Perfil de egressos de Enfermagem: competências e inserção profissional^*

Resumos

Objetivo:

avaliar o perfil dos egressos de Enfermagem uma faculdade pública a partir da percepção de competências desenvolvidas durante a graduação e do processo de inserção profissional.

Método:

estudo quantitativo, exploratório e descritivo. Compôs-se a amostra por 216 egressos. Os dados foram coletados por questionário validado e encaminhado a uma população de 470 egressos via correio eletrônico. Para a análise dos dados, aplicaram-se frequências, média e desvio-padrão e, para a correlação, o teste qui-quadrado.

Resultados:

a maioria dos participantes era do sexo feminino (88%) e a média de idade foi de 29,62 anos. A maioria (65%) possuía vínculo empregatício, 14% trabalham em uma única instituição e 48% começaram a trabalhar seis meses após a conclusão da graduação. Quanto à forma de trabalho, 56% atuam na assistência, com média de 4,5 salários mínimos e carga horária semanal entre 37 e 44 horas. A maioria reportou aquisição de competência para exercer a profissão, assistindo o paciente na sua integralidade com ética e aplicando conceitos técnicos e científicos no cuidado.

Conclusão:

o estudo viabilizou a descrição das singularidades da formação do enfermeiro, da inserção no mundo do trabalho e o impacto para a instituição educacional formadora, bem como a apresentação das competências específicas a partir da ótica dos próprios egressos.

Descritores:
Educação em Enfermagem; Estudantes de Enfermagem; Currículo; Mercado de Trabalho; Recursos Humanos em Saúde; Competência Profissional

Objective:

evaluate the profile of the graduates of Nursing a public college from the perception of skills developed during graduation and the process of professional insertion.

Method:

quantitative, exploratory and descriptive study. The sample was composed of 216 graduates. The data was collected by a validated questionnaire and sent to a population of 470 egresses via electronic mail. For the analysis of the data, frequencies, mean and standard deviation were applied and, for the correlation, the chi-square test.

Results:

the majority of the participants were female (88%) and the mean age was 29.62 years. The majority (65%) had an employment relationship, 14% worked in a single institution and 48% started working six months after graduation. Regarding the form of work, 56% work in care, with an average of 4.5 minimum wages and a weekly workload between 37 and 44 hours. The majority reported competence acquisition to practice the profession, assisting the patient in his integrality with ethics and applying technical and scientific concepts in care.

Conclusion:

the study made it possible to describe the singularities of nurses’ education, their insertion in the world of work and the impact on the educational institution, as well as the presentation of specific competences from the perspective of the graduates themselves.

Descriptors:
Education, Nursing; Students, Nursing; Curriculum; Job Market; Health Manpower; Professional Competence

Objetivo:

evaluar el perfil de egresados del curso de enfermería de una universidad pública, a partir del análisis de las competencias adquiridas durante su formación académica, así como de su proceso de inserción profesional.

Método:

estudio cuantitativo, exploratorio y descriptivo. La muestra fue realizada con 216 egresados. Los datos se recolectaron por medio de cuestionario validado y encaminado vía correo electrónico a 470 egresados. Para el análisis de los datos se consideraron frecuencias, media y desviación estándar y para la correlación se aplicó la prueba chi-cuadrado.

Resultados:

la mayor parte de los participantes era de sexo femenino (88%) con un promedio de edad de 29,62 años. La mayoría (65%) contaba con vínculo laboral, un 14% trabajaba en una única institución y un 48% comenzó a trabajar seis meses después de la conclusión de los estudios universitarios. En relación a la forma de trabajo, el 56% actúa en la asistencia, con un ingreso promedio de 4,5 salarios mínimos y una carga horaria semanal de 37 a 44 horas. La mayoría reportó haber adquirido competencia para ejercer su profesión atendiendo a los pacientes de forma integral, ética y aplicando conceptos técnicos y científicos para su cuidado.

Conclusión:

el estudio posibilitó describir singularidades de la formación del enfermero, su inserción en el mundo laboral y el impacto para la institución educativa formadora, así como la presentación de competencias específicas desde la óptica de los propios egresados.

