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Influência dos sintomas de ansiedade e depressão na qualidade de vida em pacientes submetidos à artrodese de coluna lombar Trabalho desenvolvido na Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, SC, Brasil.

RESUMO

Objetivo:

Análise comparativa da qualidade de vida e funcionalidade dos pacientes submetidos a artrodese de coluna lombar devido a doença degenerativa da coluna lombar. Os autores buscaram correlacionar a influência dos sintomas de ansiedade e depressão antes e após a cirurgia.

Métodos:

Estudo de coorte prospectivo, que acompanhou 32 pacientes submetidos à artrodese por doença degenerativa da coluna lombar e aplicou os questionários escala visual analógica da dor (EVA), Oswestry Disability Index (ODI), Medical Outcomes Survey Short Form - 36 items (SF-36) e Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS). Esses questionários foram aplicados no período pré-operatório e quatro meses após o procedimento.

Resultados:

Observou-se melhoria nas médias das pontuações das escalas EVA (p < 0,001) e ODI (p < 0,001). No pré-operatório, as variáveis que apresentaram diferença entre pacientes com e sem sintomas ansiosos foram os domínios de SF36 de estado geral de saúde (p = 0,031), aspectos sociais (p = 0,008) e saúde mental (p = 0,035). No pós-operatório, os pacientes sem sintomas de ansiedade demonstraram melhores resultados nos domínios vitalidade (p = 0,004), aspectos sociais (p = 0,001), saúde mental (p < 0,001) e dor (p = 0,011). No pré-operatório, a variável que apresentou diferença entre pacientes com e sem depressão foi o domínio do SF36 de aspectos emocionais (p = 0,022). No pós-operatório os pacientes sem depressão apresentaram melhores resultados nos domínios dor (p = 0,009), estado geral de saúde (p = 0,001), vitalidade (p < 0,001), aspectos sociais (p < 0,001), aspectos emocionais (p = 0,004) e saúde mental (p = 0,001).

Conclusão:

A artrodese de coluna lombar mostrou-se efetiva na melhoria da dor, lombalgia, capacidade funcional, limitação por aspectos físicos e vitalidade, bem como em aspectos sociais e emocionais. Pacientes sem sintomas ansiosos e depressivos apresentaram melhores resultados nas escalas avaliadas quando comparados com aqueles com sintomas de ansiedade e depressão.

Palavras-chave:
Artrodese; Qualidade de vida; Dor lombar; Depressão; Ansiedade

ABSTRACT

Objective:

Comparative analysis of the quality of life and functionality of patients undergoing lumbar spine arthrodesis due to degenerative lumbar spine disease. The authors sought to correlate the influence of anxious and depressive symptoms before and after surgery.

Methods:

A prospective cohort study was performed, with 32 patients submitted to arthrodesis due to degenerative lumbar spine disease and the visual analogue pain scale pain questionnaire, the Oswestry Disability Index questionnaire, the Medical Outcomes Survey Short Form questionnaire - 36 items (SF-36), and the Hospital Anxiety and Depression Scale, applied in the preoperative period and four months after the procedure.

Results:

There was improvement in the mean scores of the visual analogue pain scale (p < 0.001) and the Oswestry Disability Index (p < 0.001). In the preoperative period, the variables that presented a difference between patients with and without anxiety symptoms were the SF-36 domains of general health (p = 0.031), social aspects (p = 0.008), and mental health (p = 0.035). In the postoperative period, patients without anxiety symptoms showed better results in the vitality (p = 0.004), social aspects (p = 0.001), mental health (p < 0.001), and pain (p = 0.011) domains. In the preoperative period, the variable that presented a difference between patients with and without depression was the SF-36 domain of emotional aspects (p = 0.022). In the post-operative period, patients without depression presented better vitality (p < 0.001), social aspects (p < 0.001), emotional aspects (p = 0.004), and mental health results (p = 0.001).

Conclusion:

Lumbar spine arthrodesis was effective in improving pain, low back pain, functional capacity, limitation due to physical aspects, vitality, and social and emotional aspects. Patients without anxiety and depression symptoms had better results on the scales compared to those with such symptoms.

