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A inserção do cristianismo batista em Moçambique: razões que levaram os missionários a escolherem apenas os colonos portugueses como objeto de evangelização (1950-1971)

The insertion of Baptist Christianity in Mozambique: Reasons that led missionaries to choosing only Portuguese settlers as their object of evangelization (1950-1971)

La inserción del cristianismo bautista en Mozambique: motivos que llevaron a los misioneros a elegir únicamente a los colonos portugueses como objeto de evangelización (1950-1971)

RESUMO

Este artigo analisa a inserção do cristianismo batista em Moçambique, ex-colônia africana de Portugal, entre os anos de 1950 e 1971. Naquele contexto, os missionários se envolveram apenas com os colonos que ali viviam. A pergunta que tentaremos responder é: por que tais evangélicos não incluíram os(as) moçambicanos(as) autóctones em seus projetos? Consideraremos as razões históricas que explicam a primazia sociorracial assinalada, questionando alguns conceitos utilizados em estudos sobre história do protestantismo, especialmente os de protestantismos de “missão” e de “migração”, aqui interpelados a partir de apontamentos da Escola Italiana de História das Religiões, que oferece suporte para a principal conclusão do texto, a saber: em lugar de uma suposta natureza não missionária, o projeto era, sim, proselitista. A mídia impressa confessional do grupo será nossa principal fonte documental. Esperamos contribuir com os debates sobre as missões cristãs em África no século XX, sobretudo no âmbito da História Cultural das Religiões.

Palavras-chave:
cristianismo batista; Moçambique; protestantismo de missão; protestantismo de migração; História Cultural das Religiões

ABSTRACT

This article analyzes the insertion of Baptist Christianity in Mozambique, a former Portuguese colony in Africa, between the years of 1950 and 1971. In that context, the Christian missionaries get involved only settlers who lived there. The question that we will try to answer is: why such evangelicals did not include native Mozambicans in their projects? We will consider the historical reasons that explain the socio-racial primacy mentioned, questioning some concepts used in studies about the history of Protestantism, especially those of “mission” and “migration” Protestantism, here questioned from notes of the Italian School of History of Religions, which supports for the main conclusion of the text, namely: instead of an alleged non-missionary nature, this project was, rather, proselytizing. The group’s confessional print media will be our main documentary source. We hope to contribute to the debates on Christian missions in Africa during the 20th century, especially in the scope of the Cultural History of Religions.

Keywords:
baptist christianity; Mozambique; protestantism of mission; protestantism of migration; Cultural History of Religions

RESUMEN

Este artículo analiza la inserción del cristianismo bautista en Mozambique, antigua colonia africana de Portugal, entre 1950 y 1971. En ese contexto, los misioneros sólo se involucraron con los colonos que allí vivían. La pregunta que intentaremos responder es: ¿por qué estos evangélicos no incluyeron a los indígenas mozambiqueños en sus proyectos? Consideraremos las razones históricas que explican la primacía socio-racial señalada, cuestionando algunos conceptos utilizados en los estudios sobre la historia del protestantismo, especialmente los de protestantismos de “misión” y “migración”, cuestionados aquí a partir de apuntes de la Escuela Italiana de la Historia de las Religiones, lo que sustenta la principal conclusión del texto, a saber: más que un supuesto carácter no misionero, el proyecto era, más bien, proselitista. Los medios impresos confesionales del grupo serán nuestra principal fuente documental. Esperamos contribuir a los debates sobre las misiones cristianas en África en el siglo XX, especialmente en el contexto de la Historia Cultural de las Religiones.

Palabras clave:
cristianismo bautista; Mozambique; protestantismo misionero; migración protestantismo; Historia Cultural de las Religiones

Introdução

Foi nos meados do século XX que os batistas de língua portuguesa adentraram de forma contínua e sistemática nas porções africanas colonizadas por Portugal. A Primeira Igreja desse grupo foi estabelecida em Lourenço Marques, então capital da colônia moçambicana. Fundada em 1950, aquela congregação era filha das iniciativas da Convenção Batista Portuguesa que enviara um grupo de cinco pessoas1 1 Tratava-se de cinco missionários com formação teológica nas instituições batistas portuguesas: pastor Luís Rodrigues de Almeida, recém-casado com Maria de José Pato de Almeida, António Rodrigues Tapada, Alexandre dos Santos Faia e Maria Amélia de Sousa. Fundaram a Primeira Igreja Baptista de Lourenço Marques em 5 de março de 1950 (ZEFANIAS, 2008). para introduzir a presença e permanência desses cristãos portugueses metropolitanos, marcando espaço naquela sociedade colonial através de uma pequena comunidade.

Eram tempos de grandes transformações no mundo, em particular na Europa, após o fim da Segunda Guerra Mundial. Enquanto declinavam-se os colonialismos europeus, as lideranças missionárias desviavam o foco e as estratégias outrora apontadas para países populosos como a Índia, a China e outros tradicionais receptores das missões. Esses grandes alvos da atenção cristã agora eram evitados em detrimento de regiões ainda não alcançadas pelo avanço do comunismo, e menos afetadas pelos movimentos nacionalistas antiocidentais, ao menos de acordo com o “radar” das agências missionárias que para esses locais passavam a enviar seus representantes, redirecionando os rumos do movimento global de propagação cristã.

Na Europa, posteriormente ao término da Segunda Guerra Mundial, o momento apontava para a necessária readaptação das nações do velho mundo, apressadas em desembarcar de um tipo de imperialismo que tendia a naufragar conforme declinavam-se os colonialismos europeus. Visto que os contextos políticos adversos dificultavam e até impediam as ações das agências missionárias em regiões outrora colonizadas que, naquele momento, tornavam-se independentes, é que o Conselho Mundial de Igrejas (do qual não participavam os batistas) decidiu desviar o fluxo missionário em direção a áreas consideradas tribais na Oceania, na América e na África (ROBERT, 2002ROBERT, Dana. Gospel Bearers, Gender Barriers: Missionary Women in the Twentieth Century. New York: Orbis Books, 2002.).

No que concerne a Portugal, a ditadura salazarista dava o tom de um período amargo para os valores democráticos e para os direitos humanos frequentemente violados durante a vigência do Estado Novo (1933-1974), regime de fortes traços totalitários e notavelmente longevo, resistindo até mesmo às transformações políticas causadas pela Segunda Guerra Mundial. Naquela mesma década de 1950, enquanto os outros impérios ocidentais definhavam rumo às independências das nações africanas, os portugueses intensificavam a colonização daqueles territórios em franco desenvolvimento como Angola e Moçambique, para onde a forte onda de emigração conduzia populações lusas que frequentavam a casa dos milhares e eram responsáveis pelo vultoso crescimento populacional de cidades como Lourenço Marques, que dobrou o número de habitantes não africanos naquela década (MEDEIROS, 1985MEDEIROS, Eduardo. A evolução demográfica da cidade de Lourenço Marques (1894-1975): estudo bibliográfico. Revista Internacional de Estudos Africanos, n. 3, p. 221-245, 1985.).

