusada de contratar empreiteiros, também chamados de “gatos”, que arregimentava trabalhadores em regiões vizinhas e levavam-nos para trabalhar na fazenda, estabelecendo um sistema de escravidão por dívida em razão do transporte e outros custos para instalação do camponês. As denúncias foram feitas pela primeira vez em 1983 pelo padre Ricardo Rezende Figueira, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Figueira repassou mais de 600 páginas de documentos sobre o caso para o MPT, coligindo uma série de provas documentais e testemunhos de trabalhadores submetidos à condição de trabalho escravo. Os trabalhadores eram mantidos na fazenda em péssimas condições de moradia e labuta, sofrendo violências físicas e sendo proibidos de sair do recinto até que as dívidas fossem quitadas (REIS, 2022REIS, Alessandro. Como VW passou a ser investigada por trabalho escravo e tortura na Amazônia. UOL Carros. 1º jun. 2022. Disponível em: https://www.uol.com.br/carros/noticias/redacao/2022/06/01/como-vw-passou-a-ser-investigada-por-trabalho-escravo-e-tortura-na-amazonia.amp.htm. Acesso em: 27 jan. 2024.
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). Além disso, o projeto foi responsável por grande devastação ambiental, dado que era dedicado à criação extensiva de gado bovino e desmatou enorme área na região da Amazônia paraense. A fazenda contava com amplos recursos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudani) e Banco da Amazônia (Basa), conforme salientou na denúncia o procurador responsável pelo caso, Rafael Garcia Rodrigues (ALVES, 2022ALVES, Pedro. Ministério Público investiga trabalho escravo e tráfico de pessoas pela Volkswagen durante ditadura no Brasil: MP convocou empresa para audiência, onde deve ser discutida responsabilização por irregularidades. Denúncias foram reveladas por imprensa estrangeira; empresa diz que reforça “compromisso de contribuir com as investigações. G1. 30 maio 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/google/amp/df/distrito-federal/noticia/2022/05/30/ministerio-publico-investiga-trabalho-escravo-e-trafico-de-pessoas-pela-volkswagen-durante-ditadura-no-brasil.ghtml. Acesso em: 27 jan. 2024.
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). Importante sinalizar que esse não foi o primeiro processo movido contra a empresa por conta de violações cometidas contra trabalhadores durante a ditadura. A empresa reconheceu que colaborou com a repressão em sua fábrica em São Bernardo do Campo e firmou acordo com o Ministério Público Federal (MPF), em 2020, no valor de R$ 36 milhões.1
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G1. Volkswagen faz acordo com MPF para reparar violações dos direitos humanos durante a ditadura: montadora fará doações para ex-funcionários que foram alvo de perseguição e para iniciativas que preservam a memória histórica. Relatório de 2017 apontou que 6 trabalhadores foram presos e ao menos 1 foi torturado na fábrica do ABC paulista. Revista Autoesporte, 23 set. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/carros/noticia/2020/09/23/volkswagen-faz-acordo-com-mpf-para-reparar-violacoes-dos-direitos-humanos-durante-a-ditadura.ghtml. Acesso em: 27 jan. 2024.
O presente artigo analisa as atividades da fazenda Volkswagen, projeto empresarial tocado pela multinacional alemã no Sudeste do Pará a partir de 1973 que contou com denúncias de uso de trabalho escravo, amplos incentivos fiscais e financiamentos públicos, além de significativa devastação ambiental. Tentamos identificar e compreender as violações cometidas pela empresa Volkswagen no Brasil em suas atividades na propriedade mantida em Santana do Araguaia durante os anos 1970 e 1980, antes da sua venda para o grupo Matsubara, averiguando aspectos como o uso do trabalho escravo dos camponeses responsáveis pela devastação da floresta amazônica na propriedade, bem como a destruição ambiental proporcionada pelo projeto e a intensa injeção de recursos públicos no empreendimento.
A Companhia Vale do Rio Cristalino (CVRC) – nome formal da empresa responsável pela “fazenda Volkswagen” – já foi objeto de estudo e análise por parte de vários autores. Figueira (2004 et al.FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.; 2022FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.) tratou da escravidão na Amazônia, abordando especificamente em seus trabalhos o caso do uso de cativos na fazenda Volkswagen. Quem também tratou dos conflitos sociais na região amazônica foi Neide Esterci (1987)ESTERCI, Neide. Conflito no Araguaia: peões e posseiros contra a grande empresa. Rio de Janeiro: Vozes, 1987.. Outro autor que trabalhou a escravidão no Brasil contemporâneo foi José de Souza Martins (1994)MARTINS, José de Souza. A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 1-2, n. 6, p. 1-25, 1994., que enfatizou a Amazônia e mencionou o caso da propriedade da Volkswagen. Buclet (2005)BUCLET, Benjamin. Entre a tecnologia e a escravidão: a aventura da Volkswagen na Amazônia. O Social em Questão, Rio de Janeiro, n. 13, p. 1-12, 2005. tratou especificamente do uso da força de trabalho escravo na fazenda Volkswagen, ressaltando a convivência do moderno e do arcaico no projeto. Por fim, Acker (2014a)ACKER, Antoine. “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a transformar a Amazônia em uma arena política global. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 34, n. 68, p. 13-33, 2014a.; (2017ACKER, Antoine. Volkswagen in the Amazon: The Tragedy of Global Development in Modern Brazil. Cambridge: Cambridge University Press, 2017.) abordou a iniciativa como um todo, ressaltando a devastação ambiental, o uso da força de trabalho escravo e a injeção de recursos estatais.
Apesar da significativa contribuição de cada um desses estudos e da qualidade da abordagem desses autores, buscamos nos distinguir desses trabalhos e contribuir com o conhecimento e o debate por conta das fontes utilizadas e do método empregado. No que se refere às fontes, apesar de Figueira e Acker utilizarem material da Sudam, buscamos fazer uma análise sistemática da documentação da superintendência, divulgada em meio à ação do MPT junto à empresa recentemente. Entendemos que esse material evidencia e confere o elevado grau dos subsídios estatais concedidos ao projeto privado, bem como trazem dados documentais que comprovam a contratação de “gatos” que empregavam força de trabalho escrava, o que não só constava como um documento expedido pela própria empresa, como também foi submetido à Sudam como material necessário para obtenção de financiamento público. Assim, havia ciência de um órgão estatal da contratação de empreiteiros que empregavam escravos na fazenda. Acreditamos que a abordagem desses documentos traz elementos interessantes sobre o caso, confirmando entendimentos já estabelecidos e trazendo fatos novos, como conflitos com o IBDF, o grau de subsídio estatal e listagem de nomes de “gatos” no balancete da empresa, conforme veremos adiante.
