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Danos de Conotrachelus dubiae (Coleoptera: curculionidae) em frutos de camu-camu (Myrciaria dubia) na Amazônia Central

Damage of camu-camu (Myrciaria dubia) fruits by Conotrachelus dubiae (Coleoptera: curculionidae) in Central Amazonia

Resumos

No Brasil, a ocorrência de Conotrachelus dubiae O'Brien, 1995 (Coleoptera: Curculionidae) em camu-camu [Myrciaria dubia (H.B.K.) McVaugh, Myrtaceae] tinha sido constatada somente em populações naturais. Relata-se sua ocorrência em um cultivo experimental, onde se avaliou os danos de C. dubiae em frutos de camu-camu, em diferentes graus de amadurecimento, entre 1999 e 2003. Os danos causados pela larva aumentaram com o amadurecimento dos frutos, havendo maior comprometimento da polpa do fruto (30 a 90%) do que das sementes (7%). A incidência desse inseto pode implicar em perdas quantitativas significativas na produção de camu-camu.

broca do camu-camu; Insecta; cultivo em várzea amazônica


In Brazil, the occurrence of Conotrachelus dubiae O'Brien, 1995 (Coleoptera: Curculionidae) in camu-camu [Myrciaria dubia (H.B.K.) McVaugh, Myrtaceae] had only been verified in natural populations. This report describes its occurrence in an experimental cultivation, where damage of camu-camu fruits by C. dubiae at different ripening stages was evaluated between 1999 and 2003. The damage caused by the larva increased with the degree of ripening of the fruits, with greater damage of fruit pulp (30 to 90%) than to seeds (7%). The incidence of this insect may cause significant quantitative losses in the camu-camu production.

camu-camu borer; Insecta; cultivation in amazonian floodplain


COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

DEFESA FITOSSANITÁRIA

Danos de Conotrachelus dubiae (Coleoptera: curculionidae) em frutos de camu-camu (Myrciaria dubia) na Amazônia Central1 1 (Trabalho 074/2003).

Damage of camu-camu (Myrciaria dubia) fruits by Conotrachelus dubiae (Coleoptera: curculionidae) in Central Amazonia

Sidney Alberto do Nascimento FerreiraI; Daniel Felipe de Oliveira GentilII; Neliton Marques da SilvaIII

IINPA - CPCA, Caixa Postal 478, 69011-970, Manaus AM. E-mail: sanf@inpa.gov.br

IIINPA - COAD, Caixa Postal 478, 69011-970, Manaus AM. E-mail: gentil@inpa.gov.br

IIIUFAM - FCA, Av. Gal. Rodrigo Octávio J. Ramos, 3000, 69070-000, Manaus AM. E-mail: nmarques@ufam.edu.br

RESUMO

No Brasil, a ocorrência de Conotrachelus dubiae O'Brien, 1995 (Coleoptera: Curculionidae) em camu-camu [Myrciaria dubia (H.B.K.) McVaugh, Myrtaceae] tinha sido constatada somente em populações naturais. Relata-se sua ocorrência em um cultivo experimental, onde se avaliou os danos de C. dubiae em frutos de camu-camu, em diferentes graus de amadurecimento, entre 1999 e 2003. Os danos causados pela larva aumentaram com o amadurecimento dos frutos, havendo maior comprometimento da polpa do fruto (30 a 90%) do que das sementes (7%). A incidência desse inseto pode implicar em perdas quantitativas significativas na produção de camu-camu.

Termos para indexação: broca do camu-camu, Insecta, cultivo em várzea amazônica.

ABSTRACT

In Brazil, the occurrence of Conotrachelus dubiae O'Brien, 1995 (Coleoptera: Curculionidae) in camu-camu [Myrciaria dubia (H.B.K.) McVaugh, Myrtaceae] had only been verified in natural populations. This report describes its occurrence in an experimental cultivation, where damage of camu-camu fruits by C. dubiae at different ripening stages was evaluated between 1999 and 2003. The damage caused by the larva increased with the degree of ripening of the fruits, with greater damage of fruit pulp (30 to 90%) than to seeds (7%). The incidence of this insect may cause significant quantitative losses in the camu-camu production.

Index terms: camu-camu borer, Insecta, cultivation in amazonian floodplain.

O camu-camu, Myrciaria dubia (H.B.K.) McVaugh - Myrtaceae, é uma espécie amazônica cujos frutos apresentam elevado teor de ácido ascórbico e podem ser usados na elaboração de suco, sorvete, geléia, licor e concentrado de vitamina C (Whitman, 1974). Atualmente, a maior parte da produção desses frutos obtem-se extrativamente de populações naturais encontradas às margens dos rios Ucayali, Nanay e Napo, no Peru (Villachica & Labarte, 1998), e dos rios Negro e Uatumã, no Brasil.

Em cultivos comerciais de camu-camu, no Peru, tem-se verificado sido verificada a ocorrência de insetos causadores de danos nas diversas partes da planta, dentre os quais destaca-se a broca do fruto, Conotrachelus dubiae O'Brien, 1995 (Coleoptera: Curculionidae) (Couturier et al., 1992; O'Brien & Couturier, 1995). A incidência deste inseto está limitada a algumas áreas, mas o aumento dos danos e a sua disseminação para outras plantações podem ocasionar sérios problemas à produtividade da cultura (Couturier et al., 1994).

No Brasil, a ocorrência de C. dubiae, que até então se constatou somente em populações naturais (Clement, 1998), foi recentemente detectada em um cultivo experimental do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Diante disso, o presente trabalho foi realizado neste cultivo, visando avaliar os danos de C. dubiae em frutos de camu-camu, em diferentes graus de amadurecimento, entre 1999 e 2003.

