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A radiação ultravioleta e as lentes fotocrômicas

Ultraviolet radiation and photochromic lenses

Lenses; Porpoises; Ultraviolet rays; Radiation exposure; Radiation; Retina

Lentes; Óculos; Exposição à radiação; Raios ultra-violeta; Radiação; Retina

ATUALIZAÇÃO CONTINUADA

SOCIEDADE BRASILEIRA DE LENTE DE CONTATO E CÓRNEA (SOBLEC)

A radiação ultravioleta e as lentes fotocrômicas

Ultraviolet radiation and photochromic lenses

Paulo Ricardo de Oliveira1 1 Pós-graduando, doutorado, da Clínica Oftalmológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Oftalmologista do Hospital de Olhos de Goiás. 2 Acadêmica - Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro.

Adriana Chaves de Oliveira2 1 Pós-graduando, doutorado, da Clínica Oftalmológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Oftalmologista do Hospital de Olhos de Goiás. 2 Acadêmica - Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro.

Flávia Chaves de Oliveira2 1 Pós-graduando, doutorado, da Clínica Oftalmológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Oftalmologista do Hospital de Olhos de Goiás. 2 Acadêmica - Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro.

INTRODUÇÃO

Quando o oftalmologista é procurado por um paciente, ele espera que o mesmo conheça as lentes de óculos da mesma forma que conhece os medicamentos para tratamento de glaucoma ou as indicações de qualquer procedimento cirúrgico oftalmológico. Portanto, é importante que o oftalmologista tenha um conhecimento amplo dos materiais das lentes de óculos, de suas qualidades e defeitos, bem como dos tratamentos que podem ser aplicados nas mesmas, tornando-as mais confortáveis, e principalmente, protegendo melhor a visão dos usuários.

O espectro da radiação eletromagnética, por ordem de comprimento de onda, consiste de radiação gama, raios X, radiação ultravioleta, luz visível, radiação infravermelha, radar e rádio(1).

O comprimento de onda da luz visível varia de 380 a 760 nm, incluindo as cores violeta, azul, verde, amarela e vermelha.

RADIAÇÃO ULTRAVIOLETA

A radiação ultravioleta (UV), oriunda do sol, chega à superfície da terra com comprimentos de onda de 280 a 380nm e pode causar queimadura de pele, envelhecimento e câncer(2), além de lesões oculares.

As pessoas que exercem profissões que as expõem ao sol durante grande parte do dia, tem 20 vezes mais possibilidade de desenvolver pterígio, do que as que não se expõem. Da mesma forma, os habitantes que moram, nos seus cinco primeiros anos de vida, em países de latitude inferior a 30º, tem 40 vezes mais chance de desenvolver pterígio do que aqueles de áreas localizadas em latitude maior do que 40º(3-4).

A maior fonte de radiação ultravioleta é o sol, porém, ela é produzida também por lâmpadas fluorescentes e de descarga de mercúrio, além de lasers. Existem 3 tipos de radiação ultravioleta: a UV A (315 a 380 nm) utilizada para ornamentação em festas através da chamada luz negra, a UV B (280 a 315nm), que afeta a pele, produzindo eritema e pigmentação e contribuindo para a produção de Vit. D e a UV C (100 a 280 nm) que tem poder germicida(5).

A radiação UV C é absorvida pela camada de ozônio da atmosfera e a que consegue atravessá-la, é filtrada pela córnea. Os raios UV B são filtrados pelo cristalino e os UV A pela retina.

Algumas substâncias podem tornar a pele e o olho mais sensíveis à radiação ultravioleta. Entre elas estão a tetraciclina, as sulfas, as fenotiazinas e o griseofulvin(5). Pacientes em uso desses medicamentos devem evitar exposição prolongada ao sol e usar lentes de proteção.

EFEITOS OCULARES DA EXPOSIÇÃO À RADIAÇÃO ULTRAVIOLETA

Os raios ultravioleta atuam através de efeito químico, são insidiosos, havendo um período de latência de aproximadamente doze horas. Uma dose única forte ou pequenas exposições repetidas podem produzir o mesmo efeito(5). Os sintomas e sinais mais comuns, determinados por uma exposição aguda, são hiperemia, lacrimejamento intenso, prurido, fotofobia, edema conjuntival e palpebral e dificuldade de adaptação ao escuro.

Os efeitos a longo termo de uma exposição prolongada, não representam um risco maior de cegueira, entretanto, é recomendável, alguma forma especial de proteção para pessoas que desenvolvem atividades que as tornam particularmente expostas. As que trabalham no campo estão mais expostas e mesmo aquelas que vivem nas cidades, as paredes brancas e as superfícies de vidro podem aumentar a sua exposição. Existem determinadas atividades em que a utilização de lentes protetoras é quase obrigatória, sendo as mesmas particularmente importantes para os esquiadores, pescadores e profissionais da natação, uma vez que a neve reflete 85% dos raios UV, a água 20% e a areia 10%. A proporção de raios ultravioleta aumenta 10% a cada 1000 metros de aumento na altitude(6). Técnicos de laboratório e fotógrafos que trabalham com UV artificial também necessitam de usar proteção.