Essas pessoas eram atingidas pela propaganda do regime autoritário de Salazar, que alimentava as esperanças de prosperidade desses portugueses com apoio da ideologia lusotropicalista do brasileiro Gilberto Freyre (1940), segundo a qual as colônias africanas e demais regiões ultramarinas, em geral, eram exemplos de um mundo português que se irmanava sob a proteção da mesma paternidade, da qual podiam se orgulhar, afinal, segundo essas ideias, dentre os colonialismos europeus, seria este o mais peculiarmente aberto à convivência com culturas exóticas, para com as quais o português afetuoso e lírico se ofereceria num gesto cristão e acolhedor para com a miscigenação que a todos misturaria em territórios de lavra lusitana (THOMAZ, 2003THOMAZ, Omar Ribeiro. Ecos do Atlântico Sul: representações sobre o Terceiro Império Português. Ed. UFRJ, Rio de Janeiro, 2003.; CASTELO, 2011CASTELO, Claudia. Uma incursão no luso-tropicalismo de Gilberto Freyre.Blogue de História Lusófona, Lisboa, ano 6, 2011. Disponível emDisponível emhttp://www2.iict.pt/archive/doc/bHL_Ano_VI_16_Claudia_Castelo__Uma_incursao_no_lusotropicalismo.pdf . Acesso em: 3 mar. 2015.
http://www2.iict.pt/archive/doc/bHL_Ano_...
).

Distante de sua terra natal, essa população portuguesa e católica em África careceria de uma ação evangelizadora. Assim pensavam as agências missionárias batistas, em especial a portuguesa, primeira a se engajar na aventura protestante ali. Segundo Tomás Zefanias, pastor batista moçambicano, autor de História dos batistas de Moçambique2 2 A obra mencionada trata-se de um esforço da liderança batista moçambicana, preocupada em construir um registro historiográfico da expansão do grupo em Moçambique. Produzido em 2008 pelo pastor moçambicano Tomás Zefanias, teve o objetivo de funcionar como bibliografia dos cursos do Seminário Teológico Batista da Beira (capital da província de Sofala). A obra rara aparecerá nas referências bibliográficas deste artigo sem editora, uma vez que é uma produção autônoma do autor e do conjunto de colaboradores com os quais contou para a efetivação do projeto. O livro, atualmente, pode ser encontrado apenas nos acervos pessoais de algumas lideranças autóctones desse grupo religioso e nos anexos da tese doutoral de autoria de Harley Abrantes Moreira (2019). , a nova igreja se organizou com cinco membros portugueses que, em setembro de 1949, deixaram Portugal rumo a Lourenço Marques para fundar uma comunidade que, durante o período colonial, se caracterizou por ser uma igreja portuguesa e branca naquela região do continente africano (ZEFANIAS, 2008ZEFANIAS, Tomás. História dos batistas de Moçambique. s/ed. Beira, 2008.).

Naqueles tempos de colonização portuguesa, a implantação da Primeira Igreja Batista em Moçambique se deu ainda sob influência do contexto de assinatura da concordata (1940) com a Santa Sé, onde o Estado Novo passava a reconhecer e a contar com as missões católicas como instituições de utilidade imperial, responsáveis pela divulgação da cultura ocidental cristã nas colônias de ultramar (CABAÇO, 2010CABAÇO, José Luis de Oliveira. Moçambique: identidades, colonialismo e libertação. 2. ed. Maputo: Ed. Marimbe, 2010.; SILVA, 2017SILVA, Cristiane Nascimento da. “Viver a fé em Moçambique”: as relações entre a FRELIMO e as confissões religiosas (1962-1982). Tese (Doutorado em História Social), UFF. Niterói, 2017.).

Bem mais que acordos formais, a aliança entre Igreja e Império simbolizava o fundamento cristão da missão civilizadora portuguesa pregada pelo regime de Salazar. Afirmado em discursos oficiais das autoridades civis como o grande paradigma norteador do encontro cultural entre a civilização e as populações exóticas, ao catolicismo caberia fazer coincidir nos mesmos indivíduos a qualidade de cristão e a de patriota, sendo as missões cristãs não católicas toleradas, apenas se para esse ideal convergissem ou mesmo colaborassem (­RAMPINELLI, 2014RAMPINELLI, W. Salazar: uma longa ditadura derrotada pelo colonialismo. Revista Lutas Sociais, São Paulo, v. 18, n. 32, jan./jun. p. 119-132, 2014. Disponível em:Disponível em:http://www4.pucsp.br/neils/revista/vol.32/waldir_jose_rampinelli.pdf . Acesso em: 20 out. 2020.
http://www4.pucsp.br/neils/revista/vol.3...
). Nesse contexto de aliança entre Estado e Igreja Católica, o protestantismo foi, quase sempre, perseguido e, muitas vezes, associado, por padres, a outros “perigos” como o “maometanismo”, o comunismo e o nacionalismo autóctone3 3 Autores como José Luís Cabaço (2010) afirmam que as denominações protestantes foram reprimidas, mencionando Dom Teodósio Clemente de Gouveia, cardeal arcebispo de Lourenço Marques na década de 1950, como o autor de pronunciamentos intimidatórios contra essas igrejas que, junto às hierarquias islâmicas, eram alvos das políticas repressoras do clero e do Estado português. Tais ações não se limitavam aos discursos oficiais, mas, segundo o autor, consistiam de destruições de bíblias, pressões físicas e psicológicas perpetradas contra as crianças e seus pais frequentadores dessas missões, além de intempestivas obstruções de cultos através da entrada de padres durante suas celebrações impedindo seus prosseguimentos. .

Contrariamente ao que esperavam as autoridades portuguesas, apesar das igrejas protestantes também possuírem uma mensagem de civilização, em Moçambique, pode-se dizer que suas missões valorizavam, de modo geral, as línguas africanas e as culturas locais, pois era através de uma penetração cultural mais profunda que se tentava incutir a religião missionária, ao passo que o governo português de braços católicos, tentava erradicar a cultura local substituindo-a pela da metrópole. Considerável fração das igrejas não católicas, portanto, era vista como inimiga do Estado, uma vez que muitas vezes traduziam a bíblia para as línguas locais, através das quais os cultos eram celebrados, funcionando como um ponto de encontro e um suporte para as populações nativas diante das durezas do colonialismo (NEVES, 1998NEVES. Joel das. A American Boards Mission e os desafios do protestantismo em Manica e Sofala (Moçambique) 1900-1950. Bordeaux: Lusotopie, 1998.; SILVA, 2001SILVA, Teresa Cruz. Igrejas protestantes e consciência política no Sul de Moçambique: caso da Missão Suíça (1930-1974). Maputo: Ed. Promédia, 2001.).

Foi dentro desse contexto que a Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques surgiu como uma minoria protestante portuguesa, com um objetivo um tanto distinto dessas suas irmãs de outras denominações e nacionalidades, pois, em seu caso, apesar do evangelismo missionário expansionista que lhes impulsionava, na prática primava-se pelo alcance apenas dos portugueses brancos que viviam em Moçambique e à evangelização de seus compatriotas de mesma cor. É possível chegar a essa conclusão com apoio de materiais produzidos pela própria imprensa batista e nas fontes orais, em que pastores batistas moçambicanos recordam que a prioridade e a razão de ser dos primeiros esforços evangelísticos no país eram dirigidos à comunidade portuguesa (MOREIRA, 2019MOREIRA, Harley Abrantes. “Onde há desespero, a esperança é importante”? Uma história da expansão do cristianismo batista em Moçambique (1950-1992). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

Segundo tal documentação, o período em que o trabalho batista foi dirigido por portugueses na antiga colônia caracterizou-se por uma igreja monocromática que, apesar da identificação racial com as elites coloniais, sofria as perseguições de um Estado autoritário sintonizado com a Igreja Católica. Durante esse período, marcado pela deferência ao catolicismo e pelo espaço social que este ocupava em termos de direitos e privilégios, o cristianismo não católico desenvolvia seu trabalho em condições próximas às da clandestinidade, onde o cerceamento das liberdades operava nas mínimas ações do cotidiano (BULO, 2016BULO, Arão. Entrevista I. Entrevistador: Harley Abrantes Moreira, 16 out. 2016, Beira, arquivo. WAW (110 min.).).

