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Gangliosideos - estudo do colágeno e da resposta inflamatória no processo cicatricial

Resumo

Objetivo: Investigar o efeito dos gangliosídeos sobre a infiltração seqüencial de leucócitos e fibroblastos durante o processo de cicatrização usando um modelo de cicatrização da pele em ratos. Método: Foram utilizados 12 ratas EPM - 1 Wistar, com peso médio de 200 gramas e 4 meses de idade. Os animais procederam do Centro de Desenvolvimento de Pesquisa Experimental em Medicina e Biologia e foram mantidos por 5 dias para adaptação no biotério setorial da disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da UNIFESP-EPM, recebendo água e ração própria para a espécie. O protocolo anestésico utilizado foi uma associação de Cetamina (60mg.kg-1) e Xilazina (10mg.kg-1), por via intramuscular. Em seguida, realizava-se uma incisão longitudinal com 7 cm de extensão, na região dorsal paravertebral, interessando pele e tela subcutânea que foi fechada com pontos separados, com fio de prolene 7-0 e agulha triangular. As ratas foram distribuídas em dois grupos a saber: grupo experimento, que recebeu 3mg.kg-1.dia-1 de gangliosídeos, e um grupo controle, que recebeu veículo, ambos por via intramuscular durante 14 dias consecutivos. No 7º e 14º dias de pós-operatório foram ressecados fragmentos da pele e tela subcutânea para análise histológica, com a coloração de Tricrômio de Masson e Hematoxilina - Eosina. Resultados: As amostras apresentaram a mesma quantidade de colágeno em ambos os grupos mostrando que não houve inibição dos fibroblastos. Entretanto, a infiltração leucocitária foi retardada no grupo experimento quando comparado ao grupo controle. Conclusão: A alteração encontrada no processo cicatricial foi devida a um retardo na resposta inflamatória e não a uma inibição fibroblastos.

Glicolipídeos; Rato; Cicatrização


GANGLIOSIDEOS - ESTUDO DO COLÁGENO E DA RESPOSTA INFLAMATÓRIA NO PROCESSO CICATRICIAL

VON KOSSEL K,

FERREIRA R,

MARINHO LC,

CASTRO LC,

NIGRO AJT,

MONTERO EFS

Von Kossel K, Marinho LC, Ferreira R, Castro LC, Nigro AJT, Montero EFS. Gangliosídeos: estudo do colágeno e da resposta inflamatória no processo cicatricial. Acta Cir Bras 2000; 15(Supl 1):15-20.

RESUMO: Objetivo: Investigar o efeito dos gangliosídeos sobre a infiltração seqüencial de leucócitos e fibroblastos durante o processo de cicatrização usando um modelo de cicatrização da pele em ratos.

Método: Foram utilizados 12 ratas EPM - 1 Wistar, com peso médio de 200 gramas e 4 meses de idade. Os animais procederam do Centro de Desenvolvimento de Pesquisa Experimental em Medicina e Biologia e foram mantidos por 5 dias para adaptação no biotério setorial da disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da UNIFESP-EPM, recebendo água e ração própria para a espécie.

O protocolo anestésico utilizado foi uma associação de Cetamina (60mg.kg-1) e Xilazina (10mg.kg-1), por via intramuscular. Em seguida, realizava-se uma incisão longitudinal com 7 cm de extensão, na região dorsal paravertebral, interessando pele e tela subcutânea que foi fechada com pontos separados, com fio de prolene 7-0 e agulha triangular.

As ratas foram distribuídas em dois grupos a saber: grupo experimento, que recebeu 3mg.kg-1.dia-1 de gangliosídeos, e um grupo controle, que recebeu veículo, ambos por via intramuscular durante 14 dias consecutivos. No 7º e 14º dias de pós-operatório foram ressecados fragmentos da pele e tela subcutânea para análise histológica, com a coloração de Tricrômio de Masson e Hematoxilina - Eosina.

Resultados: As amostras apresentaram a mesma quantidade de colágeno em ambos os grupos mostrando que não houve inibição dos fibroblastos. Entretanto, a infiltração leucocitária foi retardada no grupo experimento quando comparado ao grupo controle.

Conclusão: A alteração encontrada no processo cicatricial foi devida a um retardo na resposta inflamatória e não a uma inibição fibroblastos.

DESCRITORES: Glicolipídeos. Rato. Cicatrização.

INTRODUÇÃO

Os gangliosídeos, um sub-grupo dos glicolipídeos de membrana, constituem uma das linhas de pesquisa da Disciplina de Cirurgia Experimental da UNIFESP-EPM e tem sido utilizados para avaliar o seu efeito imunomodulador "in vivo" e "in vitro".