Descriptores:
Educación en Enfermería; Estudiantes de Enfermería; Curriculum; Mercado de Trabajo; Recursos Humanos en Salud; Competencia Profesional

Introdução

A formação dos profissionais de saúde, ao longo da trajetória histórica do Brasil, inclinou-se a acompanhar as exigências do mundo do trabalho e do contexto político, social e econômico. Nesse sentido, a organização curricular das escolas formadoras, com vistas a atender ao modelo biomédico dominante, contribuiu, por vezes, para uma educação tecnicista, hospitalar e curativa⁽¹⁾. Esse modelo se aproxima do padrão Flexneriano, criado nos Estados Unidos, em 1910, para atender ao complexo médico-industrial, a partir da especialização precoce dos profissionais, para atuar recuperando desajustes⁽¹⁾.

Não obstante, com o movimento da medicina social^(2-3) e a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), redirecionou-se a formação com vistas à promoção, prevenção e recuperação da saúde, com enfoque na comunidade^(3-4). Além disso, houve estímulo nas bases curriculares às competências essenciais, como o pensamento crítico, a iniciativa, a autonomia, a criatividade e a capacidade de resolução de problemas^(4-5). Entende-se por competências um conjunto de habilidades, conhecimentos, atitudes e valores interdependentes e necessários à execução de ações, visando a uma atuação eficiente no exercício da atividade profissional^(5-6).

No contexto da área de saúde, mais especificamente na formação do enfermeiro, as competências extrapolam as habilidades psicomotoras, expandindo-se para o desenvolvimento baseado em habilidades cognitivas, emocionais e sociais que convergem para a tomada de decisão e resolução de problemas^(5-7). No Brasil, do egresso da graduação em Enfermagem, espera-se que tenha uma formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, com vistas a atuar, de forma resolutiva, nos indicadores de saúde, a partir do cuidado integral e transdisciplinar^(7-9).

Diante do exposto, entende-se que o perfil do enfermeiro expresso nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem (DCN/ENF) seja de um profissional com competências, habilidades, atitudes e valores para tomar decisões assertivas nas diferentes necessidades/realidades e níveis de atenção^(7-8,10-11). Assim, uma formação que promova autonomia profissional, inter e transdisciplinaridade, capacidade de autoaprendizagem, aproximação dos serviços de saúde e enfoque no cuidado ético e integral torna-se decisiva no preparo qualificado dos futuros enfermeiros^(9-10).

Nesse sentido, pesquisa realizada com 505 egressos avaliou as competências e habilidades desenvolvidas durante a graduação a partir de aspectos expressos nas DCN/ENF. Para esses egressos, ficou evidenciada a necessidade de maior estímulo à autonomia, troca de experiências e inserção precoce nos serviços de saúde⁽⁵⁾.

Outros estudos^(10-12) consideram promissora a proposta curricular que trabalha as competências a partir da inserção precoce do estudante nos cenários de práticas. Esse processo oportuniza a integração ensino-serviço-comunidade mediando o contato do estudante com os desafios singulares e plurais da profissão. Entre essas propostas, destacam-se o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) e o Programa de Educação pelo Trabalho em Saúde (PET-Saúde), que propõem, em suas bases, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa, extensão e serviço^(11-14).

Contudo, apesar de as DCN/ENF atuarem como eixo norteador na construção do perfil do egresso, estudos(5,13-15) apontam a importância da realização de investigações que busquem a compreensão do processo de formação do enfermeiro a partir da ótica do próprio egresso, permitindo, assim, o aperfeiçoamento e a reestruturação de currículos em consonância com as demandas locorregionais e nacionais.

Nessa lógica, a perspectiva dos egressos pode operar como indicador do processo formativo e da inserção profissional, permitindo comparações, ajustes e mudanças curriculares quando pertinentes. Essa premissa justificou a realização desta investigação, que teve por objetivo avaliar o perfil dos egressos de Enfermagem de uma faculdade pública a partir da percepção de competências desenvolvidas durante a graduação e do processo de inserção profissional.

Método

Trata-se de um estudo exploratório e descritivo, com abordagem quantitativa, realizado com enfermeiros egressos de uma Faculdade de Enfermagem púbica do Estado de Minas Gerais. Nesta instituição, atualmente, o bacharelado é desenvolvido em dez semestres e em período integral. São admitidos, por semestre, 40 estudantes por meio do Programam de Ingresso Seletivo Misto (Pism) e do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) do Ministério da Educação.

