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A HOSPITALIDADE NO UNIVERSO DO TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO BRASILEIRO

HOSPITALITY IN THE BRAZILIAN DOMESTIC AIR TRANSPORT INDUSTRY

HOSPITALIDAD EN EL UNIVERSO DEL TRANSPORTE AÉREO NACIONAL BRASILEÑO

RESUMO:

Conhecer a forma como os passageiros vivenciam a hospitalidade a bordo das aeronaves que voam no mercado aéreo doméstico brasileiro permite identificar os fatores que são valorizados pelos passageiros e que podem se tornar um diferencial competitivo no disputado mercado da aviação. Dentro do universo da hospitalidade na aviação, a presente pesquisa tem como objetivo estudar a forma como os passageiros percebem a hospitalidade a bordo das aeronaves do transporte aéreo doméstico brasileiro. O estudo é de natureza mista, compreendendo fase qualitativa, com revisão bibliográfica; e fase quantitativa, com o desenvolvimento de instrumento de coleta de dados e a análise de 1.163 questionários, tendo se utilizado como ferramentas de análise os softwares SPSS e SmartPLS. Os resultados alcançados permitem concluir que, na visão dos passageiros, a hospitalidade é percebida a bordo das aeronaves, abrangendo um conjunto de 19 itens que podem ser explicados usando-se 5 fatores que foram denominados “atrativos”, “atendimento”, “bem-estar”, “low-cost” e “higiene” que, submetidos à análise decorrente das hipóteses geradas, permitiu concluir que no Brasil não existem empresas genuinamente “low-cost”, tendo em vista que a redução no conforto a bordo das aeronaves não traz a consequente redução de preços esperada.

PALAVRAS-CHAVE:
Hospitalidade; Passageiros; Aviação

ABSTRACT:

Knowing how passengers experience hospitality during Brazilian domestic flights enables us to identify the factors that are most valued by passengers, and that can be used to gain competitive advantage in the highly competitive Brazilian aviation industry. Within the universe of aviation hospitality, this research aims to study how passengers view hospitality during Brazilian domestic flights. This study uses mixed methods, comprising a qualitative phase, with a bibliographic and quantitative review, the development of data collection questionnaire, and analysis of the responses gathered from 1,163 returned questionnaires, using the software programs SPSS and SmartPLS. The results show how hospitality is perceived by passengers during Brazilian domestic flights, based on a set of 19 items that can be grouped into five factors: “attractiveness”, “service”,“ well-being”, “low-cost” and “hygiene”. Based on the analysis of the generated hypotheses, this study concludes that there are no genuinely “low cost” companies in Brazil, considering that reduced in-flight comfort is not associated with the consequent expected price reduction.

KEY WORDS:
Hospitality; Passengers; Aviation

RESUMEN:

Saber cómo los pasajeros ven la hospitalidad a bordo de los aviones nacionales brasileños nos permite identificar los factores que los pasajeros valoran y que pueden convertirse en un diferenciador competitivo en el mercado de aviación brasileño en disputa. Dentro del universo de la hospitalidad en la aviación, esta investigación tiene como objetivo estudiar la forma en que los pasajeros ven la hospitalidad a bordo de los aviones de transporte aéreo nacionales de Brasil. El estudio es de naturaleza mixta y comprende una fase cualitativa con una revisión bibliográfica y cuantitativa con el desarrollo del instrumento de recopilación de datos y el análisis de 1.163 cuestionarios, utilizando el software SPSS y SmartPLS. Los resultados muestran que, a juicio de los pasajeros, se percibe la hospitalidad a bordo de los aviones de transporte aéreo nacionales de Brasil, que cubren un conjunto de 19 elementos que pueden explicarse utilizando 5 factores que se denominaron “atractivo”, “servicio”, “Bienestar”, “bajo costo” e “higiene” y que, en general, no hay compañías genuinamente” de bajo costo en Brasil, ya que se reduce la comodidad a bordo del avión sin la reducción de precios.

PALABRAS CLAVE:
Hospitalidad; Pasajeros; Aviación

INTRODUÇÃO

A palavra hospitalidade pode ser vista como um ato relacionado apenas ao ato de hospedar alguém, quando na realidade ela possui um espectro muito mais abrangente, adentrando na qualidade das relações interpessoais entre quem recebe e quem é recebido, em diversas situações do quotidiano.

Dentro dessa visão de anfitrião e hóspede, constata-se que também no mercado da aviação, mais especificamente a bordo das aeronaves, a tripulação sendo responsável pela acolhida, além de desempenhar as funções técnicas relacionadas à segurança, também é responsável por propiciar a sensação de acolhimento e conforto psicológico no interior das aeronaves. É nesse contexto, da relação entre tripulantes e passageiros, que a hospitalidade se faz presente no universo da aviação, suscitando o interesse em entender como essa hospitalidade é vivenciada pelos usuários do transporte aéreo doméstico brasileiro.

Cabe ressaltar que, no momento em que se constata a acirrada disputa de passageiros, por parte das empresas aéreas, a hospitalidade a bordo ou a sua ausência pode ser o fator que fará a diferença no momento da escolha pelo passageiro. Desta forma, este estudo é de natureza mista, permeando revisão bibliográfica, abordando a hospitalidade na aviação, na sua fase qualitativa, permitindo conhecer o estado da arte das pesquisas relacionadas ao tema. Na sequência, na sua fase quantitativa, por intermédio de pesquisa de campo cujos dados são submetidos à análise fatorial exploratória e confirmatória, respectivamente utilizando os softwares SPSS e SmartPLS, obtêm-se 5 fatores que foram denominados “atrativos”, “atendimento”, “bem-estar”, “low-cost” e “higiene”, que traduzem a forma como a hospitalidade a bordo é vivenciada e percebida pelos passageiros.

