INTRODUÇÃO
O HPV (vírus do papiloma humano) é reconhecido como o causador do câncer de colo de útero e relaciona-se a vários outros tipos de câncer. 9 Recente revisão da literatura 25 estimou prevalência de HPV em 32,1% entre 576.281 mulheres, variando de 42,2% nos países em desenvolvimento a 22,6% nos desenvolvidos. Estima-se que nove a 10 milhões de pessoas tenham o vírus e que ocorram 700 mil novos casos por ano. a Revisão da literatura 3 com estudos realizados com mulheres de diversas regiões do País mostrou prevalência de HPV de 14,0% a 54,0% entre as mulheres em geral, e de 10,0% a 24,0% entre mulheres assintomáticas.
Os níveis de conhecimento sobre o HPV são baixos em diversas populações do mundo, especialmente quanto a sua relação com resultados alterados de citologia oncológica, com câncer cervical e com verrugas genitais. 5 , 13 Existem poucas publicações que avaliaram o conhecimento da população brasileira acerca do HPV. Os estudos existentes foram realizados com pequenas amostras e apontaram que a maior parte das mulheres e dos homens tem pouco conhecimento sobre esse vírus. 14 , 17 , 23
Outro aspecto bastante discutido é a aceitabilidade das vacinas. Recomenda-se a imunização de meninas e meninos a partir de idades que variam conforme as normas de cada país. A imunização antes da exposição ao HPV resulta em proteção durável tanto para mulheres quanto para homens. Essa recomendação, porém, não é sempre bem recebida e compreendida em vários países, tanto pelos pais quanto pelos médicos pediatras. 7 , 26 A vacinação de pessoas adultas também enfrenta obstáculos, como o alto custo para a população em locais onde não é provida pelo sistema público de saúde; a necessidade de ser administrada em três doses injetáveis; além de questionamentos sobre sua eficácia, necessidade de serem vacinados os homens e o impacto da vacinação na prevenção do câncer de colo uterino. 7
As duas vacinas (quadrivalente, aprovada em 2006 e bivalente, aprovada em 2008) estavam, até 2013, disponíveis apenas no setor privado de saúde no Brasil. A Sociedade Brasileira de Imunização b recomenda que as vacinas sejam ministradas entre nove e 26 anos de idade. Alguns municípios implementaram a vacinação gratuita de meninas entre 11 e 13 anos em escolas públicas e privadas, mediante autorização dos pais. Observou-se, em um dos municípios do Estado de São Paulo, alta aceitação dos pais em relação a vacinar as filhas depois de receberem informações detalhadas sobre a vacina. Quase todas as meninas, cujos pais autorizaram a vacinação, completaram as três doses (97,0%). 10 O Ministério da Saúde estuda a inclusão da vacinação para as meninas no Programa Nacional de Imunização (PNI), pelo Sistema Único de Saúde (SUS). c Não há consenso no Brasil sobre vacinar meninos e homens. Especialistas defendem essa vacinação em vista dos efeitos benéficos para proteger os homens das consequências da infecção pelo vírus, mas principalmente para acelerar a proteção das mulheres. Outros consideram que a relação custo-benefício não recomenda a vacinação dos homens face à menor incidência e mortalidade associadas, por exemplo, ao câncer de pênis.
O objetivo deste estudo foi analisar o conhecimento de homens e mulheres acerca do HPV e sua intenção de serem vacinados e vacinarem seus filhos adolescentes.
MÉTODOS
Estudo descritivo, de corte transversal, com amostra intencional de 538 usuários de unidades básicas de saúde (UBS) e duas policlínicas do SUS de Campinas, SP, em 2011, sendo 286 mulheres (18 a 49 anos) e 252 homens (18 a 60 anos). Sorteou-se uma UBS em cada região da cidade e incluíram-se duas policlínicas nas quais havia atendimento em várias especialidades, portanto, com maior possibilidade de se encontrar homens em consulta médica. Os possíveis participantes eram convidados a participar da pesquisa enquanto esperavam atendimento nos serviços de saúde.