Keywords:
Arthrodesis; Quality of life; Low back pain; Depression; Anxiety

Introdução

Define-se lombalgia como dor, tensão muscular ou rigidez, estabelecida abaixo do gradil costal e acima da prega glútea inferior, pode estar associada à dor irradiada para os membros inferiores.11 Koes BW, van Tulder MW, Thomas S. Diagnosis and treatment of low back pain. BMJ. 2006;332(7555):1430-4.,22 Airaksinen O, Brox JI, Cedraschi C, Hildebrandt J, Klaber- Moffett J, Kovacs F, et al. European guidelines for the management of chronic nonspecific low back pain. Eur Spine J. 2006;15 Suppl. 2:S192-300 (chapter 4). As dores lombares são causa de 50% de todas as doenças musculoesqueléticas crônicas e afetam 70% da população em países desenvolvidos.33 Fransen M, Woodward M, Norton R, Coggan C, Dawe M, Sheridan N. Risk factors associated with the transition from acute to chronic occupational back pain. Spine (Phila Pa 1976). 2002;27(1):92-8.,44 Speed C. Low back pain. BMJ. 2004;328(7448):1119-21. Responsáveis por grande parte das consultas médicas ortopédicas, hospitalizações e cirurgias, ocorrem principalmente em homens maiores de 40 anos e mulheres acima dos 50.55 Marras WS. Occupational low back disorder causation and control. Ergonomics. 2000;43(7):880-902. Dentre os pacientes acometidos por essa doença, 16,4 a 73,3% apresentam depressão, normalmente associada a piores resultados pós-operatórios.66 Fanian H, Ghassemi GR, Jourkar M, Mallik S, Mousavi MR. Psychological profile of Iranian patients with low- back pain. East Mediterr Health J. 2007;13(2):335-46.,77 Currie SR, Wang J. Chronic back pain and major depression in the general Canadian population. Pain. 2004;107(1-2):54-60.

A artrodese de coluna lombar consiste em um procedimento cirúrgico usado para o tratamento de lombalgias e lombociatalgias por doenças degenerativas avançadas e que falharam ao tratamento clínico.88 DeBerard MS, LaCaille RA, Spielmans G, Colledge A, Parlin MA. Outcomes and presurgery correlates of lumbar discectomy in Utah Workers' Compensation patients. Spine J. 2009;9(3):193-203.,99 Atlas SJ, Tosteson TD, Blood EA, Skinner JS, Pransky GS, Weinstein JN. The impact of workers' compensation on outcomes of surgical and nonoperative therapy for patients with a lumbar disc herniation: SPORT. Spine (Phila Pa 1976). 2010;35(1):89-97. Não existe boa correlação entre os achados clínicos e a gravidade da doença notada pelos pacientes em relação aos sintomas dolorosos e à incapacidade funcional.1010 Michel A, Kohlmann T, Raspe H. The association between clinical findings on physical examination and self- reported severity in back pain. Results of a population-based study. Spine (Phila Pa 1976). 1997;22(3):296-303. Diversos instrumentos têm sido propostos para verificar a qualidade de vida, os aspectos psicológicos e a capacidade funcional nos pacientes com doenças vertebrais.1111 Vigatto R, Alexandre NM, Correa Filho HR. Development of a Brazilian Portuguese version of the Oswestry Disability Index: cross- cultural adaptation, reliability, and validity. Spine (Phila Pa 1976). 2007;32(4):481-6.

12 Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Tradução para a língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação de qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50.

13 Cook C, Richardson JK, Braga L, Menezes A, Soler X, Kume P, et al. Cross- cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the Neck Disability Index and Neck Pain and Disability Scale. Spine (Phila Pa 1976). 2006;31(14):1621-7.

14 Deyo RA, Battie M, Beurskens AJ, Bombardier C, Croft P, Koes B, et al. Outcome measures for low back pain research. A proposal for standardized use. Spine (Phila Pa 1976). 1998;23(18):2003-13.
-1515 Fairbank JC, Couper J, Davies JB, O'Brien JP. The Oswestry low back pain disability questionnaire. Physiotherapy. 1980;66(8):271-3.

Estudos têm avaliado a repercussão do procedimento cirúrgico para as doenças da coluna lombar na qualidade de vida e funcionalidade dos pacientes, porém ainda há necessidade de complementar esses dados, correlacioná-los com o estado depressivo ou ansioso preexistentes e a evolução pós-operatória.1010 Michel A, Kohlmann T, Raspe H. The association between clinical findings on physical examination and self- reported severity in back pain. Results of a population-based study. Spine (Phila Pa 1976). 1997;22(3):296-303.,1616 Noshchenko A, Hoffecker L, Lindley EM, Burger EL, Cain CM, Patel VV. Perioperative and long-term clinical outcomes for bone morphogenetic protein versus iliac crest bone graft for lumbar fusion in degenerative disk disease: systematic review with meta- analysis. J Spinal Disord Tech. 2014;27(3):117-35. Este trabalho tem como objetivo avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde e à funcionalidade dos pacientes antes e após o procedimento de artrodese posterolateral de coluna com instrumentação e correlacionar a influência dos sintomas de ansiedade e depressão antes e após a cirurgia.

