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Itinerários de um mundo musical: a música de câmara brasileira nos concertos da Sonata (Portugal)

Itineraries of a musical world: Brazilian chamber music and the concert society Sonata (Portugal)

RESUMO

Surgidas em um período de carência de atividade musical erudita em Portugal, as sociedades de concerto foram um importante instrumento de formação de público, socialização e di fusão de uma vasta produção, envolvendo agentes das mais diversas origens, formações, interesses e posições ideológicas. Tomamos em destaque neste artigo a Sonata, fundada em 1942 por Fernando Lopes-Graça e amigos e ativa até 1960, que realizou a estreia, no país, de muitas obras, inclusive diversas de compositores brasileiros. A partir da análise e contextualização desse repertório, buscamos compreender as redes de sociabilidade envolvidas em sua circulação, lançando um olhar sobre a Sonata como um espaço de articulação entre diferentes vivências musicais.

PALAVRAS-CHAVE
Sociedades de concerto; Fernando Lopes-Graça; música de câmara brasi leira

ABSTRACT

Developed during a period of lack of classical musical activity in Portugal, the concert societies were an important inst rument of audience format ion, socializing and diffusion of a vast repertoire, involving agents of various origins, backgrounds, interests and ideologies. In this paper, we focus the Portuguese concert society Sonata, founded in 1942 by Fernando Lopes-Graça and friends and active until 1960, which promoted the national and international première of many works, including Brazilian solo and chamber music. Parting from the contextualization and analysis of this production, we aim to broach the sociability network implied in its circulation, regarding Sonata as a space of articulation between different musical experiences.

KEYWORDS
Concert societies; Fernando Lopes-Graça; Brazilian chamber music

Lançando um olhar dinâmico e relacional às mais diversas formas de engajamento com a música, Christopher Small (1998)SMALL, Christopher. Musicking: the meanings of performing and listening. Hanover: University Press of New England, c1998. cunhou o termo “musicar” (musicking), como um verbo, destacando o seu caráter, ao mesmo tempo, de ação e processo. Anos antes, Ruth Finnegan ([1989] 2007)FINNEGAN, Ruth. The hidden musicians: music making in an English town. Middletown: Wesleyan University Press, 2007. estudou a formação e a atualidade da vida musical da jovem cidade inglesa de Milton Keynes, destacando as “trilhas” ou “trajetórias” (pathways) percorridas pelos adeptos de determinadas práticas musicais e os “mundos musicais”, redes de sociabilidade a partir das quais se desenvolviam as distintas práticas. Esse último termo é uma adaptação de “mundos da arte”, como Howard Becker (1982)BECKER, Howard. Art worlds. Berkeley: Univ. of California, 1982. caracteriza o conjunto de relações sociais e de produção que possibilita o desenvolvimento de determinadas práticas ou a criação e disseminação de determinadas obras. Tais perspectivas permitem entender a arte como atividade concreta, cotidiana, prática, coletiva e contextual, distanciando-se criticamente de abordagens que valorizam as noções de obra, indivíduo, autonomia, atemporalidade e valor objetivo, visões que ainda se fazem presentes em muitos discursos acadêmicos sobre a música. Tomando como base as visões e conceitos propostos pelos estudiosos aqui referidos, apresento, neste artigo, um “mundo musical” específico: a sociedade de concertos Sonata, tomando como foco a multifacetada atuação da figura de seu fundador Fernando Lopes-Graça (1906-1994), sua relação com o meio musical brasileiro e a circulação de repertórios por ela possibilitada. Sua contribuição para a vida cultural portuguesa deu-se através da conexão de múltiplos “musicares”: compositor, pianista, regente, crítico, tradutor, professor, pesquisador da música de tradição oral e musicólogo. Foi também multifacetada sua relação com o Brasil, envolvendo duas visitas ao país2 2 A primeira, entre agosto e outubro de 1958, com a realização de recitais e conferências em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Florianópolis, e a segunda, uma passagem breve pelo Rio de Janeiro em 1969 para participar do júri do concurso de composição do Festival de Música da Guanabara. , dedicatórias3 3 As Viagens na minha terra, para piano, a Arnaldo Estrela, a Suíte rústica n° 2, para quarteto de cordas, a Guerra-Peixe, a Balada de uma heroína, para coro misto a cappella, ao Madrigal Renascentista de Belo Horizonte, as Sete canções populares brasileiras, para voz e piano, a Vera Janacopoulos, as Dezassete canções tradicionais brasileiras, para coro misto a cappella, à memória de Mário de Andrade, entre outras. e divulgação de obras, escrita e publicação de artigos, mais de 40 anos de correspondência4 4 Entre os seus interlocutores, encontram-se escritores, como Jorge Amado e Manuel Bandeira, compositores, como Francisco Mignone, Mozart Camargo Guarnieri, César Guerra-Peixe, Cláudio Santoro, Kilza Setti, musicólogos e pesquisadores de folclore, como Oneyda Alvarenga, Andrade Muricy, Mozart de Araújo, críticos como Caldeira Filho, José da Veiga Oliveira, o musicólogo e diplomata Vasco Mariz, instituições como a Academia Brasileira de Música, entre outros. , além de uma considerável obra musical de temática brasileira5 5 Sete canções populares brasileiras (1954), para voz e piano, Desafio (1958), para tenor e piano, sobre um poema de Manuel Bandeira, Dezassete canções tradicionais brasileiras (1960), para coro misto a cappella, a abertura sinfônica Gabriela, cravo e canela (1963) e o quinteto de sopros O túmulo de Villa-Lobos (1970). Essa produção foi analisada em minha tese de doutorado (LOPES, 2018). .

As sociedades de concerto em Portugal no século XX

As primeiras décadas do século XX foram um período de florescimento, em Portugal, das sociedades de concerto, instituições particulares baseadas na contribuição de assinantes que tinham como objetivo promover a divulgação regular do repertório sinfônico e camerístico erudito, preenchendo uma lacuna no panorama artístico do país. Havia muitos pontos de intersecção entre esses círculos sociais, apesar das diferenças de repertório e recursos financeiros. Como poderemos ver, alguns nomes participaram ativamente de mais de uma dessas organizações.

Em 1917 foi fundada a Sociedade de Concertos de Lisboa (SCL) por músicos e melômanos, como o pianista, maestro, compositor, musicógrafo, organólogo, editor e comerciante de instrumentos Michel’Angelo Lambertini, o pianista José Viana da Mota, o compositor Luís de Freitas Branco, o regente, crítico musical, compositor e folclorista António Joyce, o jurista Alberto Pedroso e o engenheiro Pedro Joyce Dinis. Dava continuidade à Sociedade de Música de Câmara, fundada em 1899. O primeiro concerto da SCL deu-se em 1918, com uma apresentação do Trio de Paris no Teatro da República (hoje Teatro São Luiz). A maioria das atividades ocorria em Lisboa, sendo também realizados concertos nos Açores e na Madeira. Uma figura que muito contribuiu para a instituição foi a marquesa Olga de Cadaval, que assumiu a presidência da direção em meados dos anos 1950 e realizou grandes donativos. A SCL promoveu, entre os anos de 1918 e 1975, concertos solo, de câmara, sinfônicos e de balé, com artistas de renome nacional e internacional. Encerrou suas atividades em 1976 (BASTOS, 2010BASTOS, Patrícia Lopes. Sociedade de Concertos de Lisboa. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 4, p. 1229. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010.).