A coleta de dados foi realizada entre os meses de agosto de 2017 e abril de 2018. A população do estudo foi constituída por 470 egressos graduados entre os anos de 2005 e 2017. Foram estabelecidos como critérios de inclusão: ter correio eletrônico cadastrado na coordenação de curso e ter concluído a graduação entre os anos de 2005 e 2017. O ano de 2005 foi estabelecido como limite mínimo de inclusão, pois, se considerou que nele se formou a primeira turma após a promulgação das DCN/ENF de 2001. Excluíram-se estudantes que não concluíram e/ou desistiram do curso e que não responderam à solicitação de preenchimento do questionário mesmo após cinco tentativas.

Estabeleceu-se cálculo de amostra, para a população finita, com 95% de confiança e erro de 5%, considerando estimativa da proporção igual a 50%. Foi obtido tamanho de amostra igual a 212 para atender ao requisito estatístico de validade. Nesse sentido, fizeram parte da amostra 216 egressos.

Os dados foram coletados por aplicação de instrumento validado⁽¹⁶⁾, adaptado para pesquisa on-line, por meio da ferramenta de formulários do Google Docs, com perguntas semiabertas, de múltipla escolha e escalas tipo Likert.

O instrumento⁽¹⁶⁾ é composto por três dimensões: características sociodemográficas, com 13 questões fechadas e semiabertas; caracterização da inserção e da trajetória profissional, com nove questões de múltipla escolha e avaliação do processo de formação profissional, com oito questões construídas no formato de escala tipo Likert, de um a cinco, em que um significa “Concordo totalmente e cinco, “Discordo totalmente”.

Os dados obtidos por meio do questionário on-line foram tabulados em uma planilha do Excel - Microsoft Office 2010 e, em seguida, transferidos para a análise no software Statistical Package For The Social Science (SPSS), versão 21.

A análise descritiva e exploratória dos dados foi realizada por meio de frequências absolutas e relativas, média e desvio-padrão e a correlação entre as variáveis qualitativas, pelo teste qui-quadrado.

O estudo atendeu a todos os preceitos éticos, tendo aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob n.º CAAE 66674917.5.0000.5147 e parecer n.º 2.253.442.

Resultados

Do total de 470 egressos elegíveis, foram excluídos dois (0,4%) por não possuírem correio eletrônico cadastrado na faculdade, 89 (18,9%) desistiram/não concluíram o curso e 163 (34,7%) não responderam ao questionário. Dessa forma, participaram deste estudo 216 egressos (46%), dos quais 56% concluíram o curso entre os anos de 2011 e 2016. Em relação aos dados sociodemográficos, a maioria era do sexo feminino, com média de 29,62 anos (DP =8,2) e com cor autodeclarada branca. Quanto ao local de moradia, a maioria estava residindo no Estado de Minas Gerais e 23,1%, em outros Estados brasileiros, com destaque para o Rio de Janeiro (Tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas dos egressos do Curso de Graduação em Enfermagem (n = 216), Minas Gerais, Brasil (2017-2018)

Característica	N	%
Sexo
Feminino	191	88
Masculino	25	12
Cor
Branca	143	66
Parda	57	26
Negra	13	6
Amarela	1	0,5
Não declarada	2	1
Local de Moradia
Juiz de Fora	122	56
Municípios da Zona da Mata mineira	21	9,7
Capital e região metropolitana	7	3,2
Interior do Estado	15	6,9
Outros Estados do Brasil	50	23,1
Outro país	1	0,6
UF
Minas Gerais	165	76,3
Rio de Janeiro	36	16,6
São Paulo	7	3,2
Distrito Federal	3	1,4
Bahia	2	0,9
Mato Grosso do Sul	1	0,4
Rio Grande do Sul	1	0,4
Outro (Iowa/ EUA)	1	0,4
Ano de conclusão do curso
Até 2005	4	2%
De 2006 a 2010	91	42%
De 2011 a 2015	75	35%
De 2016 em diante	46	21%

Em relação às atividades acadêmicas realizadas no período da graduação, 188 egressos (86%) participaram de projetos ou de programas vinculados à extensão e pesquisa e 132 (61%) relataram ter atuado como monitores.

