Acessibilidade / Reportar erro

A ordem carnavalesca

The Carnival order

Resumos

A autora estuda as manifestações carnavalescas nas cidades de Tatuí, Piracicaba e São João del Rei. Baseando-se nas observações das formas pelas quais o Carnaval é celebrado nos bailes e nas ruas, questionam-se as interpretações que concebem o Carnaval como um lugar aonde as normas às quais os cidadãos se adaptam cotidianamente parecem abolidas. Pelo contrário, a pesquisa mostra que a estrutura social permanece durante estas festas, o que pode ser notado pela separação entre espectadores e foliões nas ruas, e na presença dos diferentes grupos sociais, cada um em seu respectivo bloco carnavalesco. Estes fatos apontam que as origens sócio-econômicas das pessoas se mantém e se reproduzem durante o Carnaval.

Carnaval; ordem; estrutura social; cotidiano


The author studies the Carnival shows in the cities Tatuí, Piracicaba and São João Del Rei. Based on the observation of the ways by which Carnival is celebrated at the parties and in the streets of these cities, she questions usual interpretations that conceive Carnaval as a situation in which all the norms citizens usually adapt themselves to seem to be abolished. On the contrary, the research shows that the daily social structure lasts during this feast, a fact that can be realized by noticing the separation of the coarse jesters and spectators, the presence of different social groups at the parties and in the various Carnival "blocs" [groups of people who dance together in the festive procession]. These facts point out that the persons' socio-economic origins are carried on during the Carnival days.

Carnival; order; social structure; everyday life


Texto completo disponível em PDF.

