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Sob o domínio da precariedade: escravidão e os significados da liberdade de trabalho no século XIX

Under the domain of precariousness: slavehood and the meanings of work freedon in the XIXth Century

Resumos

O artigo aborda as ambigüidades que envolvem a noção de "liberdade de trabalho" no século XIX, partindo de uma discussão comparativa não apenas sobre a história e a historiografia da escravidão, mas abrangendo a história social, econômica e institucional do trabalho de um modo geral. Parte-se do princípio de que uma abordagem deste tipo permite formular de modo mais agudo uma interpretação sobre a experiência coletiva dos trabalhadores livres e escravos, evitando algumas das armadilhas do modelo de "transição" utilizado - muitas vezes acriticamente - pela historiografia no Brasil e nas Américas para explicar a relação entre sujeição e liberdade na esfera do trabalho. Algumas das questões levantadas na primeira parte do trabalho são articuladas na discussão de uma amostra de "contratos de locação de serviços" envolvendo ex-escravos e patrões, registrados nos cartórios de notas da cidade do Desterro entre as décadas de 40 e 80 do século XIX.

escravidão; liberdade; trabalho; contratos de trabalho.


This article examines the ambiguities raised by the concept of "labor freedom" in the XIXth century, through a comparative perspective of not only the history and historiography of slavery, but also the social, economic, and institutional history of labor. It considers that this approach will allow a better understanding of the collective experience of free laborers as well as slaves, in order to criticize the "transition" model that is still used - often without any criticism - by the historiography on slavery and free labor in Brazil and in the Americas to explain the relationship between freedom and bondage in labor history. Some of the questions raised in the first part of the article will be used to analyze a sample of labor contracts between formal slaves and their formal masters or new bosses, notarized in the city of Desterro, in Southern Brazil, between the 1840s and the 1880s.

slavery; freedom; labor; wage contracts.


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    » http://www.ara.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/ordenacoes.htm
  • 1
    A noção de "interesse", como nos lembra Albert Hirschman, assume um caráter quase queestritamente econômico a partir do século XVIII. A história dessa transformação está discutida por ele em Paixões e interesses. Argumentos políticos a favor do capitalismo antes do seu triunfo. Rio de Janeiro: Record, 2002.
  • 2
    POLANYI, Karl. A grande transformação. As origens da nossa época. 7ª edição, Rio de Janeiro: Campus, 2000 (1944), p. 89. As páginas seguintes se apóiam amplamente nas análises desenvolvidas neste livro.
  • 3
    Sigo, mais uma vez, a discussão de Polanyi contida no conjunto de A grande transformação. Os termos: "encapsulado" e "desencapsulado" traduzem os termos embedded/disembedded, que são centrais na tipologia teórica de Polanyi (cf. GRENDI, Edoardo. Polanyi dell'antropologia economica alla microanalise storica. Milano: Etas Libri, 1978). Essa escolha de termos é distinta daquele utilizada pela tradução brasileira citada, que eu utilizo para todo o resto.
  • 4
    O livro de Hirschman, citado na nota 1, serve como uma útil introdução ao tema. Vertambém o livro de Louis DUMONT, Homo aequalis. Gênese e plenitude da ideologia econômica. Bauru: Edusc, 2000.
  • 5
    Cf. POLANYI, op. cit. p. 18.
  • 6
    O triunfo intelectual do modelo liberal foi muito mais extenso e duradouro que qualquertriunfo político ou econômico que tal modelo tenha tido. É preciso ter isto no horizonte quando analisarmos as posições políticas, os planos reformadores, ou os cálculos de eficácia dos agentes sociais que tinham esse modelo no seu horizonte racional.
  • 7
    Uma referência fundamental permanece sendo a discussão de E.P. Thompson sobre osentido das lutas camponesas na Inglaterra do final do século XVIII contra a imposição das regras de mercado para a regulação do preço dos gêneros: Costumes em Comum. Estudos sobre a cultura popular tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, principalmente capítulos 4 e 5 (A economia moral da multidão inglesa no século XVIII e Economia moral revisitada, pp. 150-266).