REVISÃO TEÓRICA

Com o intuito de situar o leitor no universo da hospitalidade, em especial, no contexto da aviação, passa-se a seguir e conhecer o estado da arte das pesquisas relacionadas ao tema.

Segundo Camargo (2015Camargo, L. O. L. (2015) Os interstícios da hospitalidade. Revista Hospitalidade. São Paulo, v. XII, n. especial, p. 42-69, maio, 2015. Disponível em: Disponível em: https://www.revhosp.org/hospitalidade/article/view/574 , acessado em 15/06/2019.
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), a hospitalidade se dá em interstícios, significando dizer que esta é permeada por momentos visivelmente cercados de inospitalidade e até, por que não, de hostilidade. Significa dizer, nas palavras do autor, que hospitalidade, inospitalidade e a hostilidade sempre caminharão juntas. Já Gotman (2001Gotman, A. (2001) Le sens de l´hospitalité. Paris: Presses Universitaires de France. ) considera a hospitalidade como o ato de acolher e servir alguém que esteja fora de seu local de domicílio, sendo resumida na relação entre aquele que recebe e aquele que é recebido por alguém. Para Grinover (2002Grinover, L. (2002) Hospitalidade: um tema a ser reestudado e pesquisado. In: DIAS, Célia M. (Org.). Hospitalidade: reflexões e perspectivas. São Paulo: Manole. ), a palavra hospitalidade pode ser entendida como recepção de hóspedes, visitantes e viajantes, podendo ser simplificada no ato de bem receber. Nesse cenário, os avanços dos estudos científicos demonstram que a hospitalidade também pode se fazer presente no transporte aéreo, havendo estudos em âmbito nacional e internacional nesse sentido. Em âmbito nacional, mais especificamente, na Pós-Graduação Stricto Sensu em Hospitalidade da Universidade Anhembi Morumbi, foram feitas as abordagens descritas no Quadro 1.

Quadro 1
Pesquisas sobre hospitalidade no transporte aéreo no Brasil

Assim, o que se percebe das pesquisas em âmbito nacional é que a primeira abordagem foi feita no ano de 2006 e a partir daí se intensificaram, demonstrando o interesse dos pesquisadores em aprofundar os estudos relacionados à hospitalidade no contexto da aviação. Também no cenário internacional se identificam pesquisas abordando a hospitalidade a bordo das aeronaves, conforme demonstra o Quadro 2

Quadro 2
Pesquisas internacionais sobre hospitalidade no transporte aéreo

Cabe aqui também ressaltar que a primeira pesquisa em âmbito internacional obtida nas pesquisas realizadas data de 2008, demonstrando uma contemporaneidade no que diz respeito ao interesse de autores nacionais e internacionais, tendo em vista que a primeira pesquisa do gênero identificada no Brasil data de 2006, percebendo-se a relevância atribuída ao tema hospitalidade na aviação tanto no Brasil como no exterior. De posse desses dados, o objetivo deste trabalho é estudar a forma como os passageiros enxergam a hospitalidade a bordo das aeronaves do transporte aéreo doméstico brasileiro.

METODOLOGIA

Como primeiro passo metodológico, cabe classificar a pesquisa, que, de acordo com Gil (2010Gil, A. C. (2010) Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas.), aborda a hospitalidade na aviação, estando relacionada com a área das Ciências Sociais Aplicadas, tendo em conta que busca a aquisição de novos conhecimentos. Nesse contexto, segundo Creswell (2010Creswell, J. W. (2010) Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. Tradução Magda Lopes; consultoria, supervisão e revisão técnica Dirceu da Silva. 3 ed. Porto Alegre: Artmed. ), a pesquisa é de natureza mista, pois contempla a abordagem qualitativa com a revisão bibliográfica e a parte quantitativa compreendida pela análise de dados obtidos na pesquisa de campo.

Inicialmente, a pesquisa é qualitativa, pois tem por objetivo detectar conceitos-chave ainda não pensados e entender métodos de coletas de dados utilizados por outros pesquisadores (Sampieri, Collado & Lucio, 2013Sampieri, R. H., Collado, C. F. & Lucio, M. del P. B. (2013) Metodologia de Pesquisa. Tradução: Daisy Vaz de Moraes; revisão técnica: Ana Gracinda Queluz Garcia, Dirceu da Silva, Marcos Julio. 5. ed. Porto Alegre: Penso. ). Para tanto, foram realizadas pesquisas por intermédio dos portais Google Acadêmico, Banco de Teses da CAPES, Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Blackwell Synergy, Cambridge University Press, Oxford University Press e EBSCO host, nos idiomas português, espanhol e inglês, utilizando respectivamente as palavras-chave “hospitalidade na aviação”, “hospitalidad en la aviación” e “hospitality in aviation”.