Diante desse quadro, essas outras igrejas teriam de optar, muitas vezes, por uma evangelização inserida nas culturas locais, o que implicaria em enfrentamento direto com a igreja católica e as forças coloniais, ou por um trabalho mais discreto de apoio espiritual aos colonos portugueses, cooperando indiretamente com a ideologia do regime autoritário, pa­triótico e cristão. A evangelização dos portugueses oriundos da metrópole era, portanto, conveniente aos batistas que, desejando se expandirem, teriam à sua disposição um importante seguimento composto pelo grande contingente de imigrantes lusitanos.

Por outro lado, para o governo colonial, qualquer igreja que pregasse, cantasse ou lesse em língua portuguesa na África, estaria, em princípio, cooperando com a consolidação do império ultramarino que, em sua pretensa missão civilizadora, oferecia ao indígena africano a possibilidade de certa inserção social através da assimilação do idioma português, da religião e da escolaridade católica. A garantia da permanência batista em Moçambique nas últimas décadas do regime colonial dependia, portanto, desse tipo de cooperação amistosa que parece ter sido compactuada por aquele grupo religioso missionário.

O Batista de Moçambique: um periódico e os propósitos missionários de seu grupo

Esses primórdios do trabalho batista português em Moçambique podem ser analisados a partir das publicações do jornal O Batista de Moçambique, um periódico bimestral, editado em gráficas de Lourenço Marques pelo pastor Luís R. de Almeida, e de propriedade da Convenção Batista de Moçambique durante o período de liderança portuguesa. Assim como no Brasil, em Portugal, a preocupação dos batistas em criar um jornal que auxiliasse na tarefa de doutrinar e informar os membros daquela denominação, foi uma das principais medidas tomadas logo em seguida à fundação da primeira igreja (ANJOS, 2013ANJOS, Maria de Lourdes Porfírio Ramos Trindade dos. Educação feminina batista no Nordeste: a ação educacional de Martha Elizabet Heristhon no Seminário de Educadoras cristãs de Recife (1953-1979). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013.; ADAMOVICZ, 2008ADAMOVICZ, Anna Lucia Collyer. Imprensa protestante na primeira república: evangelismo, informação e produção cultural - O Jornal Batista (1901-1922). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.).

Seu conteúdo consistia em textos que informavam aos leitores as decisões administrativas das assembleias da Convenção, atualizando-os dos acontecimentos internos ao grupo como campanhas missionárias, visitas de pastores de outros países, além de sermões pastorais, crônicas e opiniões sobre assuntos socioculturais, nacionais e internacionais, muitas vezes presentes por meio de artigos escritos no Brasil ou em Portugal que, uma vez publicados por seus respectivos periódicos, eram reaproveitados e novamente oferecidos a leitores, agora em África. Esses materiais, normalmente escritos por pastores e lideranças, também poderiam ser enviados à redação do jornal por qualquer membro de qualquer igreja batista.

A Convenção Batista de Moçambique, da qual o jornal era propriedade, era uma organização regional da Convenção Batista Portuguesa. Sua imprensa visava à cooperação das igrejas para seus propósitos doutrinários, informativos e evangelísticos em todo o mundo (ALMEIDA, 1963ALMEIDA, Luís Rodrigues de. Jornal O Batista de Moçambique. O Batista de Moçambique, set. 1963. p. 2., p. 2). Durante sua efêmera existência de 25 anos, esse veículo de informação sempre se apresentou como parte de um corpo com membros em diversos continentes, a se movimentar sincronicamente e em união, por intermédio de objetivos partilhados e direção comum. Portanto, o perfil teológico missionário notado na história desse grupo em países como o Brasil, era o mesmo que se apresentava e tentava transplantar para o território português ultramarino de acordo com aquelas páginas.

Segundo Micheline Reinaux (2013REINAUX, Micheline. A gênese da editoração protestante no Brasil: o circuito de difusão das publicações (1830-1920). CLIO - Revista de Pesquisa Histórica, Recife, n. 30. v. 2, p. 1-29, 2013.), periódicos protestantes sempre se mostraram como peças fundamentais na propaganda dos trabalhos missionários, uma vez que as lideranças apostavam no poder da palavra impressa para a difusão das doutrinas evangélicas. No caso de Moçambique, mesmo com boa parte da população não tendo acesso à leitura, ter um veículo de circulação nos espaços de língua portuguesa facilitaria a divulgação de sermões, notícias, material didático etc. entre os colonos brancos, alfabetizados, que poderiam ­expandir o protestantismo nos bolsões populacionais que concentravam o maior número de portugueses oriundos da metrópole.

A difusão desses periódicos também se dava entre aqueles que não necessariamente pertenciam à denominação e, por isso, a atitude de fundar um instrumento de mídia como esse, logo em seguida à inauguração do trabalho, indicava, também, os propósitos evangelísticos do grupo. Segundo os defensores de jornais batistas nos locais onde as missões eram implantadas, eles tinham a função de “[...] evangelizar os não-crentes, instruir os crentes e defender a Causa batista” (PEREIRA, 2001PEREIRA, José dos Reis. História dos batistas no Brasil (1882-2001). Rio de Janeiro: JUERP, 2001., p. 135) e, em estudos sobre essa imprensa confessional, esse tipo de material é compreendido como um canal de comunicação com sujeitos sociais situados para além dos muros da comunidade.

De acordo com Anna Lúcia Collyer Adamovicz (2008), jornais batistas em missões serviam na viabilização do crescimento da denominação. Para a autora, os periódicos eram vistos como uma estratégia de evangelização, ao trazer ensinamento bíblico para os conversos, bem como informações de caráter secular, mas com interpretações das lideranças batistas, indicando, assim, sua intenção de funcionar, também, como formador de opinião. No caso do Brasil, por exemplo, O Jornal Batista chegou a atingir, nos anos 1920, a marca de um exemplar para cada três membros da denominação4 4 Em 1930, as igrejas batistas filiadas à Convenção Batista Brasileira alcançaram a marca de 40.500 membros. Nesse sentido, calcula-se que a tiragem d’O Jornal Batista chegava a 13.500 exemplares semanais (FEITOSA, 1978). , que poderiam repassá-los a vizinhos e demais conhecidos de outras religiões.

Assim, o papel da imprensa batista, embora envolvesse a comunicação direta com os membros das igrejas, ultrapassava esse objetivo, sem dúvida fundamental, uma vez que ali se relatavam progressos e dificuldades das missões, objetivando sensibilizar leitores a ofertar para os trabalhos desenvolvidos5 5 Era comum os missionários tornarem público suas ações através de periódicos, principalmente mostrando o suposto sucesso naquilo que estavam desenvolvendo. Todas as denominações que desenvolviam trabalhos de evangelização nesse período usavam dessa estratégia (SOUZA, 2007). . Todavia, a existência de um jornal batista moçambicano, entre 1950 e 1975, aponta para o caráter missionário daquela experiência religiosa que, através de sua imprensa confessional, visava se comunicar com os habitantes da colônia pertencentes a outras religiões e, portanto, objetos de conversão e alvos daquela proposta missionária.

