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Qualidade do sono em diabéticos do tipo 2

Resumos

Distúrbios do sono em diabéticos do tipo 2 constituem fatores de risco para o agravamento do diabetes, pois podem interferir no controle metabólico através da síndrome da resistência à insulina. O estudo foi do tipo observacional-transversal. A qualidade do sono foi investigada em 50 diabéticos do tipo 2, sendo aplicado o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI). A maioria (52%) apresentou escores do PSQI que indicam qualidade do sono ruim. Aqueles com tempo de diagnóstico superior a 10 anos e com hipertensão possuíam pior qualidade do sono. Para os outros com valores de hemoglobina A1c > 7%, que usam medicação para dormir, e aqueles que apresentaram IMC normal a qualidade do sono mostrou-se pior. Os achados desta investigação reforçam a relevância da temática, pois não existem instrumentos específicos para a avaliação do sono do diabético do tipo 2, dificultando afirmações acerca da qualidade do sono do diabético.

transtornos do sono; diabetes mellitus tipo 2; qualidade de vida


Sleeping disorders in type 2 diabetic patients constitute risk factors for aggravating diabetes since they can affect the metabolic control through insulin resistance syndrome. This was an observational, cross-sectional study. The majority (52%) of subjects had scores indicating poor sleep quality. The Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) scores showed patients with a time after diagnosis over 10 years and hypertension had the poorest sleep quality. For those with hemoglobin A1c > 7% taking sleeping medicines and those who had normal body mass index (BMI), the sleep quality was even poorer. The findings of the present study reinforce the relevance of this topic since there are no specific tools for sleep evaluation of type 2 diabetics making it difficult to make any assertions on the sleep quality of these patients.

sleep disorders; diabetes mellitus, type 2; quality of life


Los disturbios del sueño en diabéticos del tipo 2, constituyen factores de riesgo para el agravamiento de la diabetes, pues pueden interferir en el control metabólico a través del síndrome de la resistencia a la insulina. El estudio fue del tipo observacional-transversal. La calidad del sueño fue investigada en 50 diabéticos del tipo 2, a quienes se aplicó el Índice de Calidad del Sueño de Pittsburgh (PSQI). La mayoría (52%) presentó puntuaciones del PSQI, que indican calidad del sueño mala. Aquellos con tiempo de diagnóstico superior a 10 años y con hipertensión poseían peor calidad del sueño. Para aquellos con valores de Hemoglobina A1c > 7%, que usaban medicamentos para dormir y los que presentaron IMC normal, la calidad del sueño se mostró peor. Lo encontrado en esta investigación refuerza la relevancia de la temática, ya que no existen instrumentos específicos para evaluar el sueño del diabético del tipo 2, dificultando afirmaciones sobre la calidad del sueño del diabético.

transtorno del sueño; diabetis mellitus tipo 2; calidad de vida


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade do sono em diabéticos do tipo 2

Maria Carolina Belo da CunhaI; Maria Lúcia ZanettiII; Vanderlei José HassIII

Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

IEnfermeira, Mestre em Enfermagem Fundamental, e-mail: carolindabelo@yahoo.com.br

IIEnfermeira, Livre Docente, Professor Associado, e-mail: zanetti@eerp.usp.br

IIIEstatístico, Livre Docente, e-mail: haas@eerp.usp.br

RESUMO

Distúrbios do sono em diabéticos do tipo 2 constituem fatores de risco para o agravamento do diabetes, pois podem interferir no controle metabólico através da síndrome da resistência à insulina. O estudo foi do tipo observacional-transversal. A qualidade do sono foi investigada em 50 diabéticos do tipo 2, sendo aplicado o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI). A maioria (52%) apresentou escores do PSQI que indicam qualidade do sono ruim. Aqueles com tempo de diagnóstico superior a 10 anos e com hipertensão possuíam pior qualidade do sono. Para os outros com valores de hemoglobina A1c >7%, que usam medicação para dormir, e aqueles que apresentaram IMC normal a qualidade do sono mostrou-se pior. Os achados desta investigação reforçam a relevância da temática, pois não existem instrumentos específicos para a avaliação do sono do diabético do tipo 2, dificultando afirmações acerca da qualidade do sono do diabético.