A coleta de dados foi feita por meio de questionários estruturados, apropriados ao sexo do entrevistado, aplicados por entrevistadoras capacitadas. Os questionários foram desenvolvidos com base na literatura e com assessoria de dois especialistas em questões relativas ao HPV e às vacinas disponíveis no Brasil. Os questionários foram pré-testados em pequenas amostras de usuários do SUS semelhantes aos que seriam sujeitos do estudo. O questionário foi revisado conforme surgiam eventuais problemas de compreensão e de fluxo das perguntas. Esse processo repetiu-se até a obtenção da versão considerada adequada. Os questionários tinham quatro seções: características sociodemográficas, reprodutivas e sexuais, conhecimentos sobre HPV e vacinas, e estrato socioeconômico. d
Os questionários foram revisados e duplamente digitados. A seguir foram realizados procedimentos para a limpeza e consistência do banco de dados. O tamanho da amostra foi calculado em 432 sujeitos, considerando a prevalência estimada de pessoas (homens e mulheres) que tinham ouvido falar sobre o HPV de 23,5%, 6 com diferença absoluta entre as proporções amostral e populacional de 4,0% e probabilidade do erro tipo I fixada em 5%. Durante a coleta de dados houve 13 pessoas que se recusaram a participar da pesquisa.
O teste de Qui-quadrado foi utilizado para análise bivariada e foram consideradas as variáveis independentes: idade no momento da entrevista, sexo, escolaridade, estado marital, cor da pele, religião, número e sexo dos filhos, trabalho remunerado e estrato socioeconômico.
As variáveis dependentes foram: ter ouvido falar do HPV, informações sobre o HPV, ter ouvido falar das vacinas, intenção de se vacinar, intenção de vacinar os filhos. As perguntas sobre as vacinas foram feitas a todas as pessoas que referiram ter ouvido falar do HPV. As pessoas que afirmaram nunca ter ouvido falar da vacina foram informadas sobre a sua existência antes de serem questionadas sobre a intenção de se vacinar. A variável “Informações sobre o HPV” foi categorizada como “informações adequadas” se o participante referiu pelo menos uma das alternativas de resposta: “Que é uma doença sexualmente transmissível (DST)”, “Que provoca câncer de colo de útero/de pênis/ que pode virar câncer”, “Que provoca verrugas/doença/infecção”. As demais respostas foram consideradas como “informações não adequadas”.
Foram desenvolvidos seis modelos de regressão de Poisson 4 referentes às seis variáveis dependentes. As variáveis independentes consideradas nos modelos, com suas correspondentes categorias, foram oito: idade (em anos), sexo (masculino; feminino), estado marital (unido; não unido), cor da pele (branca; não branca), escolaridade (até 8 anos; 9 anos ou mais), trabalho remunerado (sim; não), estrato socioeconômico (A/B; C/D) e filhos (algum; nenhum).
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Parecer 545/2008). A participação na pesquisa foi voluntária, mediante assinatura de termo de consentimento livre e esclarecido. Assegurou-se o anonimato das pessoas que responderam o questionário, pois não havia informações que as identificassem.
RESULTADOS
Quase metade da população estudada (46,0%) tinha 35 anos ou mais; 53,0% eram do sexo feminino, 54,0% tinham nove ou mais anos de escolaridade e 59,0% referiram cor da pele não branca. A maioria vivia em união (71,0%), possuía trabalho remunerado (71,0%) e pertencia aos estratos econômicos C e D (62,0%). Pouco mais da metade (54,0%) tinha de um a dois filhos vivos; entre as pessoas que tinham algum filho vivo, 71,0% tinham ao menos um filho e 67,0% ao menos uma filha. A maioria (86,0%) dos (as) entrevistados (as) obteve escore de conhecimento acerca de DST baixo/médio (dados não apresentados em tabela).
Pouco menos de 2/5 dos entrevistados referiram ter ouvido falar sobre o HPV. As fontes de informações mais citadas foram: a mídia (42,0%), escola/faculdade (26,0%) e os serviços de saúde (21,0%). Ginecologistas e amigos/parentes foram citados por 13,0% dos participantes (dados não apresentados em tabela).
Ter ouvido falar sobre o HPV associou-se na análise bivariada a: ser do sexo feminino (45,5%), ter maior nível de escolaridade (49,3% entre as pessoas com nove anos ou mais), pertencer aos estratos socioeconômicos A e B (46,0%) ( Tabela 1 ).