Dessa forma, é muito improvável que aqueles primeiros batistas em Moçambique almejassem apenas exportar sua igreja e conservá-la quantitativamente intacta enquanto ofereciam suporte espiritual para a membresia lusitana e, antes que se imagine que o tímido crescimento desse grupo em período colonial6 6 A respeito do acanhado crescimento numérico desse grupo no período colonial em Moçambique, ver Moreira (2019). tenha sido consequência da natureza aparentemente exclusivista de uma proposta endereçada apenas aos lusitanos, avisamos que os batistas portugueses em Moçambique, apesar de colonos, não representavam uma espécie daquilo que muitos estudiosos da temática costumam chamar de “protestantismo de migração”, e sim, também, uma comunidade de missão, cujos cinco fundadores foram enviados pela Convenção Batista Portuguesa com o intuito de evangelizar na colônia e fazer prosperar aquele trabalho numericamente.

Batistas portugueses em Moçambique: um “protestantismo de migração”?

A ideia de uma divisão entre protestantismo de missão e protestantismo de migração foi utilizada por diversos autores (TOURAULT, 1996TOURAULT, Philippe. História concisa da Igreja. Mem Martins - Sintra: Publicações Europa América, 1996.; PEREIRA, 2001PEREIRA, José dos Reis. História dos batistas no Brasil (1882-2001). Rio de Janeiro: JUERP, 2001.; MESQUITA, 1962MESQUITA, Antonio N. de. História dos batistas no Brasil de 1907 a 1935. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1962.; MATOS, 2008MATOS, Alderi Souza de. Erasmo Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira: perspectivas sobre a missão da igreja. São Paulo: Cultura Cristã, 2008.; LEONARD, 2002LEONARD, Émile G. O protestantismo brasileiro: estudo de eclesiologia e história social. São Paulo: ASTE, 2002.; AZEVEDO, 1996AZEVEDO, Israel Belo de. A celebração do indivíduo: a formação do pensamento batista brasileiro. Piracicaba: Editora da UNIMEP, 1996.) em temporalidades e espaços variados. Antonio Gouvêa Mendonça (2008MENDONÇA, Antônio Gouveia. O celeste porvir: a inserção do protestantismo no Brasil. São Paulo: EDUSP, 2008.), a exemplo, estabelece uma distinção intencional entre ambos os modelos. Um deles visaria transplantar sua religião por meio de igrejas que pretendiam atender às demandas religiosas das colônias de imigrantes, oferecendo-os a oportunidade de praticar sua religião com sacerdotes da mesma nacionalidade, livro sagrado em idioma de origem, assim como livro de cânticos e as celebrações, em si. O protestantismo de missão teria características quase opostas e visava não só à assistência aos praticantes daquela religião, mas à evangelização dos cidadãos da nação ou colônia para onde se dirigiam.

Para o tipo de presença protestante mais comprometida com o apoio religioso dos seus próprios compatriotas, então deslocados da terra natal, o termo “protestantismo histórico”7 7 Sobre o termo “protestantismo histórico”, um primeiro problema seria a resultante distinção entre aqueles que são e os que não são históricos. Ao problematizar esse tipo de classificação, Lyndon de Araújo Santos (2004) afirma que é necessário entender o processo histórico de inserção do protestantismo no Brasil para compreender que essa tipologia trata das alteridades entre os subgrupos protestantes e das suas disputas internas. Os defensores dessa corrente - protestantismo histórico - excluem desse grupo igrejas pentecostais e neopentecostais, colocando-as como correntes distintas e mostrando-as, muitas vezes, como denominações inferiores àquelas consideradas históricas. Como o protestantismo é uma corrente plural do cristianismo, que se caracteriza pelo seu sectarismo e, nesse caso, pela desconstrução do discurso do outro, afirmar pertencer à corrente dos históricos é pôr os demais em uma escala inferior de evangélicos que não fazem parte dessa suposta elite, a qual se afirma mais racional e mais próxima dos reformadores do século XVI. também costuma ser aplicado, denotando a herança da Reforma Protestante e a alteridade presente no interior dessa ramificação cristã sem, necessariamente, historicizar os termos em questão (MATOS, 2008MATOS, Alderi Souza de. Erasmo Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira: perspectivas sobre a missão da igreja. São Paulo: Cultura Cristã, 2008.). Há ainda na historiografia sobre o protestantismo, principalmente em se tratando do Brasil, aqueles que defendem o uso do termo “protestantismo de invasão”, que teria sido adotado, mesmo que de forma efêmera, na América Portuguesa durante as invasões francesa (1555, no Rio de Janeiro) e holandesa (1624, na Bahia, e de 1630 a 1645, em Pernambuco) (LEONARD, 2002LEONARD, Émile G. O protestantismo brasileiro: estudo de eclesiologia e história social. São Paulo: ASTE, 2002.).

Apesar da ampla utilização dessa classificação que costuma dividir protestantismo de “missão” e de “migração” (e, em menor escala, o de “invasão”), estudos mais recentes contestam essa divisão alegando que, na perspectiva de diversos grupos situados no amplo espectro protestante, o cristão, em si, tem a obrigação de ser um missionário, uma vez que o cristianismo seria a religião do “ide” e que soaria estranha a afirmação de que um protestantismo é missionário e outro não. A historiadora do cristianismo Dana L. Robert (2002ROBERT, Dana. Gospel Bearers, Gender Barriers: Missionary Women in the Twentieth Century. New York: Orbis Books, 2002.), por exemplo, afirma que desde o primeiro século os cristãos tomaram para si as supostas palavras de Jesus Cristo e entenderam que o mundo deveria ouvir “a mensagem do evangelho”. Seja através de exemplos (testemunhos), ou através do anúncio da mensagem falada, o cristianismo ganhou o mundo ocidental forjando sua ética, suas leis, suas condutas familiares, seus costumes etc.

Vale pensar, também, que, mesmo estudando um contexto histórico diferente, Frans ­Leonard Schalkwijk (2004SCHALKWIJK, Frans Leonard. Igreja e Estado no Brasil Holandês (1630-1654). São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004.), ao analisar a inserção protestante no Brasil Holandês (1630-1654), corrobora com essas observações por meio de exemplos que apontam para a desconstrução das classificações mais tradicionais do protestantismo. O autor mostra que, naquele recorte do período colonial da História do Brasil, missões protestantes eram abertas entre os indígenas que chegavam, por vezes, a liderar aquelas primeiras comunidades. Esses apontamentos questionam a afirmação de que o protestantismo que se instalou naquele contexto era apenas de invasão, e que os missionários que aqui chegavam não tinham o interesse em abrir campos de evangelização. Ademais, há de se notar que se tratava de uma população diversa, composta por migrantes, invasores, nativos e aqueles que estavam apenas de passagem, fazendo comércio e tratando de assuntos de Estado. Todos professavam a fé protestante e dificilmente poderiam ser agrupados em classificações que reduziriam essa diversidade de casos.

