Acessibilidade / Reportar erro

Tomografia computadorizada do tórax na avaliação da pneumonia intersticial linfocítica

A pneumonia intersticial linfocítica (PIL) é uma doença linfoproliferativa benigna caracterizada por envolvimento do interstício pulmonar por tecido linfoide(11 Koss MN, Hochholzer L, Langloss JM, et al. Lymphoid interstitial pneumonia: clinicopathological and immunopathological findings in 18 cases. Pathology. 1987;19:178-85.). Geralmente é associada a uma variedade de condições, mais comumente a doenças autoimunes, como síndrome de Sjögren, artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, ou a estados de imunodeficiência, como na infecção pelo HIV(22 Gupta N, Vassallo R, Wikenheiser-Brokamp KA, et al. Diffuse cystic lung disease. Part II. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:17-29.). Raramente, porém, a PIL pode ser idiopática e, neste caso, é classificada no grupo das pneumonias intersticiais idiopáticas raras, de acordo com a última atualização da American Thoracic Society/European Respiratory Society(33 Travis WD, Costabel U, Hansell DM, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: update of the international multidisciplinary classification of the idiopathic interstitial pneumonias. Am J Respir Crit Care Med. 2013;188:733-48.).

A tomografia computadorizada (TC) do tórax é considerada o padrão ouro de imagem para avaliação das doenças difusas pulmonares, sendo ferramenta fundamental para caracterização das pneumonias intersticiais, incluindo a PIL. A característica tomográfica mais frequente da PIL são os cistos aéreos pulmonares, geralmente pouco numerosos, com distribuição difusa pelos pulmões, e muitas vezes associados a opacidades em vidro fosco(44 Johkoh T, Müller NL, Pickford HA, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: thin-section CT findings in 22 patients. Radiology. 1999;212:567-72.). A TC tem sensibilidade para detectar e caracterizar os cistos (distribuição, tamanho, extensão e regularidade das paredes), assim como para identificar outros achados associados(55 Baldi BG, Carvalho CRR, Dias OM, et al. Diffuse cystic lung diseases: differential diagnosis. J Bras Pneumol. 2017;43:140-9.). Embora o diagnóstico diferencial das doenças que cursam com cistos aéreos pulmonares seja amplo, a maioria dessas doenças são condições raras. Linfangioliomiomatose e histiocitose das células de Langerhans são as doenças que mais frequentemente apresentam cistos aéreos pulmonares. Outras condições ainda mais raras, como síndrome de Birt-Hogg-Dubé, bronquiolite folicular e doença de deposição da cadeia leve também podem cursar com cistos aéreos múltiplos e fazem parte do diagnóstico diferencial da PIL(66 Francisco FAF, Souza Jr A, Zanetti G, et al. Multiple cystic lung disease. Eur Respir Rev. 2015;24:552-64.). Um grande desafio diagnóstico é a presença de cistos aéreos em pacientes com síndrome da imunodeficiência adquirida. Nesses pacientes, esse achado pode ser devido a pneumocistose ou a PIL. O reconhecimento das características tomográficas das doenças que cursam com cistos aéreos é fundamental para estreitar o diagnóstico diferencial.

O artigo de Louza et al.(77 Louza GF, Nobre LF, Mançano AD, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: computed tomography findings in 36 patients. Radiol Bras. 2020;53:287-92.), publicado neste número da Radiologia Brasileira, é um excelente estudo no qual os autores abordam os principais aspectos encontrados na TC de tórax de 36 pacientes com diagnóstico de PIL, 13 deles confirmados por biópsia pulmonar e os restantes confirmados com base em critérios clínicos, laboratoriais e radiológicos. O estudo possui uma casuística robusta considerando a raridade da doença e os dados da literatura. As doenças imunológicas mais frequentemente associadas à PIL são a síndrome de Sjögren e a infecção pelo HIV(88 Swigris JJ, Berry GJ, Raffin TA, et al. Lymphoid interstitial pneumonia: a narrative review. Chest. 2002;122:2150-64.), o que foi corroborado pelo estudo de Louza et al.(77 Louza GF, Nobre LF, Mançano AD, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: computed tomography findings in 36 patients. Radiol Bras. 2020;53:287-92.), no qual os autores encontraram a PIL associada à síndrome de Sjögren na maioria dos casos estudados (42%). Além da PIL, a síndrome de Sjögren pode estar associada a pneumonia em organização e a pneumonia intersticial usual, o que pode levar à necessidade de biópsia pulmonar transbrônquica ou cirúrgica(99 Flament T, Bigot A, Chaigne B, et al. Pulmonary manifestations of Sjögren's syndrome. Eur Respir Rev. 2016;25:110-23.).