Além disso, no que diz respeito ao método utilizado na investigação que deu origem a este artigo, nos baseamos na reflexão que busca verificar e imputar responsabilidade empresarial aos projetos capitalistas mantidos em países sob ditadura ao longo século XX, entendendo que as companhias que procediam violações em suas atividades são responsáveis pelos desmandos cometidos em meio ao regime de exceção. Assim, nossa hipótese é que a Volkswagen do Brasil tinha responsabilidade pelo uso da força de trabalho escravo em sua propriedade mediante a contratação de gatos que empregavam trabalhadores em regime de mão de obra cativa. Essas reflexões e método correspondem ao conjunto de estudos mantidos em nível internacional e que buscam identificar a responsabilidade das empresas e dos empresários pelas violações e política de terrorismo de Estado desenvolvidos em governos ditatoriais. Particularmente na região do Cone Sul essas investigações e reflexões têm avançado, em particular com a publicação de coletânea de pesquisas sobre a cumplicidade empresarial na Argentina (BOHOSLAVSKY; VERBITSKY, 2013BOHOSLAVSKY, Juan Pablo; VERBITSKY, Horacio. Cuentas pendientes: los cómplices económicos de la dictadura. Buenos Aires: Siglo Ventiuno, 2013.), Chile (BOHOSLAVSKY; FERNÁNDEZ; SMART, 2019BOHOSLAVSKY, Juan Pablo; FERNÁNDEZ, Karinna; SMART, Sebastián (orgs.). Complicidad económica con la dictadura: un país desigual a la fuerza. Santiago: LOM, 2019.) e Uruguai (BOHOSLAVSKY, 2016BOHOSLAVSKY, Juan Pablo (org.). El negocio del terrorismo de Estado: los cómplices económicos de la dictadura uruguaya. Montevidéo: Penguin, 2016.). A respeito da forma de estabelecer a responsabilidade empresarial, a historiadora argentina Victoria Basualdo possui uma compreensão que nos parece interessante e que levamos em consideração em nosso estudo e análise:
Falar de responsabilidade não implica em igualar níveis, desconhecer, de modo algum, o papel das forças armadas, nem implica em uniformizar o tipo de ação das empresas analisadas. Há graus, níveis e tipos de responsabilidade. Mas parece muito importante falar de responsabilidade porque a ideia de cumplicidade sempre alude a um acompanhamento secundário e parcial, nos dá um marco que parece indicar que as empresas nunca lideraram esses processos. E o que vemos, na realidade, é que isso não é assim, que existem muitos casos concretos que eu estou descrevendo nos quais as empresas não só acompanharam como foram co-responsáveis pelos processos repressivos - isso é algo a se levar em conta - não porque esse seja um caso único que possamos analisar, mas sim porque existe na realidade e nos dá um parâmetro conceituai diferente na hora de pensar o fenômeno (BASUALDO, 2020BASUALDO, Victoria. #JuicioBrigadas? Banfield-Quilmes-Lanús | VICTORIA BASUALDO en la Audiencia n° 8. 1 vídeo. Canal TV Universidade. 22 dez. 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Xf3g9L4EZRs&t=3s. Acesso em: 27 jan. 2024.
https://www.youtube.com/watch?v=Xf3g9L4E... ).2 2 Trad. livre dos autores: “Hablar de responsabilidad no implica igualar los niveles, no implica desconecer de ningún modo, el papel de las fuerzas armadas, ni implica uniformar el tipo de acción de todas las empresas analizadas. Hay grados, niveles y tipos de responsabilidad. Pero nos parece muy importante hablar de responsabilidad porque la cumplidad siempre alude a un acompañamiento secundario y parte, nos da un ponto de partida, nos da un marco que parece descontar que las empresas nunca lideraron estos procesos. Y lo que vemos, en cambio, es que esto no es así, que hay casos muy concretos que les estoy descrebiendo donde las empresas no solo acompañaron sino que fueron co-responsables de los procesos represivos - y esto es algo que hay que tener en cuenta - no porque esto sea el caso en todos los casos que uno pueda analizar, sino porque existe en la realidad y nos da un parámetro conceptual diferente a la hora de pensar este fenómeno”.
Assim, entender que a empresa e os empresários tiveram responsabilidade pelas violações cometidas durante a ditadura não desimplica as forças armadas e os dirigentes políticos responsáveis pela condução do aparelho de Estado naquele momento, mas ressalta a corresponsabilidade das companhias pelo arbítrio perpetrado. Dessa forma, apoiamo-nos também nos estudos recentes sobre a atuação do empresariado na ditadura brasileira (CAMPOS; BRANDÃO; LEMOS, 2020CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira; BRANDÃO, Rafael Vaz da Motta; LEMOS, Renato Luis do Couto Neto e (orgs.). Empresariado e ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Consequência, 2020.), que apontam para o papel decisivo mantido pelo empresariado na composição e sustentação do regime político inaugurado pelo golpe de 1964, percebendo que a relação desses agentes com o Estado nesse período não era de exterioridade, meramente de apoio e benefício, mas sim de integração e composição do pacto político e do bloco no poder.
O presente artigo está dividido em três partes. Na seção inicial, desenvolvemos uma breve elaboração sobre a história da Volkswagen, sua chegada ao Brasil e a política da ditadura para a região amazônica. Na segunda parte do artigo, tratamos do projeto da Companhia Vale do Rio Cristalino, a fazenda Volkswagen. Na terceira e última parte, exploramos o que a documentação da Sudam traz em relação ao projeto, enfatizando aspectos como os subsídios e financiamentos estatais, a contratação de empreiteiros que empregavam força de trabalho escrava e a devastação ambiental promovida pelo projeto. Depois dessas três seções, redigimos a conclusão na qual buscamos proceder uma síntese no texto.
Introito: a Volkswagen no Brasil e a política da ditadura para a Amazônia
A Volkswagen foi uma empresa criada na Alemanha pelo regime nazista durante a década de 1930. Com participação estatal e sinalização da produção de automóveis para reverter a depressão da economia germânica, a empresa colaborou com o esforço de guerra e, durante o conflito, chegou a empregar força de trabalho escrava de judeus e outros grupos perseguidos pelo nazisfascismo em sua fábrica. Após o fim da II Guerra Mundial, a empresa não foi desmobilizada pelas forças vitoriosas no conflito e a companhia foi mantida na República Federal Alemã (RFA). O que se viu foi justamente o crescimento da montadora de automóveis no compasso do “milagre” alemão da década de 1950, quando a empresa elevou ano após ano a produção de veículos e já passou a internacionalizar o seu parque produtivo menos de dez anos depois de encerrado o conflito no continente europeu. Com os mercados a Leste fechados para investimento e sem contar com colônias, a Alemanha se voltou para a América Latina e seus investimentos se direcionaram para países como o Brasil, primeiro país do mundo a receber uma fábrica da montadora fora do seu país natal (SILVA, 2022SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho. A Volkswagen e a ditadura: a fábrica de violência da multinacional alemã no Brasil durante o regime civil-militar. Rio de Janeiro: Consequência, 2022.).
A Volkswagen se instalou no Brasil em meio a um grande conjunto de investimentos de empresas multinacionais, em movimento intenso que caracterizou esse período, expressando a renovação e o advento de novas formas de dependência na economia brasileira. A instrução 113 da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), de 1955, proporcionava uma série de privilégios para as inversões do capital estrangeiro, que gozava de facilidades e benefícios cambiais e fiscais que os capitais nativos não dispunham. Assim, o governo Kubitschek viu um grande volume de investimentos e uma ampliação da participação estrangeira na economia brasileira, principalmente no controle dos segmentos mais dinâmicos da indústria existente no país. A Volkswagen instalou a sua fábrica de automóveis em São Bernardo do Campo em um momento em que o governo JK promovia um audacioso programa de desenvolvimento dos transportes no país, centrado na implementação da malha rodoviária. Moniz Bandeira recuperou matéria do jornal O Estado de S. Paulo na qual era trazida a informação de que empresários norte-americanos não se mostraram contentes com o pioneirismo da montadora alemã na produção automotiva no Brasil: “os projetos da Volkswagen para o Brasil (...), se realizados, não deixariam de causar sérios prejuízos à indústria norte-americana” (BANDEIRA, 2011, p. 115BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O ‘milagre alemão’ e o desenvolvimento do Brasil (1949-2011). São Paulo: Ed. Unesp, 2011.). O autor endossa um possível conflito entre capitais alemães e norte-americanos nesse período, o que é algo controverso, pois os investimentos da Volkswagen não foram impedidos ou encontraram uma barreira significativa e, além disso, o governo dos EUA nesse período se empenhava no fortalecimento e prosperidade do capitalismo e das empresas da Alemanha Ocidental.