Descritores: transtornos do sono; diabetes mellitus tipo 2; qualidade de vida

INTRODUÇÃO

Dentre as condições crônicas, o diabetes mellitus é considerado um problema de saúde pública pela sua alta morbimortalidade, com perda importante da qualidade de vida dos pacientes.

As projeções no Brasil para 2030 são de que possam existir cerca de 11,3 milhões de diabéticos, o que representa um aumento de mais de 100% em relação aos atuais 5 milhões de diabéticos(1).

Dentre as causas apontadas na literatura, como explicação para esse aumento, estão o envelhecimento demográfico da população, as tendências relativas aos fatores de risco que estão diretamente relacionados aos processos de modernização da sociedade e a melhoria dos critérios diagnósticos(2). Em relação aos fatores de risco, os mais investigados para o diabetes mellitus, referem-se à alimentação pouco saudável durante longo período de tempo, o tabagismo, o sedentarismo, a obesidade e o consumo exagerado de álcool(2).

Na atualidade, os fatores de risco para o diabetes mellitus tais como obesidade, adiposidade visceral, idade avançada também estão associados aos distúrbios respiratórios durante o sono(3). A descoberta de novos fatores que possam ser desencadeadores do diabetes mellitus, a relação entre alteração do metabolismo da glicose e diminuição das horas de sono vem sendo atualmente, objeto de investigação.

Durante o sono, há uma série de alterações de funções cognitivas e sistêmicas, tais como a redução do débito cardíaco e da resistência vascular periférica; com conseqüente queda da pressão arterial devido à diminuição da atividade simpática, hipo e hiperventilação, hipotermia e secreção hormonal(4).

Dentre os hormônios produzidos durante o sono, destaca-se a melatonina, secretada pela glândula pineal, cuja função está relacionada à regulação do sono e por sua ação antioxidante. A leptina, também secretada durante o sono, é um hormônio que atua como moderador da saciedade, equilibrando a necessidade de ingesta e o gasto de energia(4).

Nessa direção, na privação do sono, ocorre a sua hipersecreção, o que leva a uma maior necessidade de ingestão, principalmente de carboidratos, o que pode desencadear ou agravar a obesidade. Cabe destacar que a obesidade predispõe a doenças crônico-degenerativas, tais como o diabetes mellitus(5).

Por outro lado, sabe-se que a privação do sono, também inibe a produção de insulina através da elevação dos níveis de cortisol, a longo prazo, podem induzir ao estado pré-diabético ou até mesmo ao diabetes manifesto(6).

Durante o sono, em indivíduos normais, há um equilíbrio entre a secreção de insulina e a glicose, sem presença de hipoglicemia e hiperglicemia. Por outro lado, nos diabéticos, este equilíbrio apresenta-se comprometido pela ocorrência de hipoglicemias(6).

Durante a privação do sono, foi evidenciado aumento dos níveis de glicose, decorrente da diminuição do seu metabolismo e níveis elevados de cortisol. Além de agravar o estado diabético quando ocorre aumento dos níveis glicêmicos, a privação do sono pode aumentar o risco para o desenvolvimento do diabetes(7).

Desse modo, a dificuldade em manter o padrão de sono para os diabéticos pode significar mais do que cansaço no dia seguinte, pois elas interferem no controle metabólico, na produção de glicocorticóides e da glicemia, e no aparecimento da resistência à insulina.

Os distúrbios intrínsecos do sono - apnéia do sono, insônia, movimentos periódicos das pernas; e os extrínsecos - ritmo circadiano, higiene do sono e consumo de substâncias psicoativas, foram relatados em estudos com pacientes diabéticos. Dentre os distúrbios do sono, a apnéia foi descrita com maior freqüência(8-9).

Indivíduos com apnéia foram investigados, verificando entre eles, níveis elevados de leptina, acompanhados de resistência à sua ação. Esta situação tende ao agravamento da obesidade, predisposição ao surgimento de doenças, tal como o diabetes(5).

O efeito da leptina não se restringe apenas à moderação do apetite, mas, também à ação sobre os quimiorreceptores que detectam alterações nas concentrações de oxigênio e gás carbônico. A etiologia de disfunções ventilatórias em diabéticos está também, associada a alterações nos próprios quimiorreceptores responsáveis pelo mecanismo central da respiração.