Tabela 1 Conhecimento acerca do HPV por usuários de serviços públicos de saúde, segundo características sociodemográficas. Campinas, SP, 2012. (N = 538)
Variável | Ouviram falar do HPV |
p | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
Sim | Não | |||||
| ||||||
n | % | n | % | |||
Idade (anos) | 0,058 | |||||
18 a 24 | 36 | 30,5 | 82 | 69,5 | ||
25 a 34 | 76 | 44,2 | 96 | 55,8 | ||
35 ou mais | 92 | 37,1 | 156 | 62,9 | ||
Sexo | < 0,001 | |||||
Masculino | 74 | 29,4 | 178 | 70,6 | ||
Feminino | 130 | 45,5 | 156 | 54,5 | ||
Escolaridade (anos) | < 0,001 | |||||
0 a 8 | 60 | 24,4 | 186 | 75,6 | ||
9 ou mais | 144 | 49,3 | 148 | 50,7 | ||
Estado marital | 0,512 | |||||
Unido | 141 | 36,9 | 241 | 63,1 | ||
Não unido | 63 | 40,4 | 93 | 59,6 | ||
Cor da pele | 0,272 | |||||
Branca | 90 | 40,9 | 130 | 59,1 | ||
Não branca | 114 | 35,8 | 204 | 64,2 | ||
Religião | 0,480 | |||||
Alguma | 183 | 37,4 | 306 | 62,6 | ||
Nenhuma | 21 | 43,8 | 27 | 56,2 | ||
Total de filhos vivos | 0,433 | |||||
Nenhum | 52 | 41,9 | 72 | 58,1 | ||
De 1 a 2 | 103 | 35,6 | 186 | 64,4 | ||
≥ 3 | 49 | 39,8 | 74 | 60,2 | ||
Sexo dos filhos | 0,685 | |||||
Masculino | 47 | 34,1 | 91 | 65,9 | ||
Feminino | 46 | 39,0 | 72 | 61,0 | ||
Ambos | 59 | 37,8 | 97 | 62,2 | ||
Trabalho remunerado | > 0,999 | |||||
Sim | 142 | 37,8 | 234 | 62,2 | ||
Não | 59 | 37,6 | 98 | 62,4 | ||
Estrato socioeconômico | 0,004 | |||||
A, B | 93 | 46,0 | 109 | 54,0 | ||
C, D | 111 | 33,1 | 224 | 66,9 |
Pouco mais de 1/4 dos participantes referiram informações adequadas sobre o HPV, e as variáveis associadas na análise bivariada foram: ser do sexo feminino (37,2%), ter maior nível de escolaridade (39,9% entre as pessoas com nove anos ou mais) e pertencer aos estratos socioeconômicos A e B (35,7%) ( Tabela 2 ).
Tabela 2 Conhecimento acerca do HPV de usuários de serviços públicos de saúde, segundo características sociodemográficas e adequação do conhecimento. Campinas, SP, 2012.
Menos de 9,0% dos participantes referiram ter ouvido falar das vacinas contra o HPV. A principal fonte de informação citada foi a mídia (mencionada por 29 pessoas); médico ginecologista (cinco participantes) e uma pessoa referiu posto/centro de saúde. Quando questionados acerca do que ouviram sobre as vacinas, 11 dos participantes que sabiam de sua existência referiram: que elas protegem e/ou previnem contra o HPV, que estão em fase de testes e que só existem na rede privada e que, portanto, seu custo é alto. Seis entrevistados referiram que as vacinas estão indicadas só para adolescentes; dezenove consideravam que essas vacinas devem ser recebidas pelas pessoas que já tiveram relações sexuais; nove referiram que deveriam ser ministradas a todas as mulheres, independentemente da idade, e o mesmo número de participantes referiu que todos os homens deveriam receber essas vacinas. Oito participantes opinaram que todas as pessoas que não tiveram relações sexuais deveriam ser vacinadas e seis referiram que elas se destinam às mulheres adolescentes. Vinte e cinco entrevistados referiram que as vacinas devem ser aplicadas entre os nove e 14 anos; 19 acreditavam que elas estão indicadas para as idades entre 15 e 18 anos. Um entrevistado referiu que as vacinas devem ser aplicadas logo nos primeiros meses de vida, e outro afirmou que deveriam ser dadas quando a criança tem um ano de idade (dados não apresentados em tabela).