Dessa forma, podemos considerar, então, que binômios como o protestantismo de “missão” e “migração”, associados a outros como “protestantismo histórico” (e, por consequência, o impossível “não histórico”), já vêm sendo questionados pela bibliografia do assunto que prefere pesquisar e analisar os contextos históricos multifatoriais de seus objetos a adotar termos que atribuam apenas às intenções das agências missionárias a responsabilidade pelo resultado das missões. Dito de outra forma, ao assumir essas terminologias, não estaríamos renunciando à própria análise histórica, explicando-a através de uma tipologia que, em detrimento das reações dos missionários aos contextos políticos, sociais e culturais, já definiria as razões das estratégias religiosas adotadas e forjadas no entrelaçamento dos fatores históricos?

Na rota desses questionamentos, podemos pensar que, na primeira metade do século XX, Rafaele Pettazonni desenvolvia os alicerces de uma escola que se definiu a partir de seus contra-argumentos às matrizes teórico-metodológicas hegemônicas para o estudo das religiões (SILVA, 2011aSILVA, Eliane Moura da. História das Religiões: algumas questões teóricas e metodológicas. Campinas: Editora da UNICAMP, 2011a.; MOREIRA, 2016MOREIRA, Harley Abrantes; MOURA, Carlos André Silva de; OLIVEIRA, Gustavo de Souza. História Cultural das Religiões. In: ECCO, Clóvis; QUADROS, Eduardo Gusmão de; SIGNATES, Luiz; SILVA, Rosemary Francisca Neves(orgs.). Religião, saúde e terapias integrativas. Goiânia: Ed. Espaço Acadêmico, 2016. p. 80-99.; AGNOLIN, 2013).AGNOLIN, Adone. História das religiões: perspectiva histórico-comparativa. São Paulo: Paulinas, 2013.Contrapondo-se ao essencialismo dos representantes da fenomenologia, esse grupo, que se tornou conhecido como Escola Italiana de História das Religiões, passava a “diferenciar e determinar as peculiaridades precípuas de cada processo histórico, para entender, também, além das texturas fundamentais comuns, as irrepetíveis soluções criativas concretas, historicamente realizadas” (­MASSENZIO, 2005MASSENZIO, Marcelo. A História das Religiões na cultura moderna. São Paulo: Hedra, 2005., p. 25) e por esse motivo é que os conceitos de protestantismo de “missão” e de “migração” seriam contrários ao próprio raciocínio histórico. Eles se comprometem com algo posto antes da experiência histórica daqueles protestantes: a intenção que teriam antes de migrarem. Toda a experiência histórica ocorrida a partir do desembarque dos religiosos nas colônias seria interpretada enquanto concretização de um conceito, o de “protestantismo de imigração”, antes mesmo da pesquisa historiográfica e da análise dos elementos multifatoriais que costumam fazer parte da experiência histórica.

Ademais, de acordo com nossas fontes documentais, era notória a insatisfação da liderança da igreja, dentro e fora de Moçambique, com a ineficiência evangelística daquelas primeiras comunidades de colonos que, por não multiplicarem novos convertidos, geravam a necessidade de requisitar o apoio dos missionários batistas de outras nações como os Estados Unidos e o Brasil para, finalmente, desenvolverem a missão evangelística compartilhada por toda a rede internacional de igrejas e instituições batistas que abraçava aqueles portugueses.8 8 As visitas de missionários enviados por suas agências a pedido da igreja moçambicana eram constantemente noticiadas pelo periódico da denominação em Moçambique e podem ser exemplificadas pelos casos do missionário Lester Collins e da missionária Mary Peeble, entre tantos outros exemplos de missionários que, durante os 25 anos de existência desse jornal, visitaram Moçambique, enviados por suas agências a convite da Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques. Ver Almeida (1973b, p. 7) e Almeida (1973a, p. 6).

A missão evangelística das igrejas batistas era parte dos genes dessa denominação e se afirmava no intercâmbio que unia suas células em diversas partes do mundo. O funcionamento dessa dinâmica era demonstrado em várias matérias e, a exemplo, no início da década de 1970, através do jornal batista moçambicano, o pastor Luís Rodrigues de Almeida escrevia com entusiasmo sobre a chegada da família do missionário norte-americano Ernest Harvey, casado com Janice T. Harvey e recepcionados no aeroporto da capital sul-africana, Johanesburgo, pela principal liderança batista em Moçambique. Segundo Almeida (1971ALMEIDA, Luís Rodrigues de. Os Harveys. O Batista de Moçambique, mar./abr. 1971., p. 4), há mais de uma década, as relações entre a Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques e a agência missionária do sul dos Estados Unidos eram cultivadas por meio de visitas dos secretários-executivos americanos, com quem a ideia de contar com a colaboração de seus missionários vinha sendo amadurecida.

Assim, indicando a intensa circulação transnacional dos missionários batistas e o engajamento desse grupo na tarefa missionária, em diferentes países, o extinto periódico informava que o casal norte-americano, ao chegar em Johanesburgo para evangelizar em Moçambique, já tinha passado dez anos em exercício de evangelização no Brasil. A metade desse tempo em Belém-PA e a outra em Campinas-SP, onde, segundo o jornal, teriam aprendido a falar “mais ou menos a língua brasileira” (ALMEIDA, 1971ALMEIDA, Luís Rodrigues de. Os Harveys. O Batista de Moçambique, mar./abr. 1971., p. 4).

O missionário que a partir de então passara a morar na África do Sul, em pleno regime de Apartheid, afirmava que seu principal objetivo era o apoio ao trabalho evangelístico em Moçambique, em viagens recíprocas e frequentes, em um circuito cristão, branco e de língua portuguesa. Dessa forma, a atuação entre colonos portugueses naquele país enquanto característica exclusivista e segregacionista da Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques era proselitista e, portanto, não pode ser atribuída a qualquer suposto “protestantismo de migração”, desinteressado pela expansão missionária.

Tal qual os Harveys, outros missionários eram enviados por agências apoiadoras, especialmente do sul dos Estados Unidos, para multiplicar o número de cristãos nas áreas coloniais, fazendo avançar o cristianismo em África. O mesmo jornal indicava que as agências missionárias batistas estavam atentas à presença de comunidades de língua portuguesa em diversos pontos da África austral, para onde estavam dispostas a enviar missionários que dominassem esse idioma para um trabalho exclusivo com esse público9 9 Em matéria de 1973, o jornal informava que, a convite da principal agência missionária batista norte-americana, os irmãos de Lourenço Marques estavam se dirigindo ao Malawi, país vizinho, ao norte, que, a exemplo da Zâmbia, da Rodésia, da Tanzânia, do Quênia, da Uganda e da Etiópia, era alvo de uma “grande” campanha de evangelismo. Segundo o periódico, apesar do esforço missionário, os idiomas locais eram uma barreira, muitas vezes, intransponível e a língua portuguesa era considerada uma porta de acesso a alguns desses países onde, em suas próprias comunidades sociais, viviam os imigrantes portugueses (ALMEIDA, 1973c, p. 6, 8). e indiferente aos negros africanos e seus problemas sociopolíticos que, em tempos de descolonização e independência das nações africanas, eram múltiplos e intensos.

