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Sexualidade, Espiritualidade e Conjugalidades na Wicca Brasileira

Sexuality, Spirituality and conjugality in Brazilian Wicca

Resumo

Este artigo propõe uma análise do papel da sexualidade nas práticas da Wicca, religião neopagã surgida na Inglaterra entre 1940 e 1950. Atualmente, a Wicca é um movimento mundial multifacetado, que segue inúmeras vertentes. Esta pesquisa investiga concepções e práticas ligadas à sexualidade presentes entre grupos que praticam a Wicca publicamente em diversas capitais do Brasil. Esses grupos estão organizados em tradições (grupos religiosos com viés iniciático) que comandam associações civis com fins de resguardar direitos e promover eventos públicos para divulgação e troca de conhecimento entre praticantes da religião. Os resultados do estudo mostram que a Wicca postula uma relação intrínseca entre sexualidade, espiritualidade e liberdade, sendo suas práticas herdeiras de movimentos intelectuais diversos, como o esoterismo, a contracultura e a filosofia oriental.

Palavras-chave
Wicca; sexualidade; magia sexual; esoterismo; contracultura

Abstract

This article proposes an analysis of the role of sexuality in Wicca’s practices. Wicca is a contemporary pagan religion that arose in England between 1940 and 1950. Nowadays, it is a multifaceted global movement, which follows several strands. This research investigates conceptions and practices related to sexuality among Brazilian Wicca groups who practice this religion publicly in various Brazilian cities. They organize themselves in closed groups, the traditions, who command civil associations. Those associations aim to protect rights and promoting public events for dissemination and exchange of knowledge among religious practitioners. The research results show that Wicca posits an intrinsic relationship between sexuality, spirituality and freedom. Their sources belong from various intellectual movements such as esotericism, the counterculture and Eastern philosophy.

Keywords
Wicca; sexuality; sexual magic; esotericism; counterculture

Introdução

A Wicca é uma religião neopagã1 1 O neopaganismo é o movimento de resgate das espiritualidades pagãs, que existiam na Europa antes da penetração e hegemonia do cristianismo. Dentre elas, podemos citar, além da Wicca, o Druidismo, Azatrú, reconstrucionismo Celta e Helênico. surgida na Inglaterra entre 1940 e 1950, a partir da publicação das obras do funcionário público aposentado e antropólogo amador Gerald Gardner (Hutton 1999HUTTON, Ronald. (1999), The Triumph of the Moon: A History of Modern Pagan Witchcraft. Oxford: Paperbacks. ). Essa religião popularizou-se no mundo anglo-saxão, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, nas décadas de 1960 e 1970 (Adler 2006ADLER, Margot. (2006), Drawing down the moon. Witches, Druids, Goddess-Worshippers, and Other Pagans in America. New York: Penguim Books.; Pike 2004PIKE, Sarah. (2004), New Age and Neopagan Religions in America. New York: Columbia University Press. (Columbia Contemporary American Religion Series).; Clifton 2006CLIFTON, Chas. (2006), Her Hidden Children. The rise of Wicca and Paganism in America. Lanham: Altamira Press.). A Wicca provavelmente chegou ao Brasil na década de 1980, através de pessoas que travaram conhecimento com essa religião por meio do mercado editorial de livros esotéricos e de feiras místicas (Bezerra 2012BEZERRA, Karina Oliveira. (2012), Wicca no Brasil: adesão e permanência dos adeptos na região metropolitana do Recife. Recife: Dissertação de Mestrado em Ciências da Religião, Universidade Católica de Pernambuco.; Duarte 2013DUARTE, Janluis. (2013), Reinventando Tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. Brasília: Tese de Doutorado em História, Universidade de Brasília.). Chega ao país juntamente com a expansão do estilo de vida Nova Era, um conjunto de práticas e espiritualidades voltados para alcançar elevação espiritual e bem-estar, independentemente de sistemas de crenças ou de grupos religiosos.

Os adeptos de práticas da Nova Era caracterizaram-se por uma busca eclética por espiritualidades e práticas religiosas, e por um olhar crítico em relação às religiões institucionalizadas, como o catolicismo (Amaral 2000AMARAL, Leila. (2000), Carnaval da alma: comunidade, essência e Sincretismo na Nova Era. Petrópolis: Vozes.; D’Andrea 2000D’ANDREA, Anthony. (2000), O Self Perfeito e a Nova Era: individualismo e reflexividade em religiosidades pós-tradicionais. São Paulo: Loyola.). No Brasil, essa busca muitas vezes levou alguns adeptos a encontrar e adotar alguns dos conhecimentos e ensinamentos da Wicca (Cordovil 2015a______. (2015a), “Religiões de Nova Era em Belém, Pará: entre o cosmopolitismo e a identidade local”. Rever (PUCSP), vol. 15, n° 1: 126-143.).

Apesar de não existirem números precisos a respeito de quantos são os adeptos da Wicca no Brasil, existem hoje pelo menos três associações civis criadas por líderes da Wicca e algumas dezenas de grupos organizados. Alguns destes realizam rituais abertos ao público em diversas capitais do Brasil, desde o final dos anos 1990. A internet foi fundamental para a popularização da religião no país, pois desde cedo começaram a surgir grupos de discussão em redes sociais, como o extinto Orkut.

Em São Paulo, aconteceu em 1998 o primeiro Encontro Anual de Bruxos (EAB), que é realizado até hoje (Cordovil 2014CORDOVIL, Daniela. (2014), “The cult of Afro-Brazilian and Indigenous Gods in Brazilian Wicca: symbols and practices”. The Pomegranate, vol. 16, n° 2: 1-14.). Nos anos 2000, foram publicados os primeiros livros sobre Wicca escritos por autores brasileiros, incentivando uma prática solitária da religião2 2 Os praticantes solitários de Wicca tornaram-se populares nos Estados Unidos a partir da publicação da obra de Scott Cunningham (2014), autor best-seller que descreve os ritos básicos da religião de forma que eles possam ser compreendidos e realizados por indivíduos em suas próprias casas, sem que precisem ser aceitos por grupos secretos e iniciáticos. . Obras como Wicca: a religião da deusa, de Claudiney Prieto (2009PRIETO, Claudiney. (2009), Wicca para todos. Edição do autor. Disponível em: www.wiccanaweb.com.br/pasta/livros.html. Acesso em: 30/05/2015.
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), e Guia de Rituais das Deusas Brasileiras, de Mavesper Ceridwen (2003CERIDWEN, Mavesper Cy. (2003), Wicca Brasil ‒ Guia de Rituais das Deusas Brasileiras. São Paulo: Gaia.), apresentam uma compilação de elementos históricos e instruções detalhadas sobre como realizar os rituais básicos da religião.

Por se tratar de uma religião iniciática, a Wicca tradicionalmente deve ser praticada em pequenos grupos, chamados de covens, que não devem ultrapassar treze pessoas. Um conjunto de covens unidos por princípios doutrinários e uma ritualística comum é chamado de tradição. Pessoas que seguem a ritualística e estão ligadas por laços iniciáticos ao fundador da Wicca, Gardner, seguem uma tradição Gardneriana. Existem muitas outras tradições na Inglaterra e nos Estados Unidos. No Brasil, as tradições começaram a ser criadas a partir dos anos 2000. Entre as mais conhecidas, podemos citar Tradição Diânica Nemorensis, Tradição Caminhos das Sombras, Tradição de Lilith e Tradição Diânica do Brasil. Apesar desta ênfase em grupos fechados e iniciáticos, a prática solitária da religião cresce no mundo todo, e acredita-se ser a responsável pela maior parte dos adeptos3 3 Segundo Chas Clifton (2006), os praticantes solitários seriam 80% dos wiccanianos norte-americanos. . Praticantes solitários são aqueles que realizam rituais de maneira autônoma, geralmente a partir de conhecimentos obtidos em livros ou por meio da internet, e por isso se consideram wiccanianos.