Apesar de certa contrariedade norte-americana, a fábrica da Volkswagen foi inaugurada e a empresa despontou desde o início como a maior montadora de automóveis do país. Ao contrário do que as empresas norte-americanas previam, o mercado interno brasileiro era sólido e crescia progressivamente, de modo que a produção da Volkswagen evoluiu de forma notável e consistente desde o início das atividades da fábrica, em 1959. Após o golpe de 1964, a empresa encontrou um ambiente ideal para a prosperidade dos seus negócios no país. Além do acelerado crescimento econômico, em especial no período do “milagre”, o novo regime renovou os investimentos em rodovias, deu facilidades fiscais e cambiais para os investimentos estrangeiros e promoveu significativa política repressiva sobre a classe trabalhadora, impondo o “arrocho” salarial e cassando direitos trabalhistas conquistados previamente, como a estabilidade na empresa privada após dez anos de serviço, substituída pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), de 1966. Assim, a montadora pôde contar com uma força de trabalho cada vez mais barata, com capacidade limitada de mobilização e contestação dos salários e das condições de trabalho, dada a política repressiva do regime. Nesse sentido, a parceria entre a empresa e o Estado ditatorial rendeu lucros e expansão dos negócios por um lado, e repressão e vigilância da classe trabalhadora, por outro. Este cenário trouxe implicações na conformação da classe operária industrial não apenas na empresa, mas de maneira geral, devido ao porte da empresa no país (NEGRO, 2004NEGRO, Antonio Luigi. Linhas de montagem: o industrialismo nacional-desenvolvimentista e a sindicalização dos trabalhadores. São Paulo: Boitempo, 2004.). A Volkswagen viu sua produção crescer ano após ano, bem como a produtividade dos seus operários. A companhia empregava 50 mil trabalhadores em 1966 e 150 mil em 1975, chegando a contabilizar um faturamento equivalente a 1% do PIB brasileiro na década de 1970 (DODT; ADERS, 2017DODT, Stefanie; ADERS, Thomas. Cúmplices: a Volkswagen e a ditadura militar no Brasil. Documentário. Alemanha: Deutsche Welle, 2017.). Além da expansão e favorecimento com a política repressiva do regime, a companhia colaborou com o sistema de monitoramento e violência contra os trabalhadores. A multinacional empregava um agente nazista para controlar os seus operários e cooperou com a Operação Bandeirante. De acordo com documentação encontrada no Arquivo Público do Estado de São Paulo (Apesp), a companhia produzia e enviava relatórios das atividades políticas de seus operários, abrindo sua planta fabril para a entrada de agentes da repressão que detiveram e torturaram operários como Lúcio Belentani e Heinrich Plagge (CAMPOS; SILVA; COSTA, 2022CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira; SILVA, Marcelo Almeida de Carvalho; COSTA, Alessandra. A Volkswagen e a ditadura: a colaboração da montadora alemã com a repressão aos trabalhadores durante o regime civil-militar brasileiro. Revista Brasileira de História, v. 42, p. 141-164, 2022.).
Se as atividades da Volkswagen durante a ditadura no Brasil foram caracterizadas por expansão da produção, elevação do lucro e elevada repressão sobre os trabalhadores, situação similar viveu a Amazônia no período, que foi alvo de intensa ação e planejamento estatal, com expansão dos capitais sobre a região, em um processo altamente violento e danoso para as populações tradicionais locais. De porte de uma retórica de viés nacionalista e respaldado em discurso de base geopolítica, os governos ditatoriais montaram impactantes planos e políticas para a região, promovendo a instalação de grandes projetos capitalistas e o deslocamento de grande conjunto de pessoas para a região (IANNI, 1986IANNI, Octavio. Ditadura e agricultura: o desenvolvimento do capitalismo na Amazônia, 1964-1978. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1986.; BRAGA, 2015BRAGA, Magno Michell Marçal. Rota Transamazônica: nordestinos e o Plano de Integração Nacional. Curitiba: Pismas, 2015.).
Para o estabelecimento desse projeto, instrumentos de política estatal foram implantados no período, como a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam, de 1966, que substituiu a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia – a SPVEA, de 1953), o Programa de Integração Nacional (PIN, de 1970), a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa, de 1967), o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia, de 1974), além do fortalecimento do Banco da Amazônia (Basa, de 1942). Assim, o avanço capitalista sobre a Amazônia contou com vários sócios privados, em particular grandes grupos econômicos, mas foi pilotado e planejado de maneira contundente pelo Estado brasileiro, com suas agências e ações políticas (BRAGA, 2021BRAGA, Magno Michell Marçal. Construtores do Brasil Grande: trabalho e trabalhadores na rodovia Transamazônica (1970-1974). Tese (Doutorado em História Contemporânea) – Departamento de História, Estudos Europeus, Arqueologia e Artes, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2021.).
Esses programas alavancaram grandes intervenções estatais e privadas, que giraram em torno de mega-projetos, como a Transamazônica, dentre diversas outras estradas de rodagem instaladas na região no mesmo período, que caracterizaram a forma de “integração” da região ao resto do país. Foi instalada também a hidrelétrica de Tucuruí, no Pará – além de Samuel, em Rondônia, e Balbina, no Amazonas –, associada ao projeto das fábricas de alumínio na região, com plantas industriais no Pará e Maranhão. Por fim, houve o projeto Grande Carajás, para exploração de minério de ferro no Sul do Pará para exportação, com sistema de escoamento baseado na instalação de uma extensa ferrovia. Todos esses projetos geraram grandes impactos sociais e ambientais, afetando comunidades tradicionais como indígenas, camponesas, de pescadores e posseiros (CARVALHO, 2022CARVALHO, Erika Marques de. Uma cicatriz na selva: os impactos humanos, sanitários e ambientais da construção da Transamazônica (1970-1974). Tese (Doutorado em História da Ciência) – Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2022.).
Segundo Regina Guimarães Neto, “a intervenção do Estado, o monopólio do capital privado e a constituição de um mercado de trabalho bastante volátil constituem a base das relações que se estabelecem entre os grandes proprietários de terra e empresários e os trabalhadores rurais” (GUIMARÃES NETO, 2014GUIMARÃES NETO, Regina B. História, trabalho e memória política. Trabalhadores rurais, conflito social e medo na Amazônia (1970-1980). Revista Mundos do Trabalho, Florianópolis, v. 6, n. 11, p. 129-146, 2014.).
Vejamos agora como se deu um desses projetos que foi o da fazenda da Volkswagen na região Sudeste do Pará e que contou com características comuns a outros projetos na região, como devastação ambiental, uso intenso de recursos públicos e violência sobre trabalhadores e povos tradicionais da região.
A fazenda Volkswagen
Em 1973, a Volkswagen do Brasil adquiriu um terreno do tamanho de 140 mil hectares no Sudeste do Pará, no município de Santana do Araguaia, na fronteira com o Mato Grosso e Goiás (hoje Tocantins). Para se ter uma ideia, a propriedade, com seus 1.400 km2, era maior que o município do Rio de Janeiro, que detém 1.200 km2, e pouco menor que o município de São Paulo, que possui 1.521 km2. E essa não era a maior fazenda da região. Havia outras no Pará de até 400 mil hectares, fora a fazenda Jari, no Amapá, com seus 2 milhões de hectares de área, o equivalente ao estado do Sergipe (FIGUEIRA, 2004FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.).
O projeto da Volkswagen era estabelecer uma fazenda voltada predominantemente para a pecuária bovina, com a devastação da metade da área para a criação de pasto para gado, em formato extensivo. A empresa alegava utilizar técnicas modernas para a criação dos animais e chegou a divulgar os trabalhos na fazenda em sua revista, a “Família Volkswagen”, bem como na imprensa, conforme consta na figura 1. A propriedade guardava proximidade com a rodovia Belém-Brasília, distando aproximadamente 130 km da via, que serviria de meio de escoamento para a carne produzida na fazenda. Outras empresas se estabeleceram na região durante a ditadura atrás das vantagens proporcionadas naquele momento:
Nos mesmos municípios se instalaram dois tipos de empreendimentos agropecuários. O primeiro era composto por empresas mais conhecidas por suas atividades em área financeira – Bradesco, Bamerindus, Mercantil e Atlântica Boa Vista –, industrial – Óleos Pacaembu, Nixdorf, Volkswagen, Manah, Supergasbrás –, de construção – Cetenco Engenharia S/A, Encol, Andrade Gutierrez –, e madeira – Madeireira Agropecuária S/A Ind. Com. Agropecuária (Maginco). Algumas com mais de um imóvel. A Encol, por exemplo, possuía as fazendas de Inajá Porá Agroindustrial S/A e Paragarças, ambas em Santana do Araguaia; o Bradesco, as fazendas Reunidas Taine-Rekan e Cia. Agropecuária do Rio Araguaia (Capra), respectivamente em Santana e Conceição do Araguaia; a Atlântica Boa Vista, as fazendas Rio da Prata, em Santana do Araguaia, e a Rio Dourado, em São Félix do Xingu; a Maginco, as fazendas Magno, em Rio Maria, e Morada do Sol, em São Félix do Xingu (FIGUEIRA, 2004, p. 106FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.).
