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A reforma psiquiátrica no olhar das famílias

A look at psychiatric reform from families

La reforma psiquiátrica según la visión de las familias

Resumos

O estudo é delineado de forma qualitativa e utiliza como referencial a teoria das Representações Sociais, cujo objetivo buscou desvendar a visão dos componentes familiares acerca da Reforma Psiquiátrica. Realizada a abordagem de dez famílias de portadores de transtorno mental crônico, clientes de hospital-dia e do Centro de Atenção Psicossocial. Utilizamos a entrevista semi-estruturada e o teste de associação-livre de palavras estímulo-indutoras submetidos à Análise de Conteúdo de Lawrence Bardin. Os resultados evidenciaram o predomínio de uma visão reducionista do processo, uma vez que apontam como objetivo primordial da reforma a extinção dos hospitais psiquiátricos, sinalizando preocupações sobre a possibilidade de que essa manobra agrave ainda mais a carência de infra-estrutura para atender às demandas da clientela. A compreensão da família acerca da reforma psiquiátrica ainda não atingiu uma dimensão global. Portanto, é necessário integrar esforços de todos aqueles que se interessam pela saúde e bem-estar destes sujeitos.

Saúde mental; Família; Enfermagem psiquiátrica


This is a qualitative study and uses as a referential the theory of Social Representations. Its objective was to search to unveil the relatives¢ vision about Psychiatric Renewal. It approached ten families of hard mental disorder porters, clients of hospital-day and the Center of Psychosocial Attention. It used the semi-structured interview and the test of free association of stimulus-inducing words, submitted to Bardin¢s Analysis of Content. The results showed the predominance of a decreasing vision of process so it points to a main objective of renewing the extinction of psychiatric hospitals, showing concerns about the possibility of this fact increasing still more the lack of framework to answer the demands of customers. The comprehension of families about psychiatric renewal still doesn¢t reach the dimension desired. Thus, integrated efforts of everyone that is interested in the health and welfare state of these subjects is necessary.

Mental health; Family; Psychiatric nursing


Estudio caracterizado de manera cualitativa utilizando como referencial la Teoría de las Representaciones Sociales, cuyo objetivo es desvendar la visión acerca de la reforma psiquiátrica. Realizado con diez familias de portadores de trastornos mentales crónicos, cliente del hospital día y del Centro de atención psicosocial.Utilizamos la entrevista semi-estructurada y la evaluación de asociación livre de palabras estimulo-inductoras, al análisis del contenido de Bardin. Los resultados evidenciaron la prevalencia de una visión reductora del proceso, ya que apuntan como objeto principal de la reforma la extinsión de los hospitales psiquiátricos, señalando las preocupaciones al respecto de las posibilidades de que este medio agrave, más la carencia de la infraestructura, para atender las demandas del cliente. La comprensión de las familias acerca de la reforma psiquiátrica, todavía no alcanzó la dimensíon global. Por consiguiente, son necesarios los esfuerzos integrados de todos aquellos que tienen interés por la salud y el bienestar de estos sujetos.

Salud mental; Família; Enfermeria psiquiátrica


ARTIGO ORIGINAL

PESQUISA

A reforma psiquiátrica no olhar das famílias

A look at psychiatric reform from families

La reforma psiquiátrica según la visión de las familias

Norma Faustino Rocha RandemarkI; Maria Salete Bessa JorgeII; Maria Veraci Oliveira QueirozIII

IEnfermeira. Psicóloga. Mestre em Saúde Pública. Professora Adjunto da Universidade Estadual do Ceará na área de Saúde Mental

IIEnfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente titular da Universidade Estadual do Ceará na área de Saúde Mental. Pesquisadora 2c do CNPq. Líder do grupo de Pesquisa Saúde Mental, Família e Práticas de Saúde da Universidade Estadual do Ceará

IIIEnfermeira do Hospital Geral de Fortaleza. Docente da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem - Mestrado e Doutorado da UFC. Participante do Grupo de Pesquisa Saúde mental, Família e Práticas de Saúde da UECE

Endereço Endereço: Norma Faustino Rocha Randemark Rua Pereira Valente, 1400, apto 103. 60160-250 - Bairro Varjota, Fortaleza, CE Email: rmarck@ig.com.br