Uma vez que tinham intenções proselitistas, os primeiros cristãos batistas em Moçambique, missionários que eram, não se dirigiram para a colônia portuguesa apenas para oferecer suporte espiritual ou atenção ministerial aos compatriotas da mesma religião por um motivo ainda mais simples: tratava-se de pioneiros. Não havia, segundo as fontes documentais consultadas, batistas de língua portuguesa em Moçambique antes de 1950. Sendo assim, não poderiam aqueles cinco primeiros oferecer o tipo de suporte que caracterizaria um suposto “protestantismo de migração”.

Ademais, no império ultramarino de Salazar, os colonos eram, em sua grande maioria, católicos e, portanto, não podiam ser alvos dessa atenção pastoral protestante. Enquanto “ovelhas de outro curral”, os colonos brancos portugueses eram um importante alvo daquele esforço evangelizador que objetivava conversões ao cristianismo batista. Dessa maneira, eliminando a hipótese de qualquer tipo de protestantismo não missionário, pode-se questionar, ainda, quais suas intenções originárias e se aquele grupo de multiplicadores cristãos visava apenas à conversão exclusiva dos portugueses católicos, ou também considerava alcançar as populações negras? Ou ainda: a evangelização, quase exclusiva, dos colonos portugueses foi uma “fatalidade histórica” ou já era, de fato, parte do planejamento daquela comunidade?

A conversão das populações negras existiu enquanto intenção?

Considerando que pudessem ser os nativos, também, um de seus alvos, poderíamos, então, perguntar: ao decidirem partir para as colônias de Portugal com o intuito de evangelizar e fundar igrejas batistas, tinham aqueles metropolitanos ideia do tipo de vida social que levariam e das possibilidades de se encontrarem, ou não, com as populações locais? É possível supor que a intenção inicial, presente no planejamento do grupo, era a de expandir sua proposta religiosa entre os(as) negros(as) africanos(as) e que, se isso não ocorreu, a razão não foi a ausência do desejo, mas as condições da sociedade colonial impostas àqueles missionários portugueses? Teriam sido eles surpreendidos pelas segregações do período colonial em Moçambique?

É possível, sim, ponderar que há razões para supor que os iniciadores da história batista na colônia, ao deixarem a metrópole, em 1950, rumo àquela porção da “África portuguesa”, pouco soubessem a respeito da vida social que levariam no além-mar. Pesquisas em arquivos oficiais têm sustentado que a censura durante o regime do Estado Novo foi impactante, ampla, abrangente e eficiente. Na imprensa que atuava no território europeu do Império Português, uma diversidade de assuntos era censurada, o que, se não impedia, seguramente restringia em larga medida as informações que aqueles portugueses possuíam acerca das colônias africanas para onde se transferiam. Entre esses assuntos, destacavam-se as proibições preventivas e interdições de matérias jornalísticas que pudessem levantar a suspeita de existência de racismo nas posses portuguesas.

Além desse tema, estavam vetados pelos órgãos de censura do Estado Novo os textos e as imagens que pudessem alertar para o custo de vida ou abordar problemas quanto “à integração social e racial; ao nativismo, à descentralização e autodeterminação; à liberdade de expressão e eleições; à democracia e ao comunismo; ao pacifismo e às guerras” (MELO, 2016MELO, Daniel. A censura salazarista e as colónias: um exemplo de abrangência. Revista da história da sociedade e da cultura, Coimbra, v. 16, p. 475-496, 2016. Disponível em: Disponível em: https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/40971/1/A%20censura%20salazarista%20e%20as%20colonias.pdf?ln=pt-pt . Acesso em:24 out. 2016.
https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10...
, p. 482).

A restrição das informações, sem dúvida, dificultava o conhecimento do tipo de vida social que poderia embaraçar os planos missionários daqueles pioneiros, caso tivessem como objetivo a conversão das populações negras locais. Essa hipotética intenção, entretanto, não encontra respaldo na documentação do periódico, que ignorava a existência dos(as) negros(as) africanos(as), sobre quem silenciava-se através das fotografias e dos textos daquele período que desconsideravam tais populações.

Em suas duas primeiras décadas, o jornal O Batista de Moçambique limitou-se a informar sobre o plano cooperativo internacional das igrejas batistas, as assembleias administrativas do grupo, os relatos de missionários (na maioria das vezes, norte-americanos) em outros países ou colônias africanas, além de articulações para o financiamento de campanhas missionárias entre outros temas que contemplassem aquelas primeiras igrejas. A partir desse veículo de comunicação, de seus textos e fotografias, nota-se a expansão de um grupo que iniciou com cinco fundadores, em 1950, e se multiplicou durante as décadas seguintes sem, no entanto, alterar uma de suas características mais notáveis: a grande supremacia numérica branca (MOREIRA, 2019MOREIRA, Harley Abrantes. “Onde há desespero, a esperança é importante”? Uma história da expansão do cristianismo batista em Moçambique (1950-1992). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

Foi no interior do segmento social composto pelos colonos portugueses que esse grupo religioso agiu durante um período que durou até 1971, ano em que um grupo de missionárias(os) brasileiras(os) chegou em Moçambique para contribuir com aquele projeto. Participante desse grupo, Valnice Milhomens, que atuou em Moçambique entre 1971 e 1984, e pertencia à Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques na época em que apenas portugueses brancos compunham o quadro de membros batizados, recorda, em entrevista cedida ao Programa de televisão Vejam Só, o impacto de sua chegada. Valnice lembra, mais de quatro décadas depois, que se sentiu chocada com esta realidade, destacando o contexto de seu encontro com uma igreja “africana” que poderia muito bem ser mais uma das comunidades lisboetas localizadas na porção ocidental de Portugal. No vídeo, a ex-missionária e, agora, “apóstola”, afirma: “eu chego na igreja e só vejo brancos, só vejo portugueses. Eu fui hospedada na casa de portugueses onde o negro não podia subir pela escada da frente” (MILHOMENS, 2016MILHOMENS, Valnice. Vejam só! Entrevista com a pastora Valnice Milhomens. 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=wikmZM6D0Cw . Acesso em: 25 jan. 2018.
http://www.youtube.com/watch?v=wikmZM6D0...
).

Exibida em 2016, em um programa evangélico de televisão, essa era parte de uma entrevista que tinha como intuito apresentar ao telespectador uma reflexão sobre a ideia de apostolado, convidando, para isso, aquela que havia sido a primeira missionária batista em África e que, distante 45 anos do início daquela experiência, construía, diante das câmeras, suas narrativas sobre um passado que, agora, legitima sua atividade religiosa e seus títulos para os telespectadores de seu presente.

De acordo com seu relato, pode-se perceber que no âmbito da igreja, o racismo que estruturava aquela sociedade colonial (MATTOS, 2006MATOS, Alderi Souza de. Erasmo Braga, o protestantismo e a sociedade brasileira: perspectivas sobre a missão da igreja. São Paulo: Cultura Cristã, 2008.) era o mesmo que regia as relações no interior das igrejas, suas práticas culturais e suas estratégias missionárias. Apenas nos anos seguintes é que essa realidade eclesiástica se alterou e o hall de membros tornou-se, paulatinamente, mais representado pelas populações locais que, nos últimos quatro anos do regime colonial, tornaram-se prioritárias para os brasileiros que decidiram enfrentar um dos maiores obstáculos responsáveis pelo afastamento entre os primeiros batistas de língua portuguesa e os povos africanos de Moçambique: a diversidade linguística da região.