Vê-se como várias empresas de grande porte e que tinham suas atividades originais não identificadas com a agropecuária instalaram fazendas na região, buscando ganhos com esse negócio e acesso ao fundo público. Conforme veremos, várias dessas companhias foram acusadas de usar trabalho escravo, como ocorreu com a Volkswagen.
O processo produtivo previsto na fazenda da Volkswagen incluía a criação de dezenas de milhares de cabeças de gado, engorda, abate e processamento para a venda, principalmente no exterior. A empresa estabeleceu um convênio com a processadora de carnes alemã Atlas Handel, que ficaria responsável por essa etapa do processo produtivo (RUSSAU, 2017RUSSAU, Christian. Empresas alemãs no Brasil: o 7x1 na economia. São Paulo: Elefante, 2017.). Conforme indica Buclet (2005)BUCLET, Benjamin. Entre a tecnologia e a escravidão: a aventura da Volkswagen na Amazônia. O Social em Questão, Rio de Janeiro, n. 13, p. 1-12, 2005., a parceria com a Atlas para a montagem do projeto do frigorífico incluía também uma associação com outras empresas, como a construtora Cetenco, o Bradesco e o Banco de Crédito Nacional, que combinaram esforços com a Volkswagen para a montagem de uma planta industrial para processar e preparar a carne para escoamento a partir da fazenda.
Para a montagem desse projeto não foram usados apenas capitais da Volkswagen. Conforme várias outras iniciativas na região no período, a Companhia Vale do Rio Cristalino contou com amplos subsídios e financiamentos estatais. José de Souza Martins (1994)MARTINS, José de Souza. A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 1-2, n. 6, p. 1-25, 1994. chama a atenção de que o governo garantia até 75% dos investimentos em projetos estabelecidos na região através dos dispêndios da Sudam e do Basa. Aliás, a participação da Volkswagen do Brasil no controle da empresa rural não se dava à toa. A associação do grupo industrial com o projeto na região amazônica permitia que a companhia pudesse abater do imposto devido de suas atividades na planta automotiva as inversões que despendia na fazenda. Além do financiamento facilitado e os subsídios na instalação do projeto, a Volkswagen minorava o seu pagamento de impostos com os investimentos que fazia na propriedade no Sul do Pará.
Além dos fartos recursos públicos investidos no projeto, outra polêmica da fazenda Volkswagen, em semelhança com outras iniciativas na região no mesmo período, era a significativa devastação ambiental. A proposta previa o desmatamento de metade de toda a floresta existente na propriedade, mantendo uma reserva florestal equivalente a 50% do terreno. Assim, 70 mil hectares de florestas e vegetação nativa viriam abaixo para o plantio de pasto para o gado. Antoine Acker (2014b)ACKER, Antoine. Trabalho forçado na fazenda da Volks: crônica de um escândalo amazônico na Alemanha. Hendu, v. 4, n. 1, p. 57-69, 2014b. indica que, em 1976, o satélite norte-americano Skylab identificou uma devastação florestal significativa na região da Amazônia brasileira, verificando que uma grande responsável pela destruição da mata nativa era a fazenda da Volkswagen, que havia gerado um grande incêndio na região do Sul do Pará. Além da Nasa, outras organizações denunciaram a destruição ambiental promovida pelo projeto da Volkswagen, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e o Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (Inpa), conforme indica Acker (2014a)ACKER, Antoine. “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a transformar a Amazônia em uma arena política global. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 34, n. 68, p. 13-33, 2014a..
No entanto, os elevados incentivos fiscais e a significativa destruição ambiental não foram as questões que geraram o maior escândalo envolvendo a fazenda Volkswagen. O que mais maculou o projeto foi a denúncia de uso de trabalho escravo na propriedade. Estabelecido na região desde 1977, o padre Ricardo Rezende Figueira, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), realizou em 1983 uma denúncia pública de uso de força de trabalho escravizada no processo de derrubada da mata nativa dentro do terreno da Vale do Rio Cristalino. A acusação foi feita publicamente em Brasília pelo sacerdote e teve repercussão no país e no exterior, gerando notas em jornais brasileiros e estrangeiros. Em São Paulo, foi montada uma comissão composta por jornalistas de grandes órgãos de imprensa e deputados da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), que foram averiguar as condições dos trabalhadores na fazenda. Antoine Acker fez um relato do que ocorreu nessa visita:
Em julho de 1983, após viajarem para a fazenda Cristalino como representantes de uma comissão de inquérito sobre trabalho forçado, parlamentares do estado de São Paulo tiveram um encontro inesperado. No último dia da visita, um vaqueiro, Eliseu Batista de Oliveira, abordou-os enquanto almoçavam com vários dirigentes da Volkswagen. Ele era um homem desorientado e mancando, com um chinelo em um pé e uma bota adequada no outro. Com os olhos cheios de lágrimas, aproximou-se dos homens da comissão e explicou que, após sete anos de serviço, acabara de ser demitido da fazenda sem receber o seguro-desemprego. Ele disse: “Fui demitido porque aqui existem regras que proíbem o uso de ‘peitoral’ nos cavalos”. Um membro da comissão perguntou-lhe o que era um “peitoral” e Eliseu respondeu que era uma espécie de estrela de metal que ele usava para prender no cavalo como enfeite. Nesse momento, o gerente-chefe do Cristalino, Brügger, que assistia à cena, interveio nervoso: “não permitimos o uso de acessórios porque machuca o animal. Nossas regras foram feitas para evitar que ‘eles’ usassem esse absurdo nos cavalos. O trabalhador não cumpriu as regras, então eu o demiti.” Com efeito, o “peitoral” pesava 26 kg e, segundo o veterinário da quinta, era uma fonte de sofrimento que poderia pôr em causa a vida do cavalo. Além disso, o trabalhador havia sido avisado diversas vezes antes de receber alta definitiva. Parecia que ele só podia culpar a si mesmo e sua teimosia (ACKER, 2017, p. 191ACKER, Antoine. Volkswagen in the Amazon: The Tragedy of Global Development in Modern Brazil. Cambridge: Cambridge University Press, 2017.).3 3 Trad. livre dos autores: “In July 1983, after they traveled to the Cristalino ranch as representatives of an inquiry commission about forced labor, members of the São Paulo state parliament made an unexpected encounter. On the last day of their visit, a cowman, Eliseu Batista de Oliveira, approached them as they were having lunch with a number of Volkswagen officials. He was a disoriented, limping man with a flip-flop on one foot and a proper boot on the other. His eyes full of tears, he came closer to the men of the commission and explained that, after seven years of service, he had just been fired from the fazenda without being paid his unemployment compensation. He said, “I was fired because here there are rules which forbid using a ‘pectoral’ on the horses.” One commission member asked him what a “pectoral” was, and Eliseu answered that it was a kind of metal star that he used to attach to the horse as an ornament. At this point, the chief manager of Cristalino, Brügger, who was watching the scene, intervened nervously: “we do not allow the use of accessories because this hurts the animal. Our rules were made to prevent ‘them’ from using this nonsense on the horses. The worker did not fulfill the rules, so I fired him.” Indeed, the “pectoral” weighed 26 kg, and, according to the farm’s veterinarian, it was a source of suffering that could jeopardize the life of the horse. In addition, the worker had been warned several times before being definitively discharged. It seemed that he had only himself and his stubbornness to blame”.
