Acessibilidade / Reportar erro

Variação longitudinal da qualidade do sono em mulheres com câncer de mama

Resumo

Objetivo:

Comparar a qualidade do sono, a depressão e a esperança em mulheres com câncer de mama ao longo de aproximadamente um ano.

Métodos:

Estudo longitudinal, com 107 mulheres, em hospital universitário. Foram utilizados os instrumentos: questionário de caracterização sociodemográfica e clínica; Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh; Inventário de Depressão de Beck e Escala de Esperança de Herth. Os dados foram coletados em T0, antes da cirurgia de retirada do tumor, e após a mesma em: T1, em média 3,2 meses; T2, em média 6,1 meses; em T3, em média 12,4 meses.

Resultados:

A má qualidade do sono persistiu ao longo do seguimento; a esperança aumentou em T1; a proporção de mulheres com depressão moderada e grave elevou-se em T3. Houve correlação significativa entre os escores indicativos de qualidade do sono, de depressão e de esperança nos quatro tempos.

Conclusão:

Os achados deste estudo indicam a importância do seguimento por tempo prolongado.

Descritores
Sono/fisiologia; Neoplasias da mama/complicações; Esperança/fisiologia; Depressão/fisiologia; Qualidade de vida

Abstract

Objectives:

To compare sleep quality, depression, and hope in women with breast cancer over an approximate period of 1 year.

Methods:

This longitudinal study included 107 women assisted at a teaching hospital. The following instruments were used: Questionnaire on Socio-demographic and Clinical Characteristics; Pittsburgh Sleep Quality Index; Beck Depression Inventory; and Herth Hope Scale. Data were collected at T0, before tumor removal surgery, and after surgery at T1 (average of 3.2 months), T2 (average of 6.1 months), and T3 (average of 12.4 months).

Results:

Poor sleep quality persisted over the follow-up; hope increased at T1; the proportion of women with moderate and severe depression increased at T3. There was a significant correlation among scores indicating sleep quality, depression, and hope in all four time points.

Conclusion:

Our study findings suggest the significance of long-term follow-up.

Keywords
Sleep/physiology; Breast neoplasms/complications; Hope/physiology; Depression/physiology; Quality of life

Introdução

No Brasil, a estimativa para o biênio de 2014/2015 aponta para a ocorrência de aproximadamente 576 mil casos novos de câncer, sendo que o câncer de mama será o segundo mais incidente em mulheres, com 57 mil casos novos.(11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação de Prevenção e Vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.)

Distúrbios do sono, depressão e falta de esperança são sintomas comuns e frequentemente tem um impacto negativo na vida de mulheres com câncer de mama.(22. Chen ML, Liu LN, Miaskowski C, Chen SC, Lin YC, Wang JS. Presurgical symptom profiles predict quality of life 2 years after surgery in women with breast cancer. Support Care Cancer. 2016; 24(1):243-51.) Estes sintomas estão presentes antes do início da quimioterapia e podem perdurar após o final do tratamento clínico, refletindo-se negativamente na qualidade de vida.(33. Sanford SD, Wagner LI, Beaumont JL, Butt Z, Sweet JJ, Cella, D. Longitudinal prospective assessment of sleep quality: before, during, and after adjuvant chemotherapy for breast cancer. Support Care Cancer. 2013; 21(4):959-67.)

Entretanto, pouco se sabe da trajetória destes sintomas, em especial a avaliação da esperança nestas mulheres, sendo que os níveis altos de esperança mostram melhores formas de enfrentamento da doença e devem ser considerados durante o tratamento.(44. Schjolberg et al., Factors affecting hope in a sample of fatigued breast cancer outpatients. Palliative and Supportive Care. 2011; 9: 63-72.)

Em diversos estudos, a esperança é apontada como uma estratégia efetiva para ajudar os pacientes a enfrentarem as dificuldades e a conquistarem seus objetivos, especialmente as pessoas com câncer. Autores sugerem que a esperança é um diferencial para esses pacientes, contribuindo para a aceitação e convivência com a doença e o tratamento.(44. Schjolberg et al., Factors affecting hope in a sample of fatigued breast cancer outpatients. Palliative and Supportive Care. 2011; 9: 63-72.,55. Herth K, Cutcliffe JR. The concept of hope in nursing 1: its origins, background and nature. Br J Nurs. 2002; 11(12):832-40.)