  • 1
    O Carnaval do Rio de Janeiro foi recentemente estudado pela autora (1992) em Carnaval brasileiro: o vivido e o mito, também publicado em francês sob o título Carnaval brésilien: le vécu et le mythe.
  • 2
    Tatuí é cidade de mais ou menos 45.000 habitantes, que se orgulha por possuir afamada Escola de Música. São João del Rey, de 54.000 habitantes, foi importante no séc. XVIII devido às minas de ouro; hoje conhece uma revivescência graças a minas de cassiterita e manganês. Piracicaba, com 180.000 habitantes, tem indústrias metalúrgicas e siderúrgicas, mas também se destaca pela agricultura e pelas importantes usinas de açúcar.
  • 3
    Câmara Cascudo se detém principalmente na descrição dos blocos (ver 1962, 1º vol., p. 115 e 240; 2º vol., p. 648-649).
  • 4
    Ver também Von Simson, 1984VON SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes. (1984) A burguesia se diverte no reinado de momo (60 anos de evolução do carnaval na cidade de São Paulo). São Paulo, 283 p. Tese de Mestrado. FFLCH, Universidade de São Paulo.; Rodrigues, 1984RODRIGUES, Ana Maria. (1984) Samba negro, espoliação branca. São Paulo, Hucitec.; Von Simson, 1989______ . (1989) Brancos e negros no carnaval popular paulistano. São Paulo, 246 p. Tese de Doutorado, FFLCH, Universidade de São Paulo..
  • 5
    O destaque - a palavra significa quem sobressai, é sempre uma pessoa conhecida, de renome, de prestígio, convidada para desfilar em posição que chame a atenção - ou num espaço vazio, ou no alto de um carro alegórico. O passista, homem ou mulher, distingue-se porque inventa passos extraordinários em seu bailado e vem sempre num espaço livre para poder executá-los sem problemas e ser bem apreciado.
  • 6
    A Comissão de Frente é um elemento tradicional dos cortejos carnavalescos, desde meados do séc. XIX, quando estes eram organizados pelas grandes fortunas das cidades; era então a cavalo que vinham os maiorais, com suas cartolas na mão, pedindo ao povo que abrisse caminho para eles passarem com os grupos ricamente trajados (ver Pereira De Queiroz, 1992PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. (1978) Evolution du carnaval latino américain.Diogène. Paris, nº 104, octobre-decembre., p. 51-56).
  • 7
    Na segunda metade do séc. XIX, havia também enormes desfiles de carnaval nas ruas das maiores cidades brasileiras; eram organizados pelos grandes comerciantes, grandes proprietários rurais, pelos jornais importantes e atraíam uma quantidade de espectadores entusiasmados (Eneida, 1958ENEIDA. (1958) História do carnaval carioca. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira Ed.; Von Simson, 1984VON SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes. (1984) A burguesia se diverte no reinado de momo (60 anos de evolução do carnaval na cidade de São Paulo). São Paulo, 283 p. Tese de Mestrado. FFLCH, Universidade de São Paulo.; Pereira De Queiroz, 1992PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. (1978) Evolution du carnaval latino américain.Diogène. Paris, nº 104, octobre-decembre.).
  • 8
    A família do grande político Tancredo Neves é originária de São João del Rei; no ano em que foi feita a análise da festa, 1981, tive ocasião de verificar que toda a família se instalara no seu belo casarão a partir do Sábado Gordo, preparando-se para desfilar no Cordão Encarnado. Eleito presidente da República no ano seguinte, no primeiro pleito realizado após uma ditadura militar que durara perto de 20 anos, Tancredo Neves, doente, faleceu antes de tomar posse. No ano seguinte, sua família e alguns políticos pretenderam que ali não seria mais realizada a festa, em homenagem ao morto; encontraram grande resistência da parte dos habitantes e a realização continuou a ser feita.
  • 9
    Bumba-meu-boi - uma das "danças dramáticas" realizadas pelas mais variadas regiões do Brasil, com nomes diversos, muito querida pelo povo; é de origem ibérica (Cascudo, 1962CÂMARA CASCUDO, Luiz da. (1962) Dicionário do folclore brasileiro. 2ª ed.revista e aumentada, 2 vols. Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro/Ministério da Educação e Cultura., vol. I, p. 140-145).
  • 10
    No Rio de Janeiro, as escolas de samba, nascidas nessa cidade, surgiram em 1928, mas só se firmaram como representantes válidas do Carnaval de rua em fins da década de 1930. Porém somente a partir dos anos 50 foram consideradas parte integrante e importante dos festejos de Momo (ver Goldwasser, 1975GOLDWASSER, Maria Julia. (1975) O palácio do samba (estudo antropológico da escola de samba estação primeira de mangueira). Rio de Janeiro, Zahar Ed.; Leopoldi, 1978LEOPOLDI, José Savio. (1978) Escola de samba, ritual e sociedade. Petrópolis, Ed. Vozes.; Rodrigues, 1984RODRIGUES, Ana Maria. (1984) Samba negro, espoliação branca. São Paulo, Hucitec.; Pereira De Queiroz, 1992PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. (1978) Evolution du carnaval latino américain.Diogène. Paris, nº 104, octobre-decembre.).
  • 11