RESUMO

O estudo é delineado de forma qualitativa e utiliza como referencial a teoria das Representações Sociais, cujo objetivo buscou desvendar a visão dos componentes familiares acerca da Reforma Psiquiátrica. Realizada a abordagem de dez famílias de portadores de transtorno mental crônico, clientes de hospital-dia e do Centro de Atenção Psicossocial. Utilizamos a entrevista semi-estruturada e o teste de associação-livre de palavras estímulo-indutoras submetidos à Análise de Conteúdo de Lawrence Bardin. Os resultados evidenciaram o predomínio de uma visão reducionista do processo, uma vez que apontam como objetivo primordial da reforma a extinção dos hospitais psiquiátricos, sinalizando preocupações sobre a possibilidade de que essa manobra agrave ainda mais a carência de infra-estrutura para atender às demandas da clientela. A compreensão da família acerca da reforma psiquiátrica ainda não atingiu uma dimensão global. Portanto, é necessário integrar esforços de todos aqueles que se interessam pela saúde e bem-estar destes sujeitos.

Palavras-chave: Saúde mental. Família. Enfermagem psiquiátrica.

ABSTRACT

This is a qualitative study and uses as a referential the theory of Social Representations. Its objective was to search to unveil the relatives¢ vision about Psychiatric Renewal. It approached ten families of hard mental disorder porters, clients of hospital-day and the Center of Psychosocial Attention. It used the semi-structured interview and the test of free association of stimulus-inducing words, submitted to Bardin¢s Analysis of Content. The results showed the predominance of a decreasing vision of process so it points to a main objective of renewing the extinction of psychiatric hospitals, showing concerns about the possibility of this fact increasing still more the lack of framework to answer the demands of customers. The comprehension of families about psychiatric renewal still doesn¢t reach the dimension desired. Thus, integrated efforts of everyone that is interested in the health and welfare state of these subjects is necessary.

Keywords: Mental health. Family. Psychiatric nursing.

RESUMEN

Estudio caracterizado de manera cualitativa utilizando como referencial la Teoría de las Representaciones Sociales, cuyo objetivo es desvendar la visión acerca de la reforma psiquiátrica. Realizado con diez familias de portadores de trastornos mentales crónicos, cliente del hospital día y del Centro de atención psicosocial.Utilizamos la entrevista semi-estructurada y la evaluación de asociación livre de palabras estimulo-inductoras, al análisis del contenido de Bardin. Los resultados evidenciaron la prevalencia de una visión reductora del proceso, ya que apuntan como objeto principal de la reforma la extinsión de los hospitales psiquiátricos, señalando las preocupaciones al respecto de las posibilidades de que este medio agrave, más la carencia de la infraestructura, para atender las demandas del cliente. La comprensión de las familias acerca de la reforma psiquiátrica, todavía no alcanzó la dimensíon global. Por consiguiente, son necesarios los esfuerzos integrados de todos aquellos que tienen interés por la salud y el bienestar de estos sujetos.

Palabras clave: Salud mental. Família. Enfermeria psiquiátrica.

INTRODUÇÃO

Nas últimas duas décadas, o Brasil vem sendo palco de um dos mais importantes processos de transformação no campo da atenção psiquiátrica, com o "Movimento Brasileiro de Reforma Psiquiátrica". Tais mudanças foram inspiradas no movimento da Psiquiatria Democrática, criado na Itália a partir da década de 1970. Liderada por Franco Basaglia, a Psiquiatria Democrática, com matriz teórica no marxismo, intentava revolucionar concepções e terapêuticas médicas vigentes mediante análise crítica da cultura manicomial e do saber psiquiátrico, na intenção de denunciar, também, práticas desumanas e segregantes para fins de normatização e controle social, culminando com a criação da Lei italiana nº 180/781. Referido disposto legal proibia a internação e tratamento dos doentes mentais em hospital psiquiátrico, previa sua desativação gradativa e substituição por serviços comunitários. Este movimento tem como finalidade romper com o paradigma clínico, um modo linear de relação causa-efeito sobre a loucura e a periculosidade e buscar outro modo de tratar o doente mental, excluindo a instituição psiquiátrica2.

O Movimento Brasileiro de Reforma Psiquiátrica (MBRP) surgiu no Brasil na década de 1970, desenvolvendo-se efetivamente nos anos de 1980. Com caráter reformista e conotação socialista e social-democrático, o movimento propunha um novo modelo de intervenção que possibilitasse a desinstitucionali-zação do doente mental com a desconstrução do aparato manicomial, da construção de uma concepção diversa de doença mental e reinvenção da prática assistencial dos enfermos, de modo a possibilitar o resgate de sua cidadania e reinserção social.