  • 8
    Cf. CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social. Uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes, 1998, p. 170.
  • 9
    Ibid, p. 155.
  • 10
    Essa é, pelo menos, a imagem que os defensores do livre mercado fizeram do trabalhoforçado. Podemos constatar o quanto de "retórica" há nesta imagem ao lembrarmos da importância crescente que o trabalho escravo teve nas colônias do Novo Mundo durante a própria ascensão da economia liberal. Em economias onde a mão-de-obra "não estava prontamente disponível no lugar certo, pelo preço certo ou insuficientemente afastada das relações nãocapitalistas de produção" - como no caso da América -, o trabalho escravo e forçado era usado largamente no mesmo momento em que, na Europa, o sistema capitalista do trabalho assalariado estava amadurecendo (Cf. COOPER, F., T. Holt & R. Scott, Introdução, In: Além da escravidão. Investigações sobre raça, trabalho e cidadania em sociedades pós-emancipação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, p. 73).
  • 11
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 44.
  • 12
    Cf. CASTEL, op.cit., p. 212.
  • 13
    Para uma discussão sobre o significado do pauperismo, ver os capítulos 9 e 10 de A grande transformação e o capítulo 5 do livro de Robert Castel. Este sociólogo, em particular, discute como os discursos sobre pauperismo - que representa os operários como moralmente degradados - não representa apenas o medo dos abastados frente aos novos conflitos sociais, e nem apenas o etnocentrismo ou o puro preconceito anti-operário (ainda que também o seja), mas revela algo da realidade sociológica daquela sociedade: "a novidade [o pauperismo] é devida a tomada de consciência de uma condição trabalhadora de tal modo degradada, que coloca populações inteiras nas fronteiras da associabilidade" (CASTEL, op. cit., p. 289).
  • 14
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 219.
  • 15
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 221.
  • 16
    Cf. CASTEL, op. cit. p. 284. É esse também o sentido da afirmação de que "a vagabunda-gem representa a essência negativa do assalariado", pois, "o vagabundo é um assalariado 'puro' no sentido em que, falando de modo absoluto, só possuía a força de seus braços. É a mão-deobra em estado bruto. Mas é-lhe impossível entrar numa relação salarial para vendê-la. Sob a forma da vagabundagem, a condição de assalariado, poder-se-ia dizer, 'chega ao fundo', é o grau zero da condição salarial: um estado impossível (mas que, entretanto, existiu em carne e osso para centenas de milhares de exemplares), que condena à exclusão social. Porém, este casolimite sublinha traços que, na época, a maioria das situações salariais partilhou." (ibid. p. 149).
  • 17
    Cf. CASTEL, op. cit. p. 250.
  • 18
    Cf. POLANYI, op. cit. p. 298.
  • 19
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 263.
  • 20
    POLANYI, op. cit., p.90. O conceito de "mercadoria" é central aqui. Como nos lembra
  • 21
    Polanyi, é através dele que "o mecanismo do mercado se engrena aos vários elementos da vida industrial. As mercadorias são aqui definidas, empiricamente, como objetos produzidos para a venda no mercado; por outro lado, os mercados são definidos empiricamente como contatos reais entre compradores e vendedores. Assim, cada componente da indústria aparece como algo produzido para a venda, pois só então pode estar sujeito ao mecanismo da oferta e procura, com a intermediação do preço. Na prática, isto significa que deve haver mercado para cada um dos elementos da indústria; que nesses mercados cada um desses elementos é organizado num grupo de oferta e procura". (op. cit, p. 93, grifo meu).
  • 22
    Cf. POLANYI, op. cit., pp. 94- 95.
  • 23
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 255. Aqui, mais uma vez, as análises de Polanyi e Castel secomplementam. Podemos dizer que ambos compartilham a tese central de Polanyi, que é perseguida sistematicamente em A grande transformação: "Nossa tese é que a idéia de um mercado auto-regulável implicava uma rematada utopia. Uma tal instituição não poderia existir em qualquer tempo sem aniquilar a substância humana e natural da sociedade; ela teria destruído fisicamente o homem e transformado seu ambiente num deserto." (Cf. POLANYI, op.cit., p. 18).
