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EXCESSO DE PESO EM ADOLESCENTES: INSEGURANÇA ALIMENTAR E MULTIFATORIALIDADE NO CENÁRIO DO SEMIÁRIDO DE PERNAMBUCO

RESUMO

Objetivo:

Investigar o excesso de peso em adolescentes do Sertão e Agreste de Pernambuco, considerando a multifatoriedade dos determinantes do excesso de peso e as condições de insegurança alimentar e nutricional da região.

Métodos:

Estudo transversal, de base populacional, realizado no período de setembro a outubro de 2015. O estado nutricional dos adolescentes foi avaliado pelo índice de massa corpórea (IMC) e classificado pelo indicador IMC/idade, segundo o sexo. Para analisar os fatores associados ao excesso de peso, as variáveis foram agrupadas em: socioeconômicas, demográficas, ambientais, de estilo de vida, psicológicas, biológicas e segurança alimentar e nutricional. A regressão de Poisson foi utilizada para verificar a associação entre o excesso de peso e as variáveis independentes.

Resultados:

A prevalência de excesso de peso encontrada foi de 20,1%, sendo 13,4% de sobrepeso e 6,7% de obesidade. Após o ajuste para as variáveis de confusão, as variáveis regime de ocupação (casa cedida, alugada), consumo de álcool, segurança alimentar, insegurança alimentar leve, percepção corporal (sobrepeso e obesidade) e faixa etária (10 a 14 anos) mostraram-se associadas ao excesso de peso. Destaca-se a elevada insegurança alimentar e nutricional, em 80,4% da população, sendo as formas moderadas e graves as mais frequentes, como também as precárias condições sociais ainda prevalentes na região.

Conclusões:

A prevalência de excesso de peso foi elevada, superando o esperado para uma população com melhores condições de vida. Os determinantes do excesso de peso foram: consumo de álcool, regime de ocupação, autopercepção do peso, faixa etária e segurança alimentar/insegurança alimentar leve.

Palavras-chave:
Adolescente; Sobrepeso; Obesidade; Segurança alimentar; Fatores socioeconômicos; Estudos transversais

ABSTRACT

Objective:

To investigate context of overweight adolescents from the semiarid and rural areas of Pernambuco, considering the multifactorial nature of the determinants of being overweight, and the food and nutritional insecurity conditions of the region.

Methods:

A population based cross-sectional study was conducted from September to October 2015. The nutritional status of adolescents was assessed by body mass index (BMI) and classified by the BMI/Age indicator, according to sex. To analyze the factors associated with being overweight, the variables were grouped into: socioeconomic, demographic, environmental, lifestyle, psychological, biological and food and nutritional security. Poisson regression was used to verify the association between being overweight and independent variables.

Results:

The prevalence of excessive weight found was 20.1%, namely: 13.4% overweight and 6.7% obese. After adjusting for the confounding variables, the variables: occupancy situation (rented house), alcohol consumption, food security and light food insecurity, body perception (overweight and obese) and age range (10 to 14 years), were associated with being overweight. High food and nutritional insecurity was identified in 80.4% of the population. The moderate and severe forms were more frequent, and precarious social conditions were still prevalent in the region.

Conclusions:

The prevalence of being overweight was high, exceeding the expected for a population with better living conditions. The determinants of being overweight were: alcohol consumption, occupancy situation, self-perceived weight, age and food security/mild food insecurity.

Keywords:
Adolescent; Overweight; Obesity; Food supply; Socioeconomic factors, Cross-sectional studies

INTRODUÇÃO

A adolescência representa um período crítico para o desenvolvimento da obesidade, devido às alterações fisiológicas pertinentes a essa fase, tais como as modificações da composição corporal, alterações hormonais, cognitivas e emocionais11. Alberga AS, Sigal RJ, Goldfield G, Prud’homme D, Kenny GP. Overweight and obese teenagers: why is adolescence a critical period? Pediatr Obes. 2012;7:261-73. https://doi.org/10.1111/j.2047-6310.2011.00046.x
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,22. Castilho SD, Cocetti M, Barros Filho AA. Body mass index and body composition in relation to sexual maturation. J Pediatr Endocrinol Metab. 2008;21:127-33.. As consequências da obesidade à saúde do adolescente incluem: dislipidemias, hipertensão e intolerância à glicose, além dos efeitos à saúde mental, tais como depressão e baixa autoestima, e maiores chances de permanência da obesidade na vida adulta.33. Must A, Strauss RS. Risks and consequences of childhood and adolescent obesity. Int J Obes Relat Metab Disord. 1999;23 Suppl 2:S2-11.,44. Inge TH, King WC, Jenkins TM, Courcoulas AP, Mitsnefes M, Flum DR, et al. The effect of obesity in adolescence on adult health status. Pediatrics. 2013;132:1098-104. https://doi.org/10.1542/peds.2013-2185
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Mesmo em regiões com elevada insegurança alimentar e nutricional (INSAN), o excesso de peso (EP) alcança progressivamente valores semelhantes a regiões desenvolvidas devido à mudança da condição de extrema privação qualitativa e quantitativa para um padrão alimentar industrializado e estilo de vida sedentário.55. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC. Análise do Inquérito “Chamada Nutricional 2005” realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Ministério da Saúde. São Paulo: Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2006.