A pesquisa de campo se deu por intermédio de instrumento de coleta, desenvolvido pelos autores, baseado no modelo desenvolvido por Nameghi e Ariffin (2013Nameghi, E. N. M. & Ariffin, A. A. M. (2013) The measurement scale for airline hospitality: Cabin crew’s performance perspective. Journal of Air Transport Management . Disponível em: Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S096969971300032X , acessado em 15/06/2019.
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), utilizando-se formulário do Google Forms. No que se refere à amostra, esta foi não probabilística por conveniência, visto que a escolha dos elementos não depende da probabilidade, mas das características da pesquisa (Sampieri, Collado & Lucio, 2013Sampieri, R. H., Collado, C. F. & Lucio, M. del P. B. (2013) Metodologia de Pesquisa. Tradução: Daisy Vaz de Moraes; revisão técnica: Ana Gracinda Queluz Garcia, Dirceu da Silva, Marcos Julio. 5. ed. Porto Alegre: Penso. ). Assim, os dados obtidos foram submetidos à análise fatorial exploratória, com o software SPSS, descrevendo a população e propiciando o estabelecimento de hipóteses, testadas na fase explicativa da pesquisa, por meio de modelo de equações estruturais, utilizando o software SmartPLS.

O INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

Partindo-se do modelo de Nameghi e Ariffin (2013Nameghi, E. N. M. & Ariffin, A. A. M. (2013) The measurement scale for airline hospitality: Cabin crew’s performance perspective. Journal of Air Transport Management . Disponível em: Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S096969971300032X , acessado em 15/06/2019.
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), aplicado na Malásia, desenvolveu-se um novo instrumento de coleta de dados para se aferir os níveis de hospitalidade percebidos pelos passageiros a bordo das aeronaves do transporte aéreo doméstico brasileiro, consubstanciado no Quadro 3.

“Responda com base em sua experiência com notas de 1 a 5 às afirmações da tabela abaixo conforme segue: 1- Discordo totalmente; 2- Discordo parcialmente; 3- Não concordo e nem discordo; 4- Concordo parcialmente; 5- Concordo totalmente.”

Quadro 3
Instrumento de Coleta de Dados

Nesse contexto, após a finalização da coleta de dados, foram respondidos 1.163 questionários, sendo que 68 foram descartados, pelo fato de os respondentes não terem voado no transporte aéreo doméstico brasileiro nos últimos 24 meses, restando, portanto, para análise, 1.095 questionários.

RESULTADOS

Após submeter metade da amostra à análise fatorial exploratória, por intermédio do SPSS, o programa agrupou as respostas em 5 grupos de questões que se inter-relacionam e que estão apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Matriz de Fatores Nomeados

Este construto explica a forma como a hospitalidade é percebida a bordo das aeronaves brasileiras, na visão dos passageiros, sendo composto por 19 itens que podem ser explicados por 5 fatores que os autores, baseando-se na revisão de literatura, denominaram “atrativos”, “atendimento”, “bem-estar”, “low-cost” e “higiene” escalonados na Tabela 1 na sequência de sua importância. Em termos práticos, a análise fatorial exploratória explica a forma como as perguntas se relacionam e conseguem explicar a hospitalidade a bordo das aeronaves, estando a seguir as definições escolhidas pelos autores para cada um dos fatores que se relacionam à hospitalidade a bordo das aeronaves.

Atrativos - Fator que está associado a um conjunto de motivos que levam o passageiro a fazer a escolha pela empresa aérea.

Atendimento - Fator que se relaciona à qualidade das relações interpessoais entre passageiros e tripulantes.

Bem-estar - Fator relacionado a aspectos tangíveis e intangíveis que permitem que o passageiro realize a viagem de forma confortável.

Low-cost- Fator associado ao fornecimento de alimentos e bebidas a bordo somente mediante pagamento e à limitação do volume e do peso das bagagens de mão, fatores que estão normalmente associados à operação “low-cost”.

Higiene - Fator associado à sensação de limpeza na cabine de passageiros e nos banheiros.

Assim, a partir da definição destes fatores, tendo como base a revisão de literatura, as respostas apresentadas na pesquisa de campo e as impressões gerais dos autores, foram formuladas hipóteses relacionando os fatores obtidos da análise fatorial exploratória, consubstanciadas na Figura 1.

Figura 1
Modelo Teórico de Correlações

Desta forma, o fator “low-cost” foi definido como hipótese H1 e, na visão dos autores, exerce influência em “atrativos” (H1a), “atendimento” (H1b) e “bem-estar” (H1c). O fator “bem-estar” foi definido como hipótese H2 e na visão dos autores exerce influência em “atrativos” (H2a) e “atendimento” (H2b). Já o fator “higiene” foi definido como hipótese H3 e na visão dos autores exerce influência em “bem-estar” (H3a), “atrativos” (H3b) e “atendimento” (H3c). No que se refere ao fator “atendimento”, este foi definido como hipótese H4 e na visão dos autores exerce influência somente no

fator “atrativos” (H4). Por derradeiro, no que se refere ao fator “atrativos”, na visão dos autores, ele não exerce influência em nenhum dos outros fatores, mas é influenciado por todos. A partir deste momento, as hipóteses foram submetidas à prova por intermédio da análise fatorial confirmatória realizada pelo software SmartPLS 3.2.8 e, na sequência, novamente analisadas à luz do referencial teórico e de todo conhecimento gerado no decorrer do estudo. Cabe aqui esclarecer, mais uma vez, que a amostra foi dividida em duas partes para se evitar a ocorrência de viés da análise dos dados coletados.Para tanto, a análise fatorial confirmatória (AFC) foi iniciada por meio das equações estruturais que objetivou testar o modelo teórico. Para facilitar a análise fatorial confirmatória, as variáveis remanescentes do processo foram recodificadas, seguindo o padrão de nomeação apresentado na Tabela 2.