  • 24
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 273.
  • 25
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 44.
  • 26
    Cf. CASTEL, op. cit., p. 45.
  • 27
    A tentativa de compreender esta nova miséria que surge com a industrialização está tam-bém, de resto, na própria origem da teoria social moderna: do liberalismo econômico ou o darwinismo social ao positivismo ou o marxismo. Polanyi aponta a ligação entre o pauperismo, a economia política e essa "descoberta da sociedade" que fundamenta a busca por uma explicação "do verdadeiro significado tormentoso da pobreza" (Cf. POLANYI, op. cit. p. 153). A solução que, garantindo as premissas da economia clássica, vê na natureza a explicação da sociedade (transformando as leis do mercado em leis naturais), começa a assombrar as ciências do homem também aí. O darwinismo social, o naturalismo, o racismo "científico" são exemplos disso. O marxismo como pensamento social, por outro lado, é uma tentativa (malograda do ponto de vista teórico, de acordo com Polanyi) de reintegrar a sociedade no mundo humano. Para uma discussão mais extensa (ainda que freqüentemente impressionista) desses temas, ver os capítulos 9 e 10 de A grande transformação.
  • 28
    O conceito de "desfiliação social" é usado por Robert Castel para descrever uma situaçãosocial definida pela vulnerabilidade da posição de um indivíduo com relação às redes de integração social, que envolvem desde o pertencimento precário a uma comunidade ou rede de sociabilidade, até a precariedade do trabalho e a fragilidade dos vínculos sócio-culturais. O conceito é fluído, mas central em suas análises sobre a constituição da "sociedade salarial" no século XIX e suas especificidades. Para uma discussão extensa sobre o tema, ver a introdução e o primeiro capítulo de As metamorfoses da questão social (pp. 21-93). Ver também: CASTEL, R. et alli. "Symposium sur Les métamorphoses de la question sociale: une chronique du salariat", Sociologie du travail, nº 43, 2001, pp. 235-263.
  • 29
    O que é sugerido, por exemplo, pelo trabalho de PECK, Gunther. Reinventing free labor: Padrones and immigrant workers in the North American West, 1880-1930 (New York: Cambridge University Press, 2000), que mostra que em pleno oeste americano, em um espaço e em um tempo que a historiografia dos Estados Unidos costuma considerar paradigmático do espírito empreendedor americano, a noção de trabalho livre comportava ambigüidades importantes, e relações de trabalho centradas nas figuras dos padrones e baseadas na coerção e tutela eram empreendidas não por rudes e primitivos empregadores, mas por empreendedores modernos.
  • 30
    Cf. STEINFELD, Robert. Coercion, contract and free labor in the Nineteenth Century. Cambridge (Mas.): Cambridge University Press, 2001, p. 2. Para uma discussão anterior de Steinfeld sobre a história jurídica do "trabalho livre", ver o seu The Invention of Free Labor: The Employment Relation in English and American Law and Culture. Chapel Hill (NC): North Carolina University Press, 1991.
  • 31
    Steinfeld chama a atenção para a necessidade de se construir uma visão "anti-essencialista"das tipologias com que se lida com a questão do trabalho: "Uma dificuldade com a sabedoria convencional é que ela retifica os tipos de trabalho, trata-os como 'coisas' com um conteúdo fixo, ao invés de tratá-los como práticas sociais/legais que podem ser construídas em uma série de maneiras distintas" (Coercion, contract and free labor, cit. p. 33).
  • 32
    BRASS, Tom. Free and unfree labour: the debate continues, In: BRASS, Tom & Marcel Van Der Linden (eds.) Free and Unfree Labour: The Debate Continues. New York: Peter Lang Publishing, 1997, p. 12. Brass discute nesta passagem da introdução os artigos de Robert Steinfeld e Stanley Engerman publicados no volume.
  • 33
    Sobre isso ver os artigos publicados na primeira parte (Negotiating Slavery) do livro organizado por TURNER, Mary: From Chattel Slaves to Wage Slaves. The Dynamics of Labour Bargaining in the Americas. Kingston, Bloomington and Indianapolis, London: Ian Randle, Indiana University Press, James Currey, 1995.