Existe também uma relação complexa entre a depressão e o câncer de mama com a influência de vários fatores, sendo que muitas vezes ela não é diagnosticada e não é tratada.(66. Hansen MV, Madsen MT, Hageman I, Rasmussen LS, Bokmand S, Rosenberg J, et al. The effect of melatonin on depression, anxiety, cognitive function and sleep disturbances in patients with breast cancer. The melody trial: protocol for a randomised, placebo-controlled, double-blinded trial. BMJ Open. 2012; 2(1):e000647.) A depressão e as alterações do humor podem permanecer até o final ou mesmo após o término do tratamento.(77. El Rafihi Ferreira R, Pires ML, Soares MR. Sleep, quality of life and depression in women in breast cancer post-treatment. Psicol Reflex Crit. 2012; 25(3):506-13.,88. Chen WY, Giobbie-Hurder A, Gantman K, Savoie J, Scheib R, Parker LM, Schernhammer ES. A randomized, placebo-controlled trial of melatonin on breast cancer survivors: impact on sleep, mood, and hot flashes. Breast Cancer Res Treat. 2014; 145(2):381-8.)

Os sintomas depressivos foram preditores de qualidade subjetiva do sono em mulheres com câncer de mama antes, durante e após o tratamento radioterápico.(99. Dhruva A, Paul SM, Cooper BA, Lee K, West C, Aouizerat BE, et al. A longitudinal study of measures of objective and subjective sleep disturbance in patients with breast cancer before, during, and after radiation therapy. J Pain Symptom Manage. 2012; 44(2):215-28.) Outros autores encontraram que mulheres com câncer de mama em estadiamento inicial mostraram, em comparação com um grupo controle de mulheres sem câncer, pior qualidade do sono, mais sintomas depressivos, mais fadiga e menor qualidade de vida, um ano após a quimioterapia.(1010. Ancoli-Israel S, Liu L, Rissling M, Natarajan L, Neikrug AB, Palmer BW, et al. Sleep, fatigue, depression, and circadian activity rhythms in women with breast cancer before and after treatment: a 1-year longitudinal study. Support Care Cancer. 2014; 22(9):2535-45.) Ainda nesse sentido, em outro estudo verificou-se que a qualidade de sono em mulheres com câncer de mama pode predizer a qualidade de vida e o bem estar psicológico, de um a dez anos após o tratamento.(77. El Rafihi Ferreira R, Pires ML, Soares MR. Sleep, quality of life and depression in women in breast cancer post-treatment. Psicol Reflex Crit. 2012; 25(3):506-13.)

Considerando-se que ainda há lacunas no conhecimento a respeito do percurso da qualidade do sono, da depressão e da esperança ao longo do tratamento do câncer de mama, bem como a relevância dessas informações, ressalta-se a importância dos estudos longitudinais que avaliem essas variáveis, em particular nas mulheres brasileiras.

Sendo assim, este estudo teve por objetivos comparar os escores indicativos de qualidade do sono, depressão e esperança entre as diferentes etapas do seguimento e verificar a correlação entre essas variáveis ao longo do seguimento.

Métodos

Trata-se de um estudo analítico, longitudinal e prospectivo, conduzido com 107 mulheres com câncer de mama, realizado em três ambulatórios e na enfermaria de oncologia cirúrgica de um Hospital Universitário especializado em saúde da mulher no interior de São Paulo/Brasil.

Critérios de Inclusão: mulheres com 18 anos ou mais; com diagnóstico de câncer de mama; TNM em qualquer estágio;(1111. International Union Against Cancer (United States). TNM Classification of malignant tumors. 7th ed. New York: John Wiley & Sons; 2009.) internadas em pré-operatório de mastectomia ou quadrantectomia e em seguimento nos ambulatórios do serviço previamente citados como local de estudo.

Critérios de exclusão: Escala de Karnofsky menor que 70; inadequadas condições clínicas (tais como mucosite, dor, náusea, dispnéia, vômitos) e emocionais (tais como choro, apatia, agressividade), para responder a uma entrevista.

Amostra: optou-se por coletar os dados de todas as mulheres que se enquadravam nos critérios de inclusão no intervalo de março a dezembro de 2013, conforme orientação dos profissionais do Serviço de Estatística da instituição (n=156), sendo esta amostra de conveniência.

A coleta de dados teve início na noite anterior à cirurgia de retirada do tumor (T0), dando-se continuidade no seu retorno para tratamento clínico (consultas, quimioterapia ou radioterapia) ou exames.

Instrumentos utilizados:

  • Questionário de Caracterização sociodemográfica e Clínica: adaptado de outro estudo com pacientes com câncer,(1212. Mansano-Schlosser TC, Ceolim MF. Factors associated with sleep quality in the elderly receiving chemotherapy. Rev Latin Am Enfermagem. 2012; 20(6):1100-8.) mediante autorização das autoras, foi utilizado para coletar as informações sócio-demográficas e clínicas dos sujeitos.

  • Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh/PSQI-BR: usado para avaliar a qualidade e os distúrbios do sono presentes no último mês, validado para uso no Brasil.(1313. Bertolazi NA, Fagondes SC, Hoff LS, et al. Validation of the Brazilian Portuguese version of the Pittsburgh Sleep Quality Index. Sleep Med. 2011; 12:70-5.) Contém 19 questões agrupadas em sete componentes: qualidade subjetiva do sono, latência, duração, eficiência, transtornos do sono, uso de medicamentos para dormir e disfunção diurna. O escore global varia de zero a 21 pontos (zero a três pontos por componente), sendo que, quando superior a cinco sugere sono de má qualidade.(1313. Bertolazi NA, Fagondes SC, Hoff LS, et al. Validation of the Brazilian Portuguese version of the Pittsburgh Sleep Quality Index. Sleep Med. 2011; 12:70-5.)

  • Inventário de Depressão de Beck /BDI: medida de autoavaliação de depressão amplamente usada na pesquisa e na clínica, validado no Brasil.(1414. Gorenstein C, Andrade L. Validation of a Portuguese version of the Beck Depression Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory in Brazilian Subjects. Braz J Med Biol Res. 1996; 29:453-7.) A escala original consiste de 21 itens, incluindo sintomas e atitudes, cuja intensidade varia de zero a três. Os itens referem-se à tristeza, pessimismo, sensação de fracasso, falta de satisfação, sensação de culpa, sensação de punição, autodepreciação, autoacusações, ideias suicidas, crises de choro, irritabilidade, retração social, indecisão, distorção da imagem corporal, inibição para o trabalho, distúrbio do sono, fadiga, perda de apetite, perda de peso, preocupação somática, diminuição de libido . Os pontos de corte recomendados são: inferior a 10, sem depressão ou depressão mínima; 10 a 18, depressão leve a moderada; 19 a 29, depressão moderada a grave; 30 a 63, depressão grave.(1414. Gorenstein C, Andrade L. Validation of a Portuguese version of the Beck Depression Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory in Brazilian Subjects. Braz J Med Biol Res. 1996; 29:453-7.)

  • Escala de Esperança de Herth/ EEH: é uma escala de fácil e rápida aplicação, validada para uso no Brasil.(1515. Sartore AC, Grossi SA. Escala de Esperança de Herth - Instrumento adaptado e validado para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 2008; 42(2):227-32.) A EEH é designada para facilitar a avaliação da esperança em vários intervalos onde as variações nos níveis de esperança poderão ser identificadas. Constitui-se de 12 afirmações com respostas em escala do tipo Likert, com escores de 1 a 4. O escore total varia de 12 a 48 sendo que, quanto maior o escore, mais alto o nível de esperança.(1515. Sartore AC, Grossi SA. Escala de Esperança de Herth - Instrumento adaptado e validado para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 2008; 42(2):227-32.)

Com exceção do Questionário de Caracterização sociodemográfica e Clínica, utilizado em T0 para caracterização da amostra, todos os instrumentos foram aplicados nos quatros tempos. A incompletude nos instrumentos se deu devido a faltas de informações referentes aos receptores hormonais (receptor de estrógeno e receptor de progesterona), não sendo analisados estes dados clínicos. Somente o estadiamento, o tratamento e dimensão do tumor foram analisados, bem como a dor que foi analisada de forma dicotômica e a intensidade não foi avaliada nesta pesquisa.

Para análise de dados, estes foram digitados em planilha do programa Microsoft® Excel for Windows versão 2007 (Microsoft Corporation Inc.) e transportados ao programa SAS 9.4 para a análise, com suporte do estatístico da instituição. Realizaram-se estatística descritiva e testes não paramétricos, devido à distribuição dos dados diferente da normal. Foram empregues: teste de ANOVA de Friedman, para comparar os escores dos instrumentos entre os quatro tempos, com nível de significância de 5%; teste de Wilcoxon, para comparar cada dois tempos entre si, aplicando a correção de Bonferroni devido às comparações múltiplas, com nível de significância de 0,083%; Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman, para análise de correlação entre os escores dos instrumentos, nos quatro tempos. A confiabilidade do PSQI-BR foi avaliada pelo coeficiente alfa de Cronbach.

O estudo foi registrado na Plataforma Brasil sob o número do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 00762112.0.0000.5404.