Assim, apesar de toda preparação que a empresa estabeleceu para impedir que a delegação encontrasse trabalhadores em situação de trabalho escravo e degradante, os jornalistas e parlamentares encontraram um trabalhador demitido por não ter podido colocar uma proteção para poder montar cavalos e que não recebeu as devidas indenizações após ser dispensado. A Volkswagen não conseguiu se blindar das acusações e as denúncias se multiplicaram contra a empresa acerca das condições e uso de trabalho forçado na propriedade. Havia também acusações de menores de idade trabalhando na fazenda (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2022FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.).
As acusações geraram matérias da imprensa brasileira, denúncias no parlamento e repercussão no exterior. Os relatos feitos sobre as condições de trabalho dos responsáveis pelo desmatamento na fazenda e a ação dos “gatos” foram objeto de matéria no Der Spiegel ainda em 1983. Além da imprensa alemã, houve matérias sobre o tema em jornais franceses. Os círculos cristãos da Alemanha logo se interessaram pelo fato e parlamentares do país buscaram informações e se pronunciaram, alegando que a Volkswagen possuía capitais públicos de estados da República Federal Alemã (ACKER, 2014aACKER, Antoine. “O maior incêndio do planeta”: como a Volkswagen e o regime militar brasileiro acidentalmente ajudaram a transformar a Amazônia em uma arena política global. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 34, n. 68, p. 13-33, 2014a.).
Figueira, Prado e Palmeira (2021)FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022. elaboram uma reflexão sobre o trabalho escravo contemporâneo e a forma como ele se expressa na região amazônica. Esses autores compreendem que o moderno trabalho cativo corresponde a uma situação na qual o ser humano sofria coerções, situações degradantes e eram obrigados a realizar trabalho exaustivo. As coerções podiam ser de ordem psicológica, por ameaça, espancamento e assassinato. A justificativa era uma dívida do trabalhador. Assim, é importante perceber que os trabalhadores responsáveis pelo desmatamento eram trazidos de regiões distantes, geralmente de estados vizinhos, como Piauí, Goiás e Mato Grosso. O transporte e a instalação dos mesmos na fazenda, com a disponibilização de material para a montagem de barracas era fundamental para o estabelecimento da relação social de ‘escravidão’. Os “gatos”, pequenos empresários que arregimentavam essa força de trabalho e a proviam à fazenda cobravam o transporte e a instalação dos mesmos na propriedade na forma de realização de trabalho gratuito, de forma temporária. Também a sustentação do trabalhador, com a aquisição de alimento e itens básicos para a sustentação individual, era feita em vendas de posse desses “gatos”, que cobravam preços extorsivos e com isso acumulavam uma dívida ativa com esses trabalhadores, cobrada na forma de trabalho gratuito com valores estabelecidos pelos próprios “gatos”. Dessa forma, esses autores colheram o seguinte depoimento de um trabalhador goiano de 22 anos mantido em condição de anonimato e que começou a operar na fazenda em 1981, sendo contratado pelo empreiteiro Walter para atuar na derrubada de árvores na propriedade:
A água que tinha para beber era de um poço, água muito suja, com mosquito em cima. Logo todos pegaram malária, a febre. Como não estava me sentindo bem, na metade da derrubada resolvi vim embora. Quando a gente tava na estrada apareceu o Walter e o seu cunhado de nome Chicô armados e obrigaram nós a voltar a continuar a trabalhar. Depois disso é que a coisa ficou preta mesmo para o nosso lado. Tinha vez da gente ser obrigado a entrar para fazer derrubada direto de torrero que no dia anterior tinha sido queimado. E a gente trabalhando naquele lugar quente ainda, e com malária encima.
Fui obrigado a trabalhar todos os dias, mesmo domingo, não tinha descanso. Só no mês de setembro de 1981 é que eu mais 6 companheiros conseguimos vir embora. Viemos sem receber nada pelo serviço. E muito doentes. Eu só tinha um restinho (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2022, p. 73FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.).
Pode-se verificar nesse depoimento como o trabalhador relata condições degradantes de labuta, com acesso a água não potável, exposição a doenças, trabalho sob coerção física e com o uso de armamentos, ofício sem descanso e não remunerado. Conforme Rezende ressalta em entrevista: “Eles estavam tratando os trabalhadores de forma incomparavelmente pior do que estavam tratando o gado. Para o gado tinha boa alimentação. Para os trabalhadores não havia nada” (REZENDE, 2022REZENDE, Ricardo. Entrevista. “Tortura e trabalho escravo”: padre denuncia crimes da Volks na Amazônia durante ditadura. DeutscheWelle, 15 jun. 2022. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ctYR2ymYIaU Acesso em: 27 jan. 2024.
https://www.youtube.com/watch?v=ctYR2ymY...
).
Buclet chama a atenção para denúncias de “homens torturados, tiros, violência sexual, gente que morre por não ser atendido, fraude nos preços dos produtos, roubos” (2005, p. 7). Na acusação movida pelo Ministério Público do Trabalho recentemente, o documento menciona “falta de tratamento médico nos casos de malária, impedimento de saída da fazenda, em razão de vigilância armada ou de dívidas contraídas (servidão por dívidas), alojamentos instalados em locais insalubres, sem acesso à água potável e com alimentação precária” (ALVES, 2022ALVES, Pedro. Ministério Público investiga trabalho escravo e tráfico de pessoas pela Volkswagen durante ditadura no Brasil: MP convocou empresa para audiência, onde deve ser discutida responsabilização por irregularidades. Denúncias foram reveladas por imprensa estrangeira; empresa diz que reforça “compromisso de contribuir com as investigações. G1. 30 maio 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/google/amp/df/distrito-federal/noticia/2022/05/30/ministerio-publico-investiga-trabalho-escravo-e-trafico-de-pessoas-pela-volkswagen-durante-ditadura-no-brasil.ghtml. Acesso em: 27 jan. 2024.
https://g1.globo.com/google/amp/df/distr...
). Baseado em relatos dos trabalhadores que atuaram na fazenda, o MPT alega uma série de violações cometidas dentro da propriedade:
Esses três jovens que fugiram da ‘Fazenda Volkswagen’ ficaram apenas um mês no local e logo na primeira noite já começaram a se apavorar. Eles presenciaram fiscais armados espancando um ‘peão’ que tentou fugir. Conforme disseram, outro trabalhador foi amarrado nu em uma árvore no meio da floresta e também sofreu agressões. A mulher dessa pessoa teria sido estuprada (REIS, 2022REIS, Alessandro. Como VW passou a ser investigada por trabalho escravo e tortura na Amazônia. UOL Carros. 1º jun. 2022. Disponível em: https://www.uol.com.br/carros/noticias/redacao/2022/06/01/como-vw-passou-a-ser-investigada-por-trabalho-escravo-e-tortura-na-amazonia.amp.htm. Acesso em: 27 jan. 2024.
https://www.uol.com.br/carros/noticias/r... ).
Como se vê, o grau de violência à qual os trabalhadores eram submetidos dentro da fazenda era bem elevado. Além de exercer trabalho gratuito, eram impostas condições degradantes, falta de assistência à saúde, agressões físicas, principalmente em caso de fuga, e também sexuais.
Esses fenômenos não devem ser lidos sob um prisma exclusivamente moral ou compreendidos somente pela chave do “atraso”. Trata-se de uma ação que guarda estreita relação com a acumulação de capital e os propósitos da empresa de reduzir custos e elevar as potencialidades de ganho com o empreendimento. Dessa forma, um diretor da empresa assim se refere em relação aos ‘gatos’: “senhor não deve esquecer que estes empreiteiros, embora sejam tão execrados em vários lugares, no fundo também são empresários. Eles são o primeiro degrau nessa zona de desenvolvimento” (BUCLET, 2005, p. 10BUCLET, Benjamin. Entre a tecnologia e a escravidão: a aventura da Volkswagen na Amazônia. O Social em Questão, Rio de Janeiro, n. 13, p. 1-12, 2005.).