O estudo de Louza et al. possui grande valor, principalmente porque o reconhecimento das características tomográficas de cada padrão de doença é fundamental para a correta interpretação dos achados radiológicos, visando a estreitar o diagnóstico diferencial e, por vezes, evitar procedimentos invasivos. Nesse estudo, as manifestações tomográficas da PIL mais frequentemente encontradas foram múltiplos cistos aéreos arredondados e de paredes finas, a maioria medindo menos que 20 mm, de distribuição difusa pelos pulmões, associados a opacidades em vidro fosco ou a pequenos nódulos. Os autores destacaram, ainda, a alta prevalência da associação de PIL com amiloidose, sendo o achado concomitante de nódulos e cistos aéreos na TC muito sugestivo dessa associação, principalmente quando há calcificação dos nódulos, dado este que não foi descrito em estudos sobre PIL com casuísticas relevantes(44 Johkoh T, Müller NL, Pickford HA, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: thin-section CT findings in 22 patients. Radiology. 1999;212:567-72.).

Concluindo, o trabalho de Louza et al.(77 Louza GF, Nobre LF, Mançano AD, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: computed tomography findings in 36 patients. Radiol Bras. 2020;53:287-92.) demonstra com detalhes as características tomográficas que ajudam o radiologista a suspeitar de PIL, com grande utilidade no diagnóstico diferencial com outras pneumopatias que cursam com cistos aéreos pulmonares, como podem levantar a possibilidade de condições clínicas associadas, principalmente imunodeficiência e doenças autoimunes.

REFERENCES

  • 1
    Koss MN, Hochholzer L, Langloss JM, et al. Lymphoid interstitial pneumonia: clinicopathological and immunopathological findings in 18 cases. Pathology. 1987;19:178-85.
  • 2
    Gupta N, Vassallo R, Wikenheiser-Brokamp KA, et al. Diffuse cystic lung disease. Part II. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192:17-29.
  • 3
    Travis WD, Costabel U, Hansell DM, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: update of the international multidisciplinary classification of the idiopathic interstitial pneumonias. Am J Respir Crit Care Med. 2013;188:733-48.
  • 4
    Johkoh T, Müller NL, Pickford HA, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: thin-section CT findings in 22 patients. Radiology. 1999;212:567-72.
  • 5
    Baldi BG, Carvalho CRR, Dias OM, et al. Diffuse cystic lung diseases: differential diagnosis. J Bras Pneumol. 2017;43:140-9.
  • 6
    Francisco FAF, Souza Jr A, Zanetti G, et al. Multiple cystic lung disease. Eur Respir Rev. 2015;24:552-64.
  • 7
    Louza GF, Nobre LF, Mançano AD, et al. Lymphocytic interstitial pneumonia: computed tomography findings in 36 patients. Radiol Bras. 2020;53:287-92.
  • 8
    Swigris JJ, Berry GJ, Raffin TA, et al. Lymphoid interstitial pneumonia: a narrative review. Chest. 2002;122:2150-64.
  • 9
    Flament T, Bigot A, Chaigne B, et al. Pulmonary manifestations of Sjögren's syndrome. Eur Respir Rev. 2016;25:110-23.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2020
Publicação do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem Av. Paulista, 37 - 7º andar - conjunto 71, 01311-902 - São Paulo - SP, Tel.: +55 11 3372-4541, Fax: 3285-1690, Fax: +55 11 3285-1690 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: radiologiabrasileira@cbr.org.br