Resumos
Num mundo marcado pela violência e pela desintegração de valores, a palavra ainda pode servir de elemento para a constituição ética do indivíduo, em termos de autoconhecimento e de percepção do outro? Esta é a questão considerada no texto, a partir do comentário de alguns aspectos do filme O carteiro e o poeta.
palavra; valor; conhecimento; resistência; O carteiro e o poeta
In a world marked by violence and axiological dissolution, can Word still be good for the individual ethic constitution, as self-knowledge and knowledge of another? This is the question considered by this paper, in which we comment some views of the film Il postino.
word; value; knowledge; resistance; Il postino
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Aula inaugural do Departamento de Filosofia, proferida em 29/2/96.
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"A responsabilidade social do poeta se dá, antes de tudo, em relação à sua língua. Ao exprimir o que outras pessoas sentem, também ele está modificando seu sentimento ao torná-lo mais consciente. Ele está tornando as pessoas mais conscientes daquilo que já sentem e, por conseguinte, ensinando-lhes algo sobre si próprias" (Lima, 1995, p. 85).
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Benedito Nunes aponta de forma exemplar esta tendência na obra de Clarice Lispector. Na tentativa de transcender a esfera pessoal e atingir um universo que transborde a subjetividade, a narração exacerba a expressão da reflexividade, criando o equívoco de um Eu que se nomeia a partir de um lugar exterior a ele mesmo, de alguma maneira duplicando a flexão indicadora do si-mesmo. "Mas para quem narrar é sempre narrar-se, essa palavra mínima de uma única letra (é), submete-se ao regime reflexivo do si mesmo, indicando, em vez da apropriação subjetiva, a pertença ao âmago impessoal que transborda do pessoal". O texto comentado por B. Nunes inicia-se com a expressão "Sou-me" (Nunes, 1989NUNES, Benedito. (1989) O drama da linguagem - uma leitura de Clarice Lispector. São Paulo, Ática., p. 158).
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Ainda aqui a análise que B. Nunes faz da obra de Clarice Lispector ilumina o problema geral da dimensão ético-existencial da palavra. "Na concepção do mundo de Clarice Lispector, a liberdade é uma potência negativa. Nostalgia de Deus como nostalgia de nós mesmos, impele-nos, através do desejo de ser que se requeima na paixão da existência, na direção deste outro, a nós oposto tanto nas coisas quanto no desdobramento do eu desagregado, e que também somos nós. [...]. A esta mesma perspectiva se ajusta a acepção equívoca da própria idéia de existência na obra de Clarice Lispector, ora atribuída à realidade irredutível, mas insuficiente, do sujeito humano, ora à realidade auto-suficiente, mas não humana, do ser [...]. Mas a equivicidade da idéia acompanha [...] o descentramento do sujeito, a perda de sua autonomia substancial, de sua identidade espiritual" (Nunes, 1989, p. 127).
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"Re(cor)dar a natureza é, etimologicamente, repô-la no coração do homem [...]" (Bosi, 1977BOSI, Alfredo. (1977) O ser e o tempo da poesia. São Paulo, Cultrix/Edusp., p. 154).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- ARISTÓTELES. (1944) Arte retórica. I e II. Paris, Éditions Voilquin et Capelle. Paris, Garnier.
- BOSI, Alfredo. (1977) O ser e o tempo da poesia. São Paulo, Cultrix/Edusp.
- LIMA, Waldecy Tenório de. (1955) A bailarina andaluza - A lucidez, a esperança e o sagrado na poesia de João Cabral São Paulo. Tese (Doutorado). Departamento de Filosofia, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
- NUNES, Benedito. (1989) O drama da linguagem - uma leitura de Clarice Lispector São Paulo, Ática.
- RICOEUR, Paul. (1995) Violência e linguagem. In: ______. Leituras 1 - em torno ao político São Paulo, Loyola.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
July-Dec 1996
Histórico
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Recebido
Jul 1996