Os gangliosídeos são um tipo de glicoesfingolipídeo de membrana plasmática encontrados, principalmente, nas membranas das células nervosas. Recobrem parte da superfície celular, onde formam um padrão célula-específico, aderem à membrana por sua porção hidrofóbica - a ceramida, e pela sua parte hidrofílica - o oligossacarídeo, que está projetada para o meio extracelular, tem natureza ácida e é composta por resíduos do ácido siálico, o que lhe confere carga negativa. Os gangliosídeos (gang) constituem 5-10% do total da massa lipídica da membrana plasmática da célula nervosa e podem também serem encontrados, em menor quantidade, em outros tipos de células.

No cérebro há mais de 12 tipos diferentes de gangliosídeos, embora o monossialogangliosídeos (GM1), dissialogangliosídeos (GD1a, GD1b ) e os trissialogangliosídeos (GT1b) correspondem a mais de 90% do total. Todos eles são constituídos do mesmo tetrassacarídeo, variando de 1 a 4 o número de resíduos de ácido siálico ligado.

Os gangliosídeos recobrem parte da superfície celular, onde formam um padrão célula-especifico que muda durante a diferenciação celular e na transformação neoplásica. Servem, portanto, como receptores para a sinalização entre células e o meio extracelular.

Alguns estudos têm mostrado que os gangliosídeos têm uma ação inibitória na proliferação de células da resposta imune,1-2 com ação principal na inibição linfocitária e da síntese da interleucina 2 ( IL-2), assim como age na modulação dos sinais celulares, como adesão e reconhecimento celular3. Desta forma, mostra seu efeito imunomodulador.

Outros agentes imunossupressores têm também ação imunomoduladora retardando o processo de cicatrização, e podem ser empregados no tratamento e prevenção da rejeição de aloenxentos.

OBJETIVO

Estudar a ação dos gangliosídeos no processo de cicatrização da ferida cirúrgica da pele do rato.

MÉTODOS

AMOSTRA

Para a execução do trabalho foram utilizados 12 ratas da linhagem Wistar EPM-1, isogênicas, fornecidas pelo CEDEME- Centro de Desenvolvimento de modelos Experimentais para Medicina e Biologia da UNIFESP/EPM, com aproximadamente três meses de idade, e peso variando entre 170 a 230gramas. O experimento foi realizado no Laboratório de Microcirurgia da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da UNIFESP/EPM.

Os animais foram distribuídos, aleatoriamente, em dois grupos de 6 animais - controle e experimento.

Grupo Experimento (GE) - foi administrado 3mg/kg/dia de gangliosídeos ( Sinaxial Ò ), por via intramuscular, a partir do dia do ato operatório até o 14º PO;

Grupo Controle (GC) - foi administrado veículo constituído por solução salina tamponada (PBS) , por via intramuscular, a partir do dia do ato operatório até o 14º PO.

A dose de 3mg/kg/dia de gangliosídeo utilizada foi determinada a partir de uma curva dose-resposta da ação imunossupressora da droga, e corresponde à dose mínima com efeito imunossupressor.

PREPARO PRÉ-OPERATÓRIO, ANESTESIA E INÍCIO DO PROCEDIMENTO

Os animais permaneceram por um período de adaptação de uma semana no Biotério Setorial da Técnica Operatória e Cirurgia Experimental, em local com iluminação controlada por ciclos de 12 horas de claro e 12 horas de escuro e temperatura controlada Foram alimentados com ração padronizada e ingestão de água " ad libitum ".

Os animais foram, pesados e, em seguida, submetidos à anestesia injetando-se por via intramuscular, na região do músculo bíceps femoris, uma solução constituída pela associação de quetamina e xilasina (60mg/kg + 10mg/kg) na dose de 0,2ml da solução para cada100gramas de peso do animal.

O ato operatório foi iniciado após o animal atingir plano anestésico, no qual o reflexo de retirada da pata em resposta ao estímulo doloroso está abolido. Foram colocados em decúbito dorsal e fixados à prancha operatória por meio de tiras elásticas.

ATO OPERATÓRIO

Após tricotomia procedeu-se anti-sepsia com álcool iodado a 2%. Em seguida, foi realizada uma incisão longitudinal da pele e tela subcutânea, de 7 cm de extensa, situada na região dorsal a 1cm a direita da linha vertebral.

Realizou-se, a seguir, a síntese da ferida operatória com a aplicação de 7 pontos separados com fio de polipropilene 6-0 com agulha triangular.

No Grupo Controle, no momento do ato operatório, foi aplicado por via intramuscular uma solução salina tamponada (PBS) e , no Grupo Experimento foi aplicado por via intramuscular uma solução de glicoesfingolipídeo que contém GM1 (40%), GD1a (21%), GD1b (16%) e GT1b (19%) [Sinaxial]

No 7º dia do pós operatório todos os animais de ambos os grupos, foram novamente anestesiados para retirar um fragmento elíptico de pele e tela subcutânea da ferida operatória a dois centímetros da extremidade craneal da ferida operatória que foi feita com bisturi. Esses fragmentos foram fixados em solução de formol 10%. O local onde se fez a ressecção do fragmento foi fechado com curativo oclusivo - Micropore

No 14º dia, após anestesia geral dos animais, repetiu-se a retirada de amostra em outra região distante 5 centímetros da extremidade craneal da ferida operatória.