Um recital em 1920 no salão do Conservatório Nacional inaugurou as atividades da Sociedade Nacional de Música de Câmara (SNMC), fundada no ano anterior. Teve a participação da soprano Berta Vianna da Motta, de seu marido, o pianista José Vianna da Motta, do violinista e maestro Júlio Cardona, que regeu uma orquestra de cordas, e de Luís de Freitas Branco como conferencista e regente do coro. Ao longo de sua existência (até 1974), a Sociedade promoveu mais de 300 apresentações, tanto de câmara quanto sinfônicas e até mesmo dramáticas, das quais participaram basicamente intérpretes portugueses. Patrícia Lopes Bastos (2010, p. 1230)BASTOS, Patrícia Lopes. Sociedade de Concertos de Lisboa. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 4, p. 1229. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010., na entrada sobre a SNMC na Enciclopédia da música em Portugal no século XX, destaca, entre as obras apresentadas, a Missa solemnis, de Beethoven (1927), as Beatitudes, de César Franck (1930), Canções para as crianças mortas, de Mahler, Missa em sol maior, de Schubert (1942), Requiem à memória de Camões, de João Domingos Bomtempo (1941), e a ópera Serrana, de Alfredo Keil (1938). Note-se a total ausência de música contemporânea. Mesmo entre os portugueses citados, temos apenas um compositor atuante na transição entre os séculos XVIII-XIX e um na segunda metade do século XIX.

Havia também os concertos em ambientes privados, destinados a um público restrito. Entre os anos de 1923 e 1939, Ema dos Santos Fonseca da Câmara Reis, cantora amadora e esposa do escritor Luís da Câmara Reis, organizou centenas de concertos de “Divulgação Musical”, nos quais a atualização estética era uma preocupação constante, trazendo peças como o Pierrot lunaire e as Klavierstücke op. 11 e 19 de Arnold Schönberg, A vida de Maria, de Paul Hindemith, o Octeto e o Concerto para dois pianos, de Stravinsky. Lopes-Graça colaborou em muitas dessas apresentações como conferencista e pianista (FERNANDES, 2010FERNANDES, Cristina. Reis, Ema Romero Santos Fonseca da Câmara. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 4, p. 1107. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010.; LOPES-GRAÇA, [1952] 1973_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167.).

A Sociedade de Concertos Sonata foi fundada em 28 de dezembro de 1942 por Fernando Lopes-Graça, com o objetivo de divulgar exclusivamente a música erudita contemporânea, nacional e estrangeira. Estavam entre seus colaboradores a pianista Maria da Graça Amado da Cunha, a compositora, pianista, professora e crítica musical Francine Benoît, o escritor e crítico musical João José Cochofel, seus amigos próximos e de longa data, além do maestro e violinista Joaquim da Silva Pereira. Num primeiro momento, participou também o cravista e musicólogo inglês radicado em Portugal Macario Santiago Kastner, organizando recitais dedicados a obras pós-impressionistas.

O concerto inicial realizou-se na data de fundação da sociedade e teve lugar na Academia de Amadores de Música, escola particular onde Lopes-Graça lecionava. O texto do programa inaugural traz uma crítica ao gosto conservador do público das sociedades de concerto e à pouca atenção dada pelas instituições públicas ao repertório que buscavam promover:

[...] não temos concertos públicos, e nas sociedades privadas que chamam até nós os mais célebres virtuosos do teclado ou do arco, a música moderna parece não gozar de muito bom crédito. Só excepcionalmente nos é dada a ouvir uma ou outra peça de Debussy ou Ravel - e ficamo-nos por aí. (LOPES-GRAÇA, apud CID, 2010CID, Miguel Sobral. Sociedade Sonata. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 4, p. 1231-1232. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010., p. 1231).

Segundo Miguel Sobral Cid (2010)CID, Miguel Sobral. Sociedade Sonata. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 4, p. 1231-1232. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010., a Sonata foi criada em um momento de diminuição da oferta de eventos musicais pela iniciativa privada e aumento da intervenção estatal na área, a partir de um interesse mais propagandista que cultural. Entre os compositores apresentados ao longo dos dezoito anos de existência da sociedade, o autor destaca o húngaro Béla Bartók, o inglês Benjamin Britten, o italiano Luigi Dallapiccola, os austríacos Arnold Schönberg e Ernst Krenek, os franceses Henri Dutilleux, Olivier Messiaen e André Jolivet, o polonês Witold Lutoslawski, os russos Sergei Prokofiev e Igor Stravinsky e um grande número de compositores portugueses: Francine Benoît (1894-1990), Luís de Freitas Branco (1890-1955), Cláudio Carneyro (1895-1963), Elvira de Freitas (1928-2015), seu pai, Frederico de Freitas (1902-1980), Armando José Fernandes (1906-1983), Victor Macedo Pinto (1917-1964), Joly Braga Santos (1924-1988), Óscar da Silva (1870-1958), Berta Alves de Sousa (1906-1997), Gabriel Morais de Sousa (1927-1956), além, claro, do próprio Fernando Lopes-Graça. A primeira audição nacional da maioria das obras dos referidos autores foi realizada pela Sonata. Além da Academia de Amadores de Música, outros locais de Lisboa onde se davam os concertos eram as salas do Sindicato Nacional dos Músicos, do jornal O Século e da Sociedade Nacional de Belas-Artes. Também houve, durante um curto período, delegações regionais no Porto e em Coimbra, sendo também realizados concertos nessas cidades.

A maior parte dos intérpretes era de origem portuguesa, sendo rara a participação de músicos ou grupos estrangeiros, um dos quais foi o Quarteto Húngaro, que apresentou a integral dos quartetos de Bartók. O público, segundo Lopes-Graça ([1952] 1973, p. 163)_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167., era bastante diverso do das demais sociedades de concerto, sendo composto, em menor número, de artistas e intelectuais e, na sua maioria, jovens estudantes, funcionários de diversos setores e até mesmo operários.

Em 1947, “logo que foi possível reestabelecer entre os povos os laços pacíficos da cooperação intelectual e artística” - referência de Lopes-Graça ([1952] 1973, p. 164)_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167. ao fim da Segunda Guerra Mundial -, a Sonata, à época presidida por Luís de Freitas Branco, foi admitida na Sociedade Internacional de Música Contemporânea, o que possibilitou a maior divulgação da música portuguesa no exterior. Desligou-se, contudo, em 1951, devido a dificuldades no cumprimento das obrigações financeiras e divergências quanto ao funcionamento dos júris internacionais e à representação das seções nacionais nos festivais da sociedade.

Instituição sem fins lucrativos, sobreviveu basicamente de assinaturas. Os parcos recursos permitiam apenas a produção de concertos de música de câmara, sendo o contato com o repertório sinfônico limitado à audição em registros fonográficos. Tais dificuldades levariam ao encerramento definitivo de suas atividades em 1960.