"A desinstitucionalização" surgiu como uma das propostas mais urgentes da reforma, ainda que sua implementação venha sendo implantada gradualmente. Ela deve, no entanto, ser entendida como uma proposta diferenciada da "desospitalização".

Ao pensar a substituição do antigo modelo asilar, passou-se a enfatizar a participação da família e da comunidade na custódia e responsabilidade de cuidados com o enfermo, os quais eram antes desempenhados pelos serviços de saúde. As condições dos egressos e seus familiares, porém, no decurso da Reforma, em face da responsabilidade imputada a esta, são objeto de preocupação dos profissionais e pesquisadores de saúde mental.

A simples transferência de responsabilidade para a família e comunidade constitui um problema que necessita de análise e reflexão pelos agentes institucio-nais de saúde envolvidos com a Reforma. É importante lembrar que as famílias de portadores de transtorno mental estão expostas a sobrecarga emocional e, mesmo com a Reforma, são alvos de preconceitos e discriminação. A própria carência de suportes institucionais não permite que as famílias sejam suficientemente amparadas para o enfrentamento do problema, incentivando, conseqüentemente, a "desospi-talização".

O estudo tem como eixo, a perspectiva da família acerca da Reforma Psiquiátrica, para conhecer suas percepções e de que forma participam deste processo. Consideramos relevante desvendar esta realidade a partir da óptica das famílias, uma vez que desenvolvem papel fundamental na ressocialização: acolher o portador egresso e intermediar sua transição do manicômio para a sociedade.

Diante do contexto, o objetivo do estudo consiste em apreender as representações sociais das famílias de portadores de transtorno mental acerca da Reforma Psiquiátrica e suas implicações no processo de inserção e apropriação do fenômeno.

CAMINHOS DA PESQUISA

Este estudo é delineado de forma qualitativa com arrimo sistemático na Teoria das Representações Sociais. As representações sociais determinam um modo de conhecimento específico de um determinado grupo social, um saber que é expresso na ação do sujeito, podendo se manifestar através de imagens, conceitos, categorias, revestido de criatividade que contribui para construção da realidade vivenciada no senso comum3.

A coleta dos indicadores foi realizada nos meses de fevereiro e março de 2003, período em que foram abordadas 10 (dez) famílias de portadores de transtorno mental crônico, clientes de um hospital-dia e Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) na cidade de Fortaleza/Ce-Brasil.

As descrições aqui apresentadas foram obtidas por meio de gravação e transcrição de entrevistas semi-estruturadas em que utilizamos os seguintes itens: fale-me um pouco sobre sua experiência com a doença do seu familiar; na atualidade, como você percebe o tratamento dispensado ao seu familiar nesta instituição? A que você atribui o modo como ele é tratado atualmente? O que você entende por Reforma Psiquiátrica? Como você participa do tratamento do seu paciente? Descreva a relação do paciente com a família depois que ele passou a ser tratado nesta instituição.

O teste de associação livre de palavras foi realizado empregando-se como estímulo-indutor as seguintes palavras: loucura, cidadania, doença mental, saúde, Reforma Psiquiátrica, família, internação, ressocialização, manicômio e cidadania. Na ocasião, indagamos ao informante: o que lhe vem à mente quando eu digo a palavra (...) ?( loucura, por exemplo). Desse modo, solicitamos que cada entrevistado citasse cinco palavras tomadas aleatoriamente, associadas livremente a cada estímulo-indutor. Para a análise das informações, aplicamos a técnica de análise de conteúdo4.

APREENSÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

As categorias que refletem as representações sociais foram descritas e mostram as perspectivas das famílias sobre o tema investigado.

Experiência da família com o transtorno mental

Esta categoria compreende as unidades de análise que representam as condições de vida dos cuidadores, com ênfase nos seus sentimentos, as repercussões financeiras, emocionais e sociais da experiência com o transtorno mental. As evocações apresentam as seguintes freqüências: adaptação difícil, 150 (41%); condição financeira precária, 80 (22%); sofrer com o preconceito social, 18 (5%); sentir-se sobrecarregada, 31 (9%); saúde fragilizada do cuidador, 42 (12%); sentir-se amedrontada, 22 (6%); sentir-se sozinha, 19 (5%).

A evocação denominada "adaptação difícil" contemplou todas as unidades de análise que revelassem atitudes, sentimentos, expectativas e expressões acerca da experiência que indicasse dificuldades. A condição prejudicada de adaptabilidade é conseqüente do padrão previsível de relação socioafetiva. A emergência do transtorno mental exige mudanças bruscas nos modos de enfrentamento, postergadas até o ponto de tolerância máxima. Uma família manifesta essa experiência, comum entre as demais.