Material e métodos

O presente estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da nossa instituição, sob o parecer número 1.248.210.

Delineamento, amostra, critérios de inclusão e exclusão

Feito estudo observacional de coorte prospectivo de outubro de 2015 a abril de 2016. Entrevistados 32 pacientes com indicação de artrodese de coluna por doença degenerativa da coluna lombar conforme critérios de inclusão e exclusão abaixo, que aguardavam vaga para cirurgia pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Feita então uma amostragem por conveniência. As cirurgias foram feitas pelo serviço de ortopedia do Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC).

Foram incluídos os pacientes acima de 18 anos com indicação de cirurgia devido a doença degenerativa na coluna com queixas de dor axial e/ou dor radicular refratárias ao tratamento clínico. Foram excluídos os que fizeram o procedimento por trauma, tumor ou revisão de artrodese de coluna lombar, aqueles que não concordaram em ser submetidos à pesquisa e analfabetos. Após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), todos os pacientes responderam aos questionários. Informações a respeito dos pacientes quanto a idade, sexo, gênero, estado civil, tempo de duração dos sintomas e de tratamento, assim como o desejo de volta laboral e auxílio doença, foram coletadas no momento do recrutamento para avaliação pré-operatória. Todos os questionários foram aplicados no pré-operatório e quatro meses após o procedimento.

Instrumentos

O primeiro questionário incluiu a escala visual analógica de dor (EVA) de 0 (zero) a 10 (dez), na qual 0 significa sem dor, 5 dor média e 10 dor insuportável, os pesquisados foram orientados a assinalar a intensidade máxima de sua dor no momento da entrevista.1717 Huskisson EC. Measurement of pain. Lancet. 1974;2(7889):1127-31. A limitação funcional pela lombalgia foi avaliada pela escala The Oswestry Disability Index (ODI), validada para a língua portuguesa.1111 Vigatto R, Alexandre NM, Correa Filho HR. Development of a Brazilian Portuguese version of the Oswestry Disability Index: cross- cultural adaptation, reliability, and validity. Spine (Phila Pa 1976). 2007;32(4):481-6. A escala consiste de dez questões com seis opções para escolha, cujo valor varia de 0 a 5. A primeira questão avalia a intensidade da dor e as outras nove o efeito da dor do paciente em atividades diárias, como ocupar-se dos cuidados pessoais (vestir-se, tomar banho, por exemplo), levantar pesos, caminhar, sentar, ficar de pé, dormir, locomover-se e ter vida sexual e social. O escore total da escala é dividido por 50 se o paciente respondeu todos os itens ou por 45 se o paciente não respondeu um item (vida sexual, por exemplo), o resultado é multiplicado por 100. O resultado é expresso em porcentagem e vai de 0, para paciente sem incapacidade, até 100%, para paciente com incapacidade máxima. Os valores são classificados em incapacidade mínima (0 a 20%), incapacidade moderada (21 a 40%), incapacidade severa (41 a 60%), inválido (61 a 80%) e restrito ao leito ou com exagero dos sintomas (81 a 100%).

A qualidade de vida foi avaliada pelo questionário Medical Outcomes Survey Short Form - 36 items (SF-36) em sua versão adaptada para o Brasil, composto por 36 itens, agrupados em oito escalas ou domínios.1212 Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Tradução para a língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação de qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50. Nesses, incluem-se: capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais, saúde mental e uma questão que permite avaliação comparativa entre a avaliação da condição de saúde atual do indivíduo e a condição há um ano. Na segunda etapa do cálculo é necessário encontrar o raw score (termo usado pois o valor não representa unidade de medida). É preciso transformar os valores das questões em notas para cada um dos oito domínios do questionário. Os domínios variam de 0 a 100, nos quais 0 é pior e 100 é melhor. Quanto mais perto do 100, melhor está a qualidade de vida da pessoa naquele domínio e quanto mais próximo do 0, pior. Portanto, cada um dos domínios é normatizado em uma escala de zero a 100. Baixos valores numéricos refletem pior qualidade de vida relacionada à saúde.