O Semiárido nordestino é a macrorregião mais pobre do Brasil, incluindo os municípios do Sertão e do Agreste do estado. Possui clima semiárido e as chuvas nessa sub-região são irregulares e escassas, ocorrendo constantes períodos de estiagem. As características da região resultam em consequências econômicas e sociais graves, com danos à produção agropecuária e crises alimentares agudas. Nesse aspecto, há poucos estudos avaliando o estado nutricional de adolescentes no Semiárido. O último estudo representativo na região foi a Chamada Nutricional no Semiárido,55. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC. Análise do Inquérito “Chamada Nutricional 2005” realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Ministério da Saúde. São Paulo: Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2006. em 2005, que considerou apenas crianças menores de cinco anos, sendo que nenhum outro estudo avaliou as condições de vida e o estado nutricional dos adolescentes da região. Em busca na literatura do período de 2007 a 2017, apenas sete estudos avaliaram o estado nutricional de adolescentes no Sertão66. Oliveira JS, Lira PI, Veras IC, Maia SR, Lemos MC, Andrade SL, et al. Nutritional status and food insecurity of adolescents and adults in two cities with a low human development index. Rev Nutr. 2009;22:453-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732009000400002
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,77. Ramires EK, Menezes RC, Oliveira JS , Oliveira MA, Temoteo TL, Longo-Silva G, et al. Nutritional status of children and adolescents from a town in the semiarid Northeastern Brazil. Rev Paul Pediatr. 2014;32:200-7. http://dx.doi.org/10.1590/0103-0582201432309
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,88. Dumith SC, Santos MN, Teixeira LO, Cazeiro CC, Mazza SE, Cesar JA. Practice of physical activity among youths in a city in the semiarid region of Brazil. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21:1083-93. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015214.18762015
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,99. Ricarte KM, Costa NF, Lima TS, Silva AR, Oliveira EA, Lima LH. Relationship between nutritional status and metabolic syndrome in teenagers in the Piauí semiarid. Ciênc Cuid Saúde. 2017;16.,1010. Fulco MV, Baad VM, Pitangui AC, Mendes ML, Messias CM. Eating behavior and its reflection on the nutritional status of adolescents from a public school. Adolesc Saude. 2016;13:86-94.,1111. Silva JB, Silva FG, Medeiros HJ, Roncalli AG, Knackfuss MI. The nutritional status of schoolchildren living in the semi-arid area of northern Brazil. Rev Salud Publica (Bogota). 2009;11:62-71.,1212. Monteiro AR, Dumith SC , Gonçalves TS, Cesar JA . Overweight among young people in a city in the Brazilian semiarid region: a population-based study. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21:1157-64. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015214.15282015
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, e apenas um no Agreste,1313. Petribú MM, Tassitano RM, Nascimento WM, Santos EM, Cabral PC. Fatores associados ao sobrepeso e à obesidade em estudantes do ensino médio da rede pública estadual do município de Caruaru (PE). Rev Paul Pediatr. 2011;29:536-45. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-05822011000400011
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apresentando resultados variados. Isso destaca a evidente lacuna existente na vigilância nutricional dessa população, e que na dependência das características regionais, os fatores associados às alterações nutricionais podem ser diferentes.

Considerando o aumento marcante e progressivo do EP, as consequências sociais à saúde dos indivíduos afetados, como também a origem multifatorial que o EP apresenta, torna-se essencial compreender os múltiplos aspectos desse agravo. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi investigar a prevalência do EP em adolescentes do Sertão e do Agreste (Semiárido) de Pernambuco, considerando a multifatoriedade dos determinantes do EP, a saber, os determinantes sociais, demográficos, biológicos, psicológicos e a insegurança alimentar e nutricional da região.

MÉTODO

Estudo transversal, de base populacional, com dados de duas pesquisas que utilizaram a mesma amostra: “Avaliação da segurança alimentar e nutricional em conglomerados urbanos e rurais afetados pela seca no Sertão de Pernambuco” e “Saúde, alimentação, nutrição, serviços e condições socioeconômicas na população materno-infantil do estado de Pernambuco”. Ambas as pesquisas foram realizadas no período de setembro a outubro de 2015. A população elegível para o estudo foi constituída por todos os indivíduos entre 10 e 19 anos, residentes nos domicílios selecionados. Foram excluídos os adolescentes que estivessem gestantes ou com alguma limitação funcional que comprometesse a realização da avaliação antropométrica.