  • 34
    Cf. GLICKSTEIN, Jonathan A. Concepts of free labor in Antebellum America. New Haven: Yale University Press, 1995, p. 2. E uma afirmação como essa, poderíamos acrescentar, é obviamente válida do mesmo modo para outros lugares, como o Brasil, por todo o século XIX.
  • 35
    Ver sobre isso: COOPER, F., T. Holt, & R. Scott, Introdução, in Além da escravidão ... cit. Ver também, especialmente, o artigo de Frederick Cooper no mesmo volume: "Condições análogas à escravidão", pp. 201-279.
  • 36
    Cf. COOPER, F., T. Holt, & R. Scott, Introdução, in Além da escravidão... cit., p. 45. Os autores deste livro inspirador colocam o problema da "liberdade" em termos que valem a pena mencionar: a "liberdade não é um estado natural. É um construto social, um conjunto de valores coletivamente comuns, reforçado pelo discurso ritual, filosófico, literário e cotidiano. A liberdade tem uma história que contém noções distintas cuja própria fusão numa tradição histórica específica é tão importante quanto a tensão entre elas." (pp. 51-52).
  • 37
    "Em torno de 1890, as elites inglesas desenvolveram sua própria definição do 'trabalholivre'. 'The Economist anotou em 1891... que 'a controvérsia geral sobre o trabalho está para transformar-se amplamente sobre os respectivos direitos e deveres dos trabalhadores livres e dos sindicalistas' - os trabalhadores livres sendo definidos como todos aqueles que queriam fazer seus próprios contratos independentes com seus empregadores, sem levar em conta a posição do sindicato.' John SAVILLE, Trade Unions and Free Labour: The Background to the Taff Vale Decision, In: Essays in Labour History, ed. Asa Briggs and John Saville (London, 1967), 319." Apud: STEINFELD, Robert. Coercion, contract and free labor in the nineteenthcentury, cit. p. 14, nota 27.
  • 38
    POLANYI, Karl (e Abraham Rotstein). Dahomey and the slave trade. An analysis of an archaic economy. Seatle and London: University of Washington Press, 1966, p. xvii.
  • 39
    As referências aqui são inúmeras. No caso do Brasil, para fazer uma lista (necessariamenteincompleta) dos trabalhos mais influentes, podemos citar: CARDOSO, Ciro F. (org.) Escravidão e abolição no Brasil: novas perspectivas. Rio de Janeiro, Zahar, 1988; LARA, Sílvia H. (org) Escravidão (número especial da Revista Brasileira de História com vários artigos sobre o tema, vol. 8, nº 16, março/agosto 1988); REIS, João José & Eduardo Silva, Negociação e conflito. A resistência negra no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras, 1989; CHALHOUB, Sidney, Visões da Liberdade. Uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990; MATTOS, Hebe Maria, Das cores do silêncio: os significados da liberdade no Sudeste escravista. Brasil, século XIX, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998 (1995); FLORENTINO, M. e J. R. Góes, A paz nas senzalas. Famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, c. 1790 - c. 1850. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997; SLENES, Robert. Na Senzala uma Flor. Esperanças e recordações na formação da família escrava, Brasil Sudeste, século XIX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
  • 40
    Nesse sentido, vale também para o Brasil aquilo que os autores de Além da escravidão afirmam para a historiografia americana sobre a escravidão: O "trabalho livre", desse modo, acabava por ser definido apenas como "o fim da coação, não como uma estrutura de controle da mão-de-obra que precisasse ser analisada a seu próprio modo", cf. COOPER, F., T. Holt, & R. Scott, Introdução, cit. p. 42. E acrescentam: "O conceito de sociedades escravistas inspirou e encorajou o estudo de uma totalidade: uma economia política, sua legitimação ideológica e suas conseqüências ecológicas e culturais, tudo, de algum modo, iluminado por um conjunto específico de relações sociais de trabalho e, por sua vez, iluminando-o. Não estamos acostumados a pensar em 'trabalho livre, e 'sociedades livres' do mesmo modo" (ibid. pp. 43-44, grifo meu).