Por fim a presença de sintomas de ansiedade e depressão foi avaliada por meio das subescalas Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS), constituída por 14 itens: sete voltados para avaliação da ansiedade (HAD-A) e sete para avaliação da depressão (HAD-D).1818 Botega NJ, Bio MR, Zomignani MA, Garcia C Jr, Pereira WA. Mood disorders among inpatients in ambulatory and validation of the anxiety and depression scale HAD. Rev Saúde Pública. 1995;29(5):355-63. A avaliação da ansiedade é feita por meio de perguntas sobre sentimento de tensão, medo, preocupações, sensação de relaxamento, inquietude e pânico. A avaliação da depressão é feita por questionamentos sobre sentimentos de alegria, lentidão para pensar e fazer atividades, humor, motivação, vaidade, esperança e prazer em atividades comuns. Cada um dos itens pode ser pontuado de 0 a 3, com um máximo de 21 pontos para cada escala, são classificados para ansiedade os valores de 0 a 8 para a categoria “sem sintomas” e de 9 ou mais para a categoria “com sintomas”. Para depressão os valores são de 0 a 9 para a categoria “sem sintomas” e 10 ou mais para a categoria “com sintomas”.

Técnica cirúrgica

Os pacientes fizeram o procedimento com a mesma equipe cirúrgica. Após a anestesia geral os pacientes foram posicionados em decúbito ventral horizontal em mesa radiotransparente. Incisão mediana lombar e dissecção até plano ósseo. Instrumentação da coluna vertebral com parafusos pediculares. Descompressão neurológica com laminectomia, foraminotomia e/ou discectomia. Montadas hastes longitudinais para conectar os parafusos. Colocado enxerto ósseo autólogo posterolateralmente. Sutura por planos, dreno de sucção e curativo.

Processamento dos dados e análise estatística

Os dados foram organizados no software Microsoft Excel e analisados no software SPSS 15.0. As variáveis quantitativas foram descritas por meio de medidas de tendência central e dispersão dos dados. As variáveis qualitativas foram descritas por meio de frequência absoluta e percentual. As diferenças nas proporções em relação à ansiedade e aos sintomas de depressão foram testadas pelo teste de qui-quadrado ou prova exata de Fisher e diferenças de médias nos escores de dor e na escala SF-36 (qualidade de vida) no pré e pós-operatório pelo teste t pareado, conforme adequação dos dados. O nível de significância estatística adotado foi de 5% (valor de p 0,05).

Resultados

A média de idade foi de 50,97 ± 7,46 anos, variação de 35 a 64. A maior parte era do sexo feminino (65,6%), com estado civil predominante de indivíduos casados (78,1%). A maior parte dos pacientes apresentava sintomatologia clínica havia mais de dois anos (75%), assim como usou tratamento medicamentoso e fisioterápico previamente ao procedimento (87,5%) durante um período maior do que dois anos (18,8%) (tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas e clínicas dos pacientes

A tabela 2 demonstra as diferenças médias nas escalas de EVA e Oswestry e nos domínios do SF36 antes e após a cirurgia. As médias nas pontuações das duas primeiras escalas foram significativamente menores no pós-operatório. Essas associações foram estatisticamente significantes (p = 0,000). Por conseguinte, no SF36, os domínios que apresentaram melhoria considerável com significância estatística foram os de capacidade funcional (p = 0,001), limitação por aspectos físicos (p = 0,006), dor (p = 0,000), vitalidade (p = 0,034), aspectos sociais (p = 0,005) e emocionais (p = 0,002).

Tabela 2
Comparação e diferença média das escalas EVA, Oswestry e domínios do SF36

A tabela 3 demonstra que no pré-operatório as variáveis que apresentaram diferença entre pacientes com e sem sintomas ansiosos foram os domínios de SF36 de estado geral de saúde, aspectos sociais e saúde mental. Em seguida, no pós-operatório, os pacientes sem sintomas ansiosos demonstraram melhores resultados nos domínios vitalidade, aspectos sociais, saúde mental e dor.