É horrível! Tem hora que dá um desespero! Você pede, ele não atende, você precisa dormir para descansar, a mente não relaxa.

As condições financeiras precárias, segundo os entrevistados, estão relacionadas ao elevado custo com remédios, condução para ir à instituição participar semanalmente das terapias, alimentação e lazer, configurando uma realidade de vida dissociada das condições socioeconômicas das famílias. Sobre esta carência, ressaltam a ausência de auxílio governamental capaz de propiciar melhores condições de assistências às famílias e portadores, pois lembram:

[..]o dinheiro é apertado, só eu trabalho, só eu contribuo.

As repercussões da experiência com o transtorno mental na saúde do cuidador estão associadas à sobrecarga de funções e ausência de partilha dos problemas pelo sistema familiar, com predomínio de atribuições e responsabilidades às figuras femininas da família. A exposição prolongada da mulher a situações geradoras de estresse culmina com a sintomatolo-gia do corpo. Assim revela uma entrevistada:

[...]a doença afetou meu corpo. Minha pressão subiu. Tenho insônia, hemorragia menstrual.

O estresse reflete as dificuldades que o indivíduo tem que enfrentar e os meios de que dispõe para isso, consistindo numa forma de expressão do sofrimento5. Entendemos que, a partir destes relatos, as trajetórias das famílias caracterizam-se por inúmeras dificuldades, principalmente por se sentirem desamparadas, sem atendimento adequado das demandas psicossociais, resultando em necessidades emocionais e sofrimento.

Concepções da família acerca do transtorno mental

Nesta categoria, apresentamos esse entendimento expressando o significado construído socialmente nas suas experiências cotidiana. São abstrações que revelam as representações sociais destes sujeitos carregadas de sentidos. Apareceram as seguintes freqüências: problema da mente, 66 (30%); é viver num mundo paralelo, 45 (20.5%); Não tem cura 30 (14%); É um distúrbio 18 (8%); Tem influência espiritual 60 (27.5%).

A concepção da doença mental como "doença da mente" põe em relevo o predomínio da visão cartesiana da loucura, tão presente na nossa sociedade e revela a necessidade do senso comum em delimitar anatomicamente esta patologia:

[...]a doença tá na mente mesmo [...] os miolos ficam coalhando [...].

Como "doença da mente", ela é expressa como perda da racionalidade pelo homem. Na convivência com estes membros familiares, observamos ainda que a visão da cura compreende o retorno à normalidade, associado ao padrão de comportamento anterior e cuja importância está centrada na doença em detrimento das potencialidades do indivíduo e dos aspectos saudáveis de sua personalidade.

Os participantes também revelaram a crença de que a doença está destinada a acontecer por se constituir uma falha no indivíduo, pela predisposição heredo-familiar, cujas crises recorrentes enfraquecem a mente do indivíduo, abrindo espaço para influências de espíritos maléficos que, ao se apossarem da pessoa, causam distúrbios na sua personalidade.

Que a doença existe, existe[...]. Agora, quando o espírito vê que ele tá fraco é que ele se apossa.

Estes relatos representam as idéias construídas socialmente pelas famílias no convívio intercultural, que influenciam no modo de pensar e agir com o doente mental.

Modos de enfrentamento utilizados pelas famílias

Esta categoria representa as variadas formas de enfrentamento das famílias no labor com seu parente portador de doença mental: apoio espiritual, 62 (42%); buscar ajuda profissional, 60 (41%); resignação, 25 (17%).

Os mecanismos de enfrentamento são esforços dirigidos para o manejo do estresse. Estes recursos são adotados pelas famílias em sua experiência com o transtorno mental e envolvem estratégias que ajudam a determinar o que pode ser feito, levando em conta a possibilidade de alcançar o resultado almejado ou mesmo a utilização de defesas que possibilitem mitigar o sofrimento. Os principais recursos eleitos pelas famílias sinalizam a utilização de tarefas e esforços centrados no problema, que incluem a negociação, a busca de conforto espiritual e aconselhamento ou orientação profissional.

Eu procuro ajuda médica e de Deus. Confio na minha religião e em Deus para pedir a graça. É graças a ele que tenho força pra continuar.

Os mecanismos centrados na emoção ou com enfoque cognitivo incluem a negação e a sublimação do problema visando a sua neutralização. A resignação surge em conseqüência da busca de apoio espiritual.