    Ver Mesnil (1974)MESNIL, Marianne. (1974) Le lieu et le temps de la fête carnavalesque - trois essais sur la fête du folklore a l'ethno-sémiotique. Cahiers d'études de sociologie culturelle. Bruxelles, Ed. de l'Université de Bruxelles.; Boiteux (1977)BOITEUX, M. (1977) Formes de la fête. Annales, économies, sociétés, civilisations. Paris, An XXXII, nº 2, mars-avril.; Bonnain (1977)BONNAIN, R. & MOERDYK, D. (1977) À propos du charivari: discours bourgeois et coutumes populaires. Annales, économies, sociétés, civilisations. Paris, An. XXXII, nº 2, mars-avril.; Faure (1978)FAURE, Alain. (1978) Paris, carême prenant: du carnaval à Paris au XIXe siècle (1880-1914). Paris, Librairie Hachette Ed. e Le Roy Ladurie (1979)LE ROY LADURIE, Emmanuel. (1979) Le carnaval de romans. Paris, Gallimard..
  • 12
    Ver também Von Simson (1984)VON SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes. (1984) A burguesia se diverte no reinado de momo (60 anos de evolução do carnaval na cidade de São Paulo). São Paulo, 283 p. Tese de Mestrado. FFLCH, Universidade de São Paulo.; Rodrigues (1984)RODRIGUES, Ana Maria. (1984) Samba negro, espoliação branca. São Paulo, Hucitec. e Von Simson (1989)VON SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes. (1984) A burguesia se diverte no reinado de momo (60 anos de evolução do carnaval na cidade de São Paulo). São Paulo, 283 p. Tese de Mestrado. FFLCH, Universidade de São Paulo..
  • 13
    O Carnaval da cidade de Salvador, capital da Bahia, merece ser estudado devido a ter evoluído de maneira diversa, a partir de um início semelhante ao do Carnaval de todo o Brasil. No entanto, ali também são conservados os sinais específicos das classes sociais durante a festa e a fantasia dos integrantes de um bloco é o sinal que imediatamente o situa no grupo a que pertence e na camada social que é a sua; pois cada bloco se enquadra numa camada social, ou então sócio-profissional (Pereira De Queiroz, 1978PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. (1978) Evolution du carnaval latino américain.Diogène. Paris, nº 104, octobre-decembre.; Roxo Nobre, 1978ROXO NOBRE, Maria Tereza. (1978) Meandros da participação: formas de compartilhar o espaço (ensaio sobre o carnaval baiano). Ciência e cultura. Revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. São Paulo, Ano 30, nº 5. e Ortiz, 1980ORTIZ, Renato. (1980) A consciência fragmentada. Rio de Janeiro, Paz e Terra.).
  • 14
    Surdo - grandes tambores africanos que constituem a base das músicas das escolas de samba.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • BAKHTINE, Mikhail. (1970) L'oeuvre de François Rabelais et la culture populaire au moyen âge et sous la renaissance. Paris, Gallimard.
  • BASTIDE, Roger. (1959) Sociologia do folclore brasileiro São Paulo, Ed.Anhembi.
  • BOITEUX, M. (1977) Formes de la fête. Annales, économies, sociétés, civilisations Paris, An XXXII, nº 2, mars-avril.
  • BONNAIN, R. & MOERDYK, D. (1977) À propos du charivari: discours bourgeois et coutumes populaires. Annales, économies, sociétés, civilisations Paris, An. XXXII, nº 2, mars-avril.
  • CAILLOIS, Roger. (1950) L'homme et le sacré 2ème édition. Paris, Gallimard.
  • CÂMARA CASCUDO, Luiz da. (1962) Dicionário do folclore brasileiro 2ª ed.revista e aumentada, 2 vols. Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro/Ministério da Educação e Cultura.
  • DA MATTA, Roberto. (1979) Carnavais, malandros e heróis Rio de Janeiro, Zahar Ed.
  • ENEIDA. (1958) História do carnaval carioca Rio de Janeiro, Civilização Brasileira Ed.
  • FAURE, Alain. (1978) Paris, carême prenant: du carnaval à Paris au XIXe siècle (1880-1914) Paris, Librairie Hachette Ed.
  • GOLDWASSER, Maria Julia. (1975) O palácio do samba (estudo antropológico da escola de samba estação primeira de mangueira) Rio de Janeiro, Zahar Ed.
  • HEERS, Jacques. (1983) Fêtes des fous et carnavals Paris, Fayard Ed.
  • LE ROY LADURIE, Emmanuel. (1979) Le carnaval de romans Paris, Gallimard.
  • LEOPOLDI, José Savio. (1978) Escola de samba, ritual e sociedade Petrópolis, Ed. Vozes.
  • MESNIL, Marianne. (1974) Le lieu et le temps de la fête carnavalesque - trois essais sur la fête du folklore a l'ethno-sémiotique. Cahiers d'études de sociologie culturelle Bruxelles, Ed. de l'Université de Bruxelles.
  • ORTIZ, Renato. (1980) A consciência fragmentada Rio de Janeiro, Paz e Terra.
  • PEREIRA DE QUEIROZ, Maria Isaura. (1978) Evolution du carnaval latino américain.Diogène Paris, nº 104, octobre-decembre.
  • ______ . (1992) Carnaval brasileiro: o vivido e o mito São Paulo, Ed.Brasiliense. Em francês: Carnaval brésilien: le vécu et le mythe Paris, Gallimard.
  • RODRIGUES, Ana Maria. (1984) Samba negro, espoliação branca São Paulo, Hucitec.
  • ROXO NOBRE, Maria Tereza. (1978) Meandros da participação: formas de compartilhar o espaço (ensaio sobre o carnaval baiano). Ciência e cultura. Revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência São Paulo, Ano 30, nº 5.
  • VON SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes. (1984) A burguesia se diverte no reinado de momo (60 anos de evolução do carnaval na cidade de São Paulo) São Paulo, 283 p. Tese de Mestrado. FFLCH, Universidade de São Paulo.
  • ______ . (1989) Brancos e negros no carnaval popular paulistano São Paulo, 246 p. Tese de Doutorado, FFLCH, Universidade de São Paulo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Dec 1994

Histórico

  • Recebido
    Mar 1995
Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: temposoc@edu.usp.br