  • 41
    Dois importantes trabalhos que, no Brasil, tematizaram o problema do "significado daliberdade" diretamente - o de Sidney Chalhoub e o de Hebe Mattos citados duas notas atrás - fazem isso sem enfrentar de modo integral, entretanto, o sentido da "liberdade de trabalho". Mais recentemente, o problema historiográfico do pós-abolição vem sendo objeto de estudos inspiradores. Ver, por exemplo, os trabalhos recém-lançados: MATTOS, Hebe Maria & Ana Maria Rios. O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas. Topoi, volume 5, nº 8, janeiro-junho 2004, pp. 170-198; o já citado Além da escravidão, cit., recém-traduzido no Brasil com um importante prefácio de Hebe Mattos; e ainda: MATTOS, Hebe Maria e Ana Lugão Rios. Memórias do cativeiro: família, trabalho e cidadania no pós-abolição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.
  • 42
    Aqui, mais uma vez, as referências são variadas. Algumas das mais importantes são: COSTA,Emília Viotti da. Da senzala à colônia, São Paulo: Liv. Ciências Humanas, 1982 (1966); PINHEIRO, P. S. (ed.). Trabalho Escravo, Economia e Sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984; GEBARA, Ademir. O mercado de trabalho livre no Brasil (1871-1888). São Paulo: Brasiliense, 1986; KOWARICK, L. Trabalho e vadiagem: a origem do trabalho livre no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1987; LAMOUNIER, M. L. Da escravidão ao trabalho livre: a lei de locação de serviços de 1879. Campinas: Papirus, 1988.
  • 43
    LARA, Silvia H. Escravidão, cidadania e história do trabalho no Brasil, Projeto História, nº 16, 1998, pp. 25-38.
  • 44
    Como por exemplo, no trabalho clássico de FRANCO, Maria Sílvia de Carvalho - Homens livres na ordem escravocrata, 3ª edição, São Paulo: Kairós, 1983 - que continua a influenciar as análises sócio-históricas a esse respeito. Para uma crítica ponderada a esse trabalho e uma visão alternativa sobre alguns de seus temas, ver MATTOS, Hebe M. Das cores do silêncio... cit.
  • 45
    Manolo Florentino e João Fragoso mostraram, em contraste, que a "racionalidade" da classesenhorial não era efetivamente homogênea e podia abraçar, em pleno século XIX, um projeto amplamente "arcaico" (não necessariamente no sentido valorativo, mas no sentido polanyiano de "economia arcaica"): O arcaísmo como projeto. Mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia. Rio de Janeiro, c. 1790 - c. 1840. 4ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
  • 46
    Assim, partindo dos pressupostos de como a sociedade brasileira deveria ser, tenta-se analisaraquilo que ela é (ou foi). Ao fazer isso, constrói-se uma armadilha que arrisca fazer a interpretação andar em círculos.
  • 47
    Como mostra eloqüentemente Amy Dru Stanley no seu livro From Bondage to Contract. Wage labor, marriage and the market in the age of slave emancipation. Cambridge (Mas.): Cambridge University Press, 1998 (sobretudo o primeiro capítulo). Sobre as questões em torno do significado da liberdade e do contrato no Caribe inglês pós emancipação, ver o artigo de Thomas C. Holt no já citado Além da liberdade (2005), além do seu livro, The Problem of Freedom. Race, Labor, and Politcs in Jamaica and Britain, 1832-1938. Baltimore and London: Johns Hopkins University Press, 1992.
  • 48
    Ademir Gebara e Maria Lúcia Lamounier (ver nota 43) desenvolvem esse argumentoanalisando, respectivamente, a Lei nº 2.040, de 28/09/1871 (a Lei Rio Branco) e o Decreto nº 2.827, de 15/03/1879 (Lei Sinimbu).
  • 49
    Títulos XXIX a XXXVI (Ordenações Filipinas, vols. 1 a 5; Edição de Cândido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro de 1870, versão digitalizada: http://ara.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/ ordenacoes.htm).