Tabela 3
Diferença média na pontuação de qualidade de vida e aspectos clínicos entre pacientes com e sem sintomas ansiosos

Por fim, a tabela 4 demonstra que no pré-operatório a única variável que apresentou diferenças entre pacientes com e sem depressão foi o domínio do SF36 de aspectos emocionais; já no pós-operatório os pacientes sem depressão apresentaram melhores resultados nos domínios dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental.

Tabela 4
Diferença média na pontuação de qualidade de vida e aspectos clínicos entre pacientes com e sem sintomas de depressão

Não houve associação entre as variáveis intenção de volta laboral e auxílio doença com os escores dos questionários aplicados, com resultados sem significância estatística (p > 0,05).

Discussão

A dor lombar é uma das grandes causas de afastamento e incapacidade para o trabalho no Brasil, culmina em gastos excessivos pelo sistema de saúde e de previdência.1919 Bulhões JR, Irineu TP, Masini MCG. Eficiência dos métodos fisioterapêuticos de reabilitação no pós-operatório de hérnia de disco lombar. Rev Bras Med. 2008;65(7):206-13. No atual estudo, 62,5% dos pacientes recebem auxílio doença e 21,9% desses não têm intenção de volta laboral, outros 34,4% relatam voltar às atividades econômicas pela necessidade financeira familiar.

Neste trabalho a EVA demonstrou uma queda no nível da dor de 8,47 ± 1,41 para 4,84 ± 3,26, uma vez que a melhoria de dois pontos é considerada satisfatória.2020 Carvalho DSKP. Avaliação da intensidade da dor. Migrâneas Cefaleias. 2006;9:164-8. Milani et al.2121 Milani JP, Martins MRI, Silva EC, Rocha CE. A qualidade de vida no pré e pós-operatório de pacientes portadores de hérnia de disco lombar. J Bras Neurocir. 2009;20(3):345-51. descreveram uma melhoria semelhante com 8,3 ± 1,28 para 4,55 ± 2,25, corroboraram a consequente melhoria da funcionalidade, uma vez que o quadro álgico é incapacitante. Robleda et al.2222 Robleda G, Sillero- Sillero A, Puig T, Gich I, Baños JE. Influence of preoperative emotional state on postoperative pain following orthopedic and trauma surgery. Rev Lat Am Enfermagem. 2014;22(5):785-91. afirmaram que há associação entre ansiedade pré-operatória e a dor pós-operatória, porém no atual estudo não houve relação estatisticamente considerável entre a melhoria álgica do paciente e a presença ou não de sintomas de ansiedade no pré-operatório.

Os questionários que mensuram qualidade de vida são instrumentos que auxiliam a avaliação da eficácia de tratamentos cirúrgicos e a capacidade funcional dos pacientes. Rotineiramente usado com essa finalidade, o SF36 permite avaliar os vários aspectos do bem-estar individual. Observou-se que os pacientes obtiveram melhoria pós-operatória em todos os domínios do SF36 no pós-operatório, porém aqueles com significância estatística foram os de capacidade funcional, limitação por aspectos físicos, dor, vitalidade, aspectos sociais e emocionais. Tais resultados foram semelhantes aos encontrados por Milani et al.,2121 Milani JP, Martins MRI, Silva EC, Rocha CE. A qualidade de vida no pré e pós-operatório de pacientes portadores de hérnia de disco lombar. J Bras Neurocir. 2009;20(3):345-51. que reavaliaram seus pacientes após 60 dias do procedimento e encontraram melhoria estatisticamente comprovada nos domínios de capacidade funcional, aspectos físicos, dor e saúde mental.

Por se tratar de um questionário doença-específica, o ODI torna-se útil para avaliação adequada de doenças lombares e suas respectivas evoluções após tratamentos, é frequentemente usado em estudos em comparação ou não com outros escores.2323 Mirza SK, Deyo RA. Systematic review of randomized trials comparing lumbar fusion surgery to nonoperative care for treatment of chronic back pain. Spine (Phila Pa 1976). 2007;32(7):816-23. O presente estudo constatou um escore no ODI de 67,75% que correspondeu à incapacidade intensa no pré e 45,44% no pós-operatório, resultado esse que vai ao encontro do obtido por Ghizoni et al.,2424 Ghizoni MF, Sakae TM, Bardini E, Felippe A, Souza BC, Danielli L, et al. Aplicação da Escala de Oswestry em pacientes com doença degenerativa da coluna lombar submetidos à artrodese Application of the Oswestry Scale in patients with degenerative lumbar spine underwent arthrodesis. Arq Catarinenses Med. 2011;40(1):19-24. com uma média de 72,3% no pré e 51% no pós com um mês de evolução após o procedimento.