Os líderes das tradições de Wicca no Brasil são também os organizadores de eventos públicos como o Encontro Anual de Bruxos, e alguns publicaram livros sobre a temática. São essas pessoas que se organizaram para fundar associações civis, como a Associação Brasileira de Arte e Filosofia da Religião Wicca (Abrawicca) e a Igreja Brasileira de Wicca e Bruxaria (IBWB) (Terzetti Filho 2014TERZETTI FILHO, Celso Luiz. (2014), “A institucionalização da Wicca no Brasil: entrevista com a bruxa wiccaniana Mavesper Cy Ceridwen”. REVER, vol. 14, n° 2: 279-290.). Essas associações têm como objetivo conferir legitimidade à prática religiosa de Wicca, a exemplo do que ocorre em países como a Inglaterra e os Estados Unidos. No Brasil, pretendem contribuir para a divulgação de uma imagem positiva da Wicca e para regulamentar direitos, como a realização de casamento religioso com efeito civil.

A partir da popularização da oferta de conhecimentos sobre Wicca na internet e no espaço público de diversas cidades do Brasil, ela passou a ser uma opção religiosa viável para pessoas interessadas em misticismo e em práticas esotéricas, tornando-se muito popular entre os jovens. Os eventos e conhecimentos oferecidos pela internet podem tornar-se uma porta de entrada para aqueles que desejam buscar uma iniciação em um coven ou tradição de Wicca, e as fronteiras entre esses grupos tornam-se cada dia mais fluídas.

A disputa competitiva entre manifestações religiosas católicas, pentecostais e mediúnicas faz parte do cenário urbano das grandes cidades brasileiras e tem sido notada por diversos pesquisadores. Tal pluralismo religioso também se apresenta nos censos demográficos nas últimas décadas. No Brasil, dados estatísticos têm apontado um declínio da população católica e um aumento do percentual de evangélicos, o que tem merecido grande atenção de pesquisadores (Pierucci 2004PIERUCCI, Antônio Flávio. (2004), “‘Bye bye, Brasil’: o declínio das religiões tradicionais no Censo 2000”. Estudos avançados, vol. 18, n° 52: 17-28.). Por outro lado, chama atenção nos últimos censos o aumento do percentual dos que se declaram “sem religião”, que hoje atinge 8% da população, ou quinze milhões de pessoas. Dentro desse percentual, encontram-se os chamados buscadores religiosos, pessoas que transitam por diversas práticas e espiritualidades, ou podem estar ligadas a Novos Movimentos Religiosos, o que as ferramentas do censo não permitem identificar (Luiz 2013LUIZ, Ronaldo Robson. (2013), “A religiosidade dos sem religião”. Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e Religião, vol. 15, n° 19: 73-88.).

Não existe um quesito “paganismo” que possa ser assinalado pelos participantes do censo; por isso, aqueles que praticam essa religião ainda não aparecem nas estatísticas oficiais do governo brasileiro. No censo de 2010, 74.013 pessoas responderam pertencer a “tradições exotéricas”, 63.082 a “tradições indígenas”, e 11.306 estão em “outras religiosidades”. Provavelmente em qualquer um desses campos encontramos respostas de pagãos. Como nenhum dos quesitos do censo se adequa ao que é o paganismo, um pagão poderia se enquadrar em múltiplas respostas. Segundo dados da União Wicca do Brasil (UWB), existem quinhentos mil praticantes de Wicca no país (Bezerra 2012BEZERRA, Karina Oliveira. (2012), Wicca no Brasil: adesão e permanência dos adeptos na região metropolitana do Recife. Recife: Dissertação de Mestrado em Ciências da Religião, Universidade Católica de Pernambuco.). Essa informação não pode ser verificada estatisticamente com as ferramentas existentes atualmente no censo.

A principal dificuldade em delimitar o universo daqueles que pertencem à Wicca é a maneira como as pessoas se relacionam com ela. Quando os princípios da Wicca vieram à tona na Inglaterra a partir das obras de Gerald Gardner e de seus discípulos, a palavra religião poucas vezes surgiu a eles associada. Conhecida como a Arte, ou, no inglês, craft, praticar a bruxaria era tido muito mais como um conhecimento esotérico e iniciático do que como uma prática religiosa. No interior dos grupos de Wicca brasileiros a denominação religião costuma ser mais comum do que em grupos europeus. Aqui, a noção de Wicca como uma prática religiosa vem se cristalizando por estar relacionada à ideia da necessidade de lutarem contra o preconceito, na busca por uma liberdade “religiosa”4 4 O filme Pagão fora da lei produzido pela Abrawicca demonstra bem essa concepção. .

Outro obstáculo em classificar e delimitar as fronteiras da Wicca é a fluidez entre aqueles que aprendem e praticam as técnicas mágicas associadas a ela e aqueles que pertencem a algum grupo e se autodenominam wiccanianos. No universo dos que “praticam” a Wicca, podemos encontrar sacerdotes “autoiniciados”, praticantes solitários, membros de covens e tradições, além de buscadores religiosos que aprendem e praticam técnicas da Wicca de maneira experimental, mesclando-as com outras práticas esotéricas. O universo da Wicca é composto por um continuum que vai desde grupos e coletividades estruturadas, com regras claras de pertencimento ao grupo e critérios rígidos para sua exclusão, até indivíduos que a experimentam autonomamente. Por este motivo, considerei para os objetivos deste trabalho a autoidentificação como critério para definir os wiccanianos, ou seja, pertence à Wicca aquele que se auto define como tal5 5 Esse critério também foi usando por Cinthia Eller (1995) para definir as espiritualistas feministas e mostra-se muito útil nos estudos de paganismo contemporâneo. .

Este texto pretende discutir a concepção wiccaniana da sexualidade entre adeptos brasileiros. Os dados que fundamentam a pesquisa foram obtidos entre setembro de 2013 e junho de 2015 junto a grupos e praticantes wiccanianos que vivem na região metropolitana de Belém e também por meio da participação em três eventos nacionais, realizados em Brasília e São Paulo, entre 2014 e 20156 6 Os eventos foram o 13º e o 14º Encontro Anual de Bruxos, realizados em Atibaia, São Paulo, em março de 2014 e março de 2015, e o 16º Bruxos do Brasil em Brasília, ocorrido em julho de 2014. . Cada um desses encontros reuniu em torno de oitenta a cem participantes, entre lideranças, praticantes iniciados na Wicca e neófitos. A metodologia empregada foi a observação participante e entrevistas, realizadas dentro dos limites éticos negociados junto ao grupo. Foram entrevistados para a pesquisa sete wiccanianos, de ambos os sexos, com idades entre 20 e 47 anos.

Sexualidade no surgimento da Wicca

Nas práticas da Wicca a sexualidade é um tema fundamental. O termo Wicca deriva de witchcraft, que, em inglês, significa bruxaria. Sua liturgia baseia-se na recriação de cultos de fertilidade pré-cristãos, que supostamtente teriam conotações sexuais. Serviram de evidências para sustentar essa hipótese a análise de ritos populares celebrados na Europa, como as festividades de primavera, e diversas fontes do folclore europeu, cujos mitos tratam da união entre um princípio divino masculino e um feminino, encarnados em divindades específicas (Frazer 1982FRAZER, James. (1982), O Ramo Dourado. São Paulo: Círculo do Livro.).