Tabela 2
Recodificação das Variáveis Remanescentes após AFE

Após a recodificação apresentada na Tabela 2, as variáveis foram submetidas à análise pelo modelo de equações estruturais. Na primeira rodada do modelo, a variável ATEND02=>0,338; na segunda rodada, a variável ATRAT02=>0,479; na terceira rodada, a variável ATRAT05=>0,476; e, finalmente, na quarta rodada, a variável BETR03=>0,471 apresentaram valores abaixo da recomendação de Fornel e Lacker (1981), que é AVE acima de 0,5, sendo eliminadas do modelo. A variável ATEND06=>0,684 também foi eliminada porque o AVE do fator atendimento foi 0,484, portanto abaixo de 0,5.

Após a eliminação dessas variáveis, passou-se à análise das cargas cruzadas do modelo, optando-se por mover a variável ATEND04, para o construto “bem-estar”, por apresentar cargas muito semelhantes, o que gerou o entendimento de que os respondentes visualizam essa variável da mesma forma, não havendo discriminação nas respostas. A mudança foi efetuada, tendo a variável apresentado cargas cruzadas consistentes. Devido ao fato de possuir cargas semelhantes no construto “bem-estar” e “atendimento”, a variável ATEND04 foi movida para o fator “bem-estar”, para se verificar se havia um melhor ajuste do modelo, o que acabou ocorrendo e por essa razão a variável foi mantida nesse fator.

Ato contínuo, após se efetuar os ajustes, passou-se à análise da qualidade do modelo, que apresentou os valores apresentados na Tabela 3.

Tabela 3
Qualidade do Modelo de Equações Estruturais

Tendo como base os dados apresentados na Tabela 3, por meio da coluna “Variância média extraída”, percebe-se que todos os valores ficaram acima dos recomendados por Fornel e Lacker (1981) e de Hair et al. (2014) para esse critério, que são valores acima de 0,5. Sendo os valores apresentados: Atendimento => 0,589, Atrativos =>0,736, Bem-Estar => 0,594, Higiene => 0,773 e Low-cost => 0,583.

Utilizando-se novamente a Tabela 3 como base, passou-se ao próximo critério de análise do modelo, tendo como referência as recomendações propostas por Hair et al. (2014) e também de Pestana e Gageiro (2013Pestana, M. H. & Gageiro, J. N. (2013) Análise de Dados para as Ciências Sociais - A Complementariedade do SPSS - 5. Ed. Lisboa: ND-EDIÇÕES SILABO.) para o índice Alpha de Cronbach, que mede a confiabilidade interna do modelo, cujos valores recomendados devem ficar acima de 0,6. Tendo como base os valores da coluna Alpha de Cronbach da Tabela 3, verifica-se que os fatores apresentaram os seguintes valores: Atendimento => 0,648, Atrativos =0,821, Bem-Estar => 0,654, Higiene => 0,707 e Low-Cost => 0,637, os quais ficam acima do valor recomendado.

Devido ao fato do Alpha de Cronbach ser sensível ao número de itens existentes na escala, isto pode levar a uma subestimação da consistência, conforme observam Hair et al. (2014), sendo que, por essa razão, recomenda-se que se utilize também a confiabilidade composta do modelo para se aferir a qualidade do mesmo, devendo os valores limites para estudos exploratórios ficar acima de 0,6. Os valores apresentados na Tabela 3 são: Atendimento =>0,810, Atrativos =>0,893, Bem-Estar =>0,811, Higiene =>0,872 e Low-Cost =>0,805, demonstrando que todos os valores cumprem a recomendação.

Nesse mesmo escopo, passou-se à análise da qualidade do modelo pela análise do Coeficiente de Pearson, que faz a explicação das relações entre os construtos presentes no modelo, seguindo as recomendações propostas por Hair et al. (2014), cujos limites são os seguintes: entre 0 e 0,4 => Fraco; entre 0,4 e 0,7 => moderado; e entre 0,7 e 0,9 => forte. Desta forma, os valores encontrados podem ser interpretados da seguinte forma: Atendimento = moderado e Atrativos e Bem-Estar = Fraco.

A Tabela 4 demonstra os valores do indicador SRMR (Standardized Root Mean Square Residual):

Tabela 4
Medidas de Adequação do Modelo

Para se finalizar a análise da adequação do modelo, utilizou-se o teste de resíduos médios padronizados (Root Mean Square Residual), que é uma medida de adequação do modelo que mede as diferenças entre a matriz de correlações observadas e a matriz de correlações do modelo implícito, o que significa que esse índice reflete a magnitude de tais diferenças, indicando que quanto menor o valor de SRMR, melhor é a adequação (GARSON, 2016Garson, G. D. (2016) Partial Least Squares Regression and Structural Equation Models: 2016 Edition (Statistical Associates Blue Book Series 10). [S.l.]: Statistical Associates Publishers.). Os valores que demonstram um bom ajuste do modelo devem ficar abaixo de 0,8, segundo Hu e Bentler (1999Hu, L. & Bentler, P. M. (1999) Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, v. 6, n. 1, p. 1-55, 1 jan. 1999. ) e Henseler et al. (2009Henseler, J., Ringle C. & Sinkovics, R. (2009). The Use of Partial Least Squares Path Modeling in International Marketing. (In) Sinkovics, RR e Ghauri, PN (Ed.) New Challenges to International Marketing (Advances in International Marketing , Vol. 20), Emerald Group Publishing Limited, Bingley, pp. 277-319. ). Assim, o valor encontrado para o modelo foi de 0,076, indicando que o ajuste do modelo é muito bom. O valor do X² => 767,221, NFI=> 0,638.