A escolaridade e o estrato socioeconômico foram as variáveis associadas a ter ouvido falar das vacinas contra o HPV na análise bivariada. Os participantes com nove anos ou mais de estudo e os pertencentes aos estratos A/B foram os que mais referiram ter ouvido falar da vacina ( Tabela 3 ).
Tabela 3 Conhecimento acerca das vacinas contra o HPV disponíveis no Brasil por usuários de serviços públicos de saúde, segundo características sociodemográficas e conhecimento de HPV. Campinas, SP, 2012. (N = 538)
Variável | Ouviram falar sobre a vacina |
p | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
Sim | Não | |||||
| ||||||
n | % | n | % | |||
Idade (anos) | 0,310 | |||||
18 a24 | 6 | 5,1 | 112 | 94,9 | ||
25 a 34 | 16 | 9,3 | 156 | 90,7 | ||
35 ou mais | 24 | 9,7 | 224 | 90,3 | ||
Sexo | 0,062 | |||||
Masculino | 15 | 6,0 | 237 | 94,0 | ||
Feminino | 31 | 10,8 | 255 | 89,2 | ||
Escolaridade (anos) | < 0,001 | |||||
0 a 8 | 10 | 4,1 | 236 | 95,9 | ||
9 a 11 | 36 | 12,3 | 256 | 87,7 | ||
Estado marital | 0,157 | |||||
Unido | 28 | 7,5 | 354 | 92,7 | ||
Não unido | 18 | 11,5 | 138 | 88,5 | ||
Cor da pele | 0,141 | |||||
Branca | 24 | 10,9 | 196 | 89,1 | ||
Não branca | 22 | 6,9 | 296 | 93,1 | ||
Religião | 0,590 | |||||
Alguma | 41 | 8,4 | 448 | 91,6 | ||
Nenhuma | 5 | 10,5 | 43 | 89,6 | ||
Total de filhos vivos | 0,296 | |||||
Nenhum | 14 | 11,3 | 110 | 88,7 | ||
1 ou mais | 32 | 7,8 | 380 | 92,2 | ||
Sexo dos filhos | 0,131 | |||||
Masculino | 6 | 4,3 | 132 | 95,7 | ||
Feminino | 13 | 11,0 | 105 | 89,0 | ||
Ambos | 13 | 8,3 | 143 | 91,7 | ||
Trabalho remunerado | 0,549 | |||||
Sim | 34 | 9,0 | 342 | 91,0 | ||
Não | 11 | 7,0 | 146 | 93,0 | ||
Estrato socioeconômico | 0,049 | |||||
A, B | 24 | 11,9 | 178 | 88,1 | ||
C, D | 22 | 6,6 | 313 | 93,4 |
A maioria das pessoas que tinham ouvido falar das vacinas, disse que se vacinaria caso a vacina estivesse disponível na rede pública de saúde (94,0%) e vacinaria o filho (95,0%). Entre as 12 que referiram que não se vacinariam, os motivos citados foram: cinco acreditavam que não tinham risco de contrair uma DST, duas não tinham múltiplos parceiros, duas tinham necessidade de maiores informações sobre a vacina; e uma, por ser algo novo. O motivo mais citado para não vacinar um filho adolescente foi que a decisão caberia ao filho (sete pessoas). Dois participantes referiram que vacinariam uma filha e uma pessoa disse que vacinaria um filho somente se houvesse indicação médica (dados não apresentados em tabela). Não se observaram variáveis associadas à intenção de se vacinar e de vacinar o filho na análise bivariada ( Tabela 4 ).
Tabela 4 Intenção de usuários de serviços públicos de saúde de se vacinarem e vacinarem filhos adolescentes contra o HPV se as vacinas estiverem disponíveis nesses serviços segundo características sociodemográficas. Campinas, SP, 2012.