  • 50
    Essa lei é de 13/09/1830. Sobre a história da legislação sobre o trabalho no períodoescravista, ver GEBARA, O mercado de trabalho livre no Brasil (1871-1888), cit. (principalmente o capítulo 2). Esta é a bibliografia principal para os apontamentos sobre o tema feitos neste parágrafo.
  • 51
    Quando é editada a lei sobre a locação de serviços agrícolas. Ver LAMOUNIER, Da escravidão ao trabalho livre, op. cit.
  • 52
    Lei nº 2.040, de 28/09/1871. Collecção das Leis do Imperio do Brasil de 1871, Tomo XXXI, Parte I (Rio de Janeiro, 1871), pp. 147.151 (referências tiradas de CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, INL, 1975, que transcreve integralmente a lei no seu apêndice II, pp. 366- 369).
  • 53
    E, desse modo, a principal novidade que introduzia na relação senhor/escravo era a legalidade de práticas que antes eram apenas costumeiras e cuja validade dependia, antes de tudo, da vontade senhorial. De todo modo, esse foi certamente um elemento desestabilizador da ordem senhorial sobre a qual assentava as relações escravistas. Para uma discussão dos significados da lei de 1871 com relação às práticas costumeiras da escravidão, ver de Sidney CHALHOUB, Visões da liberdade (cit.).
  • 54
    Esse é o sentido exclusivo que se dá aos contratos dos escravos se seguirmos, por exemplo,o que diz Mary Turner sobre os termos de barganha disponíveis para os escravos: Falando de um "novo filão de resistência do trabalhador escravo" que os estudos da escravidão apontavam (para além da tradicional dicotomia "acomodação" e "rebelião"), a "negociação" dos escravos, de acordo com ela, revelava "uma população escrava trabalhadora consciente do valor do seu trabalho e determinada a ganhar o melhor retorno por ele" "Introduction" (by Mary Turner) In: From Chattel Slaves to Wage Slaves, cit. p. 2. Esse livro é uma prova de que mesmo um conjunto formidável de trabalhos que tematizam criticamente o problema da negociação dos escravos pode cair nas armadilhas montadas pelo paradigma do "mercado", mesmo quando tenta explicitamente se desvencilhar dele.
  • 55
    Ver sobre isso a discussão de Joseli Maria Nunes MENDONÇA - Entre a mão e os anéis. A lei dos sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil. Campinas: Ed. Unicamp/Cecult, 1999 (sobretudo o primeiro capítulo, pp. 45-135).
  • 56
    Sobre isso, ver a Introdução de Além da escravidão, cit., principalmente p. 70. Sobre uma discussão acerca da "visão alternativa da vida econômica" dos escravos e libertos jamaicanos, confrontadas com as expectativas dos oficiais coloniais britânicos no pós-emancipação, ver HOLT, Thomas, "A essência do contrato", In: Além da escravidão, cit. pp. 89-129.
  • 57
    Além disso, vale partir da consideração de Edoardo Grendi de que "pensar a sociedade econômica não deve necessariamente contemplar a exigência de uma abstração da esfera econômica do 'resto'" (GRENDI, Polanyi... op. cit., p. 3). Em outras palavras: entendendo que essas "visões alternativas" não se referem a uma "economia" abstraída da cultura e das relações sociais.
  • 58
    A amostra que trato a seguir contém dados levantados pela minha própria pesquisa, assimcomo pelas pesquisas de Clemente Gentil Penna e Tamelusa Ceccato, a quem agradeço.
  • 59
    Esta amostra foi retirada de uma pesquisa em andamento nos livros de notas do Cartório do2º Ofício de Notas de Florianópolis. Este cartório contém uma série bastante lacunar de livros que pertenciam ao 1º e 2º Ofício de Notas do Desterro no século XIX. A amostra é resultado do levantamento completo de todas as notas registradas nos livros seguintes: livro 11 do 1º Ofício de Notas (1886-7), 2º Ofício de Notas: livros 11 (1847-1848), 12 (1849), 14 (1853), 22 (1859), 23 (1861), 29 (1866), 31 (1868-9), 33 (1870), 58 (1884), 59 (1885), 60 (1885-86), 61 (1886-87), 62 (1887).
