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A identidade cultural na pós-modernidade

ARTIGO ORIGINAL

RESENHA

Resenha de: Elisabeth Teixeira

Doutora em Ciências Sócio-Ambientais pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Pós-Doutorado em Sociologia pela Universidade de Coimbra. Professora Adjunto IV da Universidade do Estado do Pará (UEPA). Docente do Curso de Mestrado em Educação da UEPA. Coordenadora da Rede de Extensão e Pesquisa em/de Práticas Educativas em Saúde e Cuidado na Amazônia (REPPESCAMA)

Endereço Endereço: Elizabeth Teixeira R. Municipalidade 949, Ed. Júpiter, Ap. 1104 66.050-350 - Umarizal, Belém, PA. E-mail: etfelipe@terra.com.br

Hall S. A identidade cultural na pós-modernidade. 10a ed. Rio de janeiro: dp&a; 2005.

A relevância do debate sobre cultura para o campo da saúde e enfermagem é inegável. Nesse sentido, o livro de Stuart Hall é extremamente pertinente, pois representa (e apresenta) um avanço na discussão das identidades culturais na pós-modernidade. As velhas identidades que por tanto tempo estabilizaram o mundo social estão em declínio. Novas identidades estão surgindo, deixando o indivíduo moderno fragmentado. O propósito do livro é explorar algumas das questões sobre a identidade cultural na modernidade tardia e avaliar se existe uma crise de identidade, em que consiste essa crise e em que direção ela está indo. Ao desenvolver seus argumentos, o autor introduz certas complexidades e examina alguns aspectos contraditórios que a noção de "descentração do sujeito", em sua forma mais simplificada, desconsidera.

Stuart Hall é professor da Open University, Inglaterra. Foi um dos fundadores do Centre for Contemporary Cultural Studies, da Universidade de Birmingham, Inglaterra, tendo sido seu diretor de 1970 a 1979.

Estruturou a organização do livro em seis partes. A primeira parte "A identidade em questão" trata de três concepções de identidade: a do sujeito iluminista (individualista); a do sujeito sociológico (interacionista); a do sujeito pós-moderno (que efetiva a "celebração móvel", nas palavras do autor). Nesta parte do livro o autor nos faz refletir sobre a questão: o que muda de um extremo a outro? A resposta indica que a condição de permanência, a certeza e a continuidade, são condições que se desmancham no ar nestes tempos pós-modernos.

Na segunda parte "Nascimento e morte do sujeito moderno" emerge o conceito de descentração do sujeito. O autor está tratando da morte do sujeito cartesiano e indica algumas obras e autores que contribuíram para esse processo na modernidade tardia, como por exemplo, a releitura de Marx nos anos 60 (os homens fazem a história [...] sob as condições que lhe são dadas); também os significados mutantes das palavras de Saussure e ainda os estudos de Foucault sobre o poder dos regimes disciplinares, dentre outros. Obras e autores que abalaram as estruturas do sujeito moderno e constituíram e permitiram instituir, como destaca o autor, os descentramentos, pois suas idéias descrevem deslocamentos do sujeito através de uma série de rupturas nos discursos do conhecimento moderno. Nas palavras do autor: "[...] o sujeito do iluminismo, visto como tendo uma identidade fixa e estável, foi descentrado, resultando nas identidades abertas, contraditórias, inacabadas, fragmentadas, do sujeito pós-moderno" (p.46).

Avançando no debate, na terceira parte "As culturas nacionais como comunidades imaginadas" o autor questiona: o que está acontecendo à identidade cultural na modernidade tardia? Como as identidades culturais nacionais estão sendo afetadas ou deslocadas pelo processo de globalização? O autor destaca que as nações são como comunidades imaginadas, que são perpetuadas pela memória do passado, pelo desejo de viver em conjunto e pela perpetuação da herança. Na desconstrução da idéia de cultura nacional como identidade unificadora, o autor refere que as culturas nacionais, na verdade, "são atravessadas por profundas divisões e diferenças internas, sendo unificadas apenas através do exercício de diferentes formas de poder cultural" (p.62). Neste sentido, para o autor, as nações modernas são verdadeiros "híbridos culturais".