Variável | Se vacinariam | Vacinaria uma filha | Vacinaria um filho | |||||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| ||||||||||||||||
Sim | Não | p | Sim | Não | p | Sim | Não | p | ||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | |||||
Idade (anos) | a | a | a | |||||||||||||
18 a 24 | 32 | 91,4 | 3 | 8,6 | 33 | 94,3 | 2 | 5,7 | 33 | 91,7 | 3 | 8,3 | ||||
25 a 34 | 74 | 97,4 | 2 | 2,6 | 73 | 97,3 | 2 | 2,7 | 73 | 97,3 | 2 | 2,7 | ||||
35 ou mais | 85 | 92,4 | 7 | 7,6 | 86 | 93,5 | 6 | 6,5 | 86 | 93,5 | 6 | 6,5 | ||||
Sexo | 0,543b | 0,750b | 0,534b | |||||||||||||
Masculino | 70 | 95,9 | 3 | 4,1 | 69 | 94,5 | 4 | 5,5 | 69 | 93,2 | 5 | 6,8 | ||||
Feminino | 121 | 93,1 | 9 | 6,9 | 123 | 95,3 | 6 | 4,7 | 123 | 95,3 | 6 | 4,7 | ||||
Escolaridade (anos) | 0,752 | 1,000 | 1,000 | |||||||||||||
0 a 8 | 56 | 93,3 | 4 | 6,7 | 57 | 95,0 | 3 | 5,0 | 57 | 95,0 | 3 | 5,0 | ||||
9 ou mais | 135 | 94,4 | 8 | 5,6 | 135 | 95,1 | 7 | 4,9 | 135 | 94,4 | 8 | 5,6 | ||||
Estado marital | 0,758b | 0,180b | 0,316b | |||||||||||||
Unido | 131 | 93,6 | 9 | 6,4 | 135 | 96,4 | 5 | 3,6 | 135 | 95,7 | 6 | 4,3 | ||||
Não unido | 60 | 95,2 | 3 | 4,8 | 57 | 91,9 | 5 | 8,1 | 57 | 91,9 | 5 | 8,1 | ||||
Cor da pele | 0,914 | 0,346 | 0,543b | |||||||||||||
Branca | 84 | 93,3 | 6 | 6,7 | 84 | 93,3 | 6 | 6,7 | 84 | 93,3 | 6 | 6,7 | ||||
Não branca | 107 | 94,7 | 6 | 5,3 | 108 | 96,4 | 4 | 3,6 | 108 | 95,6 | 5 | 4,4 | ||||
Religião | 1,000 | 0,603 | 0,609 | |||||||||||||
Alguma | 171 | 94,0 | 11 | 6,0 | 171 | 94,5 | 10 | 5,5 | 171 | 94,0 | 11 | 6,0 | ||||
Nenhuma | 20 | 95,2 | 1 | 5,8 | 21 | 100,0 | 0 | 0 | 21 | 100,0 | 0 | 0 | ||||
Total de filhos vivos | a | a | a | |||||||||||||
Nenhum | 50 | 98,0 | 1 | 2,0 | 47 | 94,0 | 3 | 6,0 | 48 | 94,1 | 3 | 5,9 | ||||
De 1 a 2 | 95 | 92,2 | 8 | 7,8 | 98 | 95,1 | 5 | 4,9 | 97 | 94,2 | 6 | 5,8 | ||||
≥ 3 | 46 | 93,9 | 3 | 6,1 | 47 | 95,9 | 2 | 4,1 | 47 | 95,9 | 2 | 4,1 | ||||
Sexo dos filhos | 0,637 | 0,531 | 0,530 | |||||||||||||
Masculino | 45 | 95,7 | 2 | 4,3 | 45 | 95,7 | 2 | 4,3 | 44 | 93,6 | 3 | 6,4 | ||||
Feminino | 42 | 91,3 | 4 | 8,7 | 45 | 97,8 | 1 | 2,2 | 45 | 97,8 | 1 | 2,2 | ||||
Ambos | 54 | 91,5 | 5 | 8,5 | 55 | 93,2 | 4 | 6,8 | 55 | 93,2 | 4 | 6,8 | ||||
Trabalho remunerado | 0,342b | 0,487b | 0,306b | |||||||||||||
Sim | 134 | 95,0 | 7 | 5,0 | 134 | 95,7 | 6 | 4,3 | 135 | 95,7 | 6 | 4,3 | ||||
Não | 54 | 91,5 | 5 | 8,5 | 55 | 93,2 | 4 | 6,8 | 54 | 91,5 | 5 | 8,5 | ||||
Estrato socioeconômico | 0,073 | 0,115b | 0,116b | |||||||||||||
A, B | 91 | 97,8 | 2 | 2,2 | 90 | 97,8 | 2 | 2,2 | 90 | 97,8 | 2 | 2,2 | ||||
C, D | 100 | 90,9 | 10 | 9,1 | 102 | 92,7 | 8 | 7,3 | 102 | 91,9 | 9 | 8,1 | ||||