Como argumenta Ronald Hutton (1999HUTTON, Ronald. (1999), The Triumph of the Moon: A History of Modern Pagan Witchcraft. Oxford: Paperbacks. ), essas fontes foram recriadas e reinterpretadas por intelectuais ao longo do século XIX, cujo interesse pelo paganismo estava inserido em uma nostalgia e idealização da vida e dos saberes do homem do campo, construída em contraposição à crescente urbanização da sociedade britânica nesse período (Hutton 1999:117). Entre esses intelectuais, o mais destacado foi James Frazer. Considerado um dos fundadores da antropologia, em sua obra O Ramo Dourado (1982FRAZER, James. (1982), O Ramo Dourado. São Paulo: Círculo do Livro.) Frazer descreve uma religião pré-histórica baseada em ritos de fertilidade destinados a celebrar a morte e a ressureição de deuses pagãos.

Nesse mesmo período, escritores britânicos ligados à Sociedade de Folclore desenvolveram a ideia, primeiramente proposta pelo historiador francês Jules Michelet, de que as bruxas perseguidas pela inquisição seriam sacerdotisas deste culto pré-histórico de fertilidade. A mais conhecida propagadora dessa tese foi a arqueóloga Margaret Murray (2006MURRAY, Margaret A. (2006), El Dios de los Brujos. México: Fondo de Cultura Económica.). A autora destaca em sua obra O Deus das Feiticeiras que o culto a um Deus fertilizador e à sua consorte, uma Deusa cujo poder estava ligado à terra e à capacidade de gerar vida, seriam a base de uma religião da natureza praticada pelos povos paleolíticos e neolíticos por toda a Europa. A autora chamou esses cultos de Antiga Religião.

Apesar de duramente contestadas por estudiosos, pesquisas como essas serviram de base para o estabelecimento da bruxaria moderna por Gardner e seus discípulos (Hutton 1999HUTTON, Ronald. (1999), The Triumph of the Moon: A History of Modern Pagan Witchcraft. Oxford: Paperbacks. ). Além dos antropólogos, arqueólogos e folcloristas, também fizeram referência a deuses e mitos pagãos os poetas e escritores românticos. Neste movimento artístico-literário, os deuses pagãos foram associados ao resgate de um ideal de liberdade, sensualidade e erotismo que teria sido tolhido pelo cristianismo.

A Wicca ainda recebeu influência das ordens e sociedades secretas e de mistérios, como a Maçonaria, a Rosacruz e a Golden Down. No interior dessas ordens, que eram largamente disseminadas na Inglaterra e na França do século XIX, praticavam-se rituais de iniciação onde o neófito era desnudado, vendado e jurava fidelidade diante de um altar com ferramentas mágicas repletas de conteúdos simbólicos. Tais ferramentas são bastante semelhantes às utilizadas nos ritos de Wicca7 7 Os principais instrumentos são o athame (punhal), a taça e o caldeirão. .

As raízes das práticas dessas ordens podem ser encontradas na chamada Alta Magia (high magic), conjunto de teorias e de escolas herméticas que têm origem na antiguidade greco-romana e que atravessaram a Idade Média nos escritos de teóricos como Hermes Trimegisto e Papus. Esses escritos contêm conhecimentos sobre cabala, astrologia, alquimia e outras das chamadas ciências ocultas. Além da alta magia, a Wicca também foi influenciada pelas práticas de feitiçaria popular e curandeirismo, chamadas de baixa magia (low magic). Segundo Hutton, antes do surgimento das ordens iniciáticas, havia na verdade pouca distinção entre elas.

Um tema que assumiu certo destaque no interior da chamada alta magia foi a magia sexual, uma corrente de ensinamentos esotéricos surgida no final do século XIX, que prega a utilização da energia ligada à sexualidade, obtida por meio do ato sexual ou da masturbação, para obter efeitos mágicos através de rituais específicos. Segundo Hugh Urban (2004URBAN, Hugh B. (2004), “‘Magia Sexualis’: Sex, Secrecy, and Liberation in Modern Western Esotericism”. Journal of the American Academy of Religion, vol. 72, n° 3: 695-731.), a magia sexual faz parte da proliferação de discursos sobre sexo, ocorrida na Era Vitoriana, apontada por Foucault: “O surgimento da magia sexual, no final do século XIX [...] não é apenas um fascinante e negligenciado capítulo da história dos modernos movimentos religiosos; mais importante, ela nos dá excelentes insights sobre a cultura ocidental moderna e suas atitudes com relação à sexualidade neste período” (Urban 2004URBAN, Hugh B. (2004), “‘Magia Sexualis’: Sex, Secrecy, and Liberation in Modern Western Esotericism”. Journal of the American Academy of Religion, vol. 72, n° 3: 695-731.:697, tradução nossa)8 8 “The rise of sexual magic in the late nineteenth century […] is not only a fascinating and neglected piece of the history of modern religious movements; more important, it gives us some remarkable insights into modern western culture and its attitudes toward sexuality during this critical period” (Urban 2004:697). .

Urban analisa a obra de três escritores e místicos que se dedicaram à questão da magia sexual: Pascal Bervely Randolph, Aleister Crowley e Pierre Bernard. Randolph foi um advogado e escritor negro norte-americano, defensor dos direiros civis e da emancipação da mulher, que discutiu em suas obras o papel da sexualidade como peça importante no despertar da espiritualidade e dos poderes humanos. Sua visão de sexualidade sagrada era conservadora, pois considerava apenas a relação heterossexual realizada dentro do matrimônio. Já Pierre Bernard foi um dos pioneiros na divulgação do Tantra9 9 O tantra é uma filosofia oriental que tem origem na cultura védica cujas práticas de espiritualização e despertar da consciência incluem a mobilização da sexualidade. no Ocidente, atraindo clientes ricos ao seu centro de práticas de yoga e tantra em Nova York.

Dentre os três autores, a obra de Aleister Crowley é a que terá maior relação com o desenvolvimento da Wicca e a importância da sexualidade para a nova religião. Crowley também foi iniciado em Tantra e conhecia os trabalhos sobre magia sexual de Randolph, especialmente a partir da ligação deste com a Ordo Templi Orienti (O.T.O.), fundada por Crowley.

Crowley considerava a magia sexual a força mais importante que poderia ser despertada pelo ser humano, porém, diferente de Randolph, ele incluía nas suas práticas de magia sexual a masturbação e as relações homossexuais. Para Crowley, a magia sexual poderia ser usada para direcionar a vontade humana para a consecução de virtualmente qualquer objetivo. As práticas de magia sexual eram usadas para criar espiritualmente um homúnculo, que materializaria o desejo do praticante.

Gardner, o fundador da Wicca, teve contato próximo com Crowley, tendo também feito parte da O.T.O. Em seus textos, Gardner explica como as práticas e simbolismos ligados à união entre um princípio divino masculino e um feminino se fazem representar em um ato ritual que é considerado o cerne da Wicca, o casamento sagrado.

O casamento sagrado é representado pela inserção de uma faca ritual chamada athame em um cálice. Esse ato simboliza a relação sexual efetiva entre o Deus e a Deusa, que é o princípio criador de tudo para a Wicca. No calendário wiccaniano, está ligado ao sabat de Beltane (1º de maio), que acontece no auge da primavera, o momento em que a natureza se torna fértil e se considera que o Deus, que nasce no sabat de yule (22 de dezembro), cresceu e atingiu a maturidade, simbolizada pela capacidade de ter relações sexuais com a Deusa. Apesar de todas as referências simbólicas ao sexo e à sexualidade na Wicca, é preciso notar que estas raramente redundam em um ato sexual efetivo, por parte de seus praticantes. O simbolismo do casamento sagrado ou grande rito foi criado por Gardner em substituição à magia sexual propriamente dita, praticada por Crowley.