Na quarta parte "Globalização" o autor afirma que a globalização enquanto um complexo de forças de mudança está poderosamente deslocando as identidades culturais nacionais, dando continuidade, assim, ao debate iniciado na terceira parte do livro. O autor destaca nesta parte três impactos importantes desse processo de globalização sobre as identidades culturais: a desintegração; o reforço pela resistência; a mutação (novas identidades-híbridas-estão tomando seu lugar). Nas palavras do autor, para alguns teóricos: "O efeito geral desses processos globais tem sido o de enfraquecer ou solapar formas nacionais de identidade cultural. Eles argumentam que existem evidências de um afrouxamento de fortes identificações com a cultura nacional, e um reforçamento de outros laços e lealdades culturais, acima e abaixo do nível do estado-nação" (p.73).

Na quinta parte do livro – "O global, o local e o retorno da etnia" - há um instigante debate sobre o novo interesse pelo local e a nova articulação entre o global e o local, uma verdadeira dialética das identidades: entre novas identidades globais e novas identidades locais. Aqui o autor defende que a globalização tem um efeito contestador e deslocador das identidades centradas e fechadas de uma cultura nacional. Esse efeito verdadeiramente pluralizante altera as identidades fixas, tornando-as menos fixas, plurais, mais políticas e diversas. Esse movimento pode produzir dois efeitos, e o autor refere que Kevis Robins1 chama o primeiro efeito de "Tradição", quando as nações tentam "recuperar sua pureza anterior e recobrir as unidades e certezas que são sentidas como tendo sido perdidas" (p.87). O outro efeito desse processo nas nações é denominado de "Tradução" quando as nações "aceitam que as identidades estão sujeitas ao plano da história, da política, da representação e da diferença" (p.87). Assim, as nações estariam gravitando entre manter (a tradição) e transformar (a tradução), o que afeta diretamente as novas (ou velhas) formas de identidade cultural. É nesse movimento/deslocamento que emerge a concepção de culturas híbridas (entre a tradição e a tradução) como um dos diversos tipos de identidades destes tempos de modernidade tardia.

Na sexta e última parte do livro "Fundamentalismo, Diáspora e Hibridismo" o autor faz uma análise do descentramento do Ocidente. Nas palavras do autor: "a globalização não parece estar produzindo nem o triunfo do global nem a persistência, em sua velha forma nacionalista, do local. Os deslocamentos ou os desvios da globalização mostram-se, afinal, mais variados e mais contraditórios do que sugerem seus protagonistas ou seus oponentes" (p.97).

Este livro é a tentativa de debater o movimento/deslocamento produzido pela globalização nas identidades culturais na modernidade tardia/pós-modernidade. Neste sentido, a concepção "descentramento do sujeito" ganha sentido, pois diante desses intensos fluxos produzidos/introduzidos nas paisagens culturais, estas se fragmentam/pluralizam e com elas e a partir delas também o sujeito. O debate é de extrema relevância para os estudos culturais no campo da saúde e enfermagem. A noção de híbridos culturais pode em muito contribuir com os estudos nestes campos, tornando-os mais abertos aos fenômenos plurais e diversos que se manifestam nos respectivos saberes/fazeres dos sujeitos individuais e coletivos. O livro nos brinda e ao mesmo tempo nos estimula a rever nossos scripts culturais e nossa capacidade de interpretação do mundo pós-moderno.

Recebido em: 13 de agosto de 2005

Aprovação final: 17 de fevereiro de 2006

  • 1 Robins K. Tradition and translation: national culture in its global context. In: Corner J, Harvey S, organizers. Enterprise and heritage: crosscurrents of national culture. Londres: Routledge; 1991.
  • Endereço:

    Elizabeth Teixeira
    R. Municipalidade 949, Ed. Júpiter, Ap. 1104
    66.050-350 - Umarizal, Belém, PA.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Abr 2008
    • Data do Fascículo
      Mar 2006
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