O cálculo amostral considerou a prevalência de EP de 15%,1414. Leal VS, Lira PI , Oliveira JS , Menezes RC , Sequeira LA, Arruda NM, et al. Overweight in children and adolescents in Pernambuco State, Brazil: prevalence and determinants. Cad Saude Publica. 2012;28:1175-82. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000600016
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com um erro máximo de ±5,5% e um nível de confiança de 95%, estimando um número amostral de 162 indivíduos (mais 10% para cobrir eventuais perdas), totalizando o número amostral de 178 indivíduos. Para a estimativa dos fatores associados, considerou-se um nível de confiança de 95%, um poder do estudo de 80% e a razão entre expostos e não expostos de 1 para 1, com base em um risco estimado de 2,7; totalizando 184 indivíduos, sendo 92 expostos e 92 não expostos.

O processo de seleção da amostra (probabilística e estratificada) desenvolveu-se em quatro estágios:

  • Sorteio das macrorregiões de desenvolvimento, nas quais é dividido o território do Agreste e do Sertão pernambucano (Figura 1).

  • Sorteio dos municípios a serem incluídos no estudo.

  • Sorteio dos setores censitários (unidades territoriais demarcadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE).

  • Sorteio dos domicílios dentro de cada setor censitário para selecionar as famílias, numa quota amostral de 35±5 famílias.

Figura 1
Mapa de localização dos municípios do Semiárido de Pernambuco.

Para o sorteio dos municípios e setores censitários foi utilizada a lista de números randômicos do subprograma EPITABLE, do Epi-Info™, versão 6.04.

A coleta dos dados foi realizada por uma equipe de técnicos previamente treinada para aplicação do questionário e aferição das medidas antropométricas, que seguiram os procedimentos técnicos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).1515. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995. O peso foi obtido utilizando balança digital (TANITA Corporation, São Paulo, Brasil) com capacidade para 150 kg e precisão de 100 g. A altura foi aferida utilizando estadiômetro portátil (Alturaexata Ltda., Belo Horizonte, Brasil) com precisão de 1 mm em toda a extensão. Para garantir a precisão das mensurações, as medidas foram tomadas 2 vezes para cada indivíduo, observando-se que a diferença entre as avaliações não deveria exceder 0,5 cm. Para avaliação do estado nutricional dos adolescentes foi usado o índice antropométrico - índice de massa corpórea (IMC)/idade. O IMC foi obtido a partir da divisão da massa corporal em quilogramas pela estatura em metros, elevada ao quadrado (kg/m2). A classificação dos resultados do IMC/idade foi realizada com o software Anthro plus-2007, e considerou as recomendações da OMS:1616. World Health Organization. Growth reference data for 5-19 years. Geneva: WHO ; 2007. magreza: <-2 escore Z (EZ); eutrofia: ≥-2 EZ e ≤+1 EZ; sobrepeso: >+1 EZ e ≤+2 EZ; obesidade: >+2 EZ.

As variáveis socioeconômicas foram coletadas em um questionário próprio da pesquisa e incluíram: classe socioeconômica segundo critérios da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP),1717. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério Brasil 2015 e atualização da distribuição de classes para 2016. São Paulo (SP): ABEP; 2016 [cited 2016 Apr 14]. Available from: Available from: http://www.abep.org/criterio-brasil
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escolaridade do chefe (anos de estudo), escolaridade do adolescente, situação ocupacional do adolescente, renda per capita em salário mínimo, participação no Programa Bolsa Família, número de cômodos, número de pessoas na família.

A avaliação da INSAN foi efetuada mediante a aplicação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA).1818. Brazil - Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome [homepage on the Internet]. Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação. Escala Brasileira de Insegurança Alimentar - EBIA: análise psicométrica de uma dimensão da segurança alimentar e nutricional. Estudo técnico n°. 01. Brasília (DF): Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome; 2014 [cited 2016 Apr 14]. Available from: Available from: http://acervodigital.mds.gov.br/xmlui/handle/123456789/329
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O questionário é composto por 14 questões fechadas para domicílios com menores de 18 anos ou 8 perguntas para domicílios com maiores de 18 anos; e perguntas relativas à percepção dos entrevistados sobre a situação de insuficiência alimentar vivida nos últimos 3 meses anteriores à entrevista. Cada resposta afirmativa do questionário corresponde um ponto e a soma dos pontos corresponde à pontuação da escala. A soma dos escores é classificada em quatro níveis: 0 (zero)=segurança alimentar; 1 a 5 pontos ou 1 a 3 pontos=insegurança leve; 6 a 10 pontos ou 4 a 6=insegurança moderada; e 11 a 14 pontos ou 7 a 8 pontos=insegurança grave, para domicílios com menores de 18 anos e maiores de 18 anos, respectivamente.