O estudo foi conduzido em área de várzea amazônica de 0,8 ha, contendo 492 plantas de 18 anos de idade, na Estação Experimental do Ariaú/INPA, localizada no município de Iranduba (latitude 3° 9'S, longitude 59° 15'3" W e altitude de 30m), no estado do Amazonas. O clima dessa região é do tipo Ami, com temperatura média anual de 27°C e pluviosidade média anual de 2.345 mm (Falesi, 1986). O solo, tipo Glei Pouco Húmico, é inundado anualmente no período de maio a agosto.

As coletas foram realizadas uma vez por ano, entre 1999 e 2003, após duas semanas do início do amadurecimento dos primeiros frutos no plantio. Do total de frutos colhidos na área, em um dia, foram tomadas quatro amostras de 4-5 kg, cujos frutos foram separados, conforme a coloração do epicarpo, em: frutos 100% amadurecidos (cor 100% púrpura/vermelha), frutos 75% amadurecidos (cor 75% púrpura/vermelha e 25% verde), frutos 50% amadurecidos (cor 50% púrpura/vermelha e 50% verde) e frutos 25% amadurecidos (cor 25% púrpura/vermelha e 75% verde). Em seguida, dentro de cada grau de amadurecimento, foi determinado o número de frutos atacados e o de sementes danificadas pela larva de C. dubiae.

O delineamento experimental adotado foi o inteiramente casualizado, em esquema fatorial 4 (graus de amadurecimento) x 5 (anos de observação), com quatro repetições. Para a análise de variância, os dados foram transformados em arco seno raiz quadrada de x/100, sendo as médias comparadas pelo teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade.

Foi observada relação direta entre o amadurecimento dos frutos de camu-camu e os danos de C. dubiae (Figura 1). Nos cinco anos de coletas, a ocorrência de danos foi diferenciada para cada ano, mas sempre com a tendência dos frutos mais amadurecidos apresentarem maior percentual de ocorrência de danos. Com o aumento do grau de amadurecimento, a percepção do ataque de C. dubiae (Figuras 2A e 2B) ficou mais visível devido, principalmente, à existência de perfuração provocada pela larva no epicarpo (Figura 2C), que é utilizada tanto para a deposição de dejetos quanto para a sua saída quando for pupar. Além disso, nas proximidades desse orifício, o epicarpo mostra-se rosado-pálido ou pardo-claro, e a polpa apresenta-se apodrecida (Couturier et al., 1992).



Com o passar dos anos de observação, evidenciou-se o aumento da ocorrência de danos em cada grau de amadurecimento dos frutos, principalmente nos anos de 2002 e 2003 (Figura 1). Nestes anos, as ocorrências de danos foram sempre superiores a 50%, em todos os graus de amadurecimento. Por outro lado, a produção de frutos também foi baixa, o que pode ter contribuído para uma maior freqüência relativa de incidência do inseto, tendo em vista a menor disponibilidade de frutos.

Nos frutos atacados por C. dubiae, o percentual de sementes danificadas (Figura 2D) também aumentou à medida que progrediu o amadurecimento dos frutos, embora tenha sido variável entre os anos estudados (Tabela 1). Considerando que o número médio de sementes por fruto é de duas unidades, os valores obtidos sugerem que nem todas as sementes são danificadas pela larva. No ano de 2003, em 100 frutos amadurecidos e atacados pela larva, foram observadas sementes danificadas em somente 35 frutos e que, dentre esses, apenas oito tiveram as duas sementes danificadas.

Nos anos 2001 e 2003, constatou-se que, considerando o total de frutos coletados, os percentuais de sementes danificadas não diferiram quanto ao ano de observação (Tabela 1) e, com isso, divergiram dos resultados obtidos em frutos atacados (Figura 1). Por outro lado, levando-se em conta o grau de amadurecimento, o comportamento foi semelhante ao verificado nos frutos atacados, com aumento progressivo de sementes danificadas à medida que avançou o amadurecimento dos frutos (Tabela 1).

Os danos de C. dubiae foram mais prejudiciais aos frutos do que às sementes de camu-camu. Em 2001 e 2003, o percentual de frutos atacados foi 30 e 90%, respectivamente (Figura 1), enquanto o percentual de sementes danificadas foi 7% (Tabela 1). É provável que as perdas quantitativas sejam maiores, pois muitos frutos atacados apodrecem e caem antes de serem colhidos. De qualquer modo, em plantios comerciais, os frutos atacados que forem colhidos deverão ser eliminados, pois se forem processados, em conjunto com os frutos sadios, poderão promover alterações na qualidade da polpa e, por conseguinte, reduzir o seu período de conservação. Paralelamente, as sementes danificadas também deverão ser eliminadas, pois se forem armazenadas, juntamente com as sementes intactas, poderão comprometer a viabilidade de todo o lote.

Esse é o primeiro registro de ocorrência de C. dubiae em cultivo de camu-camu no Brasil. Os resultados indicaram que os danos causados pela larva aumentam com o amadurecimento dos frutos, havendo maior comprometimento da polpa do fruto do que das sementes. A incidência desse inseto pode implicar em perdas quantitativas significativas na produção de camu-camu.

Recebido: 23/05/2003

Aceito para publicação: 04/11/2003

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  • 1
    (Trabalho 074/2003).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Fev 2004
    • Data do Fascículo
      Dez 2003

    Histórico

    • Aceito
      04 Nov 2003
    • Recebido
      23 Maio 2003
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