Com relação a sintomas de ansiedade dos pacientes e sua comparação com os domínios do SF36, encontraram-se piores escores em seis de oito domínios nos pacientes que apresentavam sintomas de ansiedade no pré-operatório, com relevância para os de estado geral de saúde, aspectos sociais e saúde mental. Assim também Pacola et al.2525 Pacola LM, Nepomuceno E, Dantas RAS, Costa HRT, Cunha DCPT, Herrero CFPSDH. Qualidade de vida relacionada à saúde e expectativas com o tratamento cirúrgico de pacientes com estenose espinhal. Coluna/Columna. 2014;13(1):35-8. constataram esses resultados nos pacientes que aguardavam tratamento cirúrgico para estenose lombar.

Os pacientes com sintomas de depressão no pré-operatório apresentaram piores resultados na escala EVA, Oswetry e sete dos oito domínios do SF36. Alguns autores têm sugerido que os sintomas de depressão podem predispor a dor lombar crônica, enquanto outros sugeriram que os problemas emocionais são reações à dor lombar crônica.2626 Magni G. Chronic low- back pain and depression: an epidemiological survey. Acta Psychiatr Scand. 1984;70(6):614-7.

No pós-operatório os pacientes com sintomas de depressão apresentaram piores resultados em todos os domínios do SF-36 comparados com os dos grupos sem sintomas de depressão. Katz et al.2727 Katz JN, Stucki G, Lipson SJ, Fossel AH, Grobler LJ, Weinstein JN. Predictors of surgical outcome in degenerative lumbar spinal stenosis. Spine (Phila Pa 1976). 1999;24(21):2229-33. também observaram que os pacientes depressivos submetidos à cirurgia de descompressão para estenose espinal relataram mais dor, menor satisfação com o tratamento, menor capacidade de caminhada e menor satisfação com a vida após a cirurgia do que o grupo sem sintomas de depressão.

Assim faz-se necessário o uso de instrumentos validados para avaliação dos pacientes com doença degenerativa na coluna para auxiliar na seleção dos pacientes e acompanhá-los durante sua evolução. Sem uma avaliação objetiva corre-se o risco de indicar uma cirurgia para um paciente que não terá um bom desfecho clínico.

Vialle et al.2828 Vialle E, de Oliveira Pinto BM, Vialle LR, Gomez JD. Evaluation of psychosomatic distress and its influence in the outcomes of lumbar fusion procedures for degenerative disorders of the spine. Eur J Orthop Surg Traumatol. 2015;25 Suppl. 1:S25-8. avaliaram, prospectivamente, a capacidade de um grupo de cirurgiões de coluna para identificar pacientes com distúrbios depressivos subjetivamente, em comparação com uma avaliação objetiva. O estudo identificou que os cirurgiões de coluna não foram capazes de identificar subjetivamente a maioria dos pacientes com distúrbios psicológicos.

Alguns autores2929 Duggal N, Sonntag VK. Fusion options and indications in the lumbosacral spine. Contemp Neurosurg. 2001;23(1):1-8.,3030 Don AS, Carragee E. A brief overview of evidence-informed management of chronic low back pain with surgery. Spine J. 2008;8(1):258-65. referem que piores resultados pós-operatórios ocorrem em pacientes com ganhos secundários, porém o presente estudo não encontrou resultados estatisticamente significativos que corroboram essa afirmação. Isso pode ter ocorrido devido à avaliação ser feita após quatro meses de cirurgia e maioria dos pacientes recebe benefício previdenciário por mais de quatro meses quando fazem artrodese de coluna lombar. Avaliações em longo prazo são necessárias para analisar essa associação.

Conclusão

A artrodese de coluna lombar mostrou-se efetiva na melhoria da dor, lombalgia, capacidade funcional, limitação por aspectos físicos, vitalidade, aspectos sociais e emocionais nos pacientes que apresentam doença degenerativa da coluna. Pacientes sem sintomas de ansiedade e de depressão apresentaram melhores resultados de qualidade de vida relacionada a saúde nas escalas avaliadas em comparação com os pacientes com sintomas de ansiedade e depressão.

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  • Trabalho desenvolvido na Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão, SC, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2018

Histórico

  • Recebido
    30 Nov 2016
  • Aceito
    17 Jan 2017
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