A maturação sexual foi determinada com base nos estágios de desenvolvimento propostos por Tanner,1919. Tanner JM. Growth at adolescence. 2nd ed. Oxford: Blackwell Scientific; 1962. que incluem cinco estágios para o desenvolvimento dos genitais (meninos) e mamas (meninas), avaliados quanto à forma e ao tamanho, além da avaliação da pilosidade pubiana em ambos os sexos. Os adolescentes receberam instruções sobre o preenchimento do questionário e foram convidados a realizar uma autoavaliação. Com base na combinação dos componentes do estadiamento, os adolescentes foram classificados em três estágios de maturação: o estágio 1 (E1) correspondente à fase infantil (impúbere); estágio 2 (E2, E3, E4) correspondente à fase púbere; e o estágio 5 (E5), à fase pós-puberal (adulta).1919. Tanner JM. Growth at adolescence. 2nd ed. Oxford: Blackwell Scientific; 1962.

As variáveis comportamentais avaliadas foram: nível de atividade física, tempo de tela e consumo de álcool. Os adolescentes foram considerados ativos quando acumularam 300 minutos ou mais de atividade física semanal; insuficientemente ativo quando acumularam de 1 a 299 minutos de atividade física por semana; e inativos quando referiram não praticar atividade física no período de referência.2020. World Health Organization. Global recommendations on physical activity for health. Geneva: WHO ; 2010. O tempo de tela excessivo foi definido como o tempo diário gasto assistindo televisão, usando videogame ou computador superior a duas horas por dia.2121. Camelo LV, Rodrigues JFC, Giatti L, Barreto SM. Sedentary leisure time and food consumption among Brazilian adolescents: the Brazilian National School-Based Adolescent Health Survey (PeNSE), 2009. Cad Saude Publica. 2012;28:2155-62. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001100015
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Em relação ao consumo do álcool, foi considerado quando o adolescente respondia que já havia experimentado e no momento da entrevista ainda fazia uso dessa substância.

A autopercepção do peso corporal foi avaliada através de um questionário e incluía quatro opções de respostas: magro, normal, um pouco acima do peso e muito acima do peso. Foi considerada como autopercepção inadequada a resposta em desacordo com o diagnóstico do estado nutricional realizado previamente pelo IMC.2222. Alwan H, Viswanathan B, Williams J, Paccaud F, Bovet P. Association between weight perception and socioeconomic status among adults in Seychelles. BMC Public Health. 2010;10:467. https://doi.org/10.1186/1471-2458-10-467
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A satisfação com o peso corporal foi avaliada através da questão: “Você está satisfeito(a) com seu peso corporal?”, e as opções de resposta eram sim e não.

A digitação dos dados foi realizada em dupla entrada e verificada no módulo Validate do programa Epi-Info, versão 6.04 (Centers for Disease Control and Prevention - CDC, Estados Unidos). Para o processamento e a análise dos dados foram utilizados os pacotes estatísticos Epi-Info versão 6.04, Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 13.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, Estados Unidos) e o Stata versão 7.0 (Stata Corp., College Station, Estados Unidos). Para efeito de interpretação, o limite de erro tipo I foi de 5% (p≤0,05).

Para associação do EP com as variáveis de exposição, foi utilizado o teste do qui-quadrado de Pearson e/ou com tendência linear, quando aplicável. Para análise dos determinantes do EP foi realizada a regressão de Poisson, com opção de erro padrão robusto, a fim de avaliar os efeitos ajustados das variáveis componentes do modelo hierárquico. As variáveis independentes que apresentaram valor p<0,20 na análise bivariada entraram na análise multivariada. No modelo hierárquico, as variáveis socioeconômicas e ambientais constituíram o nível mais distal, o nível 1; a segurança alimentar e nutricional, o nível 2; as variáveis comportamentais e psicológicas, o nível 3; e as variáveis biológicas, o nível 4, o nível mais proximal. A análise hierarquizada iniciou-se com as variáveis do nível 1 e subsequentemente foram introduzidas as variáveis dos outros níveis. Os resultados foram expressos por razões de prevalências (RP) ajustadas com respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%), sendo considerados estatisticamente significantes valores p<0,05.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco (CAAE: 38878814.9.0000.5208) e do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (CAAE: 44508215.7.0000.5201), de acordo com a Portaria nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde. Os responsáveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido e os adolescentes assinaram o termo de assentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 179 indivíduos de ambos os sexos, com mediana de idade de 14,7 anos, com intervalo interquartil (IQ) 12,1-17,7. Do total da amostra, a maioria (67%) era do sexo feminino e mais de 90% encontravam-se no estágio de maturação sexual púbere. Quase metade da população residia na zona rural (48,6%), predominando a precária condição socioeconômica (classes D e E; e renda per capita de até 0,25 salários mínimo). A vulnerabilidade socioeconômica também foi elevada (80,4%), prevalecendo as formas moderada e grave (48%). Destaca-se que 39,1% dos adolescentes mostraram escolaridade inadequada à idade, representada pelo analfabetismo ou atrasos nas etapas do nível fundamental e médio (Tabela 1).

Tabela 1
Excesso de peso em adolescentes de 10 a 19 anos segundo variáveis socioeconômicas e demográficas. Sertão e Agreste, Pernambuco, 2015.