A privação do sono em diabéticos, também, está relacionada aos problemas oftamológicos. A retinopatia poderia iniciar ou agravar pela presença de hipóxia que ocorre durante as horas de sono em ambiente escuro. Nos indivíduos normais, a circulação retiniana é adequada durante o sono. Os diabéticos com retinopatia, quando expostos a níveis de luminosidade reduzidos no ambiente escuro, durante o sono, têm o suprimento de oxigênio inadequado.

Cabe-nos atentar para a fragmentação do sono causada pela nictúria e ainda que, o ato de levantar-se várias vezes no período noturno, pode ser reflexo do mau controle da glicêmico(10).

Por outro lado, cabe não considerar apenas os níveis glicêmicos elevados como parte das alterações no padrão de sono do diabético do tipo 2. A hipoglicemia noturna ocorre com freqüência em 29% a 56% dos pacientes com diabetes do tipo 1 ou tipo 2 em uso de insulina, podendo ser imperceptível ou acompanhada de manifestações que podem comprometer a qualidade do sono.

Outro distúrbio do sono intrínseco é a insônia psicofisiológica, definida como a dificuldade de iniciar ou manter o sono, e está entre os distúrbios do sono mais freqüentes, relatados pelos diabéticos.

A síndrome das pernas inquietas, como outro distúrbio intrínseco do sono, é caracterizada por sensações desconfortáveis que ocorrem, principalmente durante o período do sono. O surgimento da síndrome das pernas inquietas está relacionado à idade avançada, uremia, polineuropatia, artrite reumatóide, anemia e alteração metabólica, inclusive diabetes mellitus(11).

Dentre os distúrbios extrínsecos destaca-se aqueles relacionados aos fatores ambientais, tais como, ruídos, prática de atividades como ouvir música, fazer uma leitura, assistir televisão, fazer trabalhos manuais, entre outros, assim como a ingesta de alimentos e líquidos excessivamente no período que precede o sono, retardam o início do sono.

Os distúrbios intrínsecos e extrínsecos do sono, de certa forma, alteram a qualidade de vida do diabético e exercem um importante papel na qualidade do sono.

Ao considerar que os diabéticos possuem distúrbios extrínsecos e intrínsecos, relacionados ao sono e que este tema tem sido pouco explorado pelos enfermeiros, há a necessidade da utilização de instrumentos fidedignos e específicos que forneçam dados objetivos acerca da qualidade do sono. Estes instrumentos possibilitarão ao enfermeiro condições para traçar estratégias efetivas para a qualificação da assistência de enfermagem.

Com base na literatura referente às alterações durante o período de sono e sua relação com o desequilíbrio metabólico do diabético, faz-se necessário aprofundar a investigação acerca deste tema, a fim de oferecer bases científicas para o planejamento de enfermagem. Estudos desta natureza fornecem ferramentas para as condutas terapêuticas que envolvam a promoção do sono em diabéticos, visando à consolidação de uma assistência integral ao paciente diabético.

OBJETIVOS

Analisar a qualidade do sono em uma população de pacientes diabéticos em um Centro de Pesquisa e Extensão Universitária em uma cidade do interior paulista.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo observacional-transversal, realizado no período de 20 de maio a 20 de junho de 2005, em um Centro de Pesquisa e Extensão Universitária do Interior Paulista. A população foi constituída por 54 pacientes diabéticos- cadastrados no Programa de Atendimento Sistematizado ao Paciente Diabético, no referido Centro. Desses foram excluídos 4 pacientes que apresentaram avaliação cognitiva prejudicada identificada através do Mini Exame do Estado Mental. A amostra foi constituída por 50 pacientes diabéticos.

Para avaliar a qualidade do sono do paciente diabético, utilizou-se um questionário denominado Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh-PSQI. O Índice de Qualidade de Sono de Pittsburg-PSQI é um instrumento utilizado na mensuração da qualidade subjetiva do sono e a ocorrência de seus distúrbios. Este instrumento foi desenvolvido e validado(12), apresentando sensibilidade de 89,6% e uma especificidade de 86,5%. Ao ser traduzido e validado para o português, manteve sua alta sensibilidade de 80%. No entanto, uma especificidade ligeiramente menor de 68,8%(13).