De acordo com Gregório Firmino essas línguas autóctones são, ainda hoje, numerosas e as mais faladas em Moçambique. O censo demográfico de 1997 aponta que elas continuam sendo faladas por 93% da população, dos quais, 90% as utilizam diariamente como primordial opção de comunicação em um país onde apenas 6,5% da população tem como língua materna o português (FIRMINO, 2008FIRMINO, Gregório. A situação do português no contexto multilíngue de Moçambique. In: SIMELP I. Anais...São Paulo. Universidade de São Paulo, 2008. p. 1-33 (Anais eletrônicos).; THOMAZ, 2006THOMAZ, Omar Ribeiro. Raça, nação e status: histórias de guerras e relações raciais em Moçambique. Revista USP, São Paulo, n. 68, p. 252-269, 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/13496 . Acesso em: 20 out. 2020.
http://www.revistas.usp.br/revusp/articl...
).

Apesar da única raiz bantu, são múltiplos os vernáculos em constante reelaboração. Interagem com a influência linguística de outros idiomas e ocupam eminente papel na formação do enorme mosaico cultural moçambicano, constituindo fatores de agregação e de apartamento entre as diversas populações de Moçambique, incluindo os colonos e missionários portugueses que não abriam mão da língua portuguesa para sua comunicação escrita e oral.

Somente após a mudança de hábitos e estratégias inauguradas pelo grupo de brasileiras(os) é que, junto ao esforço por aprender as línguas locais, a conversão de moçambicanos passou a cooperar com a utilização de tradutores, o que influenciou diretamente nas transformações numéricas e de representação racial observadas a partir da década de 1970, através de populações nativas que responderam às iniciativas com algumas dezenas ou centenas de conversões, comentadas e demonstradas por meio das imagens publicadas pelo jornal confessional.

Figura 1:
ALMEIDA, Luís Rodrigues de. O povo de Maxaquene ouvindo com atenção o orador. O Batista de Moçambique, set./dez. 1973c, p. 4. Altura: 6,21; Largura: 9,54

A imagem acima, publicada por uma mídia confessional interessada em divulgar resultados positivos e convencer os apoiadores da necessidade e viabilidade das missões, longe de se resumir em provas definitivas, somam evidências10 10 A respeito do valor e das limitações das fotografias, tomadas como provas, irrefutáveis ou não, pelo historiador, ver Carvalho e Lima (2009, p. 29-60) e Ginzburg (2014, p. 311-338). de que a experiência batista em seus primeiros 25 anos em Moçambique não pode se representar pelo conceito de “protestantismo de migração” e, apesar do forte caráter segregacionista e exclusivista, aquele projeto-piloto foi, sim, uma experiência missionária e, mesmo que visasse atingir as populações negras, enfrentaria, além de todos os obstáculos analisados, a própria distância física que também caracterizava aquele tipo de “apartheid”.

Tal distanciamento se explica através do processo histórico de formação das principais cidades moçambicanas, que é singular e pode ser representado por uma oposição entre dois modelos urbanos radicalmente distintos: a “cidade de cimento” e o “caniço”. A primeira corresponde ao fruto do investimento colonial materializado no planejamento urbano, marcado por largas avenidas, prédios e instalações modernas que atendiam às demandas dos colonos e assimilados, os quais desfrutavam, de maneira comercial e residencial, aquela malha urbana considerada um “canto da Europa em África” (CASTELO, 2011CASTELO, Claudia. Uma incursão no luso-tropicalismo de Gilberto Freyre.Blogue de História Lusófona, Lisboa, ano 6, 2011. Disponível emDisponível emhttp://www2.iict.pt/archive/doc/bHL_Ano_VI_16_Claudia_Castelo__Uma_incursao_no_lusotropicalismo.pdf . Acesso em: 3 mar. 2015.
http://www2.iict.pt/archive/doc/bHL_Ano_...
). A segunda, era fruto de fatores como o processo de industrialização que atraiu grandes populações autóctones para esses centros urbanos, povos que, lá chegando, se estabeleciam, com suas ancestralidades e culturas “tradicionais”, nas redondezas dessas cidades de cimento, consolidando, nessas franjas, habitações espontâneas construídas, geralmente, com mato, madeira e caniço. Práticas culturais, modos de morar e viver também constituíam as grandes diferenças entre esses dois espaços (FERNANDES; MENDES, 2012FERNANDES, Mário G; MENDES, Rui. ‘Dicotomias’ urbanas em Moçambique: cidades de cimento e de caniço. Porto: Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2012.).

A capital da colônia, onde situava-se a Primeira Igreja Batista de Moçambique, representava muito bem essa dicotomia entre as chamadas “cidade do cimento” e o ambiente caótico e improvisado dos “caniços” (PENVENNE, 2012PENVENNE, Jeanne Marie. Fotografando Lourenço Marques: a cidade e os seus habitantes de 1960-1975. In: CASTELO, C.; NASCIMENTO, S.; SILVA, T. C.; THOMAZ, O. R. (orgs.). Os outros da colonização: ensaios sobre o colonialismo tardio. Lisboa: ICS - Imprensa de Ciências Sociais, 2012. p. 153-177.). Os negros africanos, normalmente, não tomavam parte do cotidiano vivenciado na malha urbana portuguesa, permanecendo circunscritos às zonas afastadas chamadas de caniços. Encontrá-los implicava um esforço de deslocamento e desprendimento que os batistas portugueses não estavam dispostos a pagar. O encontro com essas populações só foi possível a partir de 1971, quando o grupo de missionárias(os) brasileiras(os) desembarcou em Lourenço Marques e inaugurou, paulatinamente, trabalhos missionários nas regiões consideradas mais remotas (MOREIRA, 2019MOREIRA, Harley Abrantes. “Onde há desespero, a esperança é importante”? Uma história da expansão do cristianismo batista em Moçambique (1950-1992). Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

Considerações finais

Conforme destacamos ao longo do texto, o início do trabalho de evangelização e estabelecimento do cristianismo batista de língua portuguesa em Moçambique, em sua primeira fase realizado em período colonial, foi conduzido por portugueses brancos, que priorizaram seus semelhantes como alvo de suas ações. Assim, aquela proposta religiosa seguia avançando pelo mundo, sem, no entanto, penetrar nos mundos africanos que compunham aquela colônia de grande maioria negra, onde uma minoria europeia conservava a distância simbólica e física que lhe favorecia dentro daquela ordem social. Neste artigo, tentamos demonstrar que o afastamento entre a primeira igreja desse grupo e as diversas populações africanas da colônia foi a principal característica desse período, e as explicações para esse fato não passam por uma suposta natureza não missionária de suas células representativas.

Essa interpretação sugerida sempre que se utiliza os conceitos de “protestantismo de migração”, antagônico ao “protestantismo de missão”, foi evitada por razões teórico-metodológicas. Assumir essas terminologias aproxima as análises acadêmicas de experiências históricas protestantes do essencialismo da escola fenomenológica contra a qual se opuseram os historiadores que fundaram a chamada Escola Italiana de História das Religiões. A concepção que entendia as religiões como inatas ao ser humano, elaborada pelos fenomenologistas da passagem do século XIX para o XX, terminou por afastá-los da história “para recuperar uma significação universal, com o objetivo final de alcançar uma pressuposta essência da religião” (MASSENZIO, 2005MASSENZIO, Marcelo. A História das Religiões na cultura moderna. São Paulo: Hedra, 2005.) presente em todas as culturas e épocas.