A eutanásia dos animais foi realizada pela administração de uma dose letal de cloreto de potássio 19,1% por punção direta de uma das câmaras cardíacas.

ESTUDO HISTOLÓGICO

Após a fixação em formol por um período mínimo de 48 horas, as peças foram processadas para inclusão em parafina, e posteriormente o material foi submetido à microtomia e os cortes corados por uma solução de hematoxilina-eosina (HE) para a análise morfológica da cicatrização e Tricromio de Masson (TM) para a análise das fibras colágenas. As características e a intensidade do infiltrado foram descritas com o auxílio de um microscópio óptico.

RESULTADOS

QUADRO 1 - Estudo anatomopatológico das peças dos grupos controle e experimento no 7º e 14º dia de pós operatório.

RESULTADO DA ANÁLISE DAS LÂMINAS CORADAS COM HE:

Nos fragmentos obtidos no 7º dia de pós operatório foi visualizado, no grupo controle, um processo inflamatório crônico granulomatoso do tipo reação ao fio de sutura caracterizado por células gigantes de corpo estranho formadas pela fusão das células epitelióides oriundas dos macrófagos. Há também formação de um tecido conjuntivo frouxo com intensa angiogênese, leucócitos e matriz extracelular que cresce preenchendo os espaços evidenciando um processo cicatricial.

No grupo experimento há formação de um discreto infiltrado inflamatório sem reação de corpo estranho ao fio de sutura e ausência de formação de tecido de granulação.

Nos cortes analisados no 14º dia de pós operatório ,no grupo controle, observa-se discreto processo inflamatório crônico em resolução, com focos de fibrose, onde, anteriormente, existiam granulomas maduros indicadores do término do processo inflamatório crônico.

No grupo experimento vê-se um processo inflamatório crônico granulomatoso do tipo corpo estranho ao fio de sutura, como o observado no 7º dia pós operatório do grupo controle, com granulomas ainda em formação e a formação de um tecido de granulação com discreta angiogênese.

RESULTADO DA ANÁLISE DAS LÂMINAS CORADAS COM TM:

Não foram encontradas diferenças na quantidade de colágeno em nenhum dos grupos analisados. As prováveis diferenças no tipo do colágeno entre o grupo controle e o experimento não foram possíveis de serem observadas nos cortes corados pela solução de tricômio de Masson.

DISCUSSÃO

Alguns autores3,7 relataram existir interações entre os Glicoesfingolipídeos (GSLs) das superfícies celulares, os quais, parecem modular sinais celulares como a adesão e o reconhecimento por células endoteliais. Estas propriedades fisiológicas sugerem uma possível interferência no processo cicatricial com o uso fesse fármaco, pois na fase inflamatória da cicatrização, as células endoteliais da área da lesão atuam desta forma no recrutamento das células da resposta imune 4,6.

Outros trabalhos mostram a ação inibitória dos GSLs sobre a proliferação linfocitária3 , e estes por sua vez, liberam citocinas que regulam a migração e proliferação celular, além de estimular a síntese e o depósito de matriz extracelular5. Esta ação inibitória poderia explicar o retardo da formação de tecido de granulação no grupo experimento.

A formação de células gigantes de corpo estranho depende do estímulo aos linfócitos T4 . A ação imunomoduladora dos GSLs sobre os linfócitos T provoca alteração na formação dos granulomas, causando retardo na evolução do processo inflamatório crônico granulomatoso, como foi observado no grupo experimento.

CONCLUSÃO

Conclue-se que o pool de gangliosídeos utilizados agiram retardando o processo inflamatório da cicatrização da pele do rato, não interferindo na quantidade de colágeno

  • 1. Marcus DM . Molecular Immunology. 1984;21:1083.
  • 2. Giorgio S, Jasiulionis MG, Straus AH, Takarashi HK, Barbiéri CL. Experimental Parasitology. 1992;75:119.
  • 3. Montero EFS, Barbieri CL, Giorgio S, Garcez-Silva MH, Sato H, Goldenberg S, Straus AH, Takahashi HK, Koh IHJ. Transplant Proc 1994;26:1597.
  • 4. Brasileiro Filho G, Pereira FEL, Pittella JEH, Bambirra EA, Barbosa AJA. Bogliolo Patologia Geral. Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan S.A;1993.
  • 5. Mutsaers, S.E; Bishop, J.E; McGriuther, G; Laurent, G.J. J Biochem Cell Biol 1997; 29:5.
  • 6. Abbas AK, Lichtman AH, Pober JS. Celular and Molecular Immunology, 3rd ed. W.B Saunders Company;1997.
  • 7. Hakomori S. Bifunctional role of Glycosphingolipids. J Biol Chem 1990;265:18713-6

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Mar 2001
  • Data do Fascículo
    2000
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