Esses “gatos” são capitalistas de pequeno porte e especializados em arregimentar e vender força de trabalho às empresas da região. Eles exploram força de trabalho, obtendo lucro dessas atividades e proporcionando custos módicos na obtenção de força de trabalho pelas empresas que contratam os seus serviços. Magno Braga (2021)BRAGA, Magno Michell Marçal. Construtores do Brasil Grande: trabalho e trabalhadores na rodovia Transamazônica (1970-1974). Tese (Doutorado em História Contemporânea) – Departamento de História, Estudos Europeus, Arqueologia e Artes, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2021. chama a atenção de que as construtoras que atuavam na Amazônia também contratavam os “gatos” para obtenção de força de trabalho a serem empregadas em seus canteiros de obra. Martins (1994)MARTINS, José de Souza. A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 1-2, n. 6, p. 1-25, 1994. também verifica como a fazenda Volkswagen não é uma exceção, mas expressa uma prática recorrente na região. Assim, segundo seus dados, mais de 70% dos casos de trabalho escravo identificados no Brasil foram localizados na Amazônia, sendo que de um total de 431 fazendas flagradas com trabalho cativo entre 1970 e 1993, 308 estavam na região da Amazônia. O total de trabalhadores submetidos à escravidão nesse período foi de ao menos 85 mil pessoas, das quais 9 mil conseguiram fugir. E vários grupos econômicos se beneficiaram do uso do trabalho forçado:
De uma identificação ainda incompleta dos grupos econômicos a que pertencem as fazendas envolvidas em denúncias de utilização de trabalho escravo, constam: Bradesco - Banco Brasileiro de Descontos S. A., BCN - Banco de Crédito Nacional, Banco Bamerindus, Sílvio Santos, Bordon, Liqüifarm, Daniel Keith Ludwig, Manah, Camargo Corrêa, Eletronorte, Café Cacique, Volkswagen (que depois vendeu sua fazenda na Amazônia ao grupo Matsubara), Supergasbrás e White Martins S. A. (MARTINS, 1994, p. 20MARTINS, José de Souza. A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 1-2, n. 6, p. 1-25, 1994.).
Várias empresas de diversos segmentos, em particular algumas de grande porte, com presença de capital estrangeiro e áreas de atividade econômica original alheias à agropecuária, são acusadas de utilizar força de trabalho escravo em suas propriedades na região amazônica.
Dessa forma, de acordo com acusações feitas na década de 1980 e nos dias atuais, a Volkswagen utilizou força de trabalho escrava em sua fazenda no Sudeste do Pará, o que fez com que a empresa acabasse vendendo a propriedade em meio às pressões sofridas no Brasil e no exterior. Assim se refere o historiador da Volkswagen em relação a esse episódio:
A VW do Brasil decidiu vender a Fazenda Rio Cristalino em 1986, para a qual foi encontrado um comprador em 1987. Entretanto, essa decisão não foi motivada somente devido à cobertura negativa da imprensa alemã e brasileira da situação social dos trabalhadores volantes e das consequências ecológicas do desmatamento. Uma vez que a VW do Brasil estava registrando perdas desde 1980, o conceito original da fazenda como recurso para economizar impostos tornou-se obsoleto. Enquanto a VW do Brasil não produzia lucros, a empresa não conseguiria investir receitas não tributáveis na fazenda (KOPPER, 2017, p 117KOPPER, Christian. A VW do Brasil durante a ditadura militar brasileira, 1964-1985: uma abordagem histórica. Wolfsburg: Volkswagen, 2017.).
Assim, a empresa tinha uma repercussão negativa das denúncias sobre o trabalho escravo, porém não vinha tendo ganhos com as atividades da fazenda.
Vejamos agora os elementos que a documentação da Sudam traz em relação a esses aspectos polêmicos das atividades da Companhia Vale do Rio Cristalino.
Os documentos da Sudam e a fazenda Volkswagen
O arquivo da Sudam tem sede em Belém, no Pará, e possui uma biblioteca francamente disponível ao público. Já o acesso ao arquivo encontra restrições e pesquisadores precisam de autorização especial para travar contato com os documentos ali depositados. É comum a vedação de acesso ao acervo para os investigadores que estudam as atividades da superintendência. No entanto, dada a movimentação do Ministério Público do Trabalho para acionar judicialmente a Volkswagen do Brasil e com o seu poder no sentido de exigir documentos de instituições públicas, foi possível ter acesso com o processo da Companhia Vale do Rio Cristalino (CVRC), plenamente digitalizado e disponibilizado aos procuradores do MPT. Foram disponibilizados 43 documentos, variando em tamanho de alguns com somente cinco páginas até outros com até 420 páginas. No acumulado eles totalizam 7.169 páginas. Em geral são documentos produzidos pela Companhia Vale do Rio Cristalino e encaminhados à Sudam para solicitação de subsídios fiscais e financiamentos para as atividades da fazenda.
Não pretendemos nesta parte do artigo esgotar a análise dessa documentação, tendo em vista inclusive o porte do material. Nosso método consistiu em fazer algumas questões a esses documentos. Buscamos averiguar como se encontra nos arquivos apresentados a situação da força de trabalho empregada na propriedade, tentando averiguar as condições particulares dos camponeses dedicados ao desmatamento da área que deu origem ao pasto, justamente a função na qual residiram as denúncias de uso de trabalho escravo. Além disso, buscamos identificar querelas referentes às violações ambientais na fazenda. Por fim, buscamos abordar os incentivos fiscais e financiamentos obtidos pela empresa, de modo a mensurar o uso do fundo público pelo projeto. Importante salientar que, apesar da postura crítica da nossa leitura em relação ao objeto, como estamos lidando com documentos oficiais e da empresa, é mais difícil encontrar as polêmicas e indicações de violações. No entanto, conforme veremos, foi possível sim vislumbrar algumas controvérsias das atividades mantidas pela fazenda Volkswagen.
O documento inicial do acervo é o projeto de formação da Companhia Vale do Rio Cristalino, com toda demanda de isenções fiscais e financiamentos da Sudam. Chama a atenção a intensidade do detalhamento do projeto. Nele é indicado que a fazenda previa a área de 139.640 hectares, sendo 50% previsto para reserva florestal e 49,7% (69.400 hectares) dedicados à pastagem artificial, para criação extensiva de gado bovino. Os 69.400 hectares deveriam ser desbravados gradualmente entre os anos de 1974 e 1981, com previsão de aproveitamento da madeira. O documento é bastante sistemático sobre o tipo de gado a ser utilizado, sua raça, o plantel total a ser criado (117.250 animais), a previsão de cuidados sanitários, a instalação de cercas e porteiras, a previsão de comedouros, bebedouros e estradas na fazenda, a previsão de produção alimentícia na fazenda, bem como criação e manutenção de animais para trabalho. O projeto é minucioso em relação aos prédios que seriam construídos: sede, hotel, administração, escola, hospital, hangar, garagem, oficina mecânica, posto de serviço, serraria, depósitos, supermercado, escritório, laboratório, igreja, farmácia, campo de pouso, estábulo, matadouro. Há previsão de veículos utilizados na propriedade e um avião, além da indicação de custos para compra de animais e perspectiva de faturamento com a venda. A indicação era que a partir de 1981 a fazenda começaria a gerar lucro4 4 ECONORTE – Economistas e Consultores Ltda. Companhia Vale do Rio Cristalino: agropecuário indústria e comércio. Projeto. [s.l.]: Econorte, 1974. .
No que diz respeito à contratação de pessoal, o documento indica a previsão de empregar administradores (50 até 1981), vaqueiros (23 até 1982) e braçais (65 funcionários). Não havia indicação de contratar funcionários ou empresas para o desflorestamento. Havia uma seção do projeto reservada ao detalhamento da assistência social que seria montada para atender aos trabalhadores, com previsão de fornecimento de serviços hospitalares e escolares às famílias dos funcionários da fazenda. Importante frisar isso, pois os trabalhadores submetidos ao regime de trabalho escravo alegaram que não tiveram acesso a qualquer serviço de assistência social ou médica da fazenda. Nas páginas 100 e 101 do projeto há a previsão exata de toda a força de trabalho que seria empregada na fazenda:
Como se vê, a quantidade de trabalhadores na fazenda deveria evoluir de um total de 28 em 1974 chegando até 392 em 1983. Novamente não percebemos previsão de contratação de pessoal para o desmatamento.