Se a descrição de outras sociedades de concerto até aqui apresentada parece confirmar a crítica à ausência de música contemporânea e portuguesa, quando tratamos do Círculo de Cultura Musical (CCM), o panorama é bem mais complexo e controverso. Foi fundado em 1934 pela pianista Elisa de Sousa Pedroso, que, com seu marido, o jurista Alberto Pedroso, havia também participado da criação da SCL. Sua primeira direção (1934-1939) era composta de figuras ligadas ao governo de Salazar, como o compositor Ivo Cruz e o pianista Lourenço Varela Cid. Ao longo de mais de 40 anos de atividade, teve entre seus convidados intérpretes de grande renome internacional, como o violinista Szymon Goldberg e o pianista Hans Neumark (que participaram do primeiro concerto, em 1935, no Teatro do Ginásio), os pianistas Edwin Fischer, Wilhelm Backhaus, Claudio Arrau, a cravista Wanda Landowska, a violinista Ginette Neveu, os violoncelistas Gregor Piatigorsky e Gaspar Cassadó, o regente, organista e compositor Paul Paray, a soprano Victoria de los Ángeles e o Quarteto Kolisch. Tal lista pode nos levar a pensar numa maior valorização da figura do intérprete e do virtuosismo, cultura tão criticada por Lopes-Graça (1941, p. 67-75)LOPES-GRAÇA, Fernando. Reflexões sôbre a música. Lisboa: Seara Nova, 1941.. No entanto, deve-se também assinalar a participação de diversos compositores que interpretaram as próprias obras, como Sergei Prokofiev, Francis Poulenc, Alfredo Casella, Arthur Honegger, Jean Françaix e Paul Hindemith. No texto “‘Sonata’ e a música contemporânea em Portugal”, Lopes-Graça ([1952] 1973, p. 162)_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167. destaca o “esforço considerável” empreendido pelo CCM em prol da divulgação da música contemporânea e atribui à postura refratária de seus sócios o arrefecimento dessas iniciativas ao longo dos anos. O próprio Lopes-Graça teve sua obra acolhida pelo CCM. Venceu quatro vezes um concurso de composição promovido pela instituição (Concerto n° 1 em sol para piano (1940), História trágico-marítima (1942), Sinfonia per orchestra (1944) e 3ª Sonata para piano (1952). Entre 1936 e 1940, o CCM recebeu um subsídio mensal do Secretariado de Propaganda Nacional, dirigido por António Ferro. A Emissora Nacional cedeu sua Orquestra Sinfônica, tendo como contrapartida a transmissão ao vivo dos concertos. Durante esse período, em plena Segunda Guerra Mundial, Elisa Pedroso recorreu à polícia política para facilitar a entrada de artistas estrangeiros, que poderiam ser tomados como fugitivos ou refugiados. Apesar do apoio estatal, o CCM buscava, nas suas escolhas, sobrepor o mérito artístico ao jogo político. A concessão dos prêmios a Lopes-Graça, músico de aberta posição contrária ao governo e que havia sido duas vezes preso e impedido de assumir cargos e benefícios públicos6 6 Três meses de prisão no Aljube em 1931, seguidos de três de exílio na vila de Alpiarça e 224 dias no Forte de Caxias, entre 1936 e 1937; impedimento de assumir o cargo de professor no Conservatório Nacional, para o qual havia sido aprovado em concurso em 1931, de usufruir de uma bolsa da Junta de Educação Nacional para estudos em Paris e recusa do convite para integrar a Seção de Música da Emissora Nacional, por implicar a assinatura de uma declaração de “activo repúdio ao comunismo e de todas as ideias subversivas” (SOUSA, 2006; VIEIRA DE CARVALHO, 2006, p. 149). , dá-nos uma ideia desse esforço. Em 1965 o CCM encomendaria a Lopes-Graça uma obra em comemoração ao quinto centenário de nascimento de Gil Vicente, que resultaria na cantata-melodrama D. Duardos e Flérida, estreada no Teatro Nacional de São Carlos em 1970.

No fim dos anos 1930, o apoio oficial e o aumento de assinaturas possibilitaram a criação de uma delegação no Porto. Na década seguinte, o CCM seguiu sua expansão, criando delegações ao longo de todo o país (Braga, Coimbra, Viana do Castelo, Funchal, Aveiro, Guimarães, Viseu, Ponta Delgada, Évora, Setúbal) e colônias (Luanda, Lourenço Marques - hoje Maputo - e Macau). No início da década de 1960, sob a direção de D. Lopo de Bragança e João de Freitas Branco (filho de Luís de Freitas Branco), passou a receber apoio financeiro da recém-criada Fundação Calouste Gulbenkian (FCG). A própria FCG passou a promover concertos em sua sede, inaugurada em 1969, o que levaria ao fim das principais associações de concertos privados, incapazes de competir com a oferta artística e de preços. Esse foi, no final da década de 1970, o caso do CCM, mantendo-se apenas a seção do Porto até o final dos anos 1990 (DENIZ SILVA, 2010DENIZ SILVA, Manuel. Círculo de Cultura Musical. In: CASTELO BRANCO, Salwa (Dir.). Enciclopédia da música em Portugal no século XX. v. 1, p. 294-296. Lisboa: Círculo de Leitores, 2010., p. 294-296).

A música brasileira nos concertos da Sonata

Teresa Cascudo (1999, p. 267-269)_____. Brasil como tópico, Brasil como espelho, Brasil como argumento: as relações de Fernando Lopes-Graça com a cultura brasileira. Revista da Organização de Estudos Culturais em Contextos Internacionais, Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência, n. 66, 1999. Disponível em: <http://www.revista.akademie-brasil-europa.org/CM66-01.htm>. Acesso em: 22 jul. 2013.
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realizou um levantamento das audições de obras brasileiras promovidas pela Sonata, num total de sete concertos apresentados em Lisboa, durante 16 anos (1944-1960), abarcando quase todo o seu período de existência. A tabela a seguir foi elaborada com base na referida pesquisa, aliada à consulta a programas disponíveis no Museu da Música Portuguesa e aos catálogos de obras dos compositores brasileiros contemplados.

Tabela 1
Listagem de obras brasileiras apresentadas pela Sonata

Podemos observar uma maioria de canções e a presença de formações pouco usuais, como voz, flauta, clarinete e violoncelo (Poema da criança e sua mamã, de Villa-Lobos) e flautim, flauta, requinta, fagote e piano a quatro mãos (Urutau, de Mignone). É interessante observar que muitas dessas obras foram pouco apresentadas e são hoje pouco conhecidas mesmo do público brasileiro.

