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O jardim secreto Notas sobre Bataille e Foucault

The secret garden. Notes about Bataille and Foucault

Resumos

Em diversas ocasiões, Michel Foucault declarou afinidades com o pensamento de Georges Bataille, chegando a apresentar-se como seu discípulo. Essa filiação pode ser reconhecida na intensidade com que ambos se empenharam em desconstruir a idéia moderna de razão, consolidada em torno das noções de saber e verdade. Contudo, uma aproximação mais rigorosa entre os dois pensadores nos coloca diante de diferenças significativas, que supõem distintos fundamentos críticos. A arquitetura pode ser um locus privilegiado para analisarmos tais diferenças. Foucault vê os edifícios por dentro; Bataille os vê de fora. Isso traz resultados diversos: se para o autor de A microfísica do poder esboça-se um espaço sem saída, para o pensador de A experiência interior abre-se a possibilidade de conceber "jardins secretos", em contraposição aos monumentos ameaçadores. Insinuam-se aí, também, diferentes leitores de Nietszche.

Foucault; Bataille; espaço; razão; saber; verdade


On several occasions, Michel Foucault expressed his affinity with the thinking of Georges Bataille, even going so far as to present himself as the latter's disciple. Such filiation can indeed be perceived in the intensity with which both scholars engaged themselves in deconstructing the modern notion of reason, as anchored to the notions of knowledge and truth. A stricter approximation of the two thinkers, however, places us before significant differences, which indicate differing critical fundaments. Architecture suggests itself as a privileged locus for engaging on an analysis of such differences. Foucault observes buildings from within; Bataille sees them from the outside. This brings about distinct results: if, for the creator of The microphysics of power, a cul de sac is etched, for the author of The inner experience the possibility of conceiving 'secret gardens' offers itself, in contraposition to the threatening monuments. This, in turn, hints at different readers of Nietszche.

Foucault; Bataille; knowledge; truth; reason; space


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  • 1
    As passagens entre aspas são citações de Nietzsche em Gaia ciência e Humano demasiado humano.
  • 2
    "Eu não me dirijo aos filósofos"; "só posso dirigir-me à exasperação" - sublinha Bataille (1973a, p. 194)______. (1973a) Méthode de méditation. In: ______. Oeuvres complètes. Tomo V. Paris, Gallimard..
  • 3
    Sobre a leitura de Bataille, Jürgen Habermas afirma: "o escritor erótico pode empregar a linguagem de tal modo que o leitor, assediado pela obscenidade, arrebatado pelo choque do inesperado e inrepresentável, seja lançado na ambivalência da náusea e do prazer" (1990, p. 224).
  • 4
    Ver, nesse sentido, o comentário de Georges Bataille à conferência "Confradías, órdenes, sociedades secretas, iglesias" de Roger Caillois (1982, p. 174-187).
  • 5
    Deleuze termina o livro numa alusão à "glândula pineal", um tema batailliano por excelência, que aparece em diversas obras suas, especialmente em L'anus solaire. Poderíamos tomar a passagem como uma tentativa de aproximação?
  • 6
    Michel Surya propõe, a respeito de Bataille, a expressão "maneira" para substituir "método" (cf. 1994, p. 15).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • BATAILLE, Georges. (1970) Architecture. In: ______. Oeuvres complètes Tomo I. Paris, Gallimard.
  • ______. (1973a) Méthode de méditation. In: ______. Oeuvres complètes Tomo V. Paris, Gallimard.
  • ______. (1973b) L'expérience intérieure. In: ______. Oeuvres complètes Tomo V. Paris, Gallimard.
  • ______. (1976) Théorie de la religion. In: ______. Oeuvres complètes Tomo VII. Paris, Gallimard.
  • ______. (1981) Prefácio a Madame Edwarda In: ______. História do olho Tradução de Glória Correia Ramos. São Paulo, Escrita.
  • ______. (1982) Comentário à conferência de Roger Callois (Confradías, órdenes, sociedades secretas, iglesias). In: HOLLIER, Denis (ed.). El colegio de sociología Tradução de Mauro Armiño. Madri, Taurus.
  • ______. (1987) L'érotisme. In: ______. Oeuvres complètes Tomo X. Paris, Gallimard.
  • BLANCHOT, Maurice. (1969) L'entretien infini Paris, Gallimard.
  • DELEUZE, Gilles. (1988) Foucault Tradução de Claudia Sant'Anna Martins. São Paulo, Brasiliense.
  • FOUCAULT, Michel. (1970) Apresentação. In: BATAILLE, Georges. Oeuvres complètes Tomo I. Paris, Gallimard.
  • ______. (1975) Surveiller et punir: Naissance de la prison Paris, Gallimard.
  • ______. (1980) História da sexualidade I - A vontade de saber Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro, Graal.
  • ______. (1982) Microfísica do poder Tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro, Graal.
  • ______. (1992) Préface à la transgression. Critique - Hommage à Georges Bataille, nº 195-196, agosto-setembro 1963. Apud SURYA, Michel. Georges Bataille, la mort à l'oeuvre Paris, Gallimard.
  • HABERMAS, J. (1990) O discurso filosófico da modernidade Tradução de Manuel José Simões Loureiro. Lisboa, Dom Quixote.
  • RIBEIRO, Renato Janine. (1985) O discurso diferente. In: ______. Recordar Foucault São Paulo, Brasiliense.
  • SURYA, Michel. (1994) O coice do burro. In: BATAILLE, Georges. A mutilação sacrificial e a orelha cortada de Van Gogh Apresentação. Tradução de Carlos Valente. Lisboa, Hiena.
  • NIETZSCHE, Friedrich. (1987) A genealogia da moral Tradução de Paulo César Souza. São Paulo, Brasiliense.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Dec 1995

Histórico

  • Recebido
    Maio 1995
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