Já quanto à trajetória acadêmica após a graduação, a maioria dos egressos (44,5%) estava cursando ou já possuía pós-graduação Stricto sensu, seguida de 43% que estavam cursando ou possuíam especialização Lato sensu.

Em relação à inserção profissional após a conclusão do curso, 48% dos egressos iniciaram as atividades em até seis meses e a maioria (67%) conseguiu o primeiro emprego em até um ano após a formatura. Quanto à situação empregatícia, verificou-se que a maioria (65%) possuía vínculo no qual exerce atividade como enfermeiro. Destes, 14% trabalhavam em uma única instituição. Cabe destacar que 41 egressos (19%) declararam estar desempregados no momento da pesquisa e 35 (16%) relataram possuir vínculo de trabalho fora da Enfermagem.

Foi verificada associação significativa entre o ano de graduação e o fato de ter ou não emprego. Para aqueles que concluíram a faculdade até 2010, foi encontrada significância estatística (p< 0,001), havendo, pois, mais pessoas empregadas no interstício de formatura de 2007 a 2010 do que de 2011 a 2017.

Entre as áreas de atuação profissional, expressiva parcela (56%) atuava na assistência, seguida da educação (30%). Quanto à caracterização da trajetória profissional, verificou-se que 77 (36%) ingressaram na profissão por concurso público, seguidos de 42 (19%) que o fizeram via processo seletivo. No que tange à natureza da instituição em que trabalhava no momento da coleta de dados, a maioria (47%) atuava na rede pública e 17 (8%), em instituições privadas. Quanto à renda mensal, 50% possuíam uma faixa salarial entre dois e sete salários, com média de 4,5 salários mínimos. Já em relação à carga horária semanal de trabalho, a maior frequência (38%) de respostas esteve entre 37 e 44 horas semanais e a menor (3%), com carga horária semanal acima de 60 horas.

As respostas às competências preconizadas para uma formação integral do profissional enfermeiro, com ênfase nas DCN/ENF e nos princípios do SUS, tiveram seus resultados sumarizados, conforme a Tabela 2.

Tabela 2
Distribuição das respostas quanto às competências percebidas para o exercício de atividades inerentes à profissão (n=216), Minas Gerais, Brasil (2017-2018)

Atividades inerentes à profissão	DT*	D†	NDC‡	C§	CT‖
Promoção/prevenção/proteção/reabilitação nos diversos níveis	4%	8%	7%	51%	30%
Ações às diferentes necessidades	4%	9%	12%	46%	30%
Saúde do Homem	8%	24%	37%	23%	8%
Saúde da Mulher	4%	6%	6%	43%	40%
Saúde do Recém-nascido	6%	17%	16%	47%	14%
Saúde da Criança e do adolescente	3%	12%	19%	49%	17%
Saúde do Adulto	6%	8%	12%	48%	27%
Saúde do Idoso	5%	13%	23%	47%	13%
Aplicar processo de Enfermagem	6%	10%	22%	40%	22%
Integralidade da assistência	3%	11%	10%	44%	31%
Tomar decisões	6%	8%	15%	46%	25%
Ser agente de transformação	4%	6%	14%	46%	30%
Princípios éticos e legais	6%	2%	3%	31%	58%
Gerenciar com ética e bioética	6%	2%	6%	36%	50%
Manter sigilo das informações	6%	1%	3%	29%	60%
Cumprir normas dos Conselhos	5%	5%	8%	35%	47%
Planejar/participar de pesquisas	5%	16%	21%	39%	19%
Prática baseada em evidências	5%	14%	25%	40%	16%
Atividades políticas/planejamento	5%	10%	14%	44%	28%
Coordenar o processo de cuidar	5%	5%	10%	50%	29%
Formação de recursos humanos	3%	7%	17%	46%	27%
Programa educação permanente	3%	5%	17%	49%	26%
Programa educação/promoção à saúde	4%	5%	16%	49%	27%
Coordenar equipe Enfermagem	5%	7%	13%	41%	34%
Administrar conflitos	7%	13%	23%	36%	22%
Gerir o processo de trabalho	2%	14%	16%	47%	20%
Cooperar com a equipe de saúde	4%	7%	10%	45%	33%
Análise custo-efetividade/benefício	9%	19%	24%	30%	19%

