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'Black star': uma mutação somática natural da uva fina de mesa cv. Brasil

'Black star': a natural somatic mutation from table grape cv. Brazil

Resumos

A uva fina de mesa 'Black Star', originada de uma mutação somática da uva cv. Brasil em Marialva-PR, é descrita quanto às suas principais características físico-químicas e produtivas. Suas bagas, com sementes, apresentam formato elipsoide alongado com coloração vermelho-escura, tendendo ao preto durante a maturação plena. O ciclo, o desempenho produtivo e a suscetibilidade às doenças fúngicas assemelham-se aos da cv. Itália. Durante a maturação plena, apresenta teor médio de sólidos solúveis de 14ºBrix, 0,6% de ácido tartárico e índice de maturação de 21. Trata-se de nova cultivar de uva fina de mesa com potencial de cultivo no Brasil.

Vitis vinifera L.; cultivar; viticultura


The fine table grape 'Black Star', originated from a somatic mutation of the grape cv. Brasil in Marialva, PR, is described here as their main physico-chemical and productive characteristics. Its berries have elongated ellipsoid shape with dark red color tending to black during the full maturation. The cycle, the production performance and the susceptibility to fungal diseases is similar to the cv. Italia. During the full maturation, it has an average content of soluble solids of 14ºBrix, 0.6% of tartaric acid and maturation index of 21. This is a new cultivar of fine table grape with cultivation potential in Brazil.

Vitis vinifera L.; somatic mutation


COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

GENÉTICA E MELHORAMENTO GENETCS AND PLANT BREEDING

'Black star': uma mutação somática natural da uva fina de mesa cv. Brasil1 1 (Trabalho 229-11). Recebido em 30-09-2011. Aceito para publicação em: 27-06-2012.

'Black star': a natural somatic mutation from table grape cv. Brazil

Sergio Ruffo RobertoI; Adriane Marinho de AssisII; Werner GentaIII; Lilian Yukari YamamotoIV; Alessandro Jefferson SatoV

IEng. Agr., Dr., Professor Associado, Departamento de Agronomia/Fitotecnia, Universidade Estadual de Londrina, Bolsista do CNPq, CP 6001, 86051-990. E-mail: sroberto@uel.br

IIEng. Agr., Dr., Universidade Estadual de Londrina, CP 6001, 86051-990, Londrina, PR, Bolsista PNPD/Capes. E-mail: agroadri@ig.com.br

IIIEng. Agr., M. Sc., Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, 87020-900, Maringá, PR. E‑mail: werner@isuper.com.br

IVEng. Agr., M. Sc., Universidade Estadual de Londrina, CP 6001, 86051-990, Londrina, PR, Bolsista CNPq. E-mail: lilianyamamoto@yahoo.com.br

VEng. Agr., Dr., Universidade Estadual do Centro-Oeste, R. Padre Salvador, 875, 85015-430, Guarapuava, PR. E-mail: ajsato82@yahoo.com.br

RESUMO

A uva fina de mesa 'Black Star', originada de uma mutação somática da uva cv. Brasil em Marialva-PR, é descrita quanto às suas principais características físico-químicas e produtivas. Suas bagas, com sementes, apresentam formato elipsoide alongado com coloração vermelho-escura, tendendo ao preto durante a maturação plena. O ciclo, o desempenho produtivo e a suscetibilidade às doenças fúngicas assemelham-se aos da cv. Itália. Durante a maturação plena, apresenta teor médio de sólidos solúveis de 14ºBrix, 0,6% de ácido tartárico e índice de maturação de 21. Trata-se de nova cultivar de uva fina de mesa com potencial de cultivo no Brasil.

Termos para indexação: Vitis vinifera L., cultivar, viticultura.

ABSTRACT

The fine table grape 'Black Star', originated from a somatic mutation of the grape cv. Brasil in Marialva, PR, is described here as their main physico-chemical and productive characteristics. Its berries have elongated ellipsoid shape with dark red color tending to black during the full maturation. The cycle, the production performance and the susceptibility to fungal diseases is similar to the cv. Italia. During the full maturation, it has an average content of soluble solids of 14ºBrix, 0.6% of tartaric acid and maturation index of 21. This is a new cultivar of fine table grape with cultivation potential in Brazil.

Index terms: Vitis vinifera L., somatic mutation.

As mutações são a base para a seleção genética em uma população de plantas. Em geral, elas são espontâneas e ocorrem de maneira não prevista e em baixa frequência, em taxas de 10-6 a 10-8 (PIRES et al., 2003). Entretanto, as mutações somáticas em videiras são relativamente frequentes e têm possibilitado o surgimento de novas variedades (CAMARGO, 1994; VOUILLAMOZ et al., 2003).

A cv. Itália (Vitis vinifera L.) foi introduzida no Brasil, possivelmente, por Francisco Marengo, na década de 20 (CAMARGO, 1994). Sua produção comercial foi iniciada pelo viticultor Sussumu Usui, no começo da década de 50, em Ferraz de Vasconcelos-SP. No Paraná, em escala comercial, as primeiras plantas de 'Itália' foram enxertadas em 1958, em Londrina e Marialva, sendo uma das mais importantes uvas de mesa no Brasil (KISHINO; ROBERTO, 2007).