A primeira composição brasileira na Sonata foi apresentada no seu 10° concerto, na Academia de Amadores de Música, a 16 de dezembro de 1944. Tratava-se da Sonata para violino solo (1940), primeira obra dodecafônica publicada de Cláudio Santoro, então aluno do alemão radicado no brasil Hans-Joachim Koellreutter (TRIO, 2014TRIO Santoro. [Programa do concerto realizado em 16 de setembro de 2014 no Centro Cultural São Paulo]. Disponível em: <http://centrocultural.sp.gov.br/site/trio-santoro/>. Acesso em: 27 dez. 2018.
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). É provável que o compositor português tenha sido o responsável por essa escolha. Segundo Teresa Cascudo (1999)_____. Brasil como tópico, Brasil como espelho, Brasil como argumento: as relações de Fernando Lopes-Graça com a cultura brasileira. Revista da Organização de Estudos Culturais em Contextos Internacionais, Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência, n. 66, 1999. Disponível em: <http://www.revista.akademie-brasil-europa.org/CM66-01.htm>. Acesso em: 22 jul. 2013.
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, Santoro e Lopes-Graça se conheceram pessoalmente em Paris, em fins da década de 1930, por intermédio do compositor de origem alemã Louis Saguer, que também o apresentou ao musicólogo Luiz Heitor Correia de Azevedo e ao pianista Arnaldo Estrela. A primeira carta de Santoro ao amigo data apenas de 1948, em sequência da participação de ambos no II Congresso de Compositores Progressistas, realizado em Praga. Nessa mesma ocasião também foram apresentadas Visões fugitivas, para piano, de Prokofiev, repetida “a pedido de vários subscritores da Sonata”, e canções do catalão Federico Mompou (1893-1987), do holandês Henk Badings (1907-1987) e do islandês Jón Leifs (1899-1968). A presença de línguas tão distintas do português sugere uma preferência geral do público da Sonata pelo gênero canção, levando a concluir que seu predomínio entre as obras brasileiras apresentadas não se devia necessariamente ao compartilhamento do idioma.

A canção brasileira ocupou boa parte do 22° concerto da Sonata, realizado na Academia de Amadores de Música em 2 de abril de 1946. A maioria era de cariz nacionalista e algumas de tendência impressionista. Na primeira parte, foram apresentadas, de Oscar Lorenzo Fernandez, Essa negra Fulô (poema de Jorge de Lima), Canção do mar (poema de Manuel Bandeira) e Canção da fonte (poema do próprio compositor) e, de Heitor Villa-Lobos, o Cromo n°2 e n° 3, sobre poemas, respectivamente, de Bernardino Lopes e Abílio Barreto, e a Canção do carreiro, sobre poema de Ribeiro Couto. A segunda parte iniciou-se com o Poema da criança e sua mamã, de Villa-Lobos, sobre texto de Epaminondas Villalba Filho (pseudônimo do próprio autor), obra onde predomina na voz a técnica do Sprechgesang. Fernandez é descrito, no programa, como pertencente à “falange dos modernos compositores brasileiros que, a exemplo de Villa-Lobos, procuraram criar uma música nacional baseada no riquíssimo folclore nativo”. Villa, por sua vez, é apontado como o “maior compositor brasileiro da atualidade”, autor de uma obra “de exuberante temperamento e notável fecundidade”, primeiro a descobrir e utilizar o “material folclórico na música erudita, opondo-se assim à orientação germanizante e italianizante dos compositores anteriores”7 7 Sobre a crítica brasileira e portuguesa do período à influência italiana na música, cf. Lopes, 2016. . A escolha desse repertório deve-se possivelmente às vivências e à rede de contatos da soprano e escritora Raquel Bastos (1903-1984), casada com o escritor José Osório de Oliveira (1900-1964), o qual passou boa parte da infância no Brasil e retornou diversas vezes ao país, mantendo intenso contato e contribuindo para a divulgação em Portugal da obra de escritores modernistas brasileiros (SARAIVA, 1998SARAIVA, Arnaldo. Uma carta inédita de Cecília Meirelles sobre o suicídio do marido (Correia Dias). Terceira margem: Revista do Centro de Estudos Brasileiros, Porto, n. 1, 1998, p. 55-59., p. 57). Considerando a prosódia das canções de caráter nacionalista, é provável que a cantora tenha optado pela pronúncia brasileira, sendo ajudada pelo marido. Não se conjectura a interferência de Lopes-Graça nessa escolha, visto que não tinha contato pessoal, à altura, com os compositores, embora estivesse familiarizado com sua produção. O compositor português apresentou-se nesse dia como pianista, interpretando seus Três epitáfios, Três bagatelas e Três danças, além da Pastoral, da compositora francesa Germaine Tailleferre (1892-1983), e da III Sonata, op. 28, de Prokofiev.

O Sexteto 1°, de Mignone, para flauta, oboé, clarinete, fagote, trompa e piano, foi apresentado em 17 de março de 1947. Considerando que a correspondência entre Mignone e Lopes-Graça ainda não havia se iniciado e que não tive, até o momento, acesso ao programa original com os nomes dos intérpretes, torna-se difícil traçar a rede que teria levado à apresentação desta obra. Barrenechea (2001, p. 507)BARRENECHEA, Sérgio. A música para flauta de Francisco Mignone. In: IAZZETTA, Fernando (Ed.). In: CONGRESSO DA ANPPOM, 13., Música do Século XXI: tendências, perspectivas e paradigmas. Belo Horizonte, Escola de Música da Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2001, v. 2, p. 501-508. Disponível em: <https://antigo.anppom.com.br/anais/anppom_2001_2.pdf>. Acesso em: 27 dez. 2018.
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aponta a influência francesa, via Villa-Lobos, na escolha da combinação instrumental e o seu caráter “autenticamente brasileiro”, por meio do uso de “melodias de inflexão modal e figuras rítmicas sincopadas”. Em seu artigo “Música de câmara no Brasil”, publicado no tomo VI do Boletim Latino-Americano de Música, Arnaldo Estrela (apud BARRENECHEA, 2001BARRENECHEA, Sérgio. A música para flauta de Francisco Mignone. In: IAZZETTA, Fernando (Ed.). In: CONGRESSO DA ANPPOM, 13., Música do Século XXI: tendências, perspectivas e paradigmas. Belo Horizonte, Escola de Música da Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2001, v. 2, p. 501-508. Disponível em: <https://antigo.anppom.com.br/anais/anppom_2001_2.pdf>. Acesso em: 27 dez. 2018.
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, p. 507) atribui a Pixinguinha os quatro temas principais utilizados na obra.

Segundo Teresa Cascudo (1999, p. 261)_____. Brasil como tópico, Brasil como espelho, Brasil como argumento: as relações de Fernando Lopes-Graça com a cultura brasileira. Revista da Organização de Estudos Culturais em Contextos Internacionais, Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência, n. 66, 1999. Disponível em: <http://www.revista.akademie-brasil-europa.org/CM66-01.htm>. Acesso em: 22 jul. 2013.
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, os dois anos seguintes marcam o período de maior presença da música brasileira na Sonata e a intensificação da correspondência de Lopes-Graça com os compositores brasileiros. Essa época também coincidiu com a realização do II Congresso dos Compositores Progressistas (1948) - no qual estiveram presentes Lopes-Graça, Cláudio Santoro e o pianista Arnaldo Estrela, outro de seus maiores interlocutores brasileiros - cujas diretivas incentivavam a buscar uma criação baseada no diálogo com a música tradicional e uma maior comunicação com o povo. A partir dessa vivência, Santoro e, posteriormente, Guerra-Peixe desligaram-se de seu mestre Koellreutter e voltaram-se para uma orientação estética mais próxima do nacionalismo.