Resultados

O seguimento do estudo se deu em T0 anterior a cirurgia e após em: T1, em média 3,2 meses (DP 0,7) após T0; T2, em média 6,2 meses (DP 0,9) após T0; T3, em média 12,4 meses (DP 1,0) após T0. Sendo que 49 foi o número de sujeitos excluídos devido as perdas de seguimento (faltas e óbitos) e respostas incompletas nos instrumentos, resultando no total de 107 mulheres. A última data de acompanhamento foi em dezembro de 2014.

A maioria das mulheres era de cor branca (77,6%), casadas (56,1%), aposentadas ou afastadas (47,7%) e recebiam até cinco salários mínimos (91,6%). A média de idade foi de 56,1 anos (DP 12,4, mediana 55,0), e apresentaram em média 5,4 anos de estudo (DP 4,0).

Entre as participantes, 81,0% tinham o câncer em estadiamento inicial (I/II) e, quanto ao tratamento, 24,8% realizaram quimioterapia neoadjuvante e 56,6% realizaram mastectomia total. A dimensão do tumor foi de, em média, 2,8 cm (DP 1,8), e 41,6% relataram presença de dor relacionada ao tumor ou tratamento, pós cirurgia.

Quanto à presença de depressão ao longo do tempo, observou-se redução da proporção de mulheres na categoria ‘sem depressão ou mínima’, de 52,3% em T0 para 32,7% em T3. Houve, portanto, aumento da proporção de participantes com depressão moderada a grave e grave, de 29,0% em T0 para 47,7% em T3 (Figura 1).

Figura 1
Proporção de mulheres com câncer de mama segundo as categorias de depressão e qualidade do sono

A má qualidade do sono foi predominante nas quatro etapas, ocorrendo em 57,0% das mulheres em T0 e em 59,8% em T3 (Figura 1).

A análise comparativa de cada instrumento entre as quatro etapas do seguimento é apresentada a seguir (Tabela 1), verificando-se que, de T0 a T3, houve diferença significativa entre os escores do BDI (p=0,0038) e da EEH (p=0,0460), porém isso não ocorreu com os escores do PSQI-BR.

Tabela 1
Análise comparativa dos escores dos instrumentos Inventário de Depressão de Beck, Escala de Esperança de Herth e Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh entre as quatro etapas do seguimento

Ao Teste de Wilcoxon (aplicando-se ao valor de p a correção de Bonferroni), verificou-se diferença significativa para os escores de depressão entre T3 e: T0 (p=0,005), T1 (p=0,0001) e T2 (p=0,0035). Os escores de esperança apresentaram diferença significativa entre T0 e T1 (p=0,0074).

Evidenciaram-se correlações significativas entre os escores do PSQI-BR, do BDI e da EEH em todas as etapas do seguimento (Tabela 2).

Tabela 2
Correlações entre os escores dos instrumentos Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh, Inventário de Depressão de Beck e Escala de Esperança de Herth nas quatro etapas de seguimento

Os coeficientes alfa de Cronbach no PSQI-BR mostraram os seguintes resultados: em T0: 0,721, em T1: 0,782, em T2: 0,795 e em T3: 0,771.

Discussão

Este estudo longitudinal mostrou que a má qualidade do sono mantém-se ao longo do seguimento, e a esperança aumentou em T1, declinando a seguir. Os escores indicativos de depressão tornam-se mais elevados e proporcionalmente, a depressão moderada a grave é mais prevalente ao final do seguimento. Houve correlações significativas entre os escores de todos os instrumentos nas quatro etapas de acompanhamento.

Na literatura o câncer de mama tem sido apresentado nos estudos comumente associado a vários sintomas, como por exemplo, a depressão, a dor, a fadiga e a qualidade do sono.(1616. Doong S, Dhruva A, Dunn LB, West C, Paul SM, Cooper BA, et al. Associations between cytokine genes and a symptom cluster of pain, fatigue, sleep disturbance, and depression in patients prior to breast cancer surgery. Biol Res Nurs. 2015; 17(3):237-47.,1717. Ho RT, Fong TC, Chan CK, Chan CL. The associations between diurnal cortisol patterns, self-perceived social support, and sleep behavior in Chinese breast cancer patients. Psychoneuroendocrinology. 2013; 38(10):2337-42.)

A proporção de mulheres com sono de má qualidade manteve-se predominante ao longo do seguimento e ao final, o sono de má qualidade persistiu com aumento do percentual de mulheres, similar a uma pesquisa com 166 mulheres com câncer de mama no qual os resultados dos escores do PSQI sugerem que as mulheres relataram má qualidade do sono antes do início do tratamento e informaram ainda pior qualidade do sono após o final.(1818. Liu L, Fiorentino L, Rissling M, Natarajan L, Parker BA, Dimsdale JE, et al. Decreased health-related quality of life in women with breast cancer is associated with poor sleep. Behavioral Sleep Med. 2013; 11(3):189-206.)