Tendo sido feitas as análises de qualidade de modelo, passou-se para as análises discriminantes, primeiramente por meio da matriz de cargas cruzadas, apresentadas na Tabela 5.

Tabela 5
Matriz de Cargas Cruzadas

A Tabela 5 de cargas cruzadas apresenta as cargas das variáveis em seus respectivos construtos, sugerindo que, caso a variável apresente cargas maiores em outros construtos, esse fator sugeriria uma maior identificação desses indicadores com outros construtos. Com esse olhar, ao analisar a Tabela 5, pode-se perceber que todas as cargas fatoriais dos indicadores são maiores nos construtos aos quais foram designados, sugerindo que devem ser mantidos onde estão (HAIR et al., 2014).

A segunda etapa da análise discriminante é determinar a discriminação do modelo por meio do critério de Fornell e Lacker (1981Fornell, C. & Larcker, D. F. (1981). Structural Equation Models with Unobservable Variables and Measurement Error: Algebra and Statistics. Journal of Marketing Research, v. 18, n. 3, p. 382-388.), cujos resultados estão apresentados na Tabela 6.

Tabela 6
Critério de Fornell e Lacker

De acordo com o critério de Fornell-Larcker (1981Fornell, C. & Larcker, D. F. (1981). Structural Equation Models with Unobservable Variables and Measurement Error: Algebra and Statistics. Journal of Marketing Research, v. 18, n. 3, p. 382-388.), a raiz quadrada de cada constructo deve ser maior que as maiores correlações com qualquer outro construto (CHIN; HENSELER; WANG, 2016Chin, W. W. & Henseler, J.; Wang, H. (2016) Handbook of Partial Least Squares. S.l.: Springer. ; GARSON, 2016Garson, G. D. (2016) Partial Least Squares Regression and Structural Equation Models: 2016 Edition (Statistical Associates Blue Book Series 10). [S.l.]: Statistical Associates Publishers.; HAIR et al., 2014). Tendo como base os valores encontrados na Tabela 6, apenas o valor de “Low-Cost” possui valores menores que as respectivas correlações, porém devido à proximidade desses valores, optou-se por manter a validade discriminante.

Para se avaliar a validade discriminante do modelo, optou-se por utilizar o modelo de correlações Heterotrait-Monotrait, demonstrado na Tabela 7.

Tabela 7
Correlações HTMT (Heterotrait-Monotrait)

A Tabela 7 apresenta o modelo Heterotrait-Monotrait, que é a medida da taxa da média geométrica das correlações do heterotrait-heterométodo, dividido pela média das correlações das submatrizes monotrait-monométodo, cujos valores encontrados nas correlações heterotrait devem ser menores que as correlações monotrait, a uma taxa inferior a 1 (Garson, 2016Garson, G. D. (2016) Partial Least Squares Regression and Structural Equation Models: 2016 Edition (Statistical Associates Blue Book Series 10). [S.l.]: Statistical Associates Publishers.). Henseler, Ringle e Sinkovics (2009Henseler, J., Ringle C. & Sinkovics, R. (2009). The Use of Partial Least Squares Path Modeling in International Marketing. (In) Sinkovics, RR e Ghauri, PN (Ed.) New Challenges to International Marketing (Advances in International Marketing , Vol. 20), Emerald Group Publishing Limited, Bingley, pp. 277-319. ) sugerem que os valores devem ser menores que 0,90 para apresentar validade discriminante.

Observando-se a Tabela 7, constata-se que os valores de Heterotrait são menores que o recomendado: Atrativos => Atendimento = 0,208, Bem-Estar=> Atendimento = 0,883, Higiene => Atendimento = 0,528, Low-cost => Atendimento = 0,335, Bem-Estar=>atrativos = 0,315, Higiene=>Atrativos = 0,259, Higiene =>Bem-Estar = 0,570, Low-Cost => Atrativos = 0,314, Low-Cost=>Bem-estar = 0,467 e Low-Cost => Higiene = 0,203.

Dando continuidade, passou-se a verificar a validade preditiva do modelo por meio do Indicador de Stone-Geisser, apresentado na Tabela 8.

Tabela 8
Indicador de Stone-Geisser

O indicador de Stone-Geisser avalia a capacidade preditiva do modelo ou relevância preditiva, onde valores acima de 0 indicam que existe relevância preditiva para um construto dependente particular (HAIR et al., 2016). Os valores da Tabela 8 para os construtos dependentes (Atendimento => 0,208 e Atrativos => 0,045) indicam que possuem validade preditiva.

A validação final foi feita por intermédio da análise dos caminhos do teste T de Student, por meio da análise Bootstrapping, conforme Tabela 9.