• ^*
  Discordo totalmente;
• ^†
  Discordo;
• ^‡
  Nem discordo nem concordo;
• ^§
  Concordo;
• ^‖
  Concordo totalmente

Os nove primeiros itens avaliados na escala estão relacionados à competência para as atividades privativas do enfermeiro, em cada campo. Nesse contexto, considerando “concordo” e “concordo totalmente”, houve prevalência (81%) dos que avaliam que a graduação os preparou para exercer ações de promoção, prevenção, proteção e reabilitação, na perspectiva da integralidade da assistência, seguidos de 83% que se sentiram aptos para atuar em programas de assistência integral à saúde da mulher. Contudo, no que diz respeito à competência para atuar nos programas de assistência integral à Saúde do Homem, 31% dos egressos reconheciam estar aptos. Com relação à competência para assistir o paciente de forma integral, itens dez a 12, observa-se o predomínio de respostas que indicam habilidades para promover estilos de vida saudáveis e conciliar as necessidades dos usuários.

Quando avaliadas as competências acerca das questões éticas no exercício da Enfermagem, itens 13 a 16, percebe-se que, entre todos os blocos de questões, esse foi o que apresentou maior frequência de respostas positivas. Para os egressos analisados, 58% e 60%, respectivamente, responderam concordar totalmente que, durante a graduação, aprenderam a respeitar os princípios éticos, legais e humanísticos da profissão e zelar pela privacidade do usuário atendido, assegurando o completo sigilo das informações adquiridas durante o atendimento.

Avaliou-se, também, a competência técnica e científica para o exercício da Enfermagem. Nesse bloco de itens, 17 e 18, houve uma frequência com tendência positiva, sendo que 58% dos egressos acreditam que foram capacitados, durante a graduação, para planejar e produzir conhecimento científico por meio de pesquisas na área da Enfermagem. Quanto a reconhecer o papel social do enfermeiro em atividades políticas e de planejamento em saúde, coordenando todas as fases do processo de cuidar em Enfermagem, itens 19 e 20, a maioria dos egressos se sentia habilitada.

No que diz respeito à educação em saúde, itens 21 a 23, a maior parte dos egressos avaliou ter sido preparada para planejar, implementar e participar de programas de educação permanente no serviço. Da mesma forma, para o bloco de questões acerca do trabalho em equipe e administração de conflitos, itens 24 e 25, houve consonância para respostas positivas. Contudo, a competência para a coordenação de atividades de equipe de Enfermagem recebeu respostas mais positivas do que os itens que avaliaram a competência para administrar conflitos da equipe de Enfermagem e multiprofissional.

No bloco que avalia a competência para a gestão em saúde, itens 26 a 28, a cooperação com a equipe na gestão de saúde se destacou em relação aos itens que avaliavam aspectos de gestão do processo de trabalho e análise de custo-efetividade, custo-benefício e custo-utilidade de produtos e procedimentos em saúde.

Cabe destacar que, subsequente à aplicação do questionário, foi testado o Coeficiente Alfa de Cronbach, sendo verificada alta confiabilidade (µ > 0,8) do instrumento empregado na coleta de dados.

Discussão

A partir dos dados sociodemográficos, observou-se que os participantes deste estudo eram predominantemente adultos jovens, brancos e do sexo feminino. Corroborando esse resultado, outras pesquisas^(5,17-18) realizadas com egressos de Enfermagem têm apontado a predominância feminina e faixa etária média inferior a 32 anos.

De forma global, estudos internacionais^(17-19) destacam a crescente inserção das mulheres com menos de 30 anos no mundo do trabalho, com destaque para a Enfermagem na área de saúde. Contudo, em relação à empregabilidade, a Enfermagem tem experimentado demanda por empregos abaixo da oferta do mercado nas regiões Sul e Sudeste do país⁽²⁰⁾.

Semelhantemente a outros estudos^(5,18,20), a maioria dos egressos permaneceu na região em que se graduou. No Brasil, há expressivo quantitativo de enfermeiros na região Sudeste, com destaque para os Estados de São Paulo (24,6%), Rio de Janeiro (11,1%) e Minas Gerais (10,4%). Por outro lado, evidencia-se a escassez de profissionais em regiões mais carentes como Norte e Nordeste, provocando desigualdades de cobertura assistencial à saúde nessas localidades⁽²¹⁾.