Quando a bruxaria moderna teve origem nas obras de Gerald Gardner, este explicitou como cerne da bruxaria a celebração dos sabats e esbats10 10 Os sabats são rituais ligados ao trajeto descrito pela Terra em torno do Sol ao longo do ano e refletem-se nas estações do ano. Estas mudanças representam os ciclos de nascimento e morte do Deus, que também está associado ao Sol. Os esbats estão relacionados ao deslocamento da Lua em torno da Terra e as fases lunares, que representam para a Wicca as faces da Deusa. e a nudez ritual como um princípio da religião. Historiadores e biógrafos de Gardner apontam sua ligação a clubes naturistas como um dos elementos que o inspirou a propor a nudez ritual como parte da liturgia da nova religião. Porém, como vimos anteriormente, a nudez ritual era elemento presente nos ritos das sociedades secretas e de mistérios dos quais Gardner e outos fundadores da Wicca participaram. Gardner indica que, para as bruxas, a nudez seria importante por possibilitar o fluxo energético necessário à consecução dos atos mágicos: “As bruxas são ensinadas e acreditam que o poder reside dentro de seus corpos e que elas podem liberá-lo de várias maneiras, a mais simples seria dançar em círculo, cantar ou gritar, para induzir a um frenesi; elas acreditam que esse poder exala de seus corpos e as roupas impedem a sua libertação” (Gardner 2004:10, tradução nossa)11 11 “Witches are taught and believe that the power resides within their bodies, which they can release in various ways, the simplest being dancing round in a circle, singing or shouting, to induce a frenzy; this power they believe exude from their bodies, clothes impeding its release.” (Gardner 2004:10). .

A questão da nudez também simbolizava para esses fundadores o desprendimento de todos os invólucros e amarras sociais e dos símbolos de status a eles associados. Para compreendê-la é preciso ainda lembrar de todas as associações negativas atribuídas ao corpo nu, vinculado pelo cristianismo à vergonha e à culpa, das quais esses místicos buscavam libertar-se.

Para além das práticas e preferências pessoais do fundador da Wicca, a associação entre bruxaria, nudez e sexualidade já existia na Europa desde a Idade Média. No imaginário produzido pelos inquisidores, as bruxas eram vistas como se reunindo à noite, em lugares ermos para realizarem seus sabats, que envolviam nudez e orgias sexuais (Cardini 1999CARDINI, Franco. (1999), Magia, brujería e superstición en el occidente medieval. Barcelona: Ed. Península, 2ª ed.). De um símbolo de perversão e sexualidade desviante, como era tido em finais da Idade Média e início do renascimento, o corpo nu e a sexualidade foram ressignificados pela nova religião para tornar-se fonte de poder e autoconhecimento. Como vimos, a influência de doutrinas orientais como o Tantra e das ordens iniciáticas foi importante para essa mudança de comportamento diante do sexo, que daria origem a novos e mais radicais desdobramentos na segunda metade do século XX.

Quando a Wicca chegou aos Estados Unidos, encontrou-se com estes movimentos de contracultura e com a efervescência política dos anos 1960. Nesse período, surgiram também novos escritos sobre a Deusa, influenciados pela obra da arqueóloga Marija Guimbutas, nos quais conceitos como matriarcado e poder feminino adquirem uma nova roupagem (Christ 1979CHRIST, Carol P. (1979), “Why women need the goddess: Phenomenological, psychological, and political reflections”. In: C. P. Christ and J. Plaskow (eds.). Womanspirit rising: A feminist reader in religion. New York: Harper Collins Publishers.). Entre autoras e lideranças destacadas desse período podemos citar Z. Budapest, criadora da Wicca Diânica, e Starhawk, líder do movimento Reclaiming. A Wicca Diânica enfatiza fortemente o culto à Deusa e ao poder feminino, sendo praticada, geralmente, em covens só de mulheres, alguns de inclinação lésbica (Barrett 2003BARRETT, Ruth Rhiannon. (2003) “Lesbian Rituals and Dianic Tradition”, Journal of Lesbian Studies, vol. 7, n° 2: 15-28.). Já a Wicca Reclaiming admite também homens e possui forte relação com a militância política feminista, pacifista, ecológica e LGBT (Salomonsen 2002SALOMONSEN, June. (2002), Enchanted Feminism: the reclaiming witches of San Francisco. London and New York: Routledge.).

Essas novas vertentes de Wicca incorporam à sua maneira diversas das heranças da contracultura e do feminismo de segunda onda. A busca pela liberdade sexual, especialmente por meio do empoderamento da mulher e de sexualidades consideradas desviantes, como a homossexualidade e a bissexualidade, é uma importante bandeira de luta desses grupos. O reconhecimento da sexualidade como princípio criativo, proposto pelas correntes místico-esotéricas da magia sexual vitoriana, é retomado e reelaborado e torna-se a principal via de acesso ao autoconhecimento, um termo-chave para as espiritualidades ligadas aos movimentos de Nova Era.

Sexo e Ritual nas práticas da Wicca Brasileira

Algumas das vertentes de Wicca mais populares no Brasil, em sua face pública12 12 Existe no Brasil também a presença de grupos Gardnerianos, o que se pode notar por algumas páginas de internet. A atuação desses grupos foi igualmente referida por Duarte (2013). No entanto, suas práticas priorizam o segredo, e os grupos não procuram difundi-las para um público mais amplo, também raramente se engajando em militâncias políticas. , são de matriz Diânica, com influência do movimento californiano Reclaiming. Entre elas podemos citar a Tradição Diânica do Brasil (TDB), liderada por Mavesper Cy Ceridwen, que também é presidente da Abrawicca; e a Tradição Diânica Nemorensis, liderada por Claudiney Prieto, um dos criadores da associação. Esta é uma Wicca cujo engajamento político com movimentos de mudança social é bastante preconizado. Nas obras de Starhawk, idealizadora do movimento Reclaiming, a transformação social e a transformação do indivíduo estão totalmente imbricadas. Nas palavras de uma sacerdotisa da Tradição Diânica do Brasil:

Ser sacerdote ou sacerdotisa [da Wicca] tem que ter a ver com ser vivo, e uma de nossas funções é transgredir nós mesmos ou apoiar quem quer transgredir. Trangredir não é simplesmente pegar uma lei e ir contra ela. [...] eu sou essencialmente a favor de uma coisa que se chama estado democrático de direito, isso tem um valor básico pra mim. Todo mundo tem que respeitar a lei posta. Mas existem leis contra as quais eu posso lutar contra, com os meios aceitos pra isso13 13 Palestra sobre moral pagã, proferida no 14º Encontro Anual de Bruxos, realizado entre 29 e 31 de março de 2015 em Atibaia, São Paulo. .

Essas palavram foram ditas em uma palestra realizada no Encontro Anual de Bruxos, momento de socialização dos wiccanianos experientes entre si e com novos adeptos da religião, que viajam do Brasil inteiro a fim de participar do evento. O público desses encontros é composto primordialmente de jovens até os 30 anos, que são os maiores interessados em adentrar na religião. Os eventos duram um fim de semana de práticas intensivas que incluem meditações, palestras e workshops.

A Abrawicca organiza anualmente dois desses encontros, o Encontro Anual de Bruxos, realizado em um chácara particular em Atibaia, São Paulo, no último fim de semana de março, e o Bruxos do Brasil em Brasília, realizado no terceiro fim de semana do mês de julho, no Templo da Deusa, chácara particular de Mavesper, onde ela vive em comunidade com aproximadamente uma dezena de membros da TDB.