Estudo pregresso longitudinal com 80 pacientes com câncer de mama, também mostrou que a má qualidade do sono foi predominante em todos os momentos do tratamento em 65,8% das mulheres, porém destacam que não se alteram significativamente ao longo do tempo, que as correlações com a qualidade do sono variaram e os autores recomendam a identificação e tratamento precoces com a finalidade de prevenir insônia crônica nos sobreviventes.(33. Sanford SD, Wagner LI, Beaumont JL, Butt Z, Sweet JJ, Cella, D. Longitudinal prospective assessment of sleep quality: before, during, and after adjuvant chemotherapy for breast cancer. Support Care Cancer. 2013; 21(4):959-67.) Assim como nesta pesquisa as mulheres ao final do tratamento referiram má qualidade do sono, fato a ser tratado pelos profissionais de saúde.

Ao avaliar medidas objetivas e subjetivas de qualidade do sono, autores concluem que mulheres com câncer de mama têm problemas com a manutenção do sono, sendo que 51% delas relataram sono de má qualidade e 97% relatam quantidade insuficiente de sono em três dias ou mais da semana.(99. Dhruva A, Paul SM, Cooper BA, Lee K, West C, Aouizerat BE, et al. A longitudinal study of measures of objective and subjective sleep disturbance in patients with breast cancer before, during, and after radiation therapy. J Pain Symptom Manage. 2012; 44(2):215-28.)

Os especialistas em sono colocam em destaque também a importância da avaliação subjetiva deste parâmetro, no caso do presente estudo com a utilização do PSQI, bem como a relevância das diferenças interindividuais, ao afirmar que as pessoas que percebem que estão dormindo muito pouco, ou demais, devem ser orientadas a buscar um profissional de saúde.(1919. Watson NF, Badr MS, Belenky G, Bliwise DL, Buxton OM, Buysse D, et al. Recommended amount of sleep for a healthy adult: a joint consensus statement of the American Academy of Sleep Medicine and Sleep Research Society. Sleep. 2015; 38(6):843-4.)

E ainda, dados analisados a partir de um estudo longitudinal após dois anos de tratamento evidenciaram que a presença de alguns sintomas anteriormente a cirurgia teve um efeito preditivo de longo prazo na qualidade de vida de mulheres com câncer de mama e os cinco sintomas presentes foram: distúrbios do sono, cognitivo, cansaço físico, depressão e ansiedade. Estes autores concluíram que se faz necessária a avaliação de sintomas no período de prétratamento para identificar grupo de alto risco.(22. Chen ML, Liu LN, Miaskowski C, Chen SC, Lin YC, Wang JS. Presurgical symptom profiles predict quality of life 2 years after surgery in women with breast cancer. Support Care Cancer. 2016; 24(1):243-51.)

Além da persistência da má qualidade do sono vivenciada por estas mulheres, houve um aumento na proporção de mulheres com depressão moderada a grave e grave, de 29% no início do estudo, até quase 50% ao final do seguimento. Em outro estudo longitudinal no qual sintomas relacionados ao câncer de mama foram acompanhados, a depressão, a fadiga e a má qualidade do sono presentes antes da quimioterapia foram avaliadas como piores ao final do quarto ciclo.(33. Sanford SD, Wagner LI, Beaumont JL, Butt Z, Sweet JJ, Cella, D. Longitudinal prospective assessment of sleep quality: before, during, and after adjuvant chemotherapy for breast cancer. Support Care Cancer. 2013; 21(4):959-67.)

Entretanto, em outro estudo no qual foram acompanhadas mulheres com câncer de mama, os autores verificaram que sintomas depressivos estavam presentes antes do início do tratamento, no quarto ciclo da quimioterapia e um ano após o início do tratamento, porém os escores de depressão retornaram ao valor inicial ao final do seguimento. (10) O fato de algumas mulheres, no presente estudo, ainda se encontrarem em tratamento clínico, poderia ter contribuído para a diferença nos resultados.