Tabela 9
Análise Bootstraping dos Caminhos

Tabela 9 demonstra que não existem caminhos para H4 = Atendimento => Atrativos (ρ=0,463; T=0,735), H1b = Low-Cost => Atendimento (ρ=0,091, T=1,691), H1a = Low-Cost => Atrativos (ρ =0,826, T=0,409), o que leva à rejeição das hipóteses H1a, H1b e H4, pois não foram suportadas.

A Tabela 9 demonstra que existem caminhos para H1c - Low-Cost => Bem-Estar (ρ ≤0,0001, T=6,929); H2a - Bem-Estar => Atrativos (ρ=0,025, T=2,252); H2b - Bem-Estar => Atendimento (ρ≤0,0001,T=16,799); H3a - Higiene => Bem-Estar (ρ≤0,0001, T=9,602); H3b - Higiene => Atrativos (ρ=0,043, T=2,032); H3c - Higiene => Atendimento (ρ≤0,0001,T=4,384).

Na Tabela 10 constam as hipóteses suportadas e não suportadas.

Tabela 10
Hipóteses aceitas e não aceitas no modelo

O Modelo final proporcionado pela validação das hipóteses geradas é demonstrado por meio da Figura 2, que será denominado Modelo LBAAH, que constitui o acrônimo para Low-Cost, Bem-Estar, Atrativos, Atendimento e Higiene, cujos resultados passarão a ser comentados a partir deste momento.

Figura 2
Modelo Final LBAAH

Hipótese H1a - A adoção do modelo “low-cost” pelas companhias aéreas influencia positivamente nos “atrativos” oferecidos (não suportada).

A interpretação literal deste resultado é que o modelo “low-cost” na aviação doméstica brasileira não funciona como um fator de atratividade.

Segundo Doganis (2006), este tipo de operação colocou as empresas tradicionais sob pressão especialmente nas viagens de curta e média distância. Segundo o autor, o desenvolvimento das empresas “low-cost” se deu em função da existência de significativas vantagens competitivas, tais como uso de aeroportos secundários, restrição de bagagens, frotas uniformizadas e adoção de medidas que geram redução de custos operacionais e não operacionais, influenciando em muitos aspectos da experiência de viagem, incluindo o conforto.

No mesmo contexto, Botelho (2017Botelho, T. (2017) Voar é Humano. São Paulo: Revista Veja, n° 2512. ) acredita que o modelo “low-cost” está se esgotando, tendo em conta que as empresas já descobriram que poderão perder vendas se não devolverem um pouco do conforto de outrora.

Portanto, a análise fatorial confirmatória está em consonância com a literatura, a pesquisa de campo e as impressões gerais dos autores ao não suportar esta hipótese no âmbito da aviação doméstica brasileira.

Hipótese H1b - A adoção de modelo “low-cost” pelas Companhias Aéreas influencia positivamente no “atendimento” das empresas aéreas (não suportada).

Conforme apresentado na hipótese H1a, o modelo “low-cost” está associado a uma série de eventos que objetivam cortar custos com a finalidade de oferecer passagens aéreas mais baratas, no entanto, conforme constatado na análise fatorial exploratória, os passageiros não reconhecem a existência de empresas legitimamente “low-cost/low-fare” no Brasil, haja vista que os cortes de custos e a diminuição do conforto a bordo não são reconhecidos como fatores que implicam redução dos valores das passagens aéreas.

Assim, no momento em que a análise fatorial confirmatória constata que esta hipótese não é suportada, tal fato está em consonância com Doganis (2006), ao lembrar que as políticas de “low-cost” exercem influência em muitos aspectos da experiência de viagem, incluindo o conforto.

Hipótese H1c - A adoção de modelo “low-cost” pelas Companhias Aéreas influencia negativamente no “bem-estar” (suportada).

Os usuários do modelo “low-cost/low-fare” ao redor do mundo sabem o que vão encontrar ao adquirir um bilhete em uma empresa “low-cost/low-fare”. Existe uma troca consentida na qual o passageiro sabe que realizará uma viagem espartana e como consequência pagará um valor médio abaixo do praticado pelas empresas tradicionais, sujeitando-se a uma menor franquia de bagagens, muitas vezes em horários diferenciados, sem o serviço de bordo gratuito e operando normalmente em aeroportos secundários.

Portanto a análise fatorial confirmatória, ao suportar a hipótese de que o modelo “low-cost” influencia negativamente no “bem-estar”, está plenamente justificada pela revisão bibliográfica e pelo senso comum de que, ao se adquirir um bilhete “low-cost”, os níveis de conforto serão menores.

Hipótese H2a - O “bem-estar” sentido pelos passageiros influencia positivamente nos “atrativos” oferecidos pelas Companhias Aéreas (suportada).

Neste caso, a análise fatorial confirmou a hipótese de que uma experiência prazerosa durante o voo, no que diz respeito ao “bem-estar”, definido como a soma de aspectos tangíveis e intangíveis que permitem que o passageiro realize a viagem de forma confortável, exercerá influência positiva no passageiro no sentido de que ele se sinta motivado a voar novamente com a empresa.