O questionário Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh-PSQI é composto por sete componentes: o primeiro refere-se à qualidade subjetiva do sono; o segundo a latência do sono; o terceiro à duração do sono; o quarto à eficiência habitual do sono; o quinto aos distúrbios do sono, o sexto ao uso de medicação para dormir; e o sétimo à sonolência diurna e distúrbios durante o dia, contendo dez questões, sendo que as questões de um a quatro são abertas e as de cinco a dez semi-abertas.

Este instrumento vem acompanhado das instruções para pontuação para cada um de seus componentes. A pontuação máxima do instrumento é 21 pontos. Os escores superiores a cinco pontos indicam má qualidade no padrão do sono. A pontuação global é determinada pela soma dos sete componentes, cada componente recebe uma pontuação estabelecida entre zero e três pontos. Um roteiro semi-estruturado foi utilizado para obtenção dos dados referentes às variáveis sócio-demográficas (sexo, idade, estado civil, escolaridade, anos de estudo, ocupação e renda familiar) e clínicas (tempo de diagnóstico, diagnóstico de hipertensão arterial, nictúria, medicamentos utilizados, hemoglobina glicada, peso e altura).

Os dados foram coletados no referido Centro, as terças e quartas-feiras, das 13:00 às 17:00 horas, mediante entrevista, pelo próprio pesquisador em uma sala previamente preparada, garantindo conforto e a tranqüilidade do paciente para a emissão das respostas, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos sujeitos da pesquisa. Para a organização dos dados, criou-se uma base de dados no Programa Excel, os quais foram transportados posteriormente para o Programa SPSS "Statitical Package for the Social Science" (versão 13.0 for Windows). Este software modular possibilitou o processo analítico dos dados. Utilizou-se números absolutos, a porcentagem e distribuição de freqüências absolutas e medianas, de acordo com a normalidade dos dados.

RESULTADOS

A maioria dos participantes era do sexo feminino (76%), casados (52%), renda mensal de 3 salários mínimos (52%), aposentados ou do lar (88%), mediana de 4 anos de estudo. Os sujeitos encontravam-se na faixa etária entre 44 e 79 anos, com mediana de 62 anos. 38% apresentam tempo de diagnóstico de diabetes superior a dez anos, 70% são hipertensos, 36% apresentaram valores de Hemoglobina A1c maior que 7%, 72% com nictúria, 85% com IMC equivalente à obesidade e 22% usam medicação para dormir.

A seguir, apresentamos os escores totais obtidos mediante a aplicação do Índice de Qualidade do Sono PSQI, em pacientes diabéticos tipo 2 (Tabela 1).

Na Tabela 1 verifica-se que 26 (52%) dos diabéticos do tipo 2 apresentaram escores do Índice de Qualidade do Sono (PSQI) inferiores a 5, o que permite constatar que, a maioria dos diabéticos investigados encontravam-se alocados na categoria boa qualidade do sono. Para 24 (48%) os dados obtidos apontam para má qualidade do sono. Ressalta-se que os dados contidos nos distintos componentes não podem ser analisados isoladamente. É importante destacar que o conjunto de dados obtidos referentes à pontuação global do PSQI é que permite avaliar a qualidade do sono do diabético do tipo 2.

Quanto à qualidade do sono 30% dos diabéticos apresentam qualidade do sono prejudicada. Quanto à latência do sono, obteve-se que 62% dos diabéticos do tipo 2 demoraram menos de 15 minutos para dormir; 16% de 16 a 30 minutos; 12% de 31 a 60 minutos; e 10% mais de 60 minutos. No que se refere a duração do sono obteve-se que 38% dos diabéticos do tipo 2 referiram dormir mais de sete horas por noite, 22% dormiram de seis a sete horas; 18% de cinco a seis horas, e 22% menos de 5 horas por noite. Quanto a eficiência habitual do sono obteve-se que 6% apresentaram eficiência do sono superior a 85%; 22% de 75 a 84%; 28% de 65 a 74% e 44% inferior a 65%.. Os distúrbios mais freqüentes foram: nictúria, tosse ou ronco alto, dificuldade para respirar, calor, frio e dor. Quanto ao uso de medicamento obteve-se que a maioria não utiliza medicamentos para dormir. No que ser refere a sonolência diurna e distúrbios durante o dia, também a maioria não referiu problemas dessa natureza.