A prevalência de EP foi elevada (20,1%), sendo 13,4% de sobrepeso e 6,7% de obesidade (Gráfico 1). O déficit estatural foi observado em 7,8% da amostra (dados não apresentados).

Gráfico 1
Estado nutricional segundo o índice de massa corpórea /idade, em adolescentes de 10 a 19 anos. Sertão e Agreste, Pernambuco, 2015.

Na análise bivariada, as variáveis que apresentaram associação significativa com o EP foram: local de domicílio, fonte de abastecimento de água, tratamento de água, nível de atividade física, percepção corporal, satisfação corporal e faixa etária (Tabelas 1, 2 e 3). Após o ajuste das variáveis de confusão, na análise multivariada, os fatores que se mostraram associados ao EP foram: regime de ocupação (casa cedida ou alugada), consumo de álcool, se autoavaliar como obeso, ter idade entre 10 e 14 anos e segurança nutricional e alimentar (SAN)/INSAN leve (Tabela 4).

Tabela 2
Excesso de peso em adolescentes de 10 a 19 anos segundo variáveis ambientais. Sertão e Agreste, Pernambuco, 2015.
Tabela 3
Excesso de peso em adolescentes de 10 a 19 anos segundo variáveis biológicas, comportamentais e psicológicas. Sertão e Agreste, Pernambuco, 2015.
Tabela 4
Razões de prevalência bruta e ajustada para o excesso de peso em adolescentes de 10 a 19 anos. Agreste e Sertão, Pernambuco, 2015.

DISCUSSÃO

Neste estudo, observa-se elevada prevalência de EP que, embora inferior à média nacional, ultrapassa o valor limítrofe estabelecido pela OMS. Outros estudos, realizados no Semiárido de diversas partes do Brasil, encontraram prevalências de EP que variam de 10,5 a 41,1%.55. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC. Análise do Inquérito “Chamada Nutricional 2005” realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Ministério da Saúde. São Paulo: Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2006.,66. Oliveira JS, Lira PI, Veras IC, Maia SR, Lemos MC, Andrade SL, et al. Nutritional status and food insecurity of adolescents and adults in two cities with a low human development index. Rev Nutr. 2009;22:453-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732009000400002
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,88. Dumith SC, Santos MN, Teixeira LO, Cazeiro CC, Mazza SE, Cesar JA. Practice of physical activity among youths in a city in the semiarid region of Brazil. Ciênc Saúde Coletiva. 2016;21:1083-93. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015214.18762015
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,99. Ricarte KM, Costa NF, Lima TS, Silva AR, Oliveira EA, Lima LH. Relationship between nutritional status and metabolic syndrome in teenagers in the Piauí semiarid. Ciênc Cuid Saúde. 2017;16.,1313. Petribú MM, Tassitano RM, Nascimento WM, Santos EM, Cabral PC. Fatores associados ao sobrepeso e à obesidade em estudantes do ensino médio da rede pública estadual do município de Caruaru (PE). Rev Paul Pediatr. 2011;29:536-45. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-05822011000400011
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Nossos resultados foram semelhantes ao estudo realizado no Semiárido de Pernambuco em 2011 (25%)1313. Petribú MM, Tassitano RM, Nascimento WM, Santos EM, Cabral PC. Fatores associados ao sobrepeso e à obesidade em estudantes do ensino médio da rede pública estadual do município de Caruaru (PE). Rev Paul Pediatr. 2011;29:536-45. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-05822011000400011
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e inferiores aos observados no Semiárido do Rio Grande do Norte, Alagoas e Piauí (28,5 a 41,1%).77. Ramires EK, Menezes RC, Oliveira JS , Oliveira MA, Temoteo TL, Longo-Silva G, et al. Nutritional status of children and adolescents from a town in the semiarid Northeastern Brazil. Rev Paul Pediatr. 2014;32:200-7. http://dx.doi.org/10.1590/0103-0582201432309
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,99. Ricarte KM, Costa NF, Lima TS, Silva AR, Oliveira EA, Lima LH. Relationship between nutritional status and metabolic syndrome in teenagers in the Piauí semiarid. Ciênc Cuid Saúde. 2017;16.,1111. Silva JB, Silva FG, Medeiros HJ, Roncalli AG, Knackfuss MI. The nutritional status of schoolchildren living in the semi-arid area of northern Brazil. Rev Salud Publica (Bogota). 2009;11:62-71. Esse achado merece atenção, visto que demonstra que, mesmo em populações com condições sociais adversas, o EP configura-se um problema de saúde pública que cresce progressivamente.