No entanto, o documento manuscrito intitulado “Memória de análise”, de 1982, referente ao projeto da CVRC, com o balancete datado de 31 de dezembro de 1982, em caráter manuscrito, traz uma série de gastos realizados pela empresa, dentre os quais destacamos a rubrica que consta na página seis referente aos “empreiteiros”:
Como se vê no documento (Figura 4), há a listagem de gastos com a contratação de “empreiteiros” com nomes de pessoas físicas, contabilizando mais de 14 desses agentes. Um deles, Abílio Dias de Araujo, é apontado por depoimentos de trabalhadores como um dos gatos que arregimentava força de trabalho escrava e que foi denunciado por Ricardo Rezende Figueira (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2021FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.). Outro é Francisco Andrade Chagas, gato conhecido como Chicô e com diversas denúncias de exploração de trabalho escravo (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2021FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos. Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.). Assim, esses são os “gatos”, ou melhor, os contratadores da força de trabalho que atuava na fazenda responsável, dentre outros serviços, pelo desmatamento da área destinada ao pasto dos animais. Conforme vimos, esses gatos eram acusados pelos trabalhadores de impor labuta forçada e gratuita pelo mecanismo da dívida com o transporte, instalação, manutenção e alimentação desses camponeses. Com isso, temos um documento da empresa que comprova que esses gatos estavam na sua lista de pagamentos, ou melhor, temos o comprometimento da empresa com a contratação de agentes que empregavam trabalhadores à força e impedidos de se ausentar da fazenda por conta de suas dívidas.
Nesse sentido, é possível perceber que a empresa utilizou tipos diferentes de mão-de-obra, uma formal, em acordo com a legislação vigente e outra, mais numerosa, menos detectável pelos mecanismos de fiscalização e muito mais descartável, reproduzindo a lógica de outros grandes projetos desenvolvidos na região, onde muitos trabalhadores pobres, reificados, tombaram junto com a paisagem amazônica em cada tentativa de superá-la. São sobre essas “formas contemporâneas que subjugam a vida ao poder da morte” que Achille Mbembe (2016, p. 146)MBEMBE, Achille. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. Arte & Ensaios, Rio de Janeiro, n. 32, p. 122-151, dez. 2016., extrapolando o conceito foucaultiano de biopoder, desenvolve a ideia de necropolítica.
Além da comprovação de contratação dos gatos para arregimentar força de trabalho forçado, os documentos que constam na Sudam indicam as violações ambientais da companhia. Documento da Sudam de 23 de agosto de 1976 com arquivo intitulado “Cópia do despacho” se refere a um processo movido pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) contra a empresa. No documento consta que o desmatamento realizado na fazenda tinha “necessidade de regularização”5 5 SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia. Cópia do despacho exarado no processo IBDF-1.666/76, referente ao projeto de interesse da Compania Vale do Rio Cristalino. Brasília: Sudam, 1976, p. 2. . Há indicação de que a empresa não arrecadou contribuições obrigatórias referentes ao desmatamento e, por isso, seria multada.
Assim, mesmo sob a ditadura, amplamente favorável a projetos altamente destrutivos do meio ambiente, o processo de desmatamento da fazenda Volkswagen foi questionado e devidamente punido pelos órgãos oficiais, notoriamente tolerantes com ações degradantes na região. O caso parece dar o tom da elevada destruição ambiental promovida pelo processo de desmatamento da floresta nativa e implementação do pasto artificial na fazenda da Volkswagen.
Por fim, vale se deter um pouco nas injeções de recursos públicos na fazenda. Vários documentos que constam no acervo trazem assembleias gerais ordinárias e extraordinárias da companhia, bem como a composição acionária do grupo, controlado pela Volkswagen do Brasil. No entanto, observando essas prestações de contas é possível perceber o grau de apoio estatal que o projeto teve. No documento “Carta-consulta”, de 25 de outubro de 1979, é feito um pedido de reformulação do projeto, aprovado na Sudam em 1974. Wolfgang Sauer solicitou readequação e foram apresentadas certidões negativas, inclusive junto ao DRT. Na página 71 do documento há o quadro de acionistas da empresa em 31 de dezembro de 1979:
Pode-se notar como a Volkswagen do Brasil era a acionista majoritária das ações ordinárias, com 63,9% do capital com direito a voto nas decisões da empresa. No entanto, no quadro geral de ações, 166.608.535 de um total de 328.095.776, ou melhor, mais de 50% das ações totais pertenciam ao Fundo de Investimento da Amazônia – Finam. O número do CNPJ (na época, CGC), 04.902.979/0001, corresponde ao registro da empresa Banco da Amazônia (Basa), um banco público que, dessa forma, foi responsável pelo ingresso de mais da metade do capital da companhia que permitiu a montagem da fazenda. Assim, a maior parte do capital da companhia era composta com ingresso de recursos públicos via Sudam e Basa. Esses números permitem perceber o elevado grau de incentivo fiscal e financiamento público do projeto.
Observando de maneira mais global os documentos, podemos perceber uma sequência de processos que dizem respeito a subscrições de capital na empresa realizados pelo Basa:
Pode-se perceber na tabela a elevada frequência e intensidade dos empréstimos concedidos pelo Basa à CVRC. Documento de 1985 se refere a um total de Cr$ 4.071.609.278,00 de incentivos fiscais liberados entre 1977 e 1984, seguindo as instruções do decreto-lei 1376/74, que dispõe sobre a criação de fundos de investimento. Neste decreto ficava determinado, de acordo com o artigo 6º, que o Fundo de Investimento da Amazônia (Finam) seria operado pelo Basa, sob a supervisão da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia6 6 SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia. Liberação da importância de Cr$ 153.879.000,00. [s.l.]: [s.n.], 1985. .
Documento de maio de 2022 do MPT atualizou esses valores e concluiu que os números dos dados que constam na tabela 1 equivalem a R$ 73,2 milhões em valores de 20227 7 MPT – Ministério Público do Trabalho. Procuradoria Regional do Trabalho da 9a Região. Setor de Cálculos. Cálculo de atualização para 01/05/2022. Curitiba: MPT, 2022. . Esses são valores bem elevados para a instalação de uma fazenda. Dessa forma, percebe-se a significativa ação financiadora por parte do Estado em relação a esse projeto.
Assim, conforme verificamos, os documentos da própria Sudam permitem verificar a contratação dos gatos por parte da fazenda Volkswagen, a violação a regras ambientais no período com pena aplicada pelo IBDF, bem como o elevado grau de financiamento estatal através das agências de fomento regional, quais sejam o Basa e a Sudam.
Conclusão
Vimos neste artigo como foi a chegada da Volkswagen ao Brasil no período do pós-guerra, como um movimento de exportação dos capitais alemães após as facilidades concedidas pelos EUA à RFA em meio à dinâmica da Guerra Fria. A montadora alemã instalou fábrica no Brasil e viu sua aposta prosperar com as facilidades concedidas pelo Estado brasileiro e com o crescimento sentido no país desde a segunda metade dos anos 50. A ditadura foi um momento propício para multinacional alemã no país, que encontrou nas políticas pró-capital e anti-trabalho do regime um instrumento para alavancar suas inversões e elevar seus lucros no Brasil.
O projeto de avanço e modernização do capitalismo brasileiro pelo regime ficou expresso na política desenvolvida para a Amazônia, que se tornou desde meados da década de 1960 em uma fronteira de expansão de atividades empresariais, com amplos incentivos fiscais e condução pelo aparelho de Estado, na forma de novas instituições fundadas para proporcionar a marcha dos negócios sobre a região, como a Sudam, a Suframa, o PIN etc. Foram muitos os projetos de grande porte desenvolvidos na Amazônia, reproduzindo os padrões brasileiros de desenvolvimento, no formato de estradas e hidrelétricas, com exploração das riquezas da região sobretudo para exportação. Tratou-se de um processo violento, com agressões contra povos indígenas, camponeses, posseiros, comunidades tradicionais e enorme destruição ambiental.