Ao analisar os escores do PSQI e o tempo de diagnóstico obteve-se que a qualidade do sono mostrou-se mais comprometida para os diabéticos do tipo 2 com tempo de diagnóstico maior que 10 anos. É sabido que as manifestações das complicações do diabetes tornam-se mais freqüentes à medida que se ultrapassam os dez primeiros anos de diagnóstico (Tabela 2).

Em relação aos escores de PSQI e os valores da hemoglobina A1c obteve-se que 33% dos diabéticos do tipo 2 com Hb A1c maior que 7%, apresentaram alterações da qualidade do sono, ou seja má qualidade do sono (Tabela 3).

Cabe destacar que ao analisar o IMC e os escores do PSQI verificou-se que 47,6% dos diabéticos obesos, estiveram alocados na categoria má qualidade do sono. Observou-se também que os pacientes diabéticos com tempo de diagnóstico superior há 10 anos e com hipertensão possuíam pior qualidade do sono.

DISCUSSÃO

A classificação da qualidade do sono, advinda das respostas dos diabéticos do tipo 2, se faz importante principalmente porque muitos deles podem acreditar que possuem uma qualidade do sono muito boa e, no entanto, não a possuem. A qualidade do sono do diabético do tipo 2, nesse estudo, foi avaliada em conjunto às informações de todos os outros componentes. Sendo assim a opinião expressa por ele, em relação à qualidade do seu sono nem sempre será correspondente a um escore global do PSQI que indique boa qualidade do sono.

Quanto à latência do sono, ou seja, dificuldades em iniciar o sono ou aquelas relacionadas à continuidade do sono, estão relacionadas às situações que os indivíduos enfrentam devido a estado de tensão e ansiedade no seu cotidiano. Em particular para os diabéticos do tipo 2, essas dificuldades podem comprometer o seu controle metabólico, pois é durante o ciclo de sono que os hormônios que desempenham papéis vitais no funcionamento do nosso organismo, são produzidos(4).

Quanto à duração do sono um adulto necessita de sete horas de sono, e esse número tende a reduzir com o processo de envelhecimento. Cabe ressaltar que o número de horas que são necessárias para proporcionar descanso varia de um indivíduo para outro, muitas vezes pode sentir-se descansado após um reduzido número de horas de sono(14). Ao considerar que 60% dos diabéticos do tipo 2, nesse estudo, são idosos, os dados encontrados podem refletir a necessidade de sono relacionada ao processo de envelhecimento e à própria alteração da estrutura intrínseca do sono nesta fase do ciclo vital.

No que se refere à eficiência habitual do sono 44% dos diabéticos do tipo 2 apresentaram eficiência habitual do sono inferior a 65%. Este dado é preocupante, pois o sono é uma necessidade fisiológica primordial para uma vida saudável e possibilita a restauração física do organismo.

Além das alterações hormonais que ocorrem quando o organismo é submetido a um padrão de sono irregular, podem ocorrer em curto prazo, irritabilidade, redução da capacidade de planejar e executar tarefas, alterações do humor e dificuldade de concentração, e em longo prazo, envelhecimento precoce, doenças cardiovasculares e gastrintestinais, obesidade e diabetes mellitus(6).

Ao considerar que 66% dos diabéticos do tipo 2 apresentaram problemas para dormir, relacionados a acordar durante a noite ou de manhã muito cedo, infere-se que nesses pacientes a eficiência habitual do sono pode estar comprometida. No entanto, outros estudos precisam ser realizados, para estabelecer esta relação.

A nictúria exerce um importante papel quando da manifestação clínica do mau controle metabólico. Essa situação leva o diabético ao risco de desidratação, devido à diurese osmótica. Além dessa complicação, também, episódios de nictúria podem ocasionar freqüentes despertares, o que interfere na qualidade, latência, duração e eficiência habitual do sono(15).

A investigação da presença de tosse, ronco alto ou dificuldade para respirar, está relacionada à manifestação da apnéia do sono. Durante o episódio de apnéia no período de sono, há obstrução da passagem de ar na traquéia, com produção de vários sons que caracterizam os roncos. Na maioria das vezes não é percebida pelo indivíduo que a apresenta, podendo ser detectada, claramente pelo companheiro de quarto(16).