Tanto nas oficinas e discussões propostas nos eventos e encontros da Abrawicca, voltadas para o público iniciado e para os praticantes solitários, quanto nas atividades realizadas por aqueles que optam por se filiar a uma tradição como a TDB, existe grande ênfase no autoconhecimento. Nas práticas da Wicca, esse processo está intrinsecamente ligado à sexualidade e aos papéis de gênero. O adepto da religião precisa realizar uma reflexão profunda a respeito dos tradicionais padrões de gênero a fim de libertar-se de papéis estabelecidos pela sociedade que reproduzem formas de opressão patriarcal.

Dentro desta cosmovisão, magia e sexualidade são percebidas como práticas e saberes acionados no cotidiano. A sexualidade integra discussões, vivências e práticas pagãs em todas as esferas, desde os eventos mais públicos até a vida privada e pessoal de cada adepto. O wiccaniano é confrontado cotidianamente com formas mais libertárias de vivenciar sua vida íntima, amorosa e sexual.

Por outro lado, o papel da sexualidade na prática religiosa do wiccaniano contemporâneo, especialmente no Brasil, na sua face pública, é bem distante da ideia de rituais praticados em nudez ou envolvendo relações sexuais efetivas entre adeptos. A nudez ritual, como proposta por Gardner, foi flexibilizada e não é considerada obrigatória pela maioria dos grupos brasileiros contemporâneos, o que não significa que ela não possa ser praticada em momentos específicos. Esses momentos variam de grupo para grupo e geralmente são mais frequentes nos covens(grupos fechados iniciáticos) que já trabalham juntos há bastante tempo, em “perfeito amor e perfeita confiança” (PAPC)14 14 Essa expressão diz respeito aos vínculos de solidariedade e confiança praticamente total que devem existir entre os membros de um coven wiccaniano. .

Entre os rituais públicos celebrados no Brasil por algumas tradições é possível encontrar práticas que são realizadas em nudez ritual, sempre com livre consentimento dos participantes. Uma das mais conhecidas é a sauna xamânica ou tenda do suor. Como o próprio nome já diz, esse ritual tem influência do xamanismo indígena norte-americano. Consiste em um grupo de pessoas reunidos em uma pequena tenda, que é aquecida por meio de pedras quentes, produzindo um efeito de sauna. No interior da tenda, são queimados incensos e ervas aromáticas, e no decorrer de aproximadamente duas horas os participantes experimentam uma purificação através do suor. Durante a sauna, algumas pessoas podem entrar em transe ou em estados alterados de consciência. Na Tradição Diânica do Brasil, o Templo da Deusa realiza periodicamente rituais de tenda do suor abertos ao público interessado. Esses rituais são realizados em nudez, mas também existem grupos que praticam a tenda do suor vestidos e não possuem ligação com a Wicca (Braga 2010BRAGA, Karina Rachel Guerra. (2010), Modelando Xamãs: o caso da tenda do suor. Natal: Dissertação de Mestrado em Antropologia Social, Universidade Federal do Rio Grande do Norte.).

De maneira geral, os rituais públicos, especialmente os promovidos pela Abrawicca, não possuem a nudez ritual como pré-requisito. São eventos sociais que congregam pessoas com níveis de conhecimento da religião bastante variado, que se conhecem pouco entre si, e onde não há o nível de PAPC necessário para a nudez.

Por outro lado, nudez ritual não significa sexo ritual. Apesar de a nudez ser considerada um elemento desejado e que pode ocorrer ou não nos rituais de Wicca, o ato sexual em si é um elemento bastante controverso. A maioria dos bruxos pronuncia-se publicamente contrária ao sexo ritual, em especial se praticado de maneira leviana ou com abuso de poder por parte do sacerdote. Existem muitas histórias e críticas, algumas em tom severo, outras contadas de maneira mais anedótica, contra sacerdotes que se utilizam de sua posição para forçar ou convencer noviços a fazer sexo com eles, ou com demais membros de seu grupo. No entanto, essas críticas não significam que o sexo ritual não possa acontecer, principalmente entre praticantes da religião que já possuem um envolvimento afetivo prévio.

A conexão entre sexualidade e espiritualidade na Wicca é compreendida como algo muito amplo, que envolve o prazer, primeiramente com o próprio corpo, depois com o corpo do outro. Como exemplo dessa concepção, cito uma vivência conduzida no Encontro Anual de Bruxos de 2015, realizado em honra à Deusa Turan, uma deusa etrusca ligada à sexualidade e à prostituição sagrada.

O nome da vivência era “Turan e a prostituição sagrada”. A preocupação em evitar julgamentos e má compreensão da sociedade está presente no anúncio da atividade no site15 15 Ver: https://www.eventbrite.com.br/e/15o-encontro-anual-de-bruxos-tickets-21216426904. Acesso em: 28/02/3015. do evento. A chamada para a atividade fornece algumas informações sobre a deusa Turan e sobre como será conduzida e qual será o objetivo da vivência. No final do texto, o palestrante escreveu, com letras destacadas, a observação: “Não haverá nudez, nem intercurso sexual entre os participantes”. Essa frase denota que os organizadores do evento não desejam que a religião seja associada pelo público leigo a práticas de orgias. Como o site do evento ficou disponível publicamente na internet, uma leitura apressada da chamada poderia levar a essa compreensão.

A vivência, que durou cerca de uma hora e meia, contou com duas partes. Na primeira, o palestrante discorreu, de maneira teórica e explicativa, sobre o tema, a partir de uma fala livre e da leitura de um texto sobre prostituição sagrada. O palestrante explicou que não há consenso entre os historiadores se realmente houve a prostituição sagrada nos templos da deusa Turan, que existiram entre os séculos VII e VI a.C., na região onde atualmente se encontra a Itália.

Após essas explicações mais técnicas, foi conduzida uma visualização16 16 Exercício de meditação no qual o participante é instruído a construir mentalmente uma cena, a partir de instruções orais fornecidas pelo condutor da meditação. , em que cada um dos participantes deveria visualizar o templo da Deusa Turan e uma de suas prostitutas sagradas, que acolhe e faz amor com um viajante cansado e faminto. Depois, quando todos já se encontravam bastante receptivos à atividade, o palestrante conduziu um exercício de despertar da kundalini17 17 O termo kundalini significa energia sexual em sânscrito e é a base das práticas do tantra, que consistem em ativar essa energia para fins espirituais. . Esse exercício consiste em, de olhos fechados, concentrar energia no chacra18 18 A noção de chacra também faz parte da filosofia e da medicina oriental que considera a existência de sete desses chacras, espécie de centros energéticos do corpo que comandam ainda funções vitais. base (que está situado nos órgãos genitais) através do estímulo do músculo localizado entre o genital e o ânus. Durante a realização do movimento recomendado, cada participante deveria visualizar a “energia” desse chacra percorrendo sua coluna vertebral, passando pelos diversos chacras, até chegar ao topo da cabeça.

Na etapa seguinte da oficina, os participantes foram instruídos a formar pares. Um dos integrantes do par era vendado, e o outro deveria estimular os sentidos deste, utilizando uma série de objetos dispostos previamente no ambiente, como penas, mel, chocolate e óleos aromáticos. Aquele que era estimulado deveria entregar-se às sensações produzidas pelo parceiro, que nesse exercício encarnava o arquétipo da prostituta sagrada. Em seguida, os papéis foram trocados, e quem anteriormente recebeu deveria produzir os estímulos. Após esse segundo ciclo de estímulos, o palestrante agradeceu e encerrou a oficina. Durante toda a atividade os participantes permaneceram vestidos.