Dessa forma, antes mesmo da pesquisa histórica, assumia-se essa essência universal da religião como um dado da realidade em uma antecipação semelhante à provocada pelos conceitos de “protestantismo de missão” e “protestantismo de migração”, que também se antecipam à pesquisa historiográfica para assumir a existência de dois tipos distintos de presença protestante. Em nosso texto, tentamos discutir a historicidade da história batista em Moçambique, analisando fatores históricos de cunho social, político, cultural e inter-racial para conhecer os motivos que explicam a preferência dos missionários portugueses pela evangelização de seus compatriotas, em detrimento das preteridas populações locais.

Conforme mostramos ao longo do texto, as razões históricas que explicam essa característica das primeiras décadas de presença batista portuguesa em Moçambique estavam associadas à: hegemonia católica simbolizada pela concordata com o governo português, o que terminou por gerar uma estratégia missionária mais tímida e restrita aos colonos, garantindo, assim, a anuência do estado colonial para com as atividades daquele grupo religioso; diversidade linguística de uma população negra subdividida em diversas etnias e idiomas; organização urbanística de cidades como Lourenço Marques, que afastava os portugueses das populações nativas e demonstrava a existência de uma organização social racista e racial.

Entre as causas da evangelização apenas de portugueses, portanto, não se encontra uma suposta natureza de “protestantismo de migração”, basicamente pelas seguintes razões: a rede de instituições batistas dentro da qual aqueles pioneiros se encontravam era missionária; a própria comunidade de Lourenço Marques requisitava missionários a agências norte-americanas, portuguesas e brasileiras; ademais, pontuamos que a grande maioria da população portuguesa em Moçambique era católica e, portanto, aquela primeira igreja batista jamais consistiria em uma experiência de “protestantismo de migração”, uma vez que essa tipologia se caracteriza pelo cuidado e assistência pastoral a pessoas da mesma religião e, segundo nossas fontes documentais, não havia batistas falantes da língua portuguesa antes da fundação da Primeira Igreja Batista de Moçambique.

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  • ZEFANIAS, Tomás. História dos batistas de Moçambique s/ed. Beira, 2008.
  • 1
    Tratava-se de cinco missionários com formação teológica nas instituições batistas portuguesas: pastor Luís Rodrigues de Almeida, recém-casado com Maria de José Pato de Almeida, António Rodrigues Tapada, Alexandre dos Santos Faia e Maria Amélia de Sousa. Fundaram a Primeira Igreja Baptista de Lourenço Marques em 5 de março de 1950 (ZEFANIAS, 2008).
  • 2
    A obra mencionada trata-se de um esforço da liderança batista moçambicana, preocupada em construir um registro historiográfico da expansão do grupo em Moçambique. Produzido em 2008 pelo pastor moçambicano Tomás Zefanias, teve o objetivo de funcionar como bibliografia dos cursos do Seminário Teológico Batista da Beira (capital da província de Sofala). A obra rara aparecerá nas referências bibliográficas deste artigo sem editora, uma vez que é uma produção autônoma do autor e do conjunto de colaboradores com os quais contou para a efetivação do projeto. O livro, atualmente, pode ser encontrado apenas nos acervos pessoais de algumas lideranças autóctones desse grupo religioso e nos anexos da tese doutoral de autoria de Harley Abrantes Moreira (2019).
  • 3
    Autores como José Luís Cabaço (2010) afirmam que as denominações protestantes foram reprimidas, mencionando Dom Teodósio Clemente de Gouveia, cardeal arcebispo de Lourenço Marques na década de 1950, como o autor de pronunciamentos intimidatórios contra essas igrejas que, junto às hierarquias islâmicas, eram alvos das políticas repressoras do clero e do Estado português. Tais ações não se limitavam aos discursos oficiais, mas, segundo o autor, consistiam de destruições de bíblias, pressões físicas e psicológicas perpetradas contra as crianças e seus pais frequentadores dessas missões, além de intempestivas obstruções de cultos através da entrada de padres durante suas celebrações impedindo seus prosseguimentos.
  • 4
    Em 1930, as igrejas batistas filiadas à Convenção Batista Brasileira alcançaram a marca de 40.500 membros. Nesse sentido, calcula-se que a tiragem d’O Jornal Batista chegava a 13.500 exemplares semanais (FEITOSA, 1978).
  • 5
    Era comum os missionários tornarem público suas ações através de periódicos, principalmente mostrando o suposto sucesso naquilo que estavam desenvolvendo. Todas as denominações que desenvolviam trabalhos de evangelização nesse período usavam dessa estratégia (SOUZA, 2007).
  • 6
    A respeito do acanhado crescimento numérico desse grupo no período colonial em Moçambique, ver Moreira (2019).
  • 7
    Sobre o termo “protestantismo histórico”, um primeiro problema seria a resultante distinção entre aqueles que são e os que não são históricos. Ao problematizar esse tipo de classificação, Lyndon de Araújo Santos (2004) afirma que é necessário entender o processo histórico de inserção do protestantismo no Brasil para compreender que essa tipologia trata das alteridades entre os subgrupos protestantes e das suas disputas internas. Os defensores dessa corrente - protestantismo histórico - excluem desse grupo igrejas pentecostais e neopentecostais, colocando-as como correntes distintas e mostrando-as, muitas vezes, como denominações inferiores àquelas consideradas históricas. Como o protestantismo é uma corrente plural do cristianismo, que se caracteriza pelo seu sectarismo e, nesse caso, pela desconstrução do discurso do outro, afirmar pertencer à corrente dos históricos é pôr os demais em uma escala inferior de evangélicos que não fazem parte dessa suposta elite, a qual se afirma mais racional e mais próxima dos reformadores do século XVI.
  • 8
    As visitas de missionários enviados por suas agências a pedido da igreja moçambicana eram constantemente noticiadas pelo periódico da denominação em Moçambique e podem ser exemplificadas pelos casos do missionário Lester Collins e da missionária Mary Peeble, entre tantos outros exemplos de missionários que, durante os 25 anos de existência desse jornal, visitaram Moçambique, enviados por suas agências a convite da Primeira Igreja Batista de Lourenço Marques. Ver Almeida (1973b, p. 7) e Almeida (1973a, p. 6).
  • 9
    Em matéria de 1973, o jornal informava que, a convite da principal agência missionária batista norte-americana, os irmãos de Lourenço Marques estavam se dirigindo ao Malawi, país vizinho, ao norte, que, a exemplo da Zâmbia, da Rodésia, da Tanzânia, do Quênia, da Uganda e da Etiópia, era alvo de uma “grande” campanha de evangelismo. Segundo o periódico, apesar do esforço missionário, os idiomas locais eram uma barreira, muitas vezes, intransponível e a língua portuguesa era considerada uma porta de acesso a alguns desses países onde, em suas próprias comunidades sociais, viviam os imigrantes portugueses (ALMEIDA, 1973c, p. 6, 8).
  • 10
    A respeito do valor e das limitações das fotografias, tomadas como provas, irrefutáveis ou não, pelo historiador, ver Carvalho e Lima (2009, p. 29-60) e Ginzburg (2014, p. 311-338).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2020
  • Aceito
    25 Jun 2021
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