Em relação às atividades extraclasse desenvolvidas pelos egressos durante a graduação, houve menção à extensão e monitoria, seguidas da pesquisa. Essas atividades, com destaque para a extensão universitária, viabilizam uma formação crítica, criativa e resolutiva, voltada para o atendimento das mais variadas demandas sociais de saúde atreladas ao mundo do trabalho. Cabe destacar que, na Enfermagem, a inserção de acadêmicos em grupos e produções científicas ainda é incipiente e indica a necessidade de se trabalhar a indissociabilidade entre ensino, extensão e pesquisa^(5,22-24).

Com relação à especialização, ficou evidenciado que parte dos egressos procurou qualificação em cursos de pós-graduação Stricto sensu e Lato sensu. Contudo, estudo congênere, realizado no Estado de São Paulo, encontrou uma inserção maior em cursos de Pós-Graduação Lato sensu (63,9%)⁽⁵⁾.

Em relação à inserção no mundo do trabalho, verificou-se que a maioria começou a exercer a profissão em até 12 meses após a formatura, com prevalência da área assistencial, recebendo, em média, 4,5 salários mínimos, por até 44 horas semanais de trabalho.

Averiguou-se, corroborando os dados, que estudo realizado com 172 egressos de uma faculdade pública verificou que 52,9% dos enfermeiros se inseriram na profissão em até seis meses após a formatura⁽⁵⁾. Contudo, outro estudo evidenciou que, apesar de a maioria dos participantes estar empregada, houve relato de dificuldades para o ingresso no mercado de trabalho⁽²⁵⁾. Nesse sentido, é pertinente destacar as dificuldades naturais para se conseguir o primeiro emprego, tendo em vista, principalmente, a falta de experiência prévia, a saturação do mercado de trabalho em regiões como o Sudeste ou até mesmo a incompatibilidade com o perfil exigido pelo empregador. A realização de estágios extracurriculares e de especialização na modalidade de residência tem sido boa opção de treinamento em serviço que intermedeia a transição da universidade para o mundo do trabalho⁽²⁴⁾.

No que diz respeito às competências desenvolvidas durante a graduação, houve predomínio de respostas que vão ao encontro do que estabelecem as DCN/ENF e a formação para o SUS. Nesse sentido, os participantes expressaram que a graduação os habilitou para tomar decisão e intervir nos problemas de saúde a partir de uma assistência integral e efetiva nos diferentes níveis de atenção à saúde.

Consonante com esses resultados, uma pesquisa⁽⁵⁾ descreveu que 62% dos egressos concordaram que a graduação possibilitou o desenvolvimento de competências relacionadas à promoção, prevenção, proteção e reabilitação nos diversos níveis de atenção, sob a perspectiva da integralidade. Porém, estudos^(5,25) realizados com enfermeiros revelaram que, ao chegar ao mercado de trabalho, identificaram preparo limitado, dificuldade para tomar decisão e para enfrentar a realidade assistencial específica de hospitais, tendo sido necessária a busca por cursos de especialização.

Cabe ressaltar que, nesta investigação, poucos concordaram que, ao concluir a graduação, estavam aptos a atuar em programas de assistência integral à Saúde do Homem. Diferentemente de programas que historicamente alcançaram avanços, como a saúde materno-infantil, o programa de saúde do homem é uma política recente, necessitando, pois, de estratégias que qualifiquem os futuros enfermeiros a intervir na saúde dessa população. Nesse sentido, estudos^(26-27) têm apontado baixa adesão dos homens aos serviços de saúde, o que suscita, na graduação, estratégias curriculares transversais sobre a saúde do homem e programas de educação permanente em serviço.

Em relação à competência para atuar frente às questões éticas, observou-se que, semelhantemente a outras investigações, os egressos se sentiram aptos a atuar diante de aspectos legais e humanísticos da profissão sustentados nos princípios da bioética^(5,25). Estudo⁽²⁸⁾ finlandês destacou a capacidade percebida de recém-formados em Enfermagem para a tomada de decisão guiada por valores éticos (86,8%). Outro estudo⁽²⁹⁾, realizado com enfermeiros recém-formados, encontrou forte correlação entre competências fundamentais ao exercício da Enfermagem e aspectos éticos e bioéticos.