Existe uma tendência do EP se concentrar nas classes sociais menos privilegiadas. As famílias de adolescentes com menor nível socioeconômico apresentam uma maior ingestão de alimentos industrializados, moram em bairros com pouca estrutura física para atividade física e se preocupam menos com a aparência física do que jovens de famílias de melhor classe social.2323. Frederick CB, Snellman K, Putnam RD. Increasing socioeconomic disparities in adolescent obesity. Proc Natl Acad Sci USA. 2014;111:1338-42. https://doi.org/10.1073/pnas.1321355110
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No entanto, a associação da condição social com o EP depende de vários fatores, tais como o sexo, a idade e o país de residência1313. Petribú MM, Tassitano RM, Nascimento WM, Santos EM, Cabral PC. Fatores associados ao sobrepeso e à obesidade em estudantes do ensino médio da rede pública estadual do município de Caruaru (PE). Rev Paul Pediatr. 2011;29:536-45. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-05822011000400011
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,1414. Leal VS, Lira PI , Oliveira JS , Menezes RC , Sequeira LA, Arruda NM, et al. Overweight in children and adolescents in Pernambuco State, Brazil: prevalence and determinants. Cad Saude Publica. 2012;28:1175-82. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000600016
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. Neste estudo, a condição social não foi associada diretamente ao EP; variáveis como a renda familiar e a classe social não apresentaram associação significativa. Provavelmente devido à pobreza generalizada da população, não houve contraste suficiente entre as categorias desses indicadores para demonstrar tal associação. Por outro lado, o indicador regime de ocupação do tipo casa cedida ou alugada, que também reflete uma pior condição social, foi associado ao EP, talvez indicando que essa variável tenha sido mais sensível para identificar a associação da condição social ao EP. De fato, das famílias com casa cedida/alugada, 49% apresentaram INSAN moderada/grave, indicando comprometimento na qualidade dos alimentos consumidos e possivelmente repercutindo no peso dos adolescentes.2323. Frederick CB, Snellman K, Putnam RD. Increasing socioeconomic disparities in adolescent obesity. Proc Natl Acad Sci USA. 2014;111:1338-42. https://doi.org/10.1073/pnas.1321355110
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A OMS2020. World Health Organization. Global recommendations on physical activity for health. Geneva: WHO ; 2010. e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)2424. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the Internet]. Manual de Orientação: Promoção da Atividade Física na Infância e Adolescência. Rio de Janeiro: SBP; 2017 [cited 2016 Apr 14]. Available from: Available from: http://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/19890d-MO-Promo_AtivFisica_na_Inf_e_Adoles.pdf
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recomendam que os jovens em idade escolar pratiquem no mínimo 60 minutos de atividade física moderada a vigorosa todos os dias da semana, e que tenham um tempo de tela inferior a duas horas ao dia. Neste estudo, verificou-se que 89,9% dos adolescentes são inativos ou insuficientemente ativos. Ao comparar estudos com adolescentes brasileiros que utilizaram o mesmo ponto de corte da presente pesquisa para avaliar inatividade física, os resultados aqui obtidos foram superiores aos da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE)2121. Camelo LV, Rodrigues JFC, Giatti L, Barreto SM. Sedentary leisure time and food consumption among Brazilian adolescents: the Brazilian National School-Based Adolescent Health Survey (PeNSE), 2009. Cad Saude Publica. 2012;28:2155-62. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001100015
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(60,8% insuficientemente ativos e 4,8% inativos) e ao do Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA)2525. Cureau FV, Silva TL, Bloch KV, Fujimori E, Belfort DR, Carvalho KM, et al. ERICA: leisure-time physical inactivity in Brazilian adolescents. Rev Saude Publica. 2016;50 Supl.1.:4s. http://dx.doi.org/10.1590/s01518-8787.2016050006683
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(54,3% de inatividade). A elevada frequência de inatividade física neste estudo poderia, em parte, ser explicada pelas características ambientais desfavoráveis à prática de atividade física no Semiárido, como o clima quente, o nível de urbanização e a infraestrutura precária. Nessa região há poucos espaços recreativos comunitários como parques, ciclovias e pistas de corrida/caminhada que, se presentes, poderiam estimular uma vida mais ativa.

A prevalência de tempo de tela excessivo neste estudo foi elevada (64,2 a 69,3%), maior do que a observada em uma pesquisa com estudantes nordestinos,2626. Farias Júnior JC, Lopes AS, Mota J, Hallal PC. Physical activity practice and associated factors in adolescents in Northeastern Brazil. Rev Saude Publica. 2012;46:505-15. https://doi.org/10.1590/s0034-89102012005000031
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que avaliou o lazer sedentário (66,1 a 57,8%). Recente revisão sistemática aponta que duas ou mais horas de televisão por dia estão associadas a vários danos à saúde, como altos níveis de peso corporal, diminuição da aptidão física, baixa autoestima e piora do desempenho dos alunos.2727. Guerra PH, Farias Júnior JC , Florindo AA. Sedentary behavior in Brazilian children and adolescents: a systematic review. Rev Saude Publica. 2016;50:9. http://dx.doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050006307
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Os dados encontrados ratificam a tendência de globalização do Semiárido. A população acompanha o comportamento de grandes centros urbanos, com estilo de vida sedentário e possível alteração do padrão alimentar.