Percepção da família acerca do tratamento no hospital-dia

Os relatos das famílias sobre o tratamento dispensado ao portador no hospital-dia revelam que esta instituição é a que melhor atende às expectativas dos usuários e famílias. As idéias apresentadas com suas freqüências mostram essa realidade: o paciente é valorizado, 85 (14%); é um amparo para os abandonados, 64 (10%); a família participa do tratamento, 30 (5%); tem atividades terapêuticas diversificadas, 63 (10%); mantém o paciente ocupado, 82 (13%); o paciente gosta de ir, 55 (9%); é um hospital para ir e vir, 52 (8%); o paciente fica mais responsável, 29 (5%); o paciente recebe auxílio, 38 (6%); a equipe faz visita domiciliar, 69 (11%); o paciente regride com a alta, 45 (7%); melhorou a relação familiar, 14 (2%).

Dentre os aspectos mais ressaltados, identificamos a valorização do paciente por parte da equipe terapêutica, que traduz a forma igualitária como são tratados, sobretudo, pelo incentivo à liberdade de expressão e exercício da autonomia, por meio de relações pautadas no respeito, confiança e valorização de suas potencialidades.

O tratamento dos portadores de transtorno mental deve constituir um projeto individualizado capaz de ofertar aos pacientes, possibilidades de gerenciar suas vidas e conquistar cada vez mais autonomia, aumentando-lhes a capacidade de escolha6.

Na concepção dos informantes, ao desempenhar seu papel, a equipe do hospital-dia supre as necessidades das famílias por intermédio das seguintes atividades: manter o paciente ocupado; fornecer auxílio básico de modo a facilitar o acesso dele à instituição e a manutenção do tratamento; fornecer modalidades terapêuticas diversificadas, com opções de lazer e integração com outros indivíduos e com famílias que sofrem do mesmo problema, bem como incentivar a participação da família no processo de tratamento, fomentando o vínculo afetivo da equipe com o sistema familiar.

Percebemos, no entanto, a necessidade de trabalhar os familiares para desenvolver melhor seus recursos de enfrentamento dos problemas no âmbito familiar, tendo em vista o combate à dependência institucional, sendo necessário para isto intensificar as intervenções terapêuticas junto a estes grupos e promover o fortalecimento de suas relações fragilizadas.

Eu não tava mais agüentando[...] foi uma benção[...] foi um amparo[...] é um apoio. Tenho medo de que ele receba alta. Acho que vou me sentir abandonada [...]

Também se constitui queixa da família a carência de instituições de referência na assistência em saúde mental que assegurem a eficácia da continuidade do tratamento do paciente após a alta hospitalar a fim de evitar a remissão do quadro.

Depois que saiu voltou a ser como era antes[...] fico de novo parado[...] ficou mais acomodado, não tem gosto[...] tá relaxado fica isolado da gente [...].

São realidades vividas pelas famílias que reconhecem a descontinuidade e, conseqüentemente, a carência do apoio domiciliar, para que não haja um hiato na assistência.

Percepção da família sobre o tratamento no CAPS

Estes dados mostram como as famílias percebem o tratamento dispensado no CAPS: o paciente é bem tratado, 29 (10%); o atendimento é reduzido, 43 (14%); o auxílio é restrito, 25 (9%); a família não participa muito, 55 (19%); não tem visita domiciliar ,89 (30%); as atividades são inadequadas para a idade do paciente, 54 (18%).

Cabe ressaltar que os relatos dos informantes dizem respeito apenas à instituição que serviu de contexto para esta pesquisa e não reflete, necessariamente, a situação dos outros CAPS situados em outras regiões do Estado e do País.

A construção do CAPS na cidade de Fortaleza é um empreendimento relativamente novo, com aproximadamente cindo anos de existência e que vêm tentando consolidar sua prática junto à população em meio à carência de recursos técnico-financeiros. Quando comparado ao hospital-dia, uma instituição cujo funcionamento já está prestes a ultrapassar uma década, o CAPS, na percepção dos componentes familiares entrevistados, parece estar "engatinhando".

Na evocação denominada "O paciente é bem tratado" (10%), os membros familiares demonstram reconhecer os esforços da equipe para atender as demandas da clientela, havendo, no entanto, uma compreensão diferenciada entre o sentido de ser "bem tratado" e de ser "valorizado" pois este último possui um significado especial porque reafirma a pessoa como sujeito humano e social.

