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Osteoartropatia hipertrófica primária (paquidermoperiostose): relato de casos em dois irmãos

Primary hypertrophic osteoarthropathy (pachydermoperiostosis): case report of two sibling

Resumos

Neste artigo apresentamos dois irmãos acometidos pela osteoartropatia hipertrófica primária (paquidermoperiostose). Esta representa somente 3% a 5% de todos os casos de osteoartropatia hipertrófica. Nos nossos pacientes as alterações nos ossos longos são evidenciadas em radiografias convencionais, constando-se em neoformação óssea periosteal e alargamento das diáfises.

Osteoartropatia hipertrófica primária; Paquidermoperiostose; Radiologia


We report a case of two siblings with primary hypertrophic osteoarthropathy (pachydermoperiostosis). Pachydermoperiostosis represents only 3 to 5 per cent of all cases of hypertrophic osteoarthropathy. These patients presented long bone changes on conventional x-ray films including periosteal new bone formation and expansion of the diaphysis.

Primary hypertrophic osteoarthropathy; Pachydermoperiostosis; Radiology


RELATO DE CASOS

Osteoartropatia hipertrófica primária (paquidermoperiostose): relato de casos em dois irmãos* * Trabalho realizado no Serviço de Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (HC-FMUFG), Goiânia, GO.

Primary hypertrophic osteoarthropathy (pachydermoperiostosis): case report of two siblings

Tarcísio Nunes CarvalhoI; Cyrillo Rodrigues de Araújo Jr.I; Sérgio Roberto Fraguas FilhoI; Marlos Augusto Bittencourt CostaI; Kim-Ir-Sen Santos TeixeiraII; Carlos Alberto XimenesIII

IMédicos Residentes do Serviço de Diagnóstico por Imagem do HC-FMUFG

IIProfessor Adjunto Doutor do Departamento de Diagnóstico por Imagem e Anatomia Patológica do HC-FMUFG

IIIProfessor Adjunto, Chefe do Serviço de Diagnóstico por Imagem do HC-FMUFG

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Tarcísio Nunes Carvalho Rua C-167, nº 130, Setor Nova Suíça Goiânia, GO, 74255-100 E-mail: tarcisionunes@hotmail.com.br

RESUMO

Neste artigo apresentamos dois irmãos acometidos pela osteoartropatia hipertrófica primária (paquidermoperiostose). Esta representa somente 3% a 5% de todos os casos de osteoartropatia hipertrófica. Nos nossos pacientes as alterações nos ossos longos são evidenciadas em radiografias convencionais, constando-se em neoformação óssea periosteal e alargamento das diáfises.

Unitermos: Osteoartropatia hipertrófica primária; Paquidermoperiostose; Radiologia.

ABSTRACT

We report a case of two siblings with primary hypertrophic osteoarthropathy (pachydermoperiostosis). Pachydermoperiostosis represents only 3 to 5 per cent of all cases of hypertrophic osteoarthropathy. These patients presented long bone changes on conventional x-ray films including periosteal new bone formation and expansion of the diaphysis.

Key words: Primary hypertrophic osteoarthropathy; Pachydermoperiostosis; Radiology.

Introdução

A osteoartropatia hipertrófica (OAH) primária, também conhecida como paquidermoperiostose, representa uma forma primária (hereditária ou idiopática) de osteoartropatia hipertrófica. Esta representa aproximadamente 3% a 5% de todos os casos de osteoartropatia hipertrófica e caracteriza-se por espessamento cutâneo (face, couro cabeludo, mãos e pés), aumento da espessura dos ossos das extremidades e dedos hipocráticos(1-4).

Os primeiros casos foram relatados por Friedreich em 1868 e foram considerados como exemplos de acromegalia(5). Em 1935, Touraine et al. definiram as características desta síndrome como uma entidade distinta e enfatizaram as semelhanças entre a síndrome e a osteoartropatia pulmonar(6).

Este relato de caso apresenta dois irmãos com "baqueteamento de dedos", hipertrofia de extremidades e alterações radiológicas compatíveis com osteoartropatia hipertrófica primária.

RELATO DOS CASOS

Caso 1

Homem, branco, 19 anos, encaminhado ao Departamento de Diagnóstico por Imagem para investigação radiológica de artralgia nos joelhos e punhos, e hipertrofia das mãos e pés. Estas manifestações iniciaram há cerca de cinco anos e aumentaram progressivamente, o que dificultava a realização das suas tarefas manuais.

Ao exame clínico evidenciaram-se espessamento cutâneo dos joelhos e das mãos, características faciais grosseiras com pele oleosa, espessada e rugas, hipertrofia nítida das mãos e dos pés com aumento dos tecidos moles e do volume articular. "Baqueteamento de dedos" e "unhas em vidro de relógio" era bem caracterizado ao exame físico (Figura 1).


O estudo radiológico evidenciou alterações simétricas e bilaterais, com neosteogênese periosteal irregular, lamelada e espessamento cortical da ulna e do rádio (Figura 2). Achado adicional de proliferação periosteal lamelada na tíbia e na fíbula se fazia presente (Figura 3).