Após sua introdução, algumas mutações dessa cultivar resultaram em importantes variedades cultivadas no país, como a 'Rubi', em 1974, que apresenta bagas rosadas, e a 'Benitaka', em 1988, que apresenta bagas vermelho-escuras (TERRA et al., 1998). Em 1991, foi descoberta a cv. Brasil, originada da cv. Benitaka, cujas bagas apresentam coloração preta (KISHINO; ROBERTO, 2007).

Além dessas, outras mutações que resultaram em novas variedades foram descobertas, destacando-se a uva 'Redimeire', originada a partir da cv. Itália (PIRES et al., 2003), a qual apresenta bagas com formato longo-ovalado, coloração roxa e delicado sabor moscatel.

De acordo com Collet et al. (2005) e Orasmo et al. (2007), as alterações morfológicas que distinguem a uva 'Itália' e seus mutantes (Rubi, Benitaka e Brasil) são decorrentes de alterações em, pelo menos, sete genes regulatórios envolvidos na expressão de antocianinas, determinantes da coloração dos frutos nessas variedades. Essas descobertas indicam a instabilidade genética e o polimorfismo da cor da casca das bagas dessas cultivares de V. vinifera (MAIA et al., 2009).

O presente estudo foi realizado com o objetivo de descrever as principais características físico-químicas e produtivas da nova cultivar de uva de mesa, Black Star, originada por mutação somática da cv. Brasil.

A uva 'Black Star' surgiu em 2006, a partir de uma mutação somática natural, em um parreiral comercial de uva 'Brasil' (Vitis vinifera L.), no Sítio Esperança, localizado no município de Marialva-PR (23º27'49,86"S, 51º47'18,74" oeste, elevação de 614 m). O nome da cultivar foi escolhido em homenagem à Sra. Estela Napoli Feltrin, esposa do proprietário, Sr. Orlando Feltrin. As características principais que distinguem as bagas da uva 'Black Star' da cv. Brasil são o seu formato elipsoide alongado e sua coloração vermelho-escura, tendendo ao preto mais intenso durante a maturação plena.

A mutação foi constatada pelo Sr. Sérgio Pires de Lima, técnico responsável pelo parreiral. Em julho de 2007, o material propagativo foi coletado e, posteriormente, enxertado na mesma propriedade sobre o porta-enxerto IAC 766 'Campinas'. As videiras foram conduzidas no sistema latada, em espaçamento de 3,0 m entre linhas e 4,0 m entre plantas, deixando-se aproximadamente 40 varas por planta.

Para a descrição das características físico-químicas e produtivas da uva 'Black Star', foram coletados, em 2010, 20 cachos das videiras no momento da colheita, sendo determinadas as seguintes variáveis: comprimento (cm) e massa dos cachos (kg), massa (g) e diâmetro das bagas (cm), teor de sólidos solúveis (SS), acidez titulável (AT) e índice de maturação (SS/AT) do mosto das bagas, bem como foram estimadas a produção por planta (kg por planta) e a produtividade (t ha-1), em função do número médio de cachos por planta, da massa média dos cachos e do número de plantas por hectare.

Os cachos foram colhidos manualmente, com o auxílio de tesoura de colheita, sendo posteriormente submetidos à limpeza, retirando-se as bagas danificadas. O comprimento dos cachos foi determinado com o auxílio de uma régua graduada, a massa dos cachos e das bagas, em balança analítica, e o diâmetro das bagas, com o paquímetro.

Para a avaliação das características químicas, foram coletadas 50 bagas, sendo posteriormente divididas em cinco subamostras. O teor de SS foi determinado em refratômetro digital de bancada com compensação automática de temperatura (Modelo DR301-95, Krüss Optronic, Alemanha), por meio do mosto obtido após o desengace e esmagamento das bagas, e o resultado foi expresso em ºBrix. A determinação da AT foi realizada por titulação do suco com solução padronizada de NaOH 0,1N, em titulador potenciométrico digital (Modelo Tritoline Easy, Schott Geräte, Alemanha), e o resultado foi expresso em porcentagem de ácido tartárico.

Verificou-se que a videira 'Black Star' apresenta bom vigor vegetativo, semelhante à cv. Brasil, com brotações eretas. Responde bem à poda longa de frutificação (8-10 gemas), sendo recomendada a condução em sistema de latada. A brotação das gemas é excelente, tanto no fim do inverno (julho) para obtenção de safra regular, quanto no verão (janeiro) para obtenção de safra fora de época, com produção média de 40 cachos por planta, ou seja, 1 cacho por vara.