A sexualidade é o ponto-chave do exercício; porém, não se trata de uma sexualidade genital, com foco na penetração e no orgasmo, entendido como momento da ejaculação masculina. A sexualidade é considerada enquanto prazer em sentido amplo, sem foco em um ponto específico do corpo, particularmente nos genitais.

Práticas como as descritas acima promovem uma ritualização do sexo. Entendo por esse termo a prática de retirar a sexualidade de uma esfera genital e privada, levando-a para o interior da vida religiosa. Dentro do processo de ritualização do sexo, o ato sexual e a sexualidade passam a integrar uma cosmovisão religiosa mais ampla, construída a partir de parâmetros e técnicas específicas. Isto significa que a sexualidade irá perpassar vivências, técnicas e práticas mágicas, será tema de debates e workshops e irá integrar uma reflexão contínua por parte dos adeptos dessa cosmovisão. Neste processo, o sexo deixa de ser uma ação profana e desprovida de sentido e passa a ser alvo de uma atitude ritualizada.

Os adeptos da Wicca desenvolvem uma ritualística que irá compor um conjunto de técnicas para lidar com o sexo. Na religião, é possível realizar meditações e empregar técnicas respiratórias que podem levar o adepto a vivenciar relações sexuais com seres extramundanos, ou com seres humanos em companhia destes19 19 Essas técnicas e as experiências delas advindas também foram objeto de uma palestra no 14º Encontro Anual de Bruxos. Essa palestra teve cunho apenas teórico. . Pode-se e deve-se empregar técnicas para expandir as formas de obter prazer sexual ou dar prazer a terceiros. E a questão do sexo e da vivência da sexualidade é tema de inesgotáveis discussões e debates.

Uma atividade que faz parte do aprendizado necessário para se tornar um sacerdote ou sacerdotiza da Wicca é integrar um Círculo de Homens ou Círculo de Mulheres (Cordovil 2015b______. (2015b), “O poder feminino nas práticas da Wicca: uma análise dos 'Círculos de Mulheres'”. Estudos Feministas (UFSC. Impresso), vol. 23, n° 2: 431-449.). Nesses grupos, os participantes são estimulados a refletir continuamente sobre seu corpo, sua sexualidade e a forma como desempenham papéis de gênero.

Noções como pecado e culpa são totalmente contrárias às práticas da Wicca e são duramente combatidas por meio de vivências e exercícios práticos. Os wicanianos consideram que toda forma de restrição ou moralismo no que tange à sexualidade é um empecilho à plena realização humana. O que não significa que não devam existir regras e uma ética relacionadas ao cuidado com o corpo e ao exercício da sexualidade. Essa ética, apresentada na palestra sobre “moral pagã” citada acima, envolve o respeito a princípios básicos como a liberdade do outro, a sacralização do corpo e da sexualidade.

Sexualidade e Conjugalidades

A atitude liberal e reflexiva com relação ao sexo reflete-se também na forma como os wiccanianos percebem os arranjos conjugais. Acreditam que a sexualidade é um valor sagrado, e estar bem com sua própria sexualidade é um pré-requisito indispensável para o exercício de um bom sacerdócio20 20 Consideram que não existem sacerdotes e fiéis na Wicca. A única maneira de vivenciar a religião é tornar-se um sacerdote, por meio de um processo iniciático coletivo ou solitário. . Porém, para eles uma sexualidade saudável não implica necessariamente a existência de múltiplos parceiros, ou a predisposição constante para o sexo. Consideram a sexualidade saudável aquela que é realizada com o objetivo do prazer e em total liberdade. Essa liberdade pode ser a liberdade também de não fazer sexo.

Dentro desta perspectiva, conceitos como promiscuidade, fidelidade, liberdade sexual, homossexualidade e heterossexualidade são relativizados. Os wiccanianos não estão preocupados com rótulos, acreditam que toda forma de prazer é válida, desde que obtida através do livre consentimento dos envolvidos e que estes sejam pessoas adultas, capazes de julgar seus próprios atos. Assim, o próprio conceito de homo e heterossexualidade cai por terra, visto que alguém pode optar por fazer sexo com pessoas do sexo oposto ou igual ao seu, dependendo da ocasião ou dos ditames da sua libido, sem que isso constitua propriamente uma identidade de gênero.

Da mesma forma, a noção de fidelidade conjugal é muito relativizada. Consideram que todo relacionamento envolve acordos entre os envolvidos e a fidelidade consiste em manter-se dentro desses acordos. Um casal pode consentir no poliamor ou em relacionamentos livres, pois consideram que a exploração das formas de obter o prazer sexual é importante para o crescimento existencial dos parceiros envolvidos. Isto não significa que nesse tipo de relacionamento não caiba o conceito de traição e de infidelidade que, neste caso, seria viver relacionamentos sem o conhecimento do parceiro. Na fala de uma jovem wiccaniana, praticante solitária, e que frequenta as atividades da Abrawicca:

Essa questão do casamento, a gente acaba colocando de uma forma mais livre [...] a gente não é contra a monogamia, nada disso, mas a gente é a favor da compreensão dos desejos de cada pessoa [...] ai já entra a questão de entrelaçar amor com sexo e sexo com casamento, e então eles misturam tudo. Mas a Wicca acaba ensinando a gente a separar, sexo é sexo, casamento é casamento e amor é amor. Sexo é uma manifestação do desejo humano, animais tem esse desejo e eles não vinculam isso a amor nem nada21 21 Entrevista concedida por A. A. S. (20 anos), em 21/03/2015, praticante wiccaniana residente em Belém, Pará. .

No Encontro Anual de Bruxos de 2015, houve uma palestra que versou sobre o “poliamor”22 22 O poliamor é a tendência ou movimento de casais ou pessoas que aceitam a possibilidade de envolver-se em relacionamentos afetivos e sexuais com mais de uma pessoa simultaneamente. e despertou forte interesse na plateia. A palestrante iniciou discutindo e questionando as bases ideológicas e econômicas da monogamia: “Quando eu falo em monogamia, os homens vão me xingar, mas é principalmente pelo controle da sexualidade da mulher. Porque... a questão da dúvida. Você sabe quem é o filho da mulher, você não sabe quem é o pai, você só consegue garantir quem é o pai controlando a sexualidade dela. Se a hereditariedade é baseada no homem, então tem que ser fixo”23 23 Palestra sobre poliamor, proferida no Encontro Anual de Bruxos de 2015. .

A palestrante discorreu sobre as bases conceituais e sociais para descontruir a monogamia, depois explicou em que consiste, para ela, o poliamor: “Poli: vários, vários amores... Então há possibilidade de vários amores simultâneos e com alguns princípios ligados ao poliamor. Porque não é só amar duas pessoas, você pode desenvolver relacionamentos do tipo amoroso com várias pessoas ao mesmo tempo e tudo isso sendo consensual”.

Ela colocou com bastante ênfase a necessidade de superar a concepção generalizada de casamento e de sexualidade, imposta pela sociedade e pelo cristianismo, para atingir uma vivência mais plena desse aspecto da vida e da espiritualidade. Apesar de possuir muita afinidade com as concepções wiccanianas a respeito de relacionamentos e sexualidade, o poliamor não é uma prática defendida como norma pelos grupos wiccanianos. Alguns wiccanianos são poliamorosos, e a maioria dos que não são presta especial atenção, respeita e até almeja tal prática.

Os adeptos da Wicca são contrários a toda forma de restrição da liberdade individual, e isso é particularmente importante no que tange à sexualidade. Por outro lado, se um casal opta pela monogamia, isso é considerado igualmente legítimo. Porém, mesmo dentro de um relacionamento monogâmico, os parceiros costumam se manter em constante vigilância com relação às restrições na liberdade individual consideradas autoritárias ou patriarcais.