Neste estudo, a maioria dos egressos avaliou positivamente o curso no que diz respeito às competências adquiridas para o desempenho técnico-científico da profissão em atividades políticas, de planejamento, de educação em saúde e de educação permanente. Cabe destacar que, apesar de as competências para as atividades de gestão terem sido avaliadas de forma positiva, ao compará-las com as demais habilidades, esse grupo de respostas obteve a menor pontuação, com destaque para a gestão de conflitos e análise de custo-efetividade. De alguma maneira, isso se relaciona às especificidades de cada organização/instituição, além de uma formação pouco atrelada a situações reais da prática de trabalho. Estudos^(25,29-31) apontam que, além dos desafios do início da carreia, o jovem enfermeiro, enquanto gestor do serviço/equipe de Enfermagem, muitas vezes, enfrenta dilemas como recursos humanos e materiais limitados, relacionamentos interpessoais conflituosos, gestão organizacional rígida e demanda assistencial variada.

Nesse sentido, cumpre ressaltar sobre a necessidade de estratégias que aproximem as vivências acadêmicas do cotidiano de trabalho do enfermeiro. Além disso, a educação permanente, mediada pelas instituições de ensino e/ou serviços, mostra-se como importante ferramenta de produção de competências, valores profissionais e qualificação do cuidado⁽³¹⁾.

Por fim, cabe refletir sobre o Nurse of the future nursing core competencies, ⁽³²⁾ que enumera estrategicamente dez competências essenciais à formação e prática do enfermeiro do futuro, a saber: cuidado paciente-centrado; profissionalismo; liderança; prática baseada em sistemas; habilidade em informática e tecnologia; comunicação; trabalho colaborativo em equipe; segurança; melhoria da qualidade e prática baseada em evidência ^(32-33). Essas competências (re) delineiam o perfil contemporâneo do egresso, comprometido de modo social, ético e político com a profissão e a saúde da população⁽³³⁾.

Em relação às limitações do estudo, indicam-se a realização de investigação em uma única instituição de ensino e a ausência de avaliação qualitativa que permitisse verificar os sentidos e significados das competências desenvolvidas e o processo de inserção profissional.

Além disso, alguns enfermeiros que participaram do estudo tinham até 12 anos de formados e, certamente, maior experiência profissional quando comparados aos recém-formados. Essa variável pode ter gerado heterogeneidade nas informações prestadas e/ou dificuldade para avaliar as competências, considerando que as mudanças são constantes no processo de formação.

Todavia, os resultados da pesquisa trazem contribuições para elucidar o processo formativo do enfermeiro, suas potencialidades e limitações, a inserção no mercado de trabalho, além de fortalecer reflexões sobre a proposta das novas DCN/ENF que se encontram em discussão no país.

Conclusão

A investigação possibilitou delinear o perfil dos egressos de Enfermagem de uma faculdade pública a partir da percepção das competências desenvolvidas durante a graduação e do processo de inserção profissional. A maioria dos participantes é composta por mulheres, encontra-se na região em que se graduou e conseguiu o primeiro emprego em até um ano após a formatura.

Durante a graduação, a atividade extraclasse mais frequente foi a extensão universitária. Para os egressos, a graduação possibilitou o desenvolvimento de competências para a educação em saúde, promoção, prevenção, proteção e reabilitação nos diversos níveis de atenção sob a perspectiva da bioética. Expressam que foram preparados para atuar como agentes sociais nas atividades políticas e de planejamento de saúde e Enfermagem. Contudo, comparada às outras competências, houve menor pontuação para a aptidão em atuar em programas de assistência integral à Saúde do Homem, gestão de conflitos e análise de custo-efetividade.

• *
  Artigo extraído da dissertação de mestrado “Egressos de Enfermagem da Universidade Federal de Juiz de Fora: competências e inserção profissional”, apresentada à Universidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Enfermagem, Juiz de Fora, MG, Brasil.

Agradecimentos

Agradecemos a todos os egressos da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Juiz de Fora que viabilizaram essa investigação a partir das informações prestadas.

References

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  28 Out 2019
• Data do Fascículo
  2019

Histórico

• Recebido
  03 Jan 2019
• Aceito
  02 Jul 2019