  • 60
    "Escritura de loucação de serviços que faz o preto liberto Antônio de Nação Mocingo a JoséManoel de Souza...", Livro 11 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1847-1848). (escrivão João Antônio Lopes Gondim), fls. 4 e 4v.
  • 61
    "Escriptura de loucação de serviços que faz a preta liberta Theresa, a Dona FilisbertaCoriolana de Souza Passos", Livro 12 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1849) (escrivão João Antônio Lopes Gondim), fls. 10 e 10v.
  • 62
    "Escriptura de loucação de serviços que faz o preto liberto Sebastião Cabinda a Pedro {Kemper}", Livro 11 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1849) (escrivão João Antônio Lopes Gondim), fls. 31v e 32.
  • 63
    "Escriptura de loucação de serviços que faz a preta liberta Maria Leocadia ao CapitãoFernando Antônio Cardoso", Livro 11 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1849) (escrivão João Antônio Lopes Gondim), fls. 41, 41v e 42.
  • 64
    "Escriptura de loucação de serviços que faz o preto liberto Francisco Benguella a AntônioLopes da Silva", Livro 11 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1849) (escrivão João Antônio Lopes Gondim), fls. 54 e 54v.
  • 65
    "Escriptura de contracto de loucação de serviços que faz o crioulo liberto João Ancelmo aJacinto Feliciano da Conceição como abaixo se declara" Livro 58 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1884) (escrivão Leonardo Jorge de Campos), fls. 27v, 28 e 28v.
  • 66
    "Escriptura de contracto de loucação de serviços que faz a crioula Gertrudes a FortunatoSoncini como abaixo se declara", Livro 59 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1885) (escrivão Leonardo Jorge de Campos), fls. 5v e 6.
  • 67
    "Escriptura de contracto de loucação de serviços que presta o pardo liberto Germano aFrerderico Momm", Livro 62 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1887) (escrivão Leonardo Jorge de Campos), fls.48 e 48v.
  • 68
    "Escriptura de loucação de serviços que presta o crioulo liberto Antônio Martins da Rochaao Doutor Joaquim Augusto do Livramento na forma que abaixo se declara", Livro 31 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1868-69) (escrivão Leonardo Jorge de Campos), fls.88. (nota datada de 31/05/1869).
  • 69
    Que ele seja - para criar um neologismo anacrônico - uma espécie de "micro-empresário aoganho" apenas torna a pergunta mais interessante, na medida em que revela a ambigüidade da própria idéia de "empreendedor" que se supunha estar ao alcance de qualquer trabalhador "livre".
  • 70
    A aceitação de um compromisso financeiro tão oneroso quanto aquele aceito pelo libertoAntônio da Rocha (ver nota 68) só pode ser entendida nesse contexto como uma escolha que coloca a estabilidade do trabalho (e de um trabalho capaz de prover uma subsistência digna e estável) à frente dos ganhos pecuniários.
  • 71
    A existência de atividades remuneradas durante a escravidão envolviam uma série dearranjos de trabalho entre os escravos e seus senhores. Essas atividades são fartamente documentadas e mereceram a atenção de trabalhos de vários especialistas sobre a história da escravidão. Ver, por exemplo, SOARES, Luiz Carlos, Os escravos de ganho no Rio de Janeiro do século XIX, Revista Brasileira de História, nº 16, mar./ago. 1988 (número dedicado à "Escravidão", organizado por Sílvia Lara), pp. 107-142; assim como o trabalho clássico de Sidney CHALHOUB, Visões da liberdade (cit.). Para o Sul do Brasil, vale citar pesquisas que apontam na mesma direção: PENA, Eduardo Spiller. O jogo da face. A astúcia escrava frente aos senhores e à lei na Curitiba Provincial. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 1999; MOREIRA, Paulo Roberto S. Os cativos e os homens de bem: experiências negras no espaço urbano. Porto Alegre, 1858-1888. Porto Alegre: EST Edições, 2003.