No Encontro Anual de Bruxos de 2015, cujo tema foi a deusa Turan, uma das sacerdotisas do grupo foi escolhida para realizar uma dança na qual ela encarnaria a própria deusa24 24 O processo de escolha da divindade homenageada nos encontros e dos rituais que serão praticados geralmente ocorre por mediação sobrenatural, com os deuses mostrando-se em meditações, sonhos, etc. . Durante a dança, ela e outras sacerdotisas usavam roupas feitas com tecidos transparentes, deixando os seios à mostra sob o tecido. Essa sacerdotisa contou que, ao saber que seria assim a roupa desejada pela deusa, teve o impulso de conversar sobre isso com seu marido. Ela vive um relacionamento monogâmico, heterossexual, com um parceiro também wiccaniano, que estava presente no evento. Depois de refletir sobre a questão, percebeu que dentro de uma visão de mundo wiccaniana não cabia pedir permissão ao marido para usar a roupa transparente. Ela simplesmente confeccionou a roupa, e o marido tomou conhecimento do fato já na hora em que se vestiu para a dança.

Essa história foi narrada durante a palestra sobre moral wiccaniana realizada no evento e serviu para ilustrar como é possível viver de forma wiccaniana ainda que em um relacionamento heterossexual monogâmico, e que um relacionamento desse tipo vivido de acordo com valores wiccanianos possui diferenças com relação aos mesmos relacionamentos vividos por pessoas não wiccanianas.

Discursos e práticas liberais a respeito de sexo são encontrados em outros novos movimentos religiosos cuja base teológica é muito diferente da Wicca. Carrara (2000CARRARA, Sérgio. (2000), “Utopias Sexuais Modernas: uma experiência religiosa americana”. Etnográfica, vol. IV, n° 2: 355-368.) observou que na comunidade protestante de Oneida, fundada nos Estados Unidos na segunda metade do século XIX, práticas de casamento grupal eram adotadas por serem consideradas uma maneira de atingir a perfeição e o autocontrole buscados pela comunidade:

Os pilares da organização social em Oneida eram, de um lado, a socialização da maternidade - com a dissolução dos laços mãe-filhos - e, de outro, a socialização da conjugalidade - através da implementação do chamado “sistema de casamento complexo” ou group marriage. Qualquer vínculo social particularista (entre pais e filhos ou entre esposos, por exemplo) devia ser cuidadosamente extirpado da vida da comunidade, pois ameaçava o vínculo que cada fiel deveria manter com Deus (Carrara 2000CARRARA, Sérgio. (2000), “Utopias Sexuais Modernas: uma experiência religiosa americana”. Etnográfica, vol. IV, n° 2: 355-368.:364).

Machado (2009MACHADO, Carly. (2009), “Os Anjos de Raël: uma análise das contradições éticas e estéticas da concepção de ‘feminilidade’ no Movimento Raeliano”. Habitus, vol. 7, n° 1-2: 193-227.) observa que a liberdade sexual também é um valor importante entre adeptos do movimento raeliano. Segundo a autora, o movimento prega a liberdade irrestrita no uso do corpo e da sexualidade, o que pode implicar, para as mulheres, escolher oferecer-se sexualmente ao profeta Raël:

Na descrição de Raël, homens e mulheres Elohim são livres em suas relações amorosas. Não existe casamento nem ciúme e se uma pessoa não sente vontade de se relacionar sentimentalmente com outra, basta ter robôs biológicos para sua satisfação sexual. Esta concepção de relacionamentos abertos, sem ciúmes e baseados na liberdade é a proposta do movimento para todos os seus adeptos. Liberdade é um conceito chave no movimento raeliano, e no que diz respeito às mulheres, um conceito controverso e contraditório que inclui legítimas liberações, mas também fortes formas de submissão (Machado 2009MACHADO, Carly. (2009), “Os Anjos de Raël: uma análise das contradições éticas e estéticas da concepção de ‘feminilidade’ no Movimento Raeliano”. Habitus, vol. 7, n° 1-2: 193-227.:201).

O aparente conflito entre a liberdade feminina apregoada pelo movimento raeliano e a submissão irrestrita ao profeta pode ser igualmente sentido na Wicca, cujas práticas e a complexa produção discursiva sobre sexo se tornam uma imposição a antigos e novos adeptos. Mesmo se submetendo a tais práticas por vontade própria e acreditando que elas fazem parte de um conjunto de aprendizados necessários ao “autoconhecimento”, os adeptos da Wicca admitem que esta busca por livrar-se de valores repressores contidos na sociedade e no cristianismo não acontece sem dificuldades.

Tanto a Wicca quanto outros movimentos religiosos cuja busca pela liberdade sexual é parte importante de seus discursos e práticas se inserem em complexo campo discursivo sobre sexo surgido a partir da Idade Moderna. Para Foucault, esses discursos compõem uma rede de saberes e poderes que facilitou o maior controle dos corpos:

Desde o século XVIII o sexo não cessou de provocar uma espécie de erotismo discursivo generalizado. E tais discursos sobre sexo não se multiplicaram fora do poder ou contra ele, porém lá onde ele se exercia e como meio para o seu exercício; criaram-se em todo o canto, incitações a falar; em toda parte, dispositivos para ouvir e registrar, procedimentos para observar, interrogar e formular (Foucault 2011FOUCAULT, Michel. (2011), História da sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo: Graal.:39).

Pode-se sempre interrogar em que medida a proliferação de discursos sobre sexo no interior de novos movimentos religiosos que pregam a promoção de uma ruptura com relação a padrões de moral vigente também não reproduz alguns dos mecanismos de controle e censura empregados pelas religiões dominantes, que esses grupos pretendem combater. Porém, uma reflexão mais aprofundada sobre esse tema foge dos limites propostos por este artigo. O que é possível assegurar, no caso da Wicca, é que a sexualidade é uma questão central em seus diálogos e debates, tornado-se parte constitutiva de um projeto de construção do eu que lhes é muito caro.

Considerações finais

A partir da análise dos discursos e práticas wiccanianos em torno do sexo, é possível perceber que sexo para eles é um rito dotado de profundos significados discursivos e sociais. Os discursos e práticas que o wiccaniano produz sobre o sexo têm como propósito libertá-lo das amarras produzidas pelos discursos sociais vigentes sobre o mesmo tema, aos quais eles buscam contrapor-se.

Como mecanismo em processo, constituído por sujeitos sociais históricos que carregam inibições e preconceitos advindos de sua socialização, este impulso libertário converte-se em um devir, uma busca constante pela liberdade e pela leveza de um mundo onde a sexualidade poderia ser livremente vivenciada, para além dos mecanismos de culpa e punição construídos pela sociedade ocidental de matriz cristã.

Por se saberem em uma contracorrente, ou contracultura, como eles mesmos dizem, reconhecem as limitações impostas à sua proposta. Diante desses conflitos, os embates pessoais na luta por superar a mentalidade dominante, da qual sabem que também são fruto, passam a ser o tema principal de suas práticas religiosas. Sexualidade, religião e ritual entram em um ciclo constante de negação e construção que se torna constitutivo da própria vivência religiosa wiccaniana.

Um praticante de Wicca que tenha obtido sucesso em todas as vivências e processos de autoconhecimento por eles preconizados poderia, em tese, atingir um grau de liberdade bastante amplo com relação aos problemas que afligem o ser humano comum na sociedade capitalista, cristã e patriarcal. Como sabem que essa liberdade não é simples de ser atingida, ela funciona muito mais como objetivo, desejo e meta, e quase todas as práticas da religião no que diz respeito à sexualidade são pensadas com vista a atingi-lo.