As crianças e os idosos são mais vulneráveis à radiação UV(1). Nas primeiras, a pupila está mais dilatada e o olho possui menos pigmento, sendo mais sensível aos raios UV. O cristalino e a córnea são também menos eficientes na filtração. Nas crianças menores de 1 ano de idade 90% dos raios UV A e 50% dos UV B, que chegam ao olho, atingem a retina. Nas de 12 e 13 anos, 60% de UV A e 25% de UV B. Nos adultos acima de 25 anos, a quantidade de luz ultravioleta que atinge a retina diminui consideravelmente.

Como os efeitos geralmente são sentidos a longo prazo, na maioria das vezes após os 50 anos de idade, a tendência natural é não haver uma maior preocupação com o problema e a exposição pode acelerar a deterioração da visão com a idade.

A degeneração macular relacionada à idade ocorre, mais freqüentemente, em pessoas com exposição prolongada à radiação UV. A retinose pigmentar surge na adolescência ou no adulto, piorando com a idade, sendo mais uma razão para proteger esses olhos dos efeitos danosos da radiação UV. Os albinos, pela falta de pigmento, também se constituem em mais um grupo de risco.

O cristalino funciona como um filtro protetor e nos pacientes afácicos, a quantidade de radiação que chega à retina é maior do que nos fácicos e pode causar desde alterações da visão de cores, com diminuição seletiva da sensibilidade dos cones ao azul, até aumento da chance de desenvolver edema macular cistóide(1).

Pessoas com hábitos que determinam intensa exposição ao sol, tem 60% mais possibilidade de desenvolver catarata cortical(7-8).

A adoção de medidas preventivas, como evitar a exposição prolongada, usar chapéu ou boné e, principalmente, utilizar óculos com filtro UV, pode reduzir os efeitos indesejáveis desse tipo de radiação.

O uso de óculos escuros sem filtro UV, em crianças, pode propiciar uma dilatação da pupila, aumentando a penetração da radiação, não sendo, portanto, recomendável.

LENTES FOTOCRÔMICAS

Como o nome indica, as lentes fotocrômicas mudam de cor, quando ativadas pela luz ultravioleta. Portanto, quando expostas à luz solar, elas ficam escuras e em ambiente interno, ou em dias pouco iluminados e à noite, permanecem relativamente claras. Essas lentes estão disponíveis em cristal e em resina. Seus fabricantes, usando diferentes tecnologias produzem lentes de diferentes propriedades(9).

Nas lentes de cristal, os microcristais de prata são distribuídos uniformemente por toda a sua espessura. Ao serem expostas a luz UV, os microcristais se dissociam em partículas de prata livre, que se aglomeram para formar colóides de prata, que absorvem luz, escurecendo as lentes. Quando a exposição cessa, o processo reverte e as lentes ficam claras novamente. As lentes de cristal sofrem também alguma ativação pela luz visível, de baixo comprimento de onda.

No caso das lentes de resina, o material fotocrômico é convertido em corante orgânico, que absorve luz, ocorrendo a mudança de cor. No processo de manufatura, o material fotocrômico é absorvido na superfície da lente até uma profundidade de aproximadamente 0,15mm(9).

As lentes de cristal, devido ao fato do material fotocromático estar distribuido em toda a sua espessura, podem apresentar diferenças na intensidade de coloração quando ativadas, sendo mais intensa nas áreas mais espessas (no centro, no caso das lentes positivas e nas bordas, no caso das negativas) e menos intensa nas áreas mais finas. Nas lentes de resina, a intensidade da coloração é uniforme, porque a camada fotocrômica possui a mesma espessura em toda a sua superfície.

As lentes fotocrômicas de cristal são também conhecidas como fotocromáticas e as de resina, como fotossensíveis. As lentes de qualquer desenho, visão simples, bifocais ou progressivas estão disponíveis em materiais fotocrômicos.

O índice de absorção de luz em ambiente interno e externo pode variar. Por exemplo, 30% em estado não ativado e 85% em estado ativado, ou 15% em ambiente interno (quase clara) e 65% (moderadamente escura) em ambiente externo. As lentes fotocrômicas não ficam completamente claras em ambiente interno.

As que escurecem muito, podem à noite, não ficarem suficientemente claras e não serem adequadas para dirigir.