Escore de conhecimento HPV | a | a | a | |||||||||||||
Baixo | 9 | 81,8 | 2 | 18,2 | 10 | 90,9 | 1 | 9,1 | 11 | 91,7 | 1 | 8,3 | ||||
Médio | 103 | 97,2 | 3 | 2,8 | 101 | 96,2 | 4 | 3,8 | 101 | 96,2 | 4 | 3,8 | ||||
Alto | 76 | 91,6 | 7 | 8,4 | 79 | 95,2 | 4 | 4,8 | 78 | 94,0 | 5 | 6,0 | ||||
Escore de conhecimento DST | 0,736b | 0,240b | 0,274b | |||||||||||||
Baixo/Médio | 148 | 94,3 | 9 | 5,7 | 150 | 96,2 | 6 | 3,8 | 150 | 95,5 | 7 | 4,5 | ||||
Alto | 43 | 93,5 | 3 | 6,5 | 42 | 91,3 | 4 | 8,7 | 42 | 91,3 | 4 | 8,7 |
O modelo de regressão de Poisson mostrou a associação entre ter ouvido falar sobre o HPV e maior escolaridade ( > 8 anos) e ser do sexo feminino. Essas variáveis também associaram-se com possuir informações adequadas acerca do HPV. Escolaridade (> 8 anos), idade (maior) e sexo (feminino) associaram-se independentemente a ter ouvido falar das vacinas, mas não se identificaram variáveis independentemente associadas à intenção de vacinar-se e/ou de vacinar um filho ( Tabela 5 ).
Tabela 5 Variáveis associadas ao conhecimento sobre HPV, a adequação do conhecimento, ao conhecimento acerca das vacinas e à intenção de se vacinar e de vacinar filhos (análise múltipla por regressão de Poisson). Campinas, SP, 2012.
Modelo/Variável | RP | IC95% | p | ||
---|---|---|---|---|---|
Modelo 1: Ouviu falar do HPV (N = 538) | |||||
Escolaridade (> 8 anos) | 2,04 | 1,51;2,75 | < 0,001 | ||
Sexo Feminino | 1,57 | 1,18;2,08 | 0,002 | ||
Modelo 2: Conhecimento adequado sobre o HPV (DST e/ou câncer e/ou verruga) (N = 494) | |||||
Escolaridade (> 8 anos) | 2,52 | 1,73;3,67 | < 0,001 | ||
Sexo Feminino | 1,88 | 1,33;2,67 | < 0,001 | ||
Modelo 3: Conhece ou já ouviu falar em vacinas para proteger do HPV (N = 538) | |||||
Escolaridade (> 8 anos) | 3,56 | 1,75;7,23 | < 0,001 | ||
Idade (anos) | 1,04 | 1,01;1,07 | 0,011 | ||
Sexo: feminino | 2,16 | 1,14;4,08 | 0,017 | ||
Modelo 4: Intenção de se vacinar | |||||
Sem variáveis associadas | |||||
Modelo 5: Intenção de vacinara filha | |||||
Sem variáveis associadas | |||||
Modelo 6: Intenção de vacinar o filho | |||||
Sem variáveis associadas |
DISCUSSÃO
A maior parte das pessoas entrevistadas nunca tinha ouvido falar do HPV e nem das vacinas hoje disponíveis no Brasil, sendo menor a proporção de pessoas com informações adequadas acerca do vírus e das consequências da infecção. Isso confirma a literatura, mostrando que o conhecimento sobre o HPV é inadequado para diversas populações. 1 , 5 , 6 , 13 , 17 Como em outros estudos, 6 , 16 mulheres e pessoas com maior escolaridade referiram com maior frequência ter ouvido falar do HPV e apresentavam conhecimento mais adequado a respeito dele.