Em sua primeira carta ao compositor, de 6 de dezembro de 1947, Guerra-Peixe anunciava o envio de seu endereço a Curt Lange, que provavelmente lhe enviaria partituras de compositores latino-americanos, o que de fato ocorreu. Lopes-Graça recebeu, segundo Ana Cláudia de Assis (2016, p. 149)ASSIS, Ana Cláudia de. Que “ismo” é esse, Koellreutter? Guerra-Peixe e Lopes-Graça entrelaçando os fios dodecafônicos (1944-1958). Opus, v. 22, n. 2, p. 147-171, dez. 2016., o tomo VI do Boletim Latino-Americano de Música, publicado em abril de 1946. O volume era integralmente dedicado à música brasileira e continha um suplemento musical com 19 partituras. Reproduzo a seguir a tabela com indicação das peças, elaborada por Ana Cláudia de Assis e Rafael Felício Silva Godoi (2016, p. 6)_____; GODOI, Rafael Felício Silva. O Boletin Latino Americano de Música VI (1946): entre linhas, músicas e ideias. In: CONGRESSO DA ANPPOM, 26., Criação Musical Criações Artísticas e a Pesquisa Acadêmica, Belo Horizonte, Universidade do Estado de Minas Gerais/Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2016, p.1-10. Disponível em: <https://www.anppom.com.br/congressos/index.php/26anppom/bh2016/paper/view/3935>. Acesso em: 26 nov. 2017.
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. Dentre elas estão três obras efetivamente apresentadas no 41° concerto da Sonata, realizado em 26 de abril de 1948, na Sociedade Nacional de Belas Artes: as Bachianas brasileiras n° 6, para flauta e fagote, de Villa-Lobos, Urutau, para flautim, flauta, requinta, fagote e piano a quatro mãos (e não dois pianos, como consta na tabela), de Francisco Mignone, e a Sonatina para flauta e clarinete, do próprio Guerra-Peixe.

Tabela 2
Obras constantes no suplemento do Boletim Latino-Americano de Música. Em destaque as apresentadas pela Sonata. Adaptação da tabela de Assis e Godoi (2016, p. 6)_____; GODOI, Rafael Felício Silva. O Boletin Latino Americano de Música VI (1946): entre linhas, músicas e ideias. In: CONGRESSO DA ANPPOM, 26., Criação Musical Criações Artísticas e a Pesquisa Acadêmica, Belo Horizonte, Universidade do Estado de Minas Gerais/Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2016, p.1-10. Disponível em: <https://www.anppom.com.br/congressos/index.php/26anppom/bh2016/paper/view/3935>. Acesso em: 26 nov. 2017.
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As Bachianas no 6 podem ser ouvidas, ao mesmo tempo, como uma referência às Invenções a duas vozes, de Johann Sebastian Bach, e uma evocação do gênero do choro, com a flauta tocando a sua parte e o fagote imitando um violão:

Figura 1
Excerto das Bachianas n° 6, de Villa-Lobos. New York: Associated Music Publishers, 1946

É possível que essa obra tenha sido, anos mais tarde, uma das referências para Lopes-Graça em seu quinteto de sopros O túmulo de Villa-Lobos (1970), notadamente para a escrita imitativa presente nos movimentos Baile e Ritual. Mário de Andrade, no Ensaio sobre música brasileira, considerava esse procedimento como caracterizador de uma polifonia especificamente brasileira, baseada nas linhas de baixo do violão nas serestas e outros gêneros populares (LOPES, 2018_____. O viajante no labirinto: a crítica ao exotismo na obra musical de temática brasileira de Fernando Lopes-Graça. 2018. 328 f. Tese (Doutorado em Música). Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2018. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/331833>. Acesso em: 27 nov. 2018.
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, p. 292-293).

Figura 2
Excerto de Baile (c. 51 a 56) (LOPES-GRAÇA, 1972_____. O túmulo de Villa-Lobos. [Partitura]. Manuscrito autógrafo, 1972. Museu da Música Portuguesa - Cascais., p. 25)

Urutau, o pássaro fantástico, de Francisco Mignone, é uma peça descritiva, em um único movimento. Segundo Amy Gillick (2014)GILLICK, Amy. Amy Gillick, Bassoon - Virginia Tech Faculty Recital, Part 2. Publicado em 18 dez. 2014. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Ara8o3AX_K8>. Acesso em: 26 dez. 2018.
https://www.youtube.com/watch?v=Ara8o3AX...
, imita os sons emitidos por esse pássaro noturno nativo da região amazônica e procura ambientar o ouvinte nessa paisagem sonora. Segundo Luís da Câmara Cascudo (1954, p. 533)CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1954., “seu canto melancólico e estranho, lembrando uma gargalhada de dor”, cercou a ave, também conhecida como mãe-da-lua, de “um misterioso prestígio assombrador”. Embora Urutau possa, pela temática, ser considerada de alinhamento estético nacionalista, não traz diretamente melodias tradicionais brasileiras nem referências rítmicas, melódicas ou harmônicas a gêneros musicais específicos. A escrita assemelha-se a alguns momentos mais tranquilos da Sagração da primavera, de Stravinsky. Utiliza efeitos percussivos no piano, com predomínio da região grave, e extremos agudos da requinta e do flautim. Em carta de 12 de maio de 1948, Mignone avisa a Lopes-Graça o recebimento do programa da Sonata e agradece-lhe a inclusão de Urutau, dizendo que gostaria de saber a impressão que causou ao amigo, bem como sua recepção pelo público. Ainda não tive acesso à correspondência do compositor brasileiro e, portanto, à resposta a essa questão. A obra não volta a ser mencionada na correspondência de Mignone a Lopes-Graça, retomada apenas dez anos mais tarde. Completa a lista das obras brasileiras desse concerto a Sonatina, para flauta e clarinete, de Guerra-Peixe, obra da fase dodecafônica do compositor (SILVA, 1994______. Guerra-Peixe: um catálogo sumário. Rio de Janeiro: Funarte/MinC, 1994.), escrita quando este ainda era aluno de Koellreutter. No programa, consta que o compositor “opõe-se, no seu atonalismo schonberguiano, à estética nacionalista dos outros compositores”.

Figura 3
Capa do programa do 41° concerto da Sonata, 1948_____. Secção portuguesa da Sociedade Internacional de Música Contemporânea - 41° Concerto. Lisboa: 26 de abril de 1948. [programa]. Acervo Fernando Lopes-Graça. Museu da Música Portuguesa - Casa verdades de Faria - Cascais.. Acervo Fernando Lopes-Graça - Museu da Música Portuguesa

Nesse dia também foi apresentada a Sonata op. 25 n° 1, para viola solo, do compositor alemão Paul Hindemith (1895-1963), por Clara Félix da Costa. A pianista francesa Lélia Gousseau interpretou obras que se poderiam caracterizar, de maneira geral, como neoclássicas, quase todas de compositores franceses: La plainte, au loin, du faune, de Paul Dukas (1865-1935), dois prelúdios (Chant d’extase dans un paysage triste e Le nombre léger), de Olivier Messiaen (1908-1992), Pièce, op. 49 n° 98 8 O(a) autor(a) do texto do programa possivelmente se enganou, visto que o Op. 49 de Roussel tem apenas três peças. , de Albert Roussel (1869-1937), e Prélude, arioso et fughetta sur le nom de Bach, de Arthur Honegger (1892-1955), suíço.