Os cachos apresentam 25,1+4,0 cm de comprimento e 0,8+0,2 kg de massa, formato cilíndrico cônico, pouco compacto (Figura 1) e bagas com 3,9+0,16 cm de comprimento, 16,2+1,8 g e 8+0,13 cm de diâmetro, com formato elipsoide alongado. As bagas são de coloração vermelho-escura, tendendo ao preto (Figura 2), com pincel e polpa mais avermelhados que a uva 'Brasil'. O sabor é agradável, e a polpa é de textura carnosa, firme e de sabor neutro.



A duração do ciclo (poda-colheita) é similar à da videira 'Itália', sendo a colheita realizada por volta de 150 dias após a poda, durante a safra regular, e 130 dias durante a safra fora de época.

Apresenta características produtivas compatíveis com os níveis produtivos observados para as uvas finas de mesa da região, alcançando, em média, 32,0 kg por planta e produtividade de 27,0 t ha-1.

Durante a maturação plena, apresenta teor médio de sólidos solúveis de 14ºBrix, acidez total de 0,6% de ácido tartárico e índice de maturação - SST/AT de 21. Entretanto, exige atenção redobrada quanto ao momento ideal de colheita, pois as bagas tornam-se pretas bem antes de atingir o valor de SST acima descrito, conforme ocorre para a uva 'Brasil' (NACHTIGAL; CAMARGO, 2005).

Quanto à suscetibilidade às doenças fúngicas, a 'Black Star' é similar à 'Itália' e seus mutantes, principalmente quanto ao míldio (Plasmopara viticola) e ao oídio (Uncinula necator), exigindo tratamentos fitossanitários constantes durante as fases fenológicas de maior suscetibilidade, sobretudo quando é obtida a produção fora de época. Devido ao seu formato alongado, é mais suscetível à rachadura das bagas por chuvas (a partir da coroinha ao redor da inserção do pedúnculo das bagas), porém menos suscetível que a uva 'Redimeire'.

Relata-se aqui, pela primeira vez, as principais características da nova cultivar de uva fina de mesa 'Black Star', com potencial de cultivo no País. No entanto, outros estudos devem ser realizados, no intuito de proceder à caracterização molecular, bem como verificar a aceitação do produto no mercado consumidor.

  • CAMARGO, U.A. Uvas do Brasil Bento Gonçalves: Centro Nacional de Pesquisa de Uva e Vinho, 1994. 90p.
  • COLLET, S.A.O.; COLLET, M.A.; MACHADO, M.F.P.S. Differential gene expression for isozymes in somatic mutants of Vitis vinifera L. (Vitaceae). Biochemical Systematics and Ecology, Amsterdam, v. 33, n. 7, p. 691-703, 2005.
  • KISHINO, A.Y.; ROBERTO, S.R. Variedades copas e porta-enxertos. In: KISHINO, A.Y.;CARVALHO, S.L.C. de; ROBERTO, S.R. Viticultura tropical: o sistema de produção do Paraná. Londrina: Iapar, 2007. p. 117-140.
  • MAIA, S.H.Z.; MANGOLIN, C.A.; COLLET, S.A.O.; MACHADO, M.F.P.S.  Genetic diversity in somatic mutants of grape (Vitis vinifera) cultivar Italia based on random amplified polymorphic DNA. Genetics and Molecular Research, Ribeirão Preto, v. 8, n. 1, p. 28-38, 2009.
  • NACHTIGAL, J.C.; CAMARGO, U.A. Cultivares. Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho. 2005. (Sistema de Produção de Uva de Mesa no Norte do Paraná). Disponível em: <http://www.cnpuv.embrapa.br/publica/sprod/MesaNorteParana/cultivares.htm>. Acesso em: 23 maio 2011.
  • ORASMO, R.G.; COLLET, S.A.O.; LAPENTA, A.S.; MACHADO, M.F.P.S. Biochemical and genetic polymorphisms for carboxylesterase and acetylesterase in grape clones of Vitis vinifera L. (Vitaceae) cultivars. Biochemical Genetics, Amsterdam, v. 45, v. 9-10, p. 663-670, 2007.
  • PIRES, E.J.P.; SAWAZAKI, H.E.; TERRA, M.M.; BOTELHO, R.V.; CONAGIM, A.; NOGUEIRA, N.A.M. Redmeire: a natural mutation of cv. Itália in Brazil. Vitis, Sibeldingen, v. 42, n. 1, p. 55-56, 2003.
  • TERRA, M.M.; PIRES E.J.P.; NOGUEIRA, N.A.M. Tecnologia para a produção de uva Itália na região noroeste do Estado de São Paulo. Campinas, SP: CATI, 1998. 51p. (Documento Técnico, 97).
  • VOUILLAMOZ, J.; MAIGRE, D.; MEREDITH, C.P. Microsatellite analysis of ancient alpine grape cultivars: pedigree reconstruction of Vitis vinifera L. 'Cornalin Du Valais'. Theoretical and Applied Genetics, Berlim, v. 107, n. 3, p. 448-454, 2003.
  • 1
    (Trabalho 229-11). Recebido em 30-09-2011. Aceito para publicação em: 27-06-2012.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      30 Set 2011
    • Aceito
      27 Jun 2012
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