As queixas das famílias apresentam como pano de fundo a falta de infra-estrutura destas instituições no que concerne à concessão de benéficos (remédios, vale-transporte e alimentação), representando 9% das respostas; a inadequação das atividades à idade do paciente, 18%; a redução do número de atendimentos 14%; a não inserção da família no processo terapêutico do paciente pela ausência de participação efetiva, 19%; a ausência de acompanhamento domiciliar pelos profissionais da instituição, 30%.

Não é que eu queira dizer que o tratamento não é bom. O médico é o mesmo do hospital-dia. As doutoras são ótimas, tratam bem o paciente, mas se comparado com o hospital-dia é mais fraco.

É importante ressaltar que há profunda diferença entre autonomia e independência. A liberdade está ligada à possibilidade de escolha entre as diversas opções oferecidas, o que implica dizer que, quanto maior a oferta de dispositivos de atenção proporcionada pelo serviço ao usuário, maior será seu grau de escolha e autonomia7.

O desenvolvimento da autonomia do usuário requer maior investimento institucional e maior quantidade de dispositivos terapêuticos, que incluem serviços cotidianos, atividades grupais, psicoterapia individual, exercícios, lazer, visitas domiciliares dentre outros recursos, devendo a instituição acompanhar sistematicamente o progresso da pessoa6.

Participação do cuidador no tratamento institucional

São diversas as formas como os membros da família participam do processo terapêutico do portador de transtorno mental, porém grande parte da adesão decorre do papel desempenhado pelas instituições no sentido de sensibilizar os componentes da rede socio-familiar a participar em forma mais ativa no tratamento do paciente, fortalecendo o vínculo com a instituição, o que nem sempre é observado: assistir à terapia, 66 (33%); participar de reuniões, 80 (41%); reclamar a participação da família, 25 (13%); informar da equipe do estado do paciente, 26 (13%).

Dentre as atividades mais valorizadas e que são desenvolvidas nas instituições estão a participação em grupos de terapia, ocasião em que ocorre a partilha de vivências dos problemas comuns no universo desta clientela e a participação em reuniões de famílias, representando, segundo os entrevistados, um momento rico de integração, descontração e troca de informações (41%).

A cada reunião cada um conta seu problema, como é que o paciente está reagindo: [...] acho eu que ali mais uma forma de informar como ele ta no tratamento e você dizer como ele tá casa. É mais uma troca de informação.

Cabe aos cuidadores o papel de agentes reprodutores da cultura que tentam implantar nestas instituições, combatendo o preconceito e a alienação, aos outros membros da família compete participarem do processo (13%), como também, servirem de elo entre a equipe e o sistema familiar, informando os profissionais das alterações que ocorrem com o paciente no âmbito domiciliar (13%).

Concepções da família sobre a Reforma Psiquiátrica

Estas reúnem várias idéias pautadas no conhecimento adquirido no grupo social de convivência, incluindo o contato com os serviços de saúde. Assim foram organizadas: conhece parcialmente ,52 (18%); é ressocializar, 20 (7%); é trabalhar mais a família, 36 (13%); é dar mais liberdade ao paciente, 27 (10%); é um novo método de tratamento, 24 (8%); é um outro tipo de hospital, 52 (18%); é pra acabar com os hospitais psiquiátricos, 76 (26%).

Sobre o conhecimento que as famílias possuem sobre a Reforma Psiquiátrica, podemos inferir que, mesmo lentamente, essa teoria se incorpora ao universo de saber dos familiares e pacientes. Percebemos, contudo, que eles apresentam limitações quando solicitados a relacionar as mudanças percebidas com os objetivos do processo da reforma em curso.

Sou muito leiga no assunto, eu acho que precisava mais me aprofundar, estou um pouco por fora.

É ter direito a passear, ir à praia, comer melhor [...].

A palavra reforma possui ligação pouco expressiva com a palavra ressocialização, atingindo apenas o índice de 5%, e remete à família a idéia de proporcionar ao paciente o lazer, conforto, relacionamentos sociais, amizades, diversão e passeios, bem como produzir um aumento da tolerância social, dar mais liberdade ao paciente (9%), porque, segundo os membros da família, quem sai, quem passeia muito, vive solto e em liberdade.

Acho que as pessoas estão se conscientizando que prender não é a solução, acho que tem que dar mais liberdade... tem doente que não tem como ficar solto, mas tem doente que tem condições de ficar, de interagir com a família [...].

Os componentes familiares demonstram possuir idéias restritas sobre a Reforma Psiquiátrica e refletem a ênfase dada pelos terapeutas institucionais aos aspectos intrapsíquicos do problema em detrimento de sua abordagem psicossocial.