É também interessante notar a menção, no programa, ao uso do “piano Bechstein dos estabelecimentos Valentim de Carvalho Ltda.”, por meio da qual podemos ter uma ideia da relação de troca de empréstimo por divulgação presente nesse mundo musical.

Temos, em 5 de julho de 1949, o predomínio de canções brasileiras, todas de alinhamento estético nacionalista. Algumas se baseavam em melodias tradicionais e outras em poemas de inspiração folclórica. De Camargo Guarnieri, foram apresentadas Sai, Aruê, do ciclo Quatro poemas de Macunaíma, baseado em excertos do romance de Mário de Andrade (VERHAALEN, 2001VERHAALEN, Marion. Camargo Guarnieri: expressões de uma vida. Tradução Vera Sílvia Camargo Guarnieri. São Paulo: Edusp/Imprensa Oficial, 2001., p. 249) e Vai, Azulão, sobre poema de Manuel Bandeira. De Francisco Mignone, Cânticos de Obaluayê, sobre “melodia dos negros nagô”. As três canções estavam presentes na antologia Musique brésilienne moderne, organizada em 1937 por José Cândido de Andrade Muricy, possível fonte do repertório do recital (SILVA, 2016SILVA, Flávio (Org.). Francisco Mignone: Catálogo de obras. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Música, 2016.; INSTITUTO, 2018INSTITUTO PIANO BRASILEIRO. Linha do tempo - 1939. Disponível em: <http://institutopianobrasileiro.com.br/years/index/1939>. Acesso em: 5 jul. 2019.
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). Embora Muricy tenha se correspondido com Lopes-Graça, não encontrei na documentação pesquisada nenhuma referência a esse volume. Também estavam presentes no recital cinco canções de Villa-Lobos: Xangô (1930), Estrela é lua nova (1935), Ulalocê (1930), Remeiro do São Francisco (1941) e Cantilena n° 3 (1938). É possível notar similaridades entre a canção Xangô, de Villa-Lobos, e a canção homônima das Sete canções populares brasileiras (1954), de Lopes-Graça, o que leva a conjeturar o seu caráter de referência, conforme assinalado em Cascudo (1999)_____. Brasil como tópico, Brasil como espelho, Brasil como argumento: as relações de Fernando Lopes-Graça com a cultura brasileira. Revista da Organização de Estudos Culturais em Contextos Internacionais, Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência, n. 66, 1999. Disponível em: <http://www.revista.akademie-brasil-europa.org/CM66-01.htm>. Acesso em: 22 jul. 2013.
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e Lopes (2018)_____. O viajante no labirinto: a crítica ao exotismo na obra musical de temática brasileira de Fernando Lopes-Graça. 2018. 328 f. Tese (Doutorado em Música). Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2018. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/331833>. Acesso em: 27 nov. 2018.
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. Diferentemente de Lopes-Graça, que utilizou uma melodia presente na coletânea Música popular brasileña (1947), de Oneyda Alvarenga, o compositor carioca baseou sua canção em uma melodia da coletânea Chants populaires du Brésil (1930), elaborada pela cantora e pesquisadora Elsie Houston-Péret, a quem a peça foi dedicada. A melodia recolhida por Houston apresenta síncopas mais recorrentes e uma métrica pensada numa quadratura quaternária e não de maneira aditiva como na apresentada por Alvarenga.

É provável que Lopes-Graça tenha se servido da descrição do culto realizada por Alvarenga, retratando um movimento repetitivo e crescente da música a partir do ritmo constante marcado pelos tambores, levando a um estado de transe. O ritmo marcado pela mão esquerda é constante, grave, pontuado por acordes abertos e notas longas na mão direita, possivelmente devido à descrição de Xangô como o orixá do relâmpago e do trovão. O ostinato grave também pode ser entendido como uma referência ao cavalo do orixá. As frases não apresentam marcação interna de compasso, apenas linhas pontilhadas para orientação dos intérpretes. O ritmo orienta-se pela prosódia. As segundas, tão características da escrita do compositor, são percebidas nessa canção mais como um efeito percussivo que harmônico. O tratamento do piano nas duas canções é bastante semelhante, sobretudo no que se refere à textura; observe-se também em Villa-Lobos a presença do ostinato grave e, na mão direita, de acordes abertos, construídos por sobreposição de intervalos de quartas e quintas, porém num registro grave, diferentemente da versão do compositor português.

Figura 4
Início da canção Xangô, de Villa-Lobos (à esq.) e de Lopes-Graça (à dir.)

Apesar da relativa pluralidade estética nos programas da Sonata, o repertório do concerto de 1949, analisado retrospectivamente, aponta para uma tomada de posição coerente com a de Lopes-Graça na imprensa portuguesa diante de uma polêmica estética que ocorreria no Brasil no ano seguinte. Na Carta aberta aos músicos e críticos do Brasil, publicada em dezembro de 1950 em diversos jornais do país por Camargo Guarnieri, o compositor alertava os jovens músicos para o que considerava os perigos do dodecafonismo. O documento levaria a uma série de respostas e tomadas de partido não só de músicos, mas de diversos artistas e intelectuais, inclusive, numa pouco conhecida carta aberta, da pessoa mais diretamente atacada, Koellreutter, considerado o introdutor da técnica no país (KATER, 2001KATER, Carlos. Música viva e H. J. Koellreutter: movimentos em direção à modernidade. São Paulo: Musa Editora/Atravez, 2001.). Em fevereiro de 1951, Lopes-Graça fez publicar excertos da carta de Guarnieri na Gazeta Musical, periódico lisboeta de que era colaborador, “em vista do interesse e da actualidade do assunto debatido e do vigor polémico com que o autor expõe a sua opinião”.

Pode-se notar a ressonância dessa publicação na entrevista realizada por Manuel Dias da Fonseca a Pierre Boulez, publicada na Gazeta em 1953. A reportagem era acompanhada de uma crítica de Lopes-Graça a alguns argumentos expostos pelo jovem compositor francês, numa tentativa de apontar a diferença entre as visões da equipe da revista e de Fonseca, colaborador independente. Há inclusive a seguinte nota de rodapé, de autoria de Fonseca: “As afirmações dum Guarnieri ao fazer corresponder o dodecafonismo ao abstraccionismo na pintura, e ao charlatanismo na ciência, são do mais ridículo que é possível conceber-se”. Boulez afirma a evolução para o pensamento serial como fruto de uma necessidade histórica e diz que a mediocridade dos críticos ao dodecafonismo estaria encoberta por pretextos políticos. Enfatiza o internacionalismo na história da música da Europa Ocidental, apontando o folclore como há muito tempo “degenerado”. O comentário de Lopes-Graça apresenta seis sofismas que estariam presentes nesse discurso: confusão entre técnica e linguagem; atribuição à organização serial da mesma importância histórica que a passagem da monodia para a polifonia; confusão do conceito de escolástica (praxis) com o de academismo (regras estabelecidas a priori); afirmação da ausência de tradição musical e degenerescência do folclore no oeste europeu; confusão de cosmopolitismo (utilização de uma linguagem internacional) com universalismo (alcance internacional da mensagem da obra); e, por fim, atribuição de racismo e mediocridade aos críticos do dodecafonismo.