Esses resultados reforçam a necessidade de intervenções educativas na população para prover informação adequada sobre o HPV e sobre medidas de prevenção. 17 Isso significa não apenas selecionar e transmitir informações cientificamente corretas sobre o HPV, mas fazê-lo de acordo com a capacidade dos diferentes estratos sociais acessarem e processarem tais informações. Esta tem sido uma crescente preocupação no âmbito da saúde pública, inclusive nos países desenvolvidos. 22 Não há dúvida, porém, de que essa tarefa representa um grande desafio em vista das desigualdades sociais que prevalecem em nosso meio, especialmente no âmbito da educação. A média de escolaridade da população não atinge sequer os oito anos do nível fundamental e e existe enorme proporção de analfabetos funcionais. f No âmbito do SUS, a educação em saúde é uma tarefa atribuída principalmente ao nível da atenção básica. Espera-se que se faça a promoção da saúde de acordo com o princípio da integralidade da atenção. Isso implica trabalhar com toda a população e não apenas com as pessoas em risco de adoecer ou que estão doentes. Entretanto, essa abordagem enfrenta obstáculos para se concretizar, tanto por falhas na formação dos profissionais de saúde quanto pelas expectativas da população de que as unidades de saúde atuem como centros de atendimento à doença em seu cotidiano. 15
A mídia exerce papel preponderante em comparação com a atuação dos serviços e dos profissionais de saúde como fonte de informação acerca do HPV e das vacinas. A proporção de pessoas que apontou a mídia como fonte de informação sobre o HPV foi o dobro dos que mencionaram posto/centro de saúde. A diferença foi ainda maior em relação às vacinas. O SUS encontra dificuldades para cumprir sua missão quanto à educação em saúde e às ações de prevenção. Embora um dos pilares da concepção do SUS seja o conceito de integralidade da atenção, as ações preventivas não se desenvolvem consistentemente em todas as suas áreas de atuação. 21 Porém, mesmo com o amplo acesso à mídia nos dias atuais, nem sempre as mensagens transmitidas são adequadas e/ou suficientes para levar as pessoas a adotarem condutas de prevenção. Isso pode ocorrer por desinformação dos próprios meios de comunicação ou por dificuldades de interpretação das pessoas que recebem as mensagens midiáticas. 22
Este estudo aponta para diferenças de gênero sobre a saúde sexual. Embora se tenha enfatizado a necessidade de incluir os homens nas iniciativas em saúde sexual e reprodutiva, especialmente nas últimas décadas, as mulheres tendem a ser as que mais buscam informações sobre os diversos temas nessa área. Os homens mantêm postura mais distante e resistente a comportamentos preventivos. 18 Em países como o Brasil, onde prevalecem relações de gênero mais tradicionais, a educação dos homens em relação aos temas inerentes à saúde sexual e reprodutiva continua a ser um desafio. Não raro, tende-se a focar as iniciativas quase que exclusivamente sobre as mulheres. 19 Em relação à prevenção da contaminação pelo HPV, isso representa um risco para os homens, mas também, e com maior intensidade, para as mulheres. 8 , 11
A proporção de homens e mulheres que tinham ouvido falar das vacinas contra o HPV foi baixa. Talvez porque, embora duas vacinas estejam aprovadas no Brasil, por ocasião da pesquisa, só estavam disponíveis na rede privada.