Qualquer tratamento que não leve em consideração o indivíduo em sua totalidade, incluindo sua interação com ele, possui eficácia questionável8.

Também observamos que as famílias, ao discutirem a Reforma, como projeto socializador do paciente institucionalizado, não atentam para um aspecto que nos parece fundamental para a construção e inserção do sujeito na sociedade capitalista, que é ser sujeito ativo no sistema produtivo.

Dentre os entrevistados, 25% adotam como concepção principal a idéia de que o objetivo primordial da Reforma Psiquiátrica é acabar com o hospital psiquiátrico, sinalizando preocupações sobre a possibilidade de que essa manobra agrave ainda mais a carência de infra-estrutura para atender as demandas da clientela.

Podem até acabar com o hospital psiquiátrico, mas tem que ter outro tratamento pra acompanhar aqueles pacientes [..] tem casos também que requer internação, então eu acho que o hospital deve ficar para aqueles que não podem realmente ficar em casa, que são violentos, né?

O hospital é visto pelos entrevistados como uma necessidade em razão da inabilidade dessas famílias para administrar conflitos decorrentes das tensões geradas pela experiência com o transtorno mental, propiciando-lhe alívio temporário.

O teste de associação livre das palavras configuradas nas representações dos membros familiares acerca da reforma psiquiátrica revelou diversas representações ilustradas a seguir.

A análise mostra aspectos do universo conceitual construído a partir da experiência cotidiana das famílias e retrata as representações das palavras indutoras:

Loucura: perturbação, juízo fraco, fora do limite da normalidade, doença da mente.

Doença mental: nervosismo, agressividade, alienação, mal sem cura, fazer o que vem à cabeça, doença que surge de repente, problema, tristeza, possessão, doença de família.

Estas representações sobre loucura e doença mental são percebidas de modo diferente. A loucura é encarada como uma doença que torna a mente fraca; a pessoa que tem juízo fraco tem perturbações que afetam o modo de vida, as relações sociais, caracterizadas pela adoção de condutas inadequada aos padrões sociais, estando, portanto, fora do limite da normalidade. Nesta representação, a loucura é entendida como rebeldia e doença mental como sujeição, algo inevitável. Loucura e doença mental são estádios distintos, pois o louco não tem consciência de sua doença, de estar no mundo, e o doente mental reconhece sua doença e submete- se ao tratamento. A crença de que a loucura é alienação completa, rebeldia, agressividade, desrazão, faz com que as famílias continuem defendendo a separação entre loucos e os doentes mentais por considerarem os últimos uma classe diferenciada em decorrência da sua capacidade de sujeitar-se ao tratamento institucional e reunir condições mínimas, necessário para o convívio social.

Família: base da sociedade, união amor, divino, solidariedade.

A família é idealizada como uma instituição criada por Deus a fim de servir de base para a sociedade. Estão implícitas as funções de socialização e a crença de que a sociedade é um reflexo da formação familiar. As relações se caracterizam por atitudes de cooperação, união e sentimentos positivos, como o amor. Os conflitos e antagonismos de classe presentes na sociedade e que permeiam os destinos dos indivíduos e famílias não são considerados como fatores constituintes da sociabilidade na sociedade moderna.

A experiência cotidiana na família na convivência com o portador de doença mental é marcada de sofrimento e reflete a inabilidade de lidar com a doença, tornando-a fator gerador de estresse. Diante da impossibilidade concreta de mudar a sua realidade, as famílias desenvolvem crenças de que a experiência com o transtorno mental é uma mera destinação divina, algo que lhes foi atribuído ou consentido por Deus, visando à purificação de pecados e à elevação da alma, justificando, portanto, a busca de apoio espiritual.

Internação: isolamento, distância, sofrimento, tratamento, população não produtiva, desprezo, alívio.

Manicômio: lugar de exclusão, cativeiro, preconceito, loucura, desumanidade.

Reforma psiquiátrica: novo tratamento, liberdade, outro hospital, necessidade, mudança, acabar com hospital psiquiátrico.

As três representações ora descritas constituem a forma de pensar dos entrevistados envolvendo estas categorias tão presentes no cotidiano das famílias. A internação representa para a família o distanciamento do paciente e seu isolamento. Os pacientes são tratados, nas instituições, com desprezo, além de permanecerem alijados dos meios sociais de produção. Embora seja uma forma de tratamento, esta impõe sofrimento para os pacientes e familiares, ainda que representem um alívio para algumas famílias.