A fazenda Volkswagen foi um projeto que sintetizou aspectos vividos pela multinacional alemã no regime, bem como as políticas para a Amazônia. Tratou-se de um grande projeto agropecuário no Pará, voltado para exportação, ligado às rodovias construídas na região e que contou com amplos subsídios fiscais, grande destruição ambiental e exploração extrema da força de trabalho. Os financiamentos da Sudam conferiram ao projeto o perfil de uma iniciativa para-estatal, na medida em que os recursos públicos não gozavam de posição de secundariedade no financiamento do empreendimento. A fazenda possuía perfil devastador e retrógrado no que diz respeito ao meio ambiente, ao prever desmatar metade da vegetação original (comum a outros projetos na região), estabelecendo um sistema de pecuária extensiva. Por fim, as denúncias de uso de trabalho escravo apontam para uma obsessão da empresa pela redução de custos e pouco cuidado com os direitos e as condições mínimas de dignidade das pessoas que trabalhavam na propriedade, com desrespeito às leis trabalhistas vigentes.
Apesar de as denúncias de devastação ambiental, emprego de força de trabalho forçada e injeção de recursos públicos no projeto ter se originado de fontes independentes, de críticos do projeto, da imprensa e movimentos sociais da região, ao consultarmos documentos públicos da Sudam, comprovamos as três acusações direcionadas à empresa. Conforme vimos, documento do processo da CVRC na Sudam comprova o questionamento do IBDF sobre o não cumprimento das modestas normas ambientais vigentes, mostrando como a empresa foi interpelada e multada pelo órgão por isso. Além disso, os balanços da companhia demonstram enorme fluxo de recursos públicos para a fazenda Volkswagen, com financiamentos da Sudam e isenções fiscais dos órgãos de fomento regionais e que faziam a fazenda uma iniciativa bancada predominantemente por organismos estatais com fundos públicos. Por fim, por mais que a empresa alegasse que tratava bem seus funcionários e que oferecia a eles uma ampla cobertura de assistência na fazenda, documentos da companhia revelam que ela contratava gatos que arregimentavam força de trabalho compulsória para laborar de forma gratuita na propriedade por força de dívidas teoricamente contraídas por esses trabalhadores no transporte até a propriedade. O pagamento a esses empreiteiros, acusados de violações como exploração de trabalho escravo, agressões, violência, estupro, assassinato, exploração de mão-de-obra infantil, dentre outras denúncias, constava no balanço da empresa devidamente submetido à Sudam para obtenção de financiamento para o projeto.
Assim, os documentos apresentados parecem comprovar a responsabilidade da Volkswagen do Brasil com violações cometidas ao longo da ditadura na empresa controlada pelo grupo, a Companhia Vale do Rio Cristalino. A empresa não só cooperava ou colaborava com as violências cometidas contra trabalhadores, mas, de porte de recursos públicos montou um grande projeto, altamente devastador do meio ambiente em plena região amazônica, como mantinha em sua propriedade graves violações aos direitos dos camponeses responsáveis pela derrubada da mata nativa para o estabelecimento do pasto artificial para o gado. Refletindo o que foi a fazenda Volkswagen na perspectiva do Estado integral (GRAMSCI, 2000GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. V 3: Maquiavel. Notas sobre o Estado e a Política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.) e da compreensão que tivemos uma ditadura empresarial-militar, podemos entender que aquele projeto é expressivo do que foi o regime e tem algo a dizer a respeito do mesmo. A violência exposta na fazenda Volkswagen, com seus amplos recursos públicos, grande violência sobre os trabalhadores e destruição ambiental, são expressão do que foi a própria ditadura e constitui o capitalismo brasileiro, que, em sua feição autoritária, conservadora, violenta e excludente, usava grande quantidade de recursos públicos e empregava trabalho forçado na propriedade. O projeto parece constituir uma espécie de síntese ou microcosmo da ditadura, com um Estado altamente generoso para a injeção de fundo público em um projeto privado, controlado pelo capital estrangeiro, e com uma exploração da força de trabalho levada ao extremo.
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G1. Volkswagen faz acordo com MPF para reparar violações dos direitos humanos durante a ditadura: montadora fará doações para ex-funcionários que foram alvo de perseguição e para iniciativas que preservam a memória histórica. Relatório de 2017 apontou que 6 trabalhadores foram presos e ao menos 1 foi torturado na fábrica do ABC paulista. Revista Autoesporte, 23 set. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/carros/noticia/2020/09/23/volkswagen-faz-acordo-com-mpf-para-reparar-violacoes-dos-direitos-humanos-durante-a-ditadura.ghtml. Acesso em: 27 jan. 2024.
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Trad. livre dos autores: “Hablar de responsabilidad no implica igualar los niveles, no implica desconecer de ningún modo, el papel de las fuerzas armadas, ni implica uniformar el tipo de acción de todas las empresas analizadas. Hay grados, niveles y tipos de responsabilidad. Pero nos parece muy importante hablar de responsabilidad porque la cumplidad siempre alude a un acompañamiento secundario y parte, nos da un ponto de partida, nos da un marco que parece descontar que las empresas nunca lideraron estos procesos. Y lo que vemos, en cambio, es que esto no es así, que hay casos muy concretos que les estoy descrebiendo donde las empresas no solo acompañaron sino que fueron co-responsables de los procesos represivos - y esto es algo que hay que tener en cuenta - no porque esto sea el caso en todos los casos que uno pueda analizar, sino porque existe en la realidad y nos da un parámetro conceptual diferente a la hora de pensar este fenómeno”.
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Trad. livre dos autores: “In July 1983, after they traveled to the Cristalino ranch as representatives of an inquiry commission about forced labor, members of the São Paulo state parliament made an unexpected encounter. On the last day of their visit, a cowman, Eliseu Batista de Oliveira, approached them as they were having lunch with a number of Volkswagen officials. He was a disoriented, limping man with a flip-flop on one foot and a proper boot on the other. His eyes full of tears, he came closer to the men of the commission and explained that, after seven years of service, he had just been fired from the fazenda without being paid his unemployment compensation. He said, “I was fired because here there are rules which forbid using a ‘pectoral’ on the horses.” One commission member asked him what a “pectoral” was, and Eliseu answered that it was a kind of metal star that he used to attach to the horse as an ornament. At this point, the chief manager of Cristalino, Brügger, who was watching the scene, intervened nervously: “we do not allow the use of accessories because this hurts the animal. Our rules were made to prevent ‘them’ from using this nonsense on the horses. The worker did not fulfill the rules, so I fired him.” Indeed, the “pectoral” weighed 26 kg, and, according to the farm’s veterinarian, it was a source of suffering that could jeopardize the life of the horse. In addition, the worker had been warned several times before being definitively discharged. It seemed that he had only himself and his stubbornness to blame”.
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ECONORTE – Economistas e Consultores Ltda. Companhia Vale do Rio Cristalino: agropecuário indústria e comércio. Projeto. [s.l.]: Econorte, 1974.
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SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia. Cópia do despacho exarado no processo IBDF-1.666/76, referente ao projeto de interesse da Compania Vale do Rio Cristalino. Brasília: Sudam, 1976, p. 2.
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SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia. Liberação da importância de Cr$ 153.879.000,00. [s.l.]: [s.n.], 1985.
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7
MPT – Ministério Público do Trabalho. Procuradoria Regional do Trabalho da 9a Região. Setor de Cálculos. Cálculo de atualização para 01/05/2022. Curitiba: MPT, 2022.
Agradecimento
O autor Pedro Henrique Pedreira Campos agradece ao CNPq pelo financiamento da pesquisa intitulada “Empresas e ditadura no Brasil: benefício econômico e responsabilidade corporativa nas violações cometidas durante o regime civil-militar; o caso de Itaipu Binacional”, processo n. 301729/2022-0, através de bolsa produtividade 2.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
10 Maio 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
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Recebido
12 Out 2022 -
Aceito
05 Jan 2023