Acessibilidade / Reportar erro

Estudo das representações sociais sobre gestação em mulheres bolivianas no contexto da atenção básica em saúde na área central da cidade de São Paulo

Study on social representations of pregnancy in bolivian women in the context of primary health care in the central area of the city of São Paulo

Resumos

O processo imigratório dos bolivianos para o Brasil vem trazendo muitos questionamentos e necessidades de intervenção pelos serviços de saúde na cidade de São Paulo. As barreiras impostas pela cultura boliviana (como a linguagem) e o receio que os bolivianos têm pela situação de ilegalidade no país colocam aos serviços obstáculos no acesso à população. O objetivo dessa pesquisa é a compreensão das concepções das mulheres imigrantes bolivianas - que frequentam o Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" (CSEBF), na região central de São Paulo - sobre gestação, nos contextos: familiar, de adaptação como imigrantes e de espaço de construção da vida pessoal. Realizou-se uma análise qualitativa de entrevistas que incluíram mulheres bolivianas gestantes maiores de 18 anos, matriculadas no CSEBF. Foram realizadas algumas visitas domiciliares junto às agentes comunitárias. Como resultado, obteve-se que as bolivianas praticam endogamia e seus parceiros são fixos. Na Bolívia, não procuravam o serviço de saúde. Notou-se um paradoxo no que diz respeito à gravidez e ao trabalho, pois dizem ter planejado a primeira gestação, embora concordem que o trabalho - principal motivo da imigração - seja prejudicado pela gestação, parto e maternidade. Quanto à prática de parto, as bolivianas desejam e acreditam que o parto normal seja melhor que a cesárea, o que diverge do posicionamento comum das mulheres brasileiras. Este estudo poderá contribuir com conhecimentos sobre as concepções de saúde, particularmente sobre a gravidez, e acredita-se que as práticas dos serviços possam ser melhoradas, ampliando-se a capacidade de organização para receber imigrantes bolivianos.

Representações sociais; Imigrantes bolivianas; Saúde da mulher; Gestação; Parto


The process of Bolivian immigration to Brazil has been bringing questions and the necessity of intervention through the Health Services in the city of São Paulo. The barriers that come with the Bolivian culture (like the language) and their fear due to their illegal situation in Brazil bring to the Services some obstacles to access this population. The objective of the study is to understand the pregnancy conceptions of the Bolivian immigrant women who attend Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" (CSEBF), in the following contexts: family, adaptation as immigrants, and space of construction of their personal life. The researchers performed a qualitative analysis of the interviews they conducted with Bolivian pregnant women older than 18 years old, enrolled at CSEBF. Some home visits were made in the company of a community-based health agent. Results showed that Bolivian women practice endogamy and monogamy. In Bolivia they never looked for a Health Service like CSEBF. A paradox was noticed when it comes to pregnancy and work, as they say they planned their first child although they agree that work - the main reason to come to Brazil - is negatively affected by pregnancy, childbirth and maternity. About childbirth practices, the Bolivian women wish and believe that natural childbirth is better than caesarean delivery, diverging from the Brazilian women's most common position. This study can contribute with knowledge about the Bolivian women's health conceptions, especially about pregnancy, so that the Health Service's actions, mainly in primary care, can be improved, increasing the organization capacity for receiving Bolivian immigrants.

Social Representations; Bolivian Immigrant Women; Women's Health; Pregnancy; Childbirth


PARTE III - TRABALHOS PREMIADOS NO X CONGRESSO PAULISTA DE SAÚDE PÚBLICA

RELATOS DE PESQUISA

Estudo das representações sociais sobre gestação em mulheres bolivianas no contexto da atenção básica em saúde na área central da cidade de São Paulo1 1 Trabalho de pesquisa desenvolvido com apoio do Programa de Iniciação Científica (PIBIC-CNPq), ano de 2007.

Study on social representations of pregnancy in bolivian women in the context of primary health care in the central area of the city of São Paulo

Maria Carolina C. MadiI; Ana Carolina CassantiII; Cássio SilveiraIII

IAcadêmica do Curso de Medicina, FCMSCSP. Av. Angélica, 1761, conjunto 111, Consolação, CEP 01227-200, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: carolinamadi@yahoo.com.br

IIAcadêmica do Curso de Medicina, FCMSCSP. Av. Paissanguaba, 1390, apto 122, Planalto Paulista, CEP 04060-002, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: anacarolcassanti@yahoo.com.br

IIIDoutor em Saúde Pública. Professor-Assistente da FCMSCSP e Unifesp. Endreço: Rua Cesário Mota Junior, 61, 5o andar, Vila Buarque, CEP 01221-020, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: cassio.silveira@fcmscsp.edu.br

RESUMO

O processo imigratório dos bolivianos para o Brasil vem trazendo muitos questionamentos e necessidades de intervenção pelos serviços de saúde na cidade de São Paulo. As barreiras impostas pela cultura boliviana (como a linguagem) e o receio que os bolivianos têm pela situação de ilegalidade no país colocam aos serviços obstáculos no acesso à população. O objetivo dessa pesquisa é a compreensão das concepções das mulheres imigrantes bolivianas - que frequentam o Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" (CSEBF), na região central de São Paulo - sobre gestação, nos contextos: familiar, de adaptação como imigrantes e de espaço de construção da vida pessoal. Realizou-se uma análise qualitativa de entrevistas que incluíram mulheres bolivianas gestantes maiores de 18 anos, matriculadas no CSEBF. Foram realizadas algumas visitas domiciliares junto às agentes comunitárias. Como resultado, obteve-se que as bolivianas praticam endogamia e seus parceiros são fixos. Na Bolívia, não procuravam o serviço de saúde. Notou-se um paradoxo no que diz respeito à gravidez e ao trabalho, pois dizem ter planejado a primeira gestação, embora concordem que o trabalho - principal motivo da imigração - seja prejudicado pela gestação, parto e maternidade. Quanto à prática de parto, as bolivianas desejam e acreditam que o parto normal seja melhor que a cesárea, o que diverge do posicionamento comum das mulheres brasileiras. Este estudo poderá contribuir com conhecimentos sobre as concepções de saúde, particularmente sobre a gravidez, e acredita-se que as práticas dos serviços possam ser melhoradas, ampliando-se a capacidade de organização para receber imigrantes bolivianos.

Palavras-chave: Representações sociais; Imigrantes bolivianas; Saúde da mulher; Gestação; Parto.

ABSTRACT

The process of Bolivian immigration to Brazil has been bringing questions and the necessity of intervention through the Health Services in the city of São Paulo. The barriers that come with the Bolivian culture (like the language) and their fear due to their illegal situation in Brazil bring to the Services some obstacles to access this population. The objective of the study is to understand the pregnancy conceptions of the Bolivian immigrant women who attend Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" (CSEBF), in the following contexts: family, adaptation as immigrants, and space of construction of their personal life. The researchers performed a qualitative analysis of the interviews they conducted with Bolivian pregnant women older than 18 years old, enrolled at CSEBF. Some home visits were made in the company of a community-based health agent. Results showed that Bolivian women practice endogamy and monogamy. In Bolivia they never looked for a Health Service like CSEBF. A paradox was noticed when it comes to pregnancy and work, as they say they planned their first child although they agree that work - the main reason to come to Brazil - is negatively affected by pregnancy, childbirth and maternity. About childbirth practices, the Bolivian women wish and believe that natural childbirth is better than caesarean