Como argumenta Hugh Urban (2004URBAN, Hugh B. (2004), “‘Magia Sexualis’: Sex, Secrecy, and Liberation in Modern Western Esotericism”. Journal of the American Academy of Religion, vol. 72, n° 3: 695-731.), discursos e práticas como o Tantra e a magia sexual têm como objetivo a liberação do sexo de suas amarras e tabus, um tema que constitui uma obsessão para a sociedade ocidental moderna. Para Foucault (2011FOUCAULT, Michel. (2011), História da sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo: Graal.), a necessidade de repressão e controle sobre os corpos está no cerne da proliferação de discursos sobre esse tema. O surgimento da psicanálise, da magia sexual e a própria Wicca são parte deste movimento de curiosidade ambivalente que a sociedade ocidental despendeu para o tema.

No século XX, a contracultura retomou e problematizou novamente a questão da sexualidade, desta vez a considerando imbricada com questões sociais como a libertação da mulher e os direitos civis para homossexuais. A libertação da sexualidade aliada ao misticismo e ao discurso do autoconhecimento serviu como base de muitas correntes esotéricas e é também o alicerce sobre o qual se constitui a moderna Wicca.

No Brasil, essa religião atrai um número crescente de jovens de centros urbanos que estão em busca de uma compreensão mais ampla sobre a sexualidade e de uma vivência espiritual menos repressora do que as oferecidas pelas diversas religiões cristãs. Os resultados dessa busca fazem-se sentir na vida íntima e nas relações sociais estabelecidas por esses grupos, cada vez mais visíveis na sociedade contemporânea.

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Site

15° ENCONTRO ANUAL DE BRUXOS. Disponível em: https://www.eventbrite.com.br/e/15o-encontro-anual-de-bruxos-tickets-21216426904. Acesso em: 28/02/3015.

Entrevista

Entrevista com A. A. S., Belém, Pará, 21 de março de 2015.

Notas

  • 1
    O neopaganismo é o movimento de resgate das espiritualidades pagãs, que existiam na Europa antes da penetração e hegemonia do cristianismo. Dentre elas, podemos citar, além da Wicca, o Druidismo, Azatrú, reconstrucionismo Celta e Helênico.
  • 2
    Os praticantes solitários de Wicca tornaram-se populares nos Estados Unidos a partir da publicação da obra de Scott Cunningham (2014CUNINGHAM, Scott. (2014), Wicca: Guia do Praticante Solitário. São Paulo: Madras.), autor best-seller que descreve os ritos básicos da religião de forma que eles possam ser compreendidos e realizados por indivíduos em suas próprias casas, sem que precisem ser aceitos por grupos secretos e iniciáticos.
  • 3
    Segundo Chas Clifton (2006CLIFTON, Chas. (2006), Her Hidden Children. The rise of Wicca and Paganism in America. Lanham: Altamira Press.), os praticantes solitários seriam 80% dos wiccanianos norte-americanos.
  • 4
    O filme Pagão fora da lei produzido pela Abrawicca demonstra bem essa concepção.
  • 5
    Esse critério também foi usando por Cinthia Eller (1995ELLER, Cynthia. (1995), Living in the lap of the goddess: The feminist spirituality movement in America. Boston: Beacon Press.) para definir as espiritualistas feministas e mostra-se muito útil nos estudos de paganismo contemporâneo.
  • 6
    Os eventos foram o 13º e o 14º Encontro Anual de Bruxos, realizados em Atibaia, São Paulo, em março de 2014 e março de 2015, e o 16º Bruxos do Brasil em Brasília, ocorrido em julho de 2014.
  • 7
    Os principais instrumentos são o athame (punhal), a taça e o caldeirão.
  • 8
    “The rise of sexual magic in the late nineteenth century […] is not only a fascinating and neglected piece of the history of modern religious movements; more important, it gives us some remarkable insights into modern western culture and its attitudes toward sexuality during this critical period” (Urban 2004URBAN, Hugh B. (2004), “‘Magia Sexualis’: Sex, Secrecy, and Liberation in Modern Western Esotericism”. Journal of the American Academy of Religion, vol. 72, n° 3: 695-731.:697).
  • 9
    O tantra é uma filosofia oriental que tem origem na cultura védica cujas práticas de espiritualização e despertar da consciência incluem a mobilização da sexualidade.
  • 10
    Os sabats são rituais ligados ao trajeto descrito pela Terra em torno do Sol ao longo do ano e refletem-se nas estações do ano. Estas mudanças representam os ciclos de nascimento e morte do Deus, que também está associado ao Sol. Os esbats estão relacionados ao deslocamento da Lua em torno da Terra e as fases lunares, que representam para a Wicca as faces da Deusa.
  • 11
    “Witches are taught and believe that the power resides within their bodies, which they can release in various ways, the simplest being dancing round in a circle, singing or shouting, to induce a frenzy; this power they believe exude from their bodies, clothes impeding its release.” (Gardner 2004GARDNER, Gerald. (2004), Witchcraft Today. New York: Citadel Press. :10).
  • 12
    Existe no Brasil também a presença de grupos Gardnerianos, o que se pode notar por algumas páginas de internet. A atuação desses grupos foi igualmente referida por Duarte (2013DUARTE, Janluis. (2013), Reinventando Tradições: representações e identidades da bruxaria neopagã no Brasil. Brasília: Tese de Doutorado em História, Universidade de Brasília.). No entanto, suas práticas priorizam o segredo, e os grupos não procuram difundi-las para um público mais amplo, também raramente se engajando em militâncias políticas.
  • 13
    Palestra sobre moral pagã, proferida no 14º Encontro Anual de Bruxos, realizado entre 29 e 31 de março de 2015 em Atibaia, São Paulo.
  • 14
    Essa expressão diz respeito aos vínculos de solidariedade e confiança praticamente total que devem existir entre os membros de um coven wiccaniano.
  • 15
  • 16
    Exercício de meditação no qual o participante é instruído a construir mentalmente uma cena, a partir de instruções orais fornecidas pelo condutor da meditação.
  • 17
    O termo kundalini significa energia sexual em sânscrito e é a base das práticas do tantra, que consistem em ativar essa energia para fins espirituais.
  • 18
    A noção de chacra também faz parte da filosofia e da medicina oriental que considera a existência de sete desses chacras, espécie de centros energéticos do corpo que comandam ainda funções vitais.
  • 19
    Essas técnicas e as experiências delas advindas também foram objeto de uma palestra no 14º Encontro Anual de Bruxos. Essa palestra teve cunho apenas teórico.
  • 20
    Consideram que não existem sacerdotes e fiéis na Wicca. A única maneira de vivenciar a religião é tornar-se um sacerdote, por meio de um processo iniciático coletivo ou solitário.
  • 21
    Entrevista concedida por A. A. S. (20 anos), em 21/03/2015, praticante wiccaniana residente em Belém, Pará.
  • 22
    O poliamor é a tendência ou movimento de casais ou pessoas que aceitam a possibilidade de envolver-se em relacionamentos afetivos e sexuais com mais de uma pessoa simultaneamente.
  • 23
    Palestra sobre poliamor, proferida no Encontro Anual de Bruxos de 2015.
  • 24
    O processo de escolha da divindade homenageada nos encontros e dos rituais que serão praticados geralmente ocorre por mediação sobrenatural, com os deuses mostrando-se em meditações, sonhos, etc.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2017

Histórico

  • Recebido
    Mar 2016
  • Aceito
    Jan 2017
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