Nesse meio-tempo, uma situação relacionada a essa polêmica atingiu diretamente Lopes-Graça, possivelmente reforçando sua posição. No artigo “Que ‘ismo’ é esse, Koellreutter?”, publicado na revista brasileira Fundamentos em 1953 e republicado na Gazeta, são mencionados plágios de trechos de seu livro Música e músicos modernos pelo professor alemão. O músico português publicou, em resposta, a Carta aberta ao compositor brasileiro Guerra-Peixe, em que expõe brevemente sua insatisfação com a apropriação indevida e descontextualizada de seus argumentos e chama a atenção para o que considera os problemas mais graves: a ignorância mútua acerca da música dos dois países e a luta por uma música “verdadeiramente brasileira”9 9 Para mais detalhes sobre essas polêmicas, ver: Assis (2016), Cascudo (2003, 2010) e Lopes (2018). .

No 79° concerto da Sonata, dedicado à “música de inspiração folclórica”, realizado na Sociedade Nacional de Belas Artes a 9 de abril de 1957, foram apresentadas, em estreia mundial, as Trovas capixabas e as Trovas alagoanas, de Guerra-Peixe, ambas compostas em 1955. Em carta de 22 de abril de 1957, o autor revela seu agradecimento, permeado por uma crítica ao descaso do meio musical brasileiro.

Mòrmente10 10 Optei por manter a ortografia original nas citações diretas. se se tem em conta que até os dias que correm ninguém, entre nós, registrou, em jornais ou revistas, o aparecimento dessas publicações, assim como ainda não foram cantadas - apesar da falta de música nova, de autor brasileiro. [...] Sua nota veio, portanto, me confortar bastante.

Também foram apresentadas as Trois chansons hébraïques, de Maurice Ravel (1875-1937), pela soprano Maria Alice Vieira de Almeida e pela pianista Maria Beatriz Soares - mesmas intérpretes das Trovas de Guerra-Peixe, Suíte, op. 21, do húngaro Pál Kadosa (1903-1983), Cantos e danças de Siljustöl, do norueguês Harald Sæverud (1897-1992), pela pianista Maria Emília Oliveira Machado, e Dez canções populares portuguesas, de Lopes-Graça, pelo Coro da Academia de Amadores de Música, sob a regência do compositor. É bem possível que as Trovas tenham sido apresentadas com a pronúncia brasileira devido à presença, em algumas quadras, de referências à linguagem coloquial popular.

A música brasileira esteve presente na Sonata até o último ano de sua existência, quando foi apresentada a Sonata n° 4, para piano e violino, de Camargo Guarnieri, peça de moldura modal, marcada pela presença do intervalo harmônico de quarta e com algumas referências ao samba no 3° movimento (VERHAALEN, 2001VERHAALEN, Marion. Camargo Guarnieri: expressões de uma vida. Tradução Vera Sílvia Camargo Guarnieri. São Paulo: Edusp/Imprensa Oficial, 2001.).

Em sua reflexão retrospectiva, expressa no artigo “‘Sonata’ e a música contemporânea em Portugal”, Lopes-Graça (1973, p. 162)_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167. destaca Heitor Villa-Lobos entre os “nomes universalmente consagrados”, Guerra-Peixe e Cláudio Santoro entre os nomes “a bem dizer ignorados em Portugal” cuja produção a Sonata contribuiu para divulgar, ao lado de Koechlin, Chostakovitch, André Jolivet, Elsa Barraine, Frank Martin, Louis Saguer, entre outros. Camargo Guarnieri é listado, ao lado de nomes como Alban Berg e Anton Webern, entre os compositores “de relevo [...] pouco ou nada conhecidos entre nós” ([notas], p. 315).

Considerações finais: o papel das relações sociais na construção de um musicar

Permitindo-nos lançar os olhos sobre as sociedades de concerto, mundos musicais ainda pouco abordados na literatura acadêmica luso-brasileira, deparamo-nos com um sistema de grande relevância para a circulação de repertórios e o estabelecimento de redes de sociabilidade através da prática musical, sendo nelas atuantes personalidades das mais diversas origens, formações e interesses: artistas de maior e menor renome, melômanos de diversas profissões, membros da aristocracia, estudantes, operários etc. Além de trazer à luz esses diversos agentes e seus “musicares”, esta pesquisa nos indica a dimensão do papel das relações pessoais nas escolhas envolvidas nessa prática.

É interessante observar, nos programas da Sonata aqui analisados, a divulgação quase que exclusiva da produção de compositores vivos (à exceção de Ravel, Roussel e Dukas), o que revela um profundo compromisso com a causa da música contemporânea11 11 Sobre atualização, internacionalização e divulgação da música portuguesa como valores na programação da Sonata, cf. o excelente estudo de Teresa Cascudo (2017). . Outro ponto que distingue a Sonata das demais organizações do gênero vigentes em Portugal na primeira metade do século XX é a presença recorrente de figuras femininas atuando como intérpretes e, ainda que em menor medida, compositoras. Se analisarmos atentamente a lista das instrumentistas cuja passagem pelas outras sociedades é destacada, verificaremos o predomínio de nomes estrangeiros já internacionalmente ventilados, enquanto a Sonata foi, para as musicistas ali atuantes, um de seus principais espaços de prática e formação. Há que considerar, contudo, a ausência de compositoras brasileiras dos concertos da Sonata. Por que não foram incluídos nomes como Dinorá de Carvalho, autora de uma das obras constantes no suplemento do Boletim? Ou Eunice Catunda, companheira de jornada estética e ideológica de Guerra-Peixe e Santoro, cuja participação no debate nacionalismo x dodecafonismo Lopes-Graça, segundo Teresa Cascudo (1999)_____. Brasil como tópico, Brasil como espelho, Brasil como argumento: as relações de Fernando Lopes-Graça com a cultura brasileira. Revista da Organização de Estudos Culturais em Contextos Internacionais, Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência, n. 66, 1999. Disponível em: <http://www.revista.akademie-brasil-europa.org/CM66-01.htm>. Acesso em: 22 jul. 2013.
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, certamente conhecia? À parte questões contingenciais, referentes à disponibilidade de instrumentistas para determinada récita ou proficiência técnica para certas obras, o principal fator decisivo do repertório eram as redes de sociabilidade dos agentes, sobretudo a de contatos pessoais de Fernando Lopes-Graça, figura central do corpo diretivo, que se movia entre os “musicares” de curador, compositor, intérprete e crítico. Segundo Teresa Cascudo (2010, p. 103)CASCUDO, Teresa. A tradição como problema na obra do compositor Fernando Lopes-Graça: um estudo no contexto português. Sevilha: Editorial Doble J, 2010., “Lopes-Graça não teve nenhum colega compositor que, em Portugal, o acompanhasse nas suas actividades políticas. Manteve, no entanto, contacto com vários músicos não portugueses com os quais partilhou as suas preocupações, entre os quais se destacam vários compositores brasileiros”. Segundo Ana Cláudia de Assis (2016)ASSIS, Ana Cláudia de. Que “ismo” é esse, Koellreutter? Guerra-Peixe e Lopes-Graça entrelaçando os fios dodecafônicos (1944-1958). Opus, v. 22, n. 2, p. 147-171, dez. 2016., a semelhança de pensamento com o já falecido Mário de Andrade teria tornado Lopes-Graça, aos olhos dos jovens Guerra-Peixe e Santoro, uma promissora figura tutelar. A partir da análise da presença da música brasileira nos programas, não se pode concordar totalmente com a atribuição, pelo músico português (LOPES-GRAÇA, [1952] 1973_____. “Sonata” e a música contemporânea em Portugal. In: _____. A música portuguesa e os seus problemas. v. III Lisboa: Edições Cosmos, 1973, p. 161-167., p. 162), de ausência de partipris à Sonata. Mesmo as obras de orientação estilística diversa do nacionalismo são composições de juventude de adeptos dessa estética que tinham com ele relações de amizade.