A luz fluorescente, típica de muitos escritórios, é rica em radiação UV e nesses ambientes, as lentes fotocrômicas podem permanecer parcialmente escurecidas. Por outro lado, algumas pessoas, quando sem óculos com filtro UV, apresentam irritação ocular, sob luz fluorescente, como prurido, hiperemia e lacrimejamento, possivelmente causada pela radiação.

O tratamento anti-reflexo torna as lentes fotocrômicas ligeiramente mais claras em ambiente interno e menos escuras em ambiente externo e a mudança do estado ativado para inativado e vice-versa, pode ser mais lenta. Essa alteração, determinada pelo aumento da transmissão da luz em cerca de 3% é insignificante e não chega a ser percebida pelo usuário.

A absorção da luz ultravioleta e a intensidade da coloração das lentes podem variar com a temperatura ambiente, aumentando com a diminuição da mesma. Portanto, as lentes escurecem mais a baixas temperaturas e clareiam mais rapidamente a temperaturas crescentes(10).

O DESEMPENHO DAS LENTES FOTOCRÔMICAS E O TEMPO DE USO

As lentes fotocrômicas tem a sua capacidade de ativação reduzida com o passar do tempo, sendo recomendável a sua troca a cada dois anos. A "fadiga" da lente pode variar com a exposição mais ou menos freqüente a condições severas. Com o tempo, as lentes de cristal ou de plástico sofrem alteração de seu desempenho. Os cristais fotossensíveis escurecem gradualmente, clareando menos em ambiente interno. Nas lentes de resina, as moléculas fotossensíveis sofrem uma foto-oxidação perdendo sua fotossensibilidade, tornando as mesmas gradualmente mais claras e escurecendo menos quando expostas à radiação UV. Na maioria das vezes, a alteração da prescrição acontece antes da "fadiga" da lente e o usuário não chega a perceber a mudança.

CONCLUSÃO

As lentes fotocromáticas ou fotossensíveis mais do que um recurso utilizado com finalidade estética ou para proporcionar conforto aos usuários de óculos, têm importantes indicações médicas. O seu uso pode reduzir ou retardar a ocorrência de pterígio, catarata e degeneração macular relacionada à idade.

Os efeitos da exposição à radiação utravioleta, geralmente são sentidos somente a longo prazo e esse fato faz com que haja uma certa negligência dos pacientes e dos médicos em relação à proteção dos olhos. Portanto, seria recomendável que os oftalmologistas ficassem atentos ao problema, prescrevendo lentes com filtro ultravioleta sempre que houver indicação, proporcionando mais segurança e comodidade, especialmente às pessoas que ficam grande parte do tempo expostas a esse tipo de radiação.

Descritores: Lentes; Óculos; Exposição à radiação; Raios ultra-violeta; Radiação; Retina/fisiopatologia

Keywords: Lenses; Porpoises; Ultraviolet rays; Radiation exposure, Radiation; Retina/physiopathology

  • 1. Arieta CEL. Efeitos oculares induzidos por raios ultravioleta. Sinop Oftalmol 1999;2:56-8.
  • 2. Stephen G, Davis JK. Spectable lens. In: Tasman W. Duane's clinical ophthalmology. [monografia em CD-ROM]. Philadelphia: J.B. Lippincott; 1998. p. 51
  • 3. Hill JC, Maske R. Pathogenesis of pterygium. Eye 1989;3:218-26.
  • 4. Mackenzie FD, Hirst LW, Battistutta D, Green A. Risk analysis in the development of pterygia. Opthalmology 1992;99:1056-61.
  • 5. Alves AA. Lentes de proteção ocular. In: Alves AA. Refração. Rio de Janeiro: Cultura Médica; 1999. p. 394-414.
  • 6. Transitions Optical. A lifetime under ultraviolet rays. National Association for the Improvement of Sight and Sun Safety; [s.d.] p. 1-9.
  • 7. Taylor HR. Ultraviolet radiation and the eye: an epidemiologic study. Trans Am Ophthalmol Soc 1989;87:802-53.
  • 8. Hu H. Effects of ultraviolet radiation. Med Clin North Am 1990;74:509-14.
  • 9. DiSanto MR. Photochromic lens technology. Refract Eyecare Ophthalmol 1998 Jan/Feb p. 11-2.
  • 10. Stein HA, Freeman MJ, Stenson SM. O que há de novo em lentes especiais e tratamento de superfícies. In: Stein HA, Freeman MJ, Stenson SM. Guia CLAO para refração e óculos: um manual para oftalmologistas. Tradução de Newton Kara José, Cleusa Coral-Ghanem, Paulo Ricardo de Oliveira. New Orleans: Contact Lens Association of Ophthalmologists; 1999. p. 43-51.
  • 1
    Pós-graduando, doutorado, da Clínica Oftalmológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Oftalmologista do Hospital de Olhos de Goiás.
    2
    Acadêmica - Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 2006
    • Data do Fascículo
      Abr 2001
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