Em nossa pesquisa, os indivíduos ativos apresentaram frequência maior de EP. Esse resultado contraditório poderia ser explicado pelo fenômeno da causalidade reversa, característica dos estudos transversais. Os indivíduos podem ter iniciado a prática de atividade física após terem se percebido obesos, porém, até a realização da pesquisa, ainda não teria havido tempo suficiente para a atividade física ter efeitos na redução da obesidade.

A maturação sexual neste estudo não foi associada ao EP. Os estudos que avaliam essa associação geralmente consideram o atraso ou a precocidade do processo. Sabe-se que, na adolescência, o estágio puberal influencia os parâmetros antropométricos e de composição corporal, mas devido à variabilidade da maturação sexual segundo o sexo e a idade e às limitações do método de classificação da maturação, tal relação nem sempre é estabelecida nos estudos.2828. Li W, Liu Q, Deng X, Chen Y, Liu S, Story M. Association between obesity and puberty timing: a systematic review and meta-analysis. Int J Environ Res Public Health. 2017;14. https://doi.org/10.3390/ijerph14101266
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Já em relação à idade cronológica, observou-se uma tendência de diminuição da prevalência de EP e da atividade física com o aumento progressivo da idade. No início da adolescência, os indivíduos são mais suscetíveis à influência dos pares e da mídia, o que propiciaria o EP. Já no estágio final da adolescência, com a identidade pessoal já desenvolvida, os adolescentes tornam-se menos influenciáveis, já conseguem refletir sobre as consequências dos seus hábitos e escolhas e estão mais preocupados com sua aparência física.2929. Stang J S, Story M , University of Minnesota. Center for Leadership, Education, and Training in Maternal and Child Nutrition. Guidelines for adolescent nutrition services. Minneapolis: Center for Leadership, Education and Training in Maternal and Child Nutrition; 2005.

No que diz respeito à associação do consumo de álcool, ele se associou a uma chance 11% maior para EP. Outros estudos confirmam que, comparados a os jovens com peso normal, os adolescentes com EP apresentam maior probabilidade de serem bebedores frequentes ou de terem iniciado o uso do álcool precocemente.3030. Zeller MH, Becnel J, Reiter-Purtill J, Peugh J, Wu YP. Associations among excess weight status and tobacco, alcohol, and illicit drug use in a large national sample of early adolescent youth. Prev Sci. 2016;17:483-92. https://doi.org/10.1007/s11121-016-0639-2
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Se por um lado o uso frequente do álcool, que é uma fonte calórica considerável, pode conduzir um jovem de peso normal ao EP, o adolescente que é obeso pode se tornar um bebedor frequente. Os adolescentes com EP geralmente apresentam dificuldade em fazer amigos, sofrendo discriminação frequentemente. Os adolescentes obesos tendem a escolher pares similarmente marginalizados, combinando influências baseadas em pares para comportamento de risco como tabagismo, etilismo e dietas restritivas ou lançam mão desses comportamentos no intuito de mudar sua forma corporal e serem aceitos.3030. Zeller MH, Becnel J, Reiter-Purtill J, Peugh J, Wu YP. Associations among excess weight status and tobacco, alcohol, and illicit drug use in a large national sample of early adolescent youth. Prev Sci. 2016;17:483-92. https://doi.org/10.1007/s11121-016-0639-2
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De fato, dos adolescentes com EP, apenas 10,8% estiveram satisfeitos com sua situação corporal, enquanto naqueles sem EP a satisfação corporal foi de 89,2%