Os resultados da análise de correlação, nesta pesquisa, indicam que, quanto pior a qualidade do sono, mais elevado é o escore de depressão. Em outro estudo, realizado com 396 mulheres, antes e após seis meses da mastectomia, os autores relataram que altos índices de depressão estavam associados à presença de distúrbios do sono ao longo do seguimento.(2020. Van Onselen C, Paul SM, Lee K, Dunn L, Aouizerat BE, West C, et al. Trajectories of sleep disturbance and daytime sleepiness in women before and after surgery for breast cancer. J Pain Symptom Manage. 2013; 45:244-60.) Em estudo longitudinal realizado com 3343 mulheres com câncer de mama em estágio inicial, avaliadas três a quatro meses após a cirurgia de ressecção do tumor, os autores verificaram que a depressão foi o fator preditivo mais forte de alterações do sono.(2121. Colagiuri B, Christensen S, Jensen AB, Price MA, Butow PN, Zacharia R. Prevalence and predictors of sleep difficulty in a national cohort of women with primary breast cancer three to four months post-surgery. J Pain Symptom Manage 2011; 42(5):710-20.)

Além da depressão, a dor também constituiu uma influência significativa para o sono de má qualidade neste estudo. É um sintoma frequente nestas pacientes, acometendo 41,6% das mulheres desta pesquisa. Dentre os fatores que afetam negativamente a sua qualidade de vida, as pacientes com câncer de mama vivenciam a presença da depressão, ansiedade, fadiga, dor e distúrbios do sono, sendo que estes últimos podem também contribuir para um aumento da mortalidade.(66. Hansen MV, Madsen MT, Hageman I, Rasmussen LS, Bokmand S, Rosenberg J, et al. The effect of melatonin on depression, anxiety, cognitive function and sleep disturbances in patients with breast cancer. The melody trial: protocol for a randomised, placebo-controlled, double-blinded trial. BMJ Open. 2012; 2(1):e000647.)

Além da correlação positiva entre má qualidade do sono e depressão, houve correlação negativa entre os escores de esperança e a má qualidade do sono e, da mesma forma, entre a esperança e a depressão, em todas as etapas deste estudo. Além disso, em mulheres com câncer de mama, foi demonstrado que o status de saúde, o suporte familiar e autoestima, afetam a depressão indiretamente por meio da esperança.(2222. Sook Tae Y, Heitkemper M, Kim MY. A path analysis: a model of depression in Korean women with breast cancer-mediating effects of self-esteem and hope. Oncol Nurs Forum. 2012; 39(1):E49-E57.)

Existem poucos estudos que empregam intervenções para melhoria da esperança,(2323. Herth KA. Development and implementation of a Hope Intervention Program. Oncol Nurs Forum. 2001; 28(6):1009-16.,2424. Duggleby WD, Williams AM. Living with hope: developing a psychosocial supportive program for rural women caregivers of persons with advanced câncer. BMC Palliat Care. 2010; 9:3. doi: 10.1186/1472-684X-9-3.
https://doi.org/10.1186/1472-684X-9-3...
) no entanto, há um estudo recente que tratou de um ensaio clínico randomizado com mulheres que sofreram a mastectomia com o objetivo de avaliar o efeito da intervenção de apoio espiritual sobre a espiritualidade e os parâmetros clínicos. Este evidenciou que a intervenção ajudou a aumentar a expressão da sua espiritualidade e também a diminuição do ritmo cardíaco e a intervenção foi avaliada de forma positiva pelas mulheres mastectomizadas.(2525. Guilherme C, Ribeiro GR, Caldeira S, Zamarioli CM, de Souza Oliveira-Kumakura, AR, Almeida AM, et al. Effect of the “spiritual support” Intervention on spirituality and the clinical parameters of women who have undergone mastectomy: a pilot study. Religions. 2016; 7(3): 26.) Assemelhase a presente pesquisa pois a escala de espiritualidade empregada utiliza como subitens a esperança e otimismo, investigada na atual pesquisa.

Ressalta-se que por meio destas intervenções, os autores verificaram o aumento da esperança e concluíram que é um caminho único e de inovação para dar suporte aos pacientes e aos familiares que convivem com estes doentes. A intervenção foi composta de meditação, imaginação guiada, música e relaxamento respiratório.(2525. Guilherme C, Ribeiro GR, Caldeira S, Zamarioli CM, de Souza Oliveira-Kumakura, AR, Almeida AM, et al. Effect of the “spiritual support” Intervention on spirituality and the clinical parameters of women who have undergone mastectomy: a pilot study. Religions. 2016; 7(3): 26.) podendo ser útil como exemplo a ser empregue em futuras intervenções no Brasil.

Enfatiza-se que intervenções fundamentadas no incentivo à esperança, nas mulheres com câncer de mama, poderiam ser testadas como estratégias não farmacológicas para melhoria da qualidade do sono. Esta proposta é ousada e não se fundamenta nos resultados do presente estudo, que não permitem inferir relação de causalidade entre as três variáveis estudadas, mas sim um imbricamento entre elas.