A partir do caso aqui apresentado, retomo o apelo a um olhar panorâmico no estudo da produção e prática musical, no sentido de compreender o papel das relações sociais e de produção na promoção do repertório, afastando a desgastada porém onipresente ideia de um seleto grupo de obras de arte como entidades autônomas, cuja mera existência lhes justificaria o mérito.

  • 2
    A primeira, entre agosto e outubro de 1958, com a realização de recitais e conferências em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Florianópolis, e a segunda, uma passagem breve pelo Rio de Janeiro em 1969 para participar do júri do concurso de composição do Festival de Música da Guanabara.
  • 3
    As Viagens na minha terra, para piano, a Arnaldo Estrela, a Suíte rústica n° 2, para quarteto de cordas, a Guerra-Peixe, a Balada de uma heroína, para coro misto a cappella, ao Madrigal Renascentista de Belo Horizonte, as Sete canções populares brasileiras, para voz e piano, a Vera Janacopoulos, as Dezassete canções tradicionais brasileiras, para coro misto a cappella, à memória de Mário de Andrade, entre outras.
  • 4
    Entre os seus interlocutores, encontram-se escritores, como Jorge Amado e Manuel Bandeira, compositores, como Francisco Mignone, Mozart Camargo Guarnieri, César Guerra-Peixe, Cláudio Santoro, Kilza Setti, musicólogos e pesquisadores de folclore, como Oneyda Alvarenga, Andrade Muricy, Mozart de Araújo, críticos como Caldeira Filho, José da Veiga Oliveira, o musicólogo e diplomata Vasco Mariz, instituições como a Academia Brasileira de Música, entre outros.
  • 5
    Sete canções populares brasileiras (1954), para voz e piano, Desafio (1958), para tenor e piano, sobre um poema de Manuel Bandeira, Dezassete canções tradicionais brasileiras (1960), para coro misto a cappella, a abertura sinfônica Gabriela, cravo e canela (1963) e o quinteto de sopros O túmulo de Villa-Lobos (1970). Essa produção foi analisada em minha tese de doutorado (LOPES, 2018_____. O viajante no labirinto: a crítica ao exotismo na obra musical de temática brasileira de Fernando Lopes-Graça. 2018. 328 f. Tese (Doutorado em Música). Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2018. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/331833>. Acesso em: 27 nov. 2018.
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    ).
  • 6
    Três meses de prisão no Aljube em 1931, seguidos de três de exílio na vila de Alpiarça e 224 dias no Forte de Caxias, entre 1936 e 1937; impedimento de assumir o cargo de professor no Conservatório Nacional, para o qual havia sido aprovado em concurso em 1931, de usufruir de uma bolsa da Junta de Educação Nacional para estudos em Paris e recusa do convite para integrar a Seção de Música da Emissora Nacional, por implicar a assinatura de uma declaração de “activo repúdio ao comunismo e de todas as ideias subversivas” (SOUSA, 2006SOUSA, António de. A construção de uma identidade: Tomar na vida e obra de Fernando Lopes-Graça. Lisboa: Edições Cosmos, 2006.; VIEIRA DE CARVALHO, 2006_____. Pensar a música, mudar o mundo: Fernando Lopes-Graça. Porto: Campo das Letras, 2006., p. 149).
  • 7
    Sobre a crítica brasileira e portuguesa do período à influência italiana na música, cf. Lopes, 2016LOPES, Guilhermina. As claridades e sombras da música portuguesa: teleologia e contingência na concepção de História de Fernando Lopes-Graça. In: CONGRESSO DA ANPPOM, 26., Universidade do Estado de Minas Gerais/Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2016, p. 1-8. Disponível em: <http://www.anppom.com.br/congressos/index.php/26anppom/bh2016/paper/view/4492/1275>. Acesso em: 25 nov. 2017.
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    .
  • 8
    O(a) autor(a) do texto do programa possivelmente se enganou, visto que o Op. 49 de Roussel tem apenas três peças.
  • 9
    Para mais detalhes sobre essas polêmicas, ver: Assis (2016)_____; GODOI, Rafael Felício Silva. O Boletin Latino Americano de Música VI (1946): entre linhas, músicas e ideias. In: CONGRESSO DA ANPPOM, 26., Criação Musical Criações Artísticas e a Pesquisa Acadêmica, Belo Horizonte, Universidade do Estado de Minas Gerais/Universidade Federal de Minas Gerais. Anais..., 2016, p.1-10. Disponível em: <https://www.anppom.com.br/congressos/index.php/26anppom/bh2016/paper/view/3935>. Acesso em: 26 nov. 2017.
    https://www.anppom.com.br/congressos/ind...
    , Cascudo (2003_____. Fernando Lopes-Graça e os compositores brasileiros: a polémica “do dodecafonismo vs. nacionalismo” entre 1939 e 1954 numa perspectiva comparativa. In: RIBEIRO, Maria Manuela Tavares (Coord.). Actas do Colóquio Portugal-Brasil: uma visão interdisciplinar do século XX. Coimbra, 2003, p. 268-284., 2010)CASCUDO, Teresa. A tradição como problema na obra do compositor Fernando Lopes-Graça: um estudo no contexto português. Sevilha: Editorial Doble J, 2010. e Lopes (2018)_____. O viajante no labirinto: a crítica ao exotismo na obra musical de temática brasileira de Fernando Lopes-Graça. 2018. 328 f. Tese (Doutorado em Música). Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2018. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/331833>. Acesso em: 27 nov. 2018.
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    .
  • 10
    Optei por manter a ortografia original nas citações diretas.
  • 11
    Sobre atualização, internacionalização e divulgação da música portuguesa como valores na programação da Sonata, cf. o excelente estudo de Teresa Cascudo (2017)_____. Modernismo e internacionalismo como programa: o compositor Fernando Lopes-Graça e a sociedade de concertos Sonata (Lisboa, 1942-1960). Resonancias v. 21, n.40, p. 71-110. jan.-jun. 2017..

REFERÊNCIAS

  • ASSIS, Ana Cláudia de. Que “ismo” é esse, Koellreutter? Guerra-Peixe e Lopes-Graça entrelaçando os fios dodecafônicos (1944-1958). Opus, v. 22, n. 2, p. 147-171, dez. 2016.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2018
  • Aceito
    18 Jul 2019
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