Nesse sentido, vale a pena relembrar a fala de Kakinoff (2019Kakinoff, P. S. (2019) Paulo Sérgio Kakinoff: entrevista. São Paulo, 1 arquivo .mp3 (25’:18’’).) ao enfatizar que a hospitalidade pode não ser o fator isolado de escolha de uma companhia aérea, mas a falta de hospitalidade é o fator de abandono ou de rejeição de uma companhia aérea. Um cliente dificilmente esquece um mau atendimento a bordo e, se esquecer, leva alguns anos, porque mau atendimento a bordo normalmente está associado a uma necessidade que o cliente tem.

a importância desse “bem-estar” sentido pelo passageiro, Camargo (2004Camargo, L. O. L. (2004) Hospitalidade. São Paulo: Aleph. ) enfatiza que a hospitalidade se origina do sistema da dádiva e que ambas não são observáveis de maneira clara pelas ciências aplicadas, que têm por objetivo a gestão e quando percebida na sua dimensão de acolhimento, a hospitalidade revela-se como uma espécie de vantagem competitiva para a empresa aérea.

Portanto, constata-se que a análise fatorial, ao confirmar esta hipótese, apenas corrobora a segunda hipótese qualitativa; o quanto descrito na revisão bibliográfica; os dados obtidos na coleta de campo; as informações fornecidas pelo Presidente da GOL e as impressões gerais do autor.

Hipótese H2b - O “bem-estar” percebido pelos passageiros influencia positivamente na percepção do “atendimento” oferecido pelas companhias aéreas (suportada).

O fator “bem-estar” foi definido como uma mescla de aspectos tangíveis e intangíveis que permitem que o passageiro realize a viagem de forma confortável. Já o fator “atendimento” está relacionado à qualidade das relações interpessoais entre passageiros e tripulantes. Desta forma, no momento em que a análise fatorial suporta esta correlação, constata-se que, se houver qualidade nas relações interpessoais, ou seja, o passageiro que se sentir acolhido, recebendo a atenção dos tripulantes necessariamente, tenderá a maximizar a sua percepção de “bem-estar”.

Pode-se até dizer que no binômio “bem-estar/atendimento” repousariam dois alicerces da hospitalidade, pois, na visão de Grinover (2002Grinover, L. (2002) Hospitalidade: um tema a ser reestudado e pesquisado. In: DIAS, Célia M. (Org.). Hospitalidade: reflexões e perspectivas. São Paulo: Manole. ), a palavra hospitalidade pode ser entendida como recepção de hóspedes, visitantes e viajantes, podendo ser simplificada no ato de bem receber. De posse desse dado, leva-se a acreditar que a associação dos aspectos intangíveis (sorriso, simpatia, calor humano, atenção, educação, delicadeza) aos aspectos tangíveis (assentos confortáveis, bom serviço de bordo, temperatura adequada, pontualidade) provavelmente formariam o cenário ideal para se acolher os passageiros. Também nesse sentido Kakinoff (2019Kakinoff, P. S. (2019) Paulo Sérgio Kakinoff: entrevista. São Paulo, 1 arquivo .mp3 (25’:18’’).) apresenta o que chamou de mantra para todos os funcionários que interagem com os passageiros, que consiste no trinômio segurança, simplicidade e simpatia, englobando, neste caso, fatores tangíveis e principalmente os intangíveis, resultado da qualidade das relações interpessoais.

Hipótese H3a - A “higiene” influencia positivamente na percepção de “bem-estar” dos passageiros (suportada).

Ao suportar esta hipótese, a análise fatorial indica que o fator “bem-estar” definido como o conjunto de aspectos tangíveis e intangíveis que permitem que o passageiro realize a viagem de forma confortável é influenciado positivamente pela “higiene” percebida a bordo da aeronave.

Assim, para se reconhecer a importância da “higiene”, se resgata a definição de Nameghi e Ariffin (2013Nameghi, E. N. M. & Ariffin, A. A. M. (2013) The measurement scale for airline hospitality: Cabin crew’s performance perspective. Journal of Air Transport Management . Disponível em: Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S096969971300032X , acessado em 15/06/2019.
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) para a dimensão conforto, que está relacionada tanto a fatores tangíveis relacionados à qualidade da infraestrutura e das facilidades disponibilizadas a bordo, bem como ao conforto psicológico que trará a tranquilidade e a confiança necessárias ao “bem-estar” do passageiro durante a viagem.

Desta forma, o fator “higiene” será um dos componentes que propiciará o “bem-estar” que todos os passageiros esperam e a empresa se esforça em promover. Corroborando essa ideia, Botelho (2017Botelho, T. (2017) Voar é Humano. São Paulo: Revista Veja, n° 2512. ) acrescenta que empresas fora do Brasil têm apresentado novidades para agradar os passageiros, dentre elas, a higienização dos banheiros das aeronaves, em apenas três segundos, por meio de luz ultravioleta.

Portanto, fica clara a confirmação da hipótese ao associar positivamente o fator “higiene” ao fator “bem-estar”, tendo em vista que juntos conduzirão à sensação geral de conforto almejada por todas as empresas aéreas.

Hipótese H3b - A higiene influencia positivamente na percepção dos atrativos oferecidos pela empresa aérea (suportada).

O fator “atrativos” foi definido pelos autores como um conjunto de motivos que levam o passageiro a fazer a escolha pela empresa aérea. Assim, a análise fatorial, nesta hipótese, confirma que a higiene atua positivamente nos complexos meandros que levam um passageiro a optar por uma empresa aérea em detrimento de outra.