Autores sugerem o uso de métodos como a polissonografia e actigrafia para promover informações adicionais sobre a magnitude das alterações de sono encontradas.(99. Dhruva A, Paul SM, Cooper BA, Lee K, West C, Aouizerat BE, et al. A longitudinal study of measures of objective and subjective sleep disturbance in patients with breast cancer before, during, and after radiation therapy. J Pain Symptom Manage. 2012; 44(2):215-28.) Acredita-se também que o detalhamento obtido com métodos como a actigrafia e o diário de sono possam contribuir com dados relevantes sobre a variabilidade intraindividual ao longo do tempo, a qual poderia ser examinada em função de fatores que influenciam negativa ou positivamente a qualidade do sono.

Portanto, estas três condições, ou seja, a presença de depressão, o sono de má qualidade e a esperança, devem ser avaliadas em pacientes com câncer de mama, pois sua identificação é fundamental para seja possível tratar os dois primeiros, e incentivar a esperança. Autores afirmam, ainda, que pesquisas são necessárias para determinar se, realizando-se o tratamento dessas alterações antes do início do tratamento clínico, seria possível aliviar a intensidade dos mesmos no decorrer do tempo.(1010. Ancoli-Israel S, Liu L, Rissling M, Natarajan L, Neikrug AB, Palmer BW, et al. Sleep, fatigue, depression, and circadian activity rhythms in women with breast cancer before and after treatment: a 1-year longitudinal study. Support Care Cancer. 2014; 22(9):2535-45.)

Destaca-se, desta forma, a relevância de ampliar a atenção oferecida às mulheres com câncer de mama para além do momento do diagnóstico ou imediatamente após a cirurgia de ressecção do câncer. Os achados deste estudo reforçam essa afirmativa, pois indicam a importância do seguimento por tempo prolongado de todos os sintomas que podem acompanhar a má qualidade do sono, permitindo o tratamento conjunto destes.

Como limitações do estudo, pode-se apontar: a não utilização de medidas objetivas para avaliar as alterações do sono que implicaram em má qualidade; a ausência de acompanhamento detalhado das características do sono que permitissem avaliar sua variabilidade; a incompletude de alguns dados nos prontuários; e as perdas de seguimento, que englobaram óbitos e faltas das mulheres.

Conclusão

Neste estudo, não houve diferença significativa dos escores de avaliação de qualidade do sono nas quatro etapas de acompanhamento das mulheres com câncer de mama, sendo que em todas persistiu o sono de má qualidade; os escores de depressão aumentaram significativamente na última etapa do seguimento (T3), em relação às demais; a esperança mostrou-se significativamente mais elevada em T1. Encontrou-se correlação significativa entre os escores indicativos de qualidade do sono, de depressão e de esperança, nos quatro tempos do seguimento.

  • * Extraído da tese intitulada: “Qualidade do sono e evolução clínica de mulheres com câncer de mama: estudo longitudinal”, 2015.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES; bolsa de doutorado para Mansano-Schlosser TC).