  • 72
    Essa era uma preocupação que atravessava toda a discussão sobre a importação de mão-de-obra estrangeira e o manejo da mão-de-obra escrava e nacional, por exemplo, na lavoura cafeeira nas últimas décadas da escravidão (cf. LAMOUNIER, Da escravidão ao trabalho livre, cit.). É importante notar que as diferenças entre as situações rural e urbana são muito importantes e irão merecer mais atenção na continuidade deste trabalho.
  • 73
    CASTEL, R. As metamorfoses da questão social. cit. p. 117.
  • 74
    Cf. LEVI, Giovanni. A herança imaterial. Trajetória de um exorcista no Piemonte do século XVII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, p. 104.
  • 75
    Cf. POLANYI, K. A grande transformação, cit. p. 191.
  • 76
    Como sugere Bernard Lepetit como alternativa ao termo "filiação social" usado por Robert Castel(cf. LEPETIT, B. "Le travail de l'histoire", Annales HSS, mai-juin 1996, nº 3, p. 537).
  • 77
    Cf. a Introdução de Além da escravidão, cit. p. 60.
  • 78
    Como aponta David Brion Davis, tratava-se também de uma transformação radical naconsciência moral ocidental, marcada pelo aparecimento de uma opinião relativamente generalizada de que a escravidão no Novo Mundo "simbolizava todas as forças que ameaçavam o verdadeiro destino do homem", Cf. DAVIS, D. B. The problem of Slavery in the Age of Revolution 1770-1823. New York/Oxford: Oxford University Press, 1999, p. 41.
  • 79
    Ver, sobre isso, mais uma vez, a discussão sobre a idéia de cidadania, direitos e liberdade nocontexto das sociedades escravistas e no pós-emancipação, que atravessa o trabalho de Cooper, Holt e Scott, em Além da escravidão (cit.).
  • 80
    Cf. CHALHOUB, S. A enxada e o guarda-chuva: a luta pela libertação dos escravos e aformação da classe trabalhadora no Brasil (trabalho apresentado no XXI Simpósio Nacional da ANPUH, Niterói, junho de 2001, mimeo.).
  • 81
    Do ponto de vista das elites, como mostra Castel, "quando se recusa a opção literalmentereacionária de reconstituir, enquanto tais, as antigas sujeições, é necessário reconstruir, num universo onde em princípio reina o contrato, novas regulações que sejam compatíveis com a liberdade e mantendo as relações de dependência, sem as quais uma ordem social é impossível" (Cf. CASTEL, R. As metamorfoses da questão social, cit. p. 307).
  • 82
    Cf. CASTEL, R. op. cit. p. 278. Ver, para as Américas (sobretudo o Caribe), ver HOLT,Thomas, "A essência do contrato", cit. In: Além da escravidão; SCOTT, Rebecca C. Fronteiras móveis, 'linhas de cor' e divisões partidárias, In: Além da escravidão, cit. pp. 131-200; CRATON, Michael. Reembaralhando as cartas: a transição da escravidão para outras formas de trabalho no Caribe britânico (c. 1790-1890), Estudos Afro-Asiáticos, n. 28, 1995, pp. 31-83.
  • 83
    Para usar a feliz expressão empregada nas análises de Sidney Chalhoub (ver, por exemplo,"Para que servem os narizes? Paternalismo, darwinismo social e ciência racial em Machado de Assis", In: CHALHOUB, S. et alli (org.) Artes e ofícios de curar no Brasil. Capítulos de história social. Campinas: Ed. Unicamp, 2003, p. 31).
  • 84
    No Livro 58 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1884) (escrivão Leonardo Jorge de Campos) estão registrados uma alforria e dois contratos de locação de serviços que têm como contratante "Carl Hoepke & Companhia". No Livro 60 do 2º Ofício de Notas da Cidade do Desterro (1884) (escrivão Leonardo Jorge de Campos), há um contrato de locação entre Wendhausen e o crioulo liberto Idalino que se comprometia, como pagamento dos duzentos mil réis que lhe havia emprestado, trabalhar por quatro anos "com todo respeito, amor e carinho" (fls. 34).0

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2005

Histórico

  • Recebido
    Jan 2005
  • Aceito
    Jun 2005
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