Caso 2

Homem, branco, 17 anos, único irmão do paciente do caso 1, encaminhado com manifestações clínicas semelhantes, porém menos intensas que as de seu irmão.

Ao exame clínico notava-se aumento simétrico e bilateral dos punhos e tornozelos, com hipertrofia das mãos e dos pés. Alterações cutâneas e fâneros eram semelhantes.

O estudo radiológico evidenciou alterações ósseas com as características do seu irmão. Neosteogênese periosteal lamelada com espessamento cortical do rádio, ulna, tíbia e fíbula (Figuras 4 e 5).



DISCUSSÃO

A OAH primária é considerada de etiologia desconhecida e de caráter familiar, ocorrendo em cerca de 25% a 30% dos familiares nos casos estudados. Discute-se a participação genética determinada por gene autossômico dominante, com graus variáveis de penetrabilidade e fenotipicamente de maior intensidade no sexo masculino(7).

A enfermidade manifesta-se usualmente na puberdade e progride vagarosamente, com autolimitação do seu curso após alguns anos.

Touraine admitiu três formas clínicas de OAH primária: 1) completa, com paquiperiostose e paquidermia das extremidades, face e couro cabeludo; 2) incompleta, com paquiperiostose (acompanhada ou não de artrite) e paquidermia de extremidades ou face, sem comprometimento do couro cabeludo; 3) frustra, quando há apenas "baqueteamento de dedos" e/ou espessamento de pele circunscrito à face ou couro cabeludo; e as alterações radiológicas, quando presentes, são mínimas(2).

Alguns autores consideraram como principais manifestações da OAH primária o aumento do volume das extremidades, dedos hipocráticos, unhas "em vidro de relógio", paquidermia e queixas neuromusculares e/ou articulares. Entretanto, nos últimos anos vêm sendo descritos quadros semelhantes de osteoartropatia hipertrófica secundária a doenças pulmonares de caráter supurativo ou infiltrativo ou neoplasias intratorácicas malignas(8-10) ou benignas(11) que exibiam os mesmos sinais clínicos assinalados como patognomônicos da OAH primária. Pelas razões expostas não é possível diferenciar as duas formas, a não ser pelo curso clínico e pela exclusão de lesões pulmonares primitivas. Entretanto, a OAH secundária é de início mais tardio, não apresentando ocorrência familiar nem hereditária e as alterações ósseas são mais agudas e dolorosas(7). Os achados radiográficos têm algumas diferenças. Na OAH primária a reação periosteal é irregular e mal definida, em contradição com o depósito linear evidenciado na OAH secundária(1).

O diagnóstico de OAH primária é realizado basicamente com achados radiológicos e clínicos, consistindo de proliferação periosteal com neoformação óssea (em camadas finas, tornando-se progressivamente irregulares, ásperas e ondulantes), simétrica e bilateral nos ossos longos, mais evidentes nas inserções de tendões e ligamentos. Os espaços medulares mostram-se normais(7).

Nos casos em discussão o diagnóstico de OAH primária baseou-se nas alterações clínicas sem qualquer doença pulmonar, na história familiar e nos achados radiográficos característicos, principalmente nos punhos e tornozelos. Os casos classificam-se na forma clínica incompleta, segundo Touraine.

O diagnóstico de OAH primária, portanto, deve ser considerado após exclusão de OAH secundária em qualquer adolescente apresentando artralgia, "baqueteamento" digital e história familiar, e confirmado com os achados radiográficos.

Recebido para publicação em 20/3/2003. Aceito, após revisão, em 1/7/2003.

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  • 3.Rimoin DL. Pachydermoperiostosis (idiopathic clubbing and periostosis): genetic and physiologic consideration. N Engl J Med 1965;272:923-31.
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  • 6.Touraine A, Solente G, Golé L. Un syndrome osteodermopathique: la pachydermie plicaturée avec pachypériostose de extrémités. Presse Med 1935;43:1820-4.
  • 7.Pastor EH, Cossermelli W, Barros MT, et al. Paquidermoperiostose: relato de caso e discussão diagnóstica. Rev Assoc Med Bras 1979;25:288-90.
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  • 10.Ray ES, Fisher HP. Hypertrophic osteoarthropathy in pulmonary malignancies. Ann Intern Med 1953;38:239.
  • 11.Shapiro RF, Zvaifler NJ. Concurrent intrathoracic Hodgkin's disease and hypertrophic osteoarthropathy. Chest 1973;63:912-5.
  • Endereço para correspondência:
    Dr. Tarcísio Nunes Carvalho
    Rua C-167, nº 130, Setor Nova Suíça
    Goiânia, GO, 74255-100
    E-mail:
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    Trabalho realizado no Serviço de Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (HC-FMUFG), Goiânia, GO.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Maio 2004
    • Data do Fascículo
      Abr 2004

    Histórico

    • Aceito
      01 Jul 2003
    • Recebido
      20 Mar 2003
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