A comparação entre as categorias de IMC e a autopercepção do peso corporal mostrou que, entre os adolescentes classificados com EP, 33,3% subestimaram seu estado nutricional. É provável que a baixa condição socioeconômica e o baixo nível de escolaridade dos pais tenham influenciado os resultados da percepção corporal dos adolescentes. Pais com menor nível educacional geralmente subestimam o peso dos filhos, pois tendem a associar o EP a melhor condição de saúde. Enquanto os jovens com melhor condição socioeconômica são mais pressionados para se adequarem ao ideal de beleza magro.3131. Garcia DM, Mekitarian FE, Gilio AE, Lotufo JP, Lo DS. Nutritional status, nutritional self-perception, and use of licit drugs in adolescents. Rev Paul Pediatr. 2015;33:332-9. https://doi.org/10.1016/j.rpped.2014.11.015
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O fato de o adolescente se autoavaliar com EP associou-se a uma chance 45% maior dele realmente ser obeso. O reconhecimento da obesidade pelo adolescente e pelos pais pode constituir o primeiro passo no seu tratamento. Por outro lado, quando o adolescente ou os pais não reconhecem a obesidade, a busca pelo profissional de saúde pode ser tardia e aumentar a chance de o adolescente não realizar adequadamente o tratamento prescrito.3131. Garcia DM, Mekitarian FE, Gilio AE, Lotufo JP, Lo DS. Nutritional status, nutritional self-perception, and use of licit drugs in adolescents. Rev Paul Pediatr. 2015;33:332-9. https://doi.org/10.1016/j.rpped.2014.11.015
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A INSAN neste estudo totalizou 80,4% da população, sendo as formas moderadas e graves as mais frequentes. Esse resultado é semelhante ao estudo de Oliveira,66. Oliveira JS, Lira PI, Veras IC, Maia SR, Lemos MC, Andrade SL, et al. Nutritional status and food insecurity of adolescents and adults in two cities with a low human development index. Rev Nutr. 2009;22:453-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732009000400002
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com adolescentes de uma cidade do Semiárido, que encontrou uma prevalência de INSAN de 91,5%. Em termos econômicos, o Semiárido nordestino é a macrorregião mais carente do Brasil, concentrando a maioria da população pobre. Suas características de clima irregular e solos pobres acarretam consequências econômicas e sociais severas, com perdas na produção agropecuária e crises alimentares agudas. O adolescente estar em SAN ou em INSAN leve apresentou uma maior chance de ter EP. É possível que as condições de SAN/INSAN reflitam melhores condições para a compra de alimentos, mesmo que não saudáveis. Enquanto a INSAN moderada e grave reflete a fome ou a dificuldade de acesso ou compra de alimentos em termos de quantidade suficiente para as necessidades nutricionais. Um segundo aspecto um tanto surpreendente é a coexistência de uma elevada INSAN com baixa prevalência de desnutrição e elevada prevalência de eutrofia. Esse paradoxo nutricional é considerado um momento rápido do processo de transição epidemiológica que ocorre no Brasil.66. Oliveira JS, Lira PI, Veras IC, Maia SR, Lemos MC, Andrade SL, et al. Nutritional status and food insecurity of adolescents and adults in two cities with a low human development index. Rev Nutr. 2009;22:453-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-52732009000400002
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Em 2005, a Chamada Nutricional do Semiárido55. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC. Análise do Inquérito “Chamada Nutricional 2005” realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Ministério da Saúde. São Paulo: Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde e Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2006. avaliou o estado nutricional e as condições sociais de crianças menores de cinco anos do Semiárido e assentamentos do Nordeste e norte de Minas Gerais. Essa pesquisa revelou as condições socioeconômicas adversas dos domicílios em Pernambuco: prevalência das classes D e E de 41,6 e 33,3%, respectivamente; analfabetismo e baixa escolaridade em 12,7 e 30,1% dos chefes de família, respectivamente; e rede pública de abastecimento de água em 76,7% dos domicílios. No presente estudo, a maioria das famílias dos adolescentes avaliados pertence às classes D e E (49,7%), a maioria dos chefes da família apresenta baixa ou nenhuma escolaridade (56,4%) e a fonte de abastecimento de água referida ainda é insatisfatória, sendo que apenas 60,3% do fornecimento de água vêm da rede pública. Quanto à renda familiar, não houve diferença significativa nos extratos, o que talvez se deva à homogeneidade da amostra. Por outro lado, o adolescente residir em casa cedida ou alugada foi associado ao maior risco de EP. O regime de ocupação é um indicador de condição social, sugerindo que piores condições de vida estão associadas ao EP.

Este estudo apresentou algumas limitações. Primeiro a sua natureza transversal, que não possibilita testar relações de causalidade; a não inclusão de dados de consumo alimentar e de medidas de composição corporal; e a utilização de um questionário para avaliar atividade física que não possibilitou discriminar intensidade, frequência e duração das atividades físicas. Os dados foram coletados em uma região específica do país e, por isso, a generalização dos resultados para outras regiões deve ser efetuada com cautela.

Apesar das limitações, o presente estudo traz contribuições relevantes ao investigar a prevalência de EP em uma população de adolescentes no Semiárido, no qual são escassos os estudos na literatura. Quanto aos aspectos metodológicos, a amostra foi probabilística e a qualidade dos dados foi garantida mediante a realização de estudo piloto, treinamento de entrevistadores, checagem de questionários e digitação do banco de dados em dupla entrada. As medidas foram aferidas utilizando técnicas apropriadas, com instrumentos científicos e avaliadores qualificados. Adicionalmente, poucos estudos avaliam o EP com o amplo espectro de variáveis que foram utilizadas neste estudo, que contempla a multiplicidade de fatores de risco que o EP apresenta.

A prevalência de EP em adolescentes no semiárido foi elevada, apesar de a população apresentar elevada vulnerabilidade socioeconômica e insegurança alimentar. Os fatores associados ao EP foram: consumo de álcool, regime de ocupação, autopercepção do peso, faixa etária e SAN/INSAN leve. Almeja-se, com este estudo, alertar sobre a necessidade de políticas públicas para o combate à pobreza e ao EP também nessas áreas mais pobres da região nordeste

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Financiamento

  • Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    08 Jun 2018
  • Aceito
    09 Nov 2018
  • Publicado
    08 Nov 2019
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