Tal constatação pode ser identificada em Kakinoff (2019Kakinoff, P. S. (2019) Paulo Sérgio Kakinoff: entrevista. São Paulo, 1 arquivo .mp3 (25’:18’’).) ao explicar que, na percepção do cliente, o avião deveria funcionar como uma grande máquina do tempo, na qual o passageiro entra no avião, fica entretido, dorme, descansa, trabalha e não percebe que viajou. Assim, terá sido prestado o melhor serviço se o passageiro não perceber que voou. Portanto, para que o passageiro sinta essa continuidade de sua vida sem se dar conta da realização do voo é importante que este ambiente esteja adequadamente higienizado, pois, do contrário, a sensação de rejeição ao ambiente e de desconforto é imediata.

Hipótese H3c - A higiene influencia positivamente na percepção de atendimento oferecido pela empresa aérea (suportada).

Cabe lembrar que o fator “atendimento” está relacionado à qualidade das relações interpessoais entre passageiros e tripulantes, restando a pergunta de por qual motivo um fator tangível, como é o caso da “higiene”, influencia positivamente na percepção da qualidade das relações interpessoais.

A resposta é simples e cada um se colocando na posição de um passageiro chegaria facilmente a esta conclusão. Observando-se a Figura 1 (Modelo Teórico de Correlações), percebe-se que assim como a “higiene” influencia no “atendimento” (hipótese 3c), a “higiene” também influencia no “bem-estar” (hipótese 3a) e, por conseguinte, o “bem-estar” influencia no “atendimento” (hipótese 2b). Assim, estes três fatores estão inter-relacionados. Basta imaginar a cena de um passageiro embarcando em uma aeronave suja, em que, por mais gentileza e acolhimento que a tripulação prestasse, dificilmente se reverteria o mal-estar.

Portanto, o que se conclui é que, se a pessoa estiver em um ambiente perfeitamente higienizado, se aumentará a sensação de “bem-estar”, permitindo que as relações interpessoais ocorram com melhor qualidade.

Hipótese H4 - O atendimento oferecido pela Companhia Aérea influencia positivamente nos “atrativos” (não suportada).

Ao constatar que a análise fatorial não suportou este comportamento, procurou-se, no universo da revisão bibliográfica, os motivos pelos quais o fator “atendimento” não exerceria influência positiva no fator “atrativos”. Inicialmente, a não confirmação desta hipótese causou inquietação. Cabe, no entanto, esclarecer que esta inquietação foi superada ao se imaginar o que o passageiro esperaria encontrar a bordo da aeronave. A resposta surgiu como uma imagem gravada na mente, de anos de utilização do transporte aéreo doméstico brasileiro, no qual a primeira visão na porta de entrada da aeronave é uma comissária recebendo os passageiros com um sorriso nos lábios, apresentando as boas-vindas da tripulação. Ou seja, este comportamento é o esperado pelos passageiros, portanto não se concebe que essa cena se desenvolva de forma diferente. Na entrevista com Kakinoff (2019Kakinoff, P. S. (2019) Paulo Sérgio Kakinoff: entrevista. São Paulo, 1 arquivo .mp3 (25’:18’’).), ao ser questionado quanto à importância da hospitalidade a bordo das aeronaves, este respondeu que a hospitalidade pode não ser o fator isolado de escolha de uma companhia aérea, mas certamente a falta de hospitalidade é o fator de abandono ou de rejeição de uma companhia aérea.

Finalmente, tal comportamento pode estar associado ao que Herzberg (1987Herzberg, F. (1987) One More Time: How Do You Motivate Employees? Harwards Business, Review, September-October, 1-16. ) usou chamar de fatores higiênicos, que são considerados componentes esperados, que seriam quase uma obrigação, sendo que ao não se materializarem, tornam-se motivo de grande insatisfação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao se finalizar este estudo, percebe-se a sua importância ao juntar dois universos importantes, quais sejam, da hospitalidade e da aviação que, como visto na revisão bibliográfica, ainda não têm uma gama variada de pesquisas. O ponto a se ressaltar foi a apresentação da hospitalidade a bordo das aeronaves a partir da visão dos passageiros, ressaltando-se como pontos principais as seguintes constatações:

  • os passageiros não reconhecem a existência de empresas legitimamente “low-cost/low-fare” no Brasil, pois os cortes de custos e a diminuição do conforto a bordo não são reconhecidos como fatores que implicam em redução dos valores das passagens aéreas;

  • a adoção do modelo “low-cost” traz atrelada a sensação de que o fator “atendimento” será aquém do prestado em uma empresa de modelo tradicional;

  • uma experiência prazerosa durante o voo, no que diz respeito ao “bem-estar”, exercerá influência positiva no passageiro no sentido de que ele se sinta motivado a voar novamente com a empresa; e

  • se houver qualidade nas relações interpessoais, o passageiro tenderá a maximizar a sua percepção de “bem-estar”.

Desta forma, está alcançado o objetivo geral desta pesquisa, que foi enxergar a forma como os passageiros enxergam a hospitalidade a bordo das aeronaves do transporte aéreo doméstico brasileiro.

No que se referem às limitações da pesquisa, os resultados são válidos para a realidade do mercado da aviação doméstica brasileira, não podendo essas conclusões ser generalizadas, por exemplo, para os voos internacionais de empresas brasileiras ou para o cenário de outros países. Em relação às pesquisas futuras, sugere-se aplicar o presente instrumento de pesquisa em outros países, fazendo-se assim um comparativo entre a realidade da aviação doméstica brasileira e a do país objeto do novo estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Set 2019
  • Aceito
    19 Fev 2020
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