Referências

  • 1
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação de Prevenção e Vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.
  • 2
    Chen ML, Liu LN, Miaskowski C, Chen SC, Lin YC, Wang JS. Presurgical symptom profiles predict quality of life 2 years after surgery in women with breast cancer. Support Care Cancer. 2016; 24(1):243-51.
  • 3
    Sanford SD, Wagner LI, Beaumont JL, Butt Z, Sweet JJ, Cella, D. Longitudinal prospective assessment of sleep quality: before, during, and after adjuvant chemotherapy for breast cancer. Support Care Cancer. 2013; 21(4):959-67.
  • 4
    Schjolberg et al., Factors affecting hope in a sample of fatigued breast cancer outpatients. Palliative and Supportive Care. 2011; 9: 63-72.
  • 5
    Herth K, Cutcliffe JR. The concept of hope in nursing 1: its origins, background and nature. Br J Nurs. 2002; 11(12):832-40.
  • 6
    Hansen MV, Madsen MT, Hageman I, Rasmussen LS, Bokmand S, Rosenberg J, et al. The effect of melatonin on depression, anxiety, cognitive function and sleep disturbances in patients with breast cancer. The melody trial: protocol for a randomised, placebo-controlled, double-blinded trial. BMJ Open. 2012; 2(1):e000647.
  • 7
    El Rafihi Ferreira R, Pires ML, Soares MR. Sleep, quality of life and depression in women in breast cancer post-treatment. Psicol Reflex Crit. 2012; 25(3):506-13.
  • 8
    Chen WY, Giobbie-Hurder A, Gantman K, Savoie J, Scheib R, Parker LM, Schernhammer ES. A randomized, placebo-controlled trial of melatonin on breast cancer survivors: impact on sleep, mood, and hot flashes. Breast Cancer Res Treat. 2014; 145(2):381-8.
  • 9
    Dhruva A, Paul SM, Cooper BA, Lee K, West C, Aouizerat BE, et al. A longitudinal study of measures of objective and subjective sleep disturbance in patients with breast cancer before, during, and after radiation therapy. J Pain Symptom Manage. 2012; 44(2):215-28.
  • 10
    Ancoli-Israel S, Liu L, Rissling M, Natarajan L, Neikrug AB, Palmer BW, et al. Sleep, fatigue, depression, and circadian activity rhythms in women with breast cancer before and after treatment: a 1-year longitudinal study. Support Care Cancer. 2014; 22(9):2535-45.
  • 11
    International Union Against Cancer (United States). TNM Classification of malignant tumors. 7th ed. New York: John Wiley & Sons; 2009.
  • 12
    Mansano-Schlosser TC, Ceolim MF. Factors associated with sleep quality in the elderly receiving chemotherapy. Rev Latin Am Enfermagem. 2012; 20(6):1100-8.
  • 13
    Bertolazi NA, Fagondes SC, Hoff LS, et al. Validation of the Brazilian Portuguese version of the Pittsburgh Sleep Quality Index. Sleep Med. 2011; 12:70-5.
  • 14
    Gorenstein C, Andrade L. Validation of a Portuguese version of the Beck Depression Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory in Brazilian Subjects. Braz J Med Biol Res. 1996; 29:453-7.
  • 15
    Sartore AC, Grossi SA. Escala de Esperança de Herth - Instrumento adaptado e validado para a língua portuguesa. Rev Esc Enferm USP. 2008; 42(2):227-32.
  • 16
    Doong S, Dhruva A, Dunn LB, West C, Paul SM, Cooper BA, et al. Associations between cytokine genes and a symptom cluster of pain, fatigue, sleep disturbance, and depression in patients prior to breast cancer surgery. Biol Res Nurs. 2015; 17(3):237-47.
  • 17
    Ho RT, Fong TC, Chan CK, Chan CL. The associations between diurnal cortisol patterns, self-perceived social support, and sleep behavior in Chinese breast cancer patients. Psychoneuroendocrinology. 2013; 38(10):2337-42.
  • 18
    Liu L, Fiorentino L, Rissling M, Natarajan L, Parker BA, Dimsdale JE, et al. Decreased health-related quality of life in women with breast cancer is associated with poor sleep. Behavioral Sleep Med. 2013; 11(3):189-206.
  • 19
    Watson NF, Badr MS, Belenky G, Bliwise DL, Buxton OM, Buysse D, et al. Recommended amount of sleep for a healthy adult: a joint consensus statement of the American Academy of Sleep Medicine and Sleep Research Society. Sleep. 2015; 38(6):843-4.
  • 20
    Van Onselen C, Paul SM, Lee K, Dunn L, Aouizerat BE, West C, et al. Trajectories of sleep disturbance and daytime sleepiness in women before and after surgery for breast cancer. J Pain Symptom Manage. 2013; 45:244-60.
  • 21
    Colagiuri B, Christensen S, Jensen AB, Price MA, Butow PN, Zacharia R. Prevalence and predictors of sleep difficulty in a national cohort of women with primary breast cancer three to four months post-surgery. J Pain Symptom Manage 2011; 42(5):710-20.
  • 22
    Sook Tae Y, Heitkemper M, Kim MY. A path analysis: a model of depression in Korean women with breast cancer-mediating effects of self-esteem and hope. Oncol Nurs Forum. 2012; 39(1):E49-E57.
  • 23
    Herth KA. Development and implementation of a Hope Intervention Program. Oncol Nurs Forum. 2001; 28(6):1009-16.
  • 24
    Duggleby WD, Williams AM. Living with hope: developing a psychosocial supportive program for rural women caregivers of persons with advanced câncer. BMC Palliat Care. 2010; 9:3. doi: 10.1186/1472-684X-9-3.
    » https://doi.org/10.1186/1472-684X-9-3
  • 25
    Guilherme C, Ribeiro GR, Caldeira S, Zamarioli CM, de Souza Oliveira-Kumakura, AR, Almeida AM, et al. Effect of the “spiritual support” Intervention on spirituality and the clinical parameters of women who have undergone mastectomy: a pilot study. Religions. 2016; 7(3): 26.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2016
  • Aceito
    20 Out 2016
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: actapaulista@unifesp.br