O manicômio é percebido como lugar de exclusão, uma vez que eles ainda compreendem que estas instituições se destinam aos loucos, desempregados, aposentados, velhos, aleijados e criminosos. É um cativeiro, pois mantém os pacientes presos, fora do convívio social. Os representantes familiares definem o tratamento como desumano, porque destitui o sujeito de seus direitos, de sua liberdade, tratando-o com preconceito, tendo como função a segregação de todas as pessoas cujos comportamentos fogem às regras.

Quanto à Reforma Psiquiátrica, significa para eles uma nova forma de tratamento. Neste contexto, as famílias demonstram perceber as mudanças ocorridas na maneira de tratar os pacientes. Aquelas que testemunham o tratamento em outras instituições psiquiátricas que não o hospital psiquiátrico percebem esta realidade dos manicômios de forma distanciada, algo de que não fazem parte, afirmando que seus pacientes possuem hoje condições que viabilizam sua convivência no seio da família, e acreditando serem eles muito diferentes daqueles que ainda estão encarcerados no hospital psiquiátrico.

Ressocialização: novo caminho, nova vida, solidariedade, novas amizades.

Cidadania: poder, ter direitos, saber ser brasileiro, cooperação, ter trabalho, convivência, ser respeitado.

Saúde: felicidade, vitalidade, lazer, ausência de doenças.

Estas representações evidenciam que as famílias percebem os ganhos e as conquistas alcançadas. A ressocialização representa uma nova forma de vida que possibilita ao portador associar- se a outras pessoas, estabelecendo relações mais solidárias. Embora seja encarada como um novo caminho, a idéia de ressocialização restringe-se a um aumento da tolerância social, sem que isto signifique o crescimento da contratualidade social, inserção no mercado de trabalho e utilização das potencialidades do portador, uma vez que ele é visto ainda como alguém incapaz de viver na sociedade.

A cidadania é a condição de poder e direitos sociais. É cidadão, todavia, aquele que tem trabalho, moradia, condições de sobrevivência, os quais, no contexto do portador de doença mental, constituem requisitos essenciais para a promoção da convivência social, do exercício pleno de direitos e da capacidade de impor respeito. Concluímos então, que, atualmente, o portador de transtorno mental não possui condições de exercer sua cidadania, uma vez que é ele é mantido à margem da sociedade produtiva; em sua maioria, pertencem a estrato desprovido de poder econômico, vendo com isto comprometida a sua efetiva convivência social.

A saúde é representada pelas famílias como ausência de doença e presença de felicidade plena, gosto pela vida, energia, possibilidade de acesso ao lazer. São situações indispensáveis à saúde, porém não refletem as necessidades globais dos usuários de saúde - o ser portador de doença mental e sua família.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo permitiu desvendar a visão das famílias acerca da doença mental, trazendo relatos de suas experiências cotidianas, relacionando dificuldades e mecanismos de enfrentamento utilizados pelas famílias, a percepção sobre as instituições e modalidades de tratamento. Esta construção possui reflexos importantes no modo como a família representa o processo da reforma psiquiátrica.

Para as famílias, a Reforma Psiquiátrica traz como proposta básica eliminar os hospitais psiquiátricos, instituindo mudanças no modo de tratar o paciente, tais como: propor um novo tipo de tratamento e construção de um outro tipo de hospital que propicie mais liberdade ao usuário dos serviços. Referidas mudanças são percebidas pelas famílias como necessárias, embora elas enfatizem a necessidade de manter as instituições manicomiais, a fim de abrigar alguns pacientes, pela própria dificuldade estrutural destas famílias em abarcar as demandas de cuidados e custos financeiros com o cliente.

A compreensão das famílias acerca da Reforma Psiquiátrica, portanto, ainda não atingiu a dimensão de processo mais global, uma perspectiva ética que exige esforços integrados de todos aqueles que se interessam pela saúde e bem-estar dos doentes. Assim sendo, tornou-se evidente que as expectativas das famílias sobre esse processo de adoecer se reduzem ao aperfeiçoamento das instituições e modalidades de tratamentos existentes, sem, contudo, negá-las.

Ao concluir este estudo, embora não tenhamos pretensão de esgotar o tema, acreditamos haver contribuído para ampliar a compreensão dos profissionais de saúde mental acerca do universo perceptual das famílias com relação à Reforma Psiquiátrica e sua inserção no processo, oferecendo, com isto, subsídios para o aprimoramento da prática assistencial.

Recebido em: 15 de fevereiro de 2004

Aprovação final: 15 de setembro de 2004

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Recebido
      15 Fev 2004
    • Aceito
      15 Ago 2004
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