Os resultados deste estudo indicaram que a maioria dos entrevistados se vacinaria e vacinaria um filho ou uma filha se a vacina estivesse disponível na rede pública de saúde. Isso é coerente ao observado por Fregnani et al 10 em estudo realizado em outra cidade do interior do Estado de São Paulo, no qual a vacina quadrivalente foi oferecida a alunas da rede pública e privada de educação que frequentavam a sexta e sétima série do ensino fundamental. Cerca de 92,0% dos pais autorizaram a vacinação das filhas depois de serem esclarecidos a respeito da vacina. Disposição semelhante de vacinar os filhos foi observada entre mulheres da Argentina, em estudo realizado antes que a vacina fosse incluída no programa público de imunização daquele país, em 2011. 2 Recente revisão da literatura 24 apontou que, logo após a aprovação das vacinas pela Food and Drug Administration (FDA-USA) em 2006, os estudos realizados principalmente na Europa e nos Estados Unidos indicaram que houve crescimento na intenção dos pais vacinarem seus filhos chegando a 80,0% em 2008. Porém, essa proporção diminuiu e chegou a 41,0% em 2011. Nessa mesma revisão da literatura, os autores apontaram que se evidenciou receio dos pais em relação à segurança das vacinas e o desejo de obter mais informações antes de tomarem uma decisão sobre vacinar ou não os filhos. Pitts & Tufts 20 encontraram esse mesmo tipo de preocupação em estudo realizado no estado da Virgínia (USA), o primeiro estado norte-americano a tornar obrigatória a vacina contra o HPV nas escolas públicas em 2009. Neste estudo, porém, não se identificaram variáveis associadas à intenção de se vacinar e de vacinar os filhos. Talvez isso tenha ocorrido porque o tamanho da amostra não foi calculado com o objetivo de avaliar essa possível associação.
Os resultados do presente estudo não podem ser generalizados para homens e mulheres adultos, pois a amostra não foi probabilística, tampouco de base populacional, mas, sim, específica de usuários de serviços públicos de saúde em uma grande cidade do Estado de São Paulo, região sudeste, a mais desenvolvida do País. Entretanto, uma vez que mais de 70,0% da população brasileira depende do SUS para os cuidados com saúde, 12 acreditamos que os resultados deste estudo sejam úteis para indicar a necessidade de ações educativas sobre o HPV com mulheres e homens e usuários das unidades básicas de saúde, justamente a maior parcela da população.
Os resultados desta pesquisa sugerem que há boa receptividade para as vacinas contra o HPV na população usuária do SUS, porém, essa potencial aceitabilidade convive com a falta de informação e/ou com informações inadequadas. Uma vez que o Ministério da Saúde vai incluir a vacina quadrivalente no Programa Nacional de Imunização a partir de 2014, para meninas de dez e onze anos, é necessário melhorar o acesso da população em geral a informações adequadas e significativas sobre o HPV, as consequências da infecção e sobre as vacinas.
DESTAQUES
O vírus do Papiloma Humano (HPV) é reconhecido como o causador do câncer de colo de útero e tem sido relacionado a vários outros tipos de câncer. Estudos com mulheres de diversas regiões do Brasil apontam significativa prevalência de HPV, mesmo entre mulheres assintomáticas. Entretanto, poucos estudos, realizados com pequenas amostras, indicam que a maior parte das mulheres e dos homens tem pouco conhecimento sobre o HPV e suas consequências, o que dificulta a adoção de medidas preventivas. Adicionalmente, as vacinas (bivalente e quadrivalente) contra esse vírus estão disponíveis no Brasil há poucos anos e, até então, somente no setor privado de saúde. Em 2014, o Ministério da Saúde do Brasil incluirá a vacina quadrivalente no Programa Nacional de Imunização para meninas de 10 e 11 anos. Nesse cenário, é importante conhecer o que a população sabe sobre o HPV, sobre as consequências da infecção e qual a possível aceitabilidade da vacina pelos pais. Essas informações são úteis para desenhar estratégias de educação em saúde e estímulo à vacinação.
Os resultados da pesquisa mostram que a maior parte das pessoas entrevistadas nunca tinha ouvido falar do HPV e nem das vacinas disponíveis no Brasil. Menor ainda foi a proporção das que tinham informações adequadas acerca do HPV e das consequências da infecção. Entretanto, a grande maioria dos entrevistados disse que vacinaria uma filha adolescente se a vacina estivesse disponível no sistema público de saúde.
Os resultados reforçam a necessidade de haver intervenções educativas na população para prover informação adequada sobre o HPV e medidas de prevenção.
Profa. Rita de Cássia Barradas Barata Editora Científica