Por outro lado, sabe-se que durante a apnéia há hipóxia e consequentemente, poderá desenvolver intolerância à glicose, com comprometimento de funções metabólicas(17). Desse modo, recomenda-se que outros estudos descrevam detalhadamente os distúrbios do sono, a fim de estabelecer o diagnóstico de apnéia do sono para o diabético do tipo 2 que apresente problemas para dormir relacionados a episódios de tosse, ronco alto e dificuldades respiratórias.

Os medicamentos utilizados no tratamento dos distúrbios do sono provocam distorções no padrão de sono, pois podem deprimir ou reduzir a resposta do córtex cerebral aos estímulos e produzir estado de vigilância, ansiedade e depressão. A maioria dos indutores do sono deprime o sono REM, de modo que o indivíduo tenha um ciclo de sono alterado(15).

Também é preciso considerar que durante o tratamento dos distúrbios do sono, esse nem sempre é acompanhado pelo médico, quanto ao tipo de medicamento, dose e horário da administração. Por outro lado, quando o tratamento é indicado pelo médico, percebe-se pouca adesão por parte do paciente à terapêutica medicamentosa. Essas situações podem comprometer a qualidade do sono, constituindo-se um efeito adverso.

A utilização de medicamentos para melhorar o padrão de sono em diabéticos pode provocar mais problemas do que benefícios. Nesta direção, cabe lembrar que diabéticos idosos, geralmente, tomam diversos medicamentos para controlar o diabetes, dislipidemias, hipertensão arterial, entre outros, podendo os efeitos combinados de vários medicamentos comprometer o seu padrão de sono. Portanto todos os tipos de medicamentos utilizados pelos pacientes diabéticos devem ser utilizados criteriosamente e acompanhados pelo médico(18-20).

Cabe destacar que, a sonolência diurna excessiva é a queixa mais comum associada aos distúrbios do sono. Esta sonolência diurna pode ser confundida com preguiça, falta de interesse nas atividades ou embriaguez(15).

Por outro lado, em diabéticos, ela pode denotar problemas relacionados aos sinais e sintomas da descompensação metabólica, devido ao despertar freqüente noturno pela nictúria; dor; formigamento nos membros inferiores, sudorese, palpitação, entre outros.

No entanto, atualmente, a caracterização dos episódios de cochilo e até mesmo a interrupção no sono noturno, parecem constituir o padrão aceito como típico do ciclo vigília/sono, mas há ainda controvérsias. Estudo experimental mostrou que a privação do sono pode desencadear intolerância à glicose. Distúrbios do sono são referidos como resultados do efeito deletério do diabetes mellitus no mecanismo central de controle da respiração, por tanto, mostrando que o diabetes mellitus pode ser causa ou efeito dos distúrbios do sono(3). Porém, não pudemos afirmar que valores de hemoglobina glicada superiores a 7% comprometeram a qualidade do sono, uma vez que a maioria (66,7%) dos diabéticos do tipo 2 que apresentaram valores de H1Ac >7% encontravam-se alocados na categoria qualidade do sono boa.

CONCLUSÃO

O escore global do PSQI mostrou que 48% do pacientes diabéticos do tipo 2 foram alocados na categoria má qualidade do sono. Conclui-se que a utilização do PSQI, como ferramenta para obtenção de dados acerca da qualidade do sono do diabético do tipo 2, permite a ampliação das informações durante a coleta de dados com vistas a traçar intervenções de enfermagem com base em evidências científicas. Os achados dessa investigação reforçam a relevância da temática, pois não existem instrumentos específicos para a avaliação do sono de pessoas com diabetes. Por outro lado os resultados permitem que o enfermeiro amplie o seu conhecimento acerca dos fatores que dificultam o padrão do sono na busca de intervenções efetivas de enfermagem para melhorar o padrão de sono do diabético.

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  • Sleep quality in type 2 diabetics

    Maria Carolina Belo da CunhaI; Maria Lúcia ZanettiII; Vanderlei José HassIII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Out 2008

    Histórico

    • Recebido
      24 Jan 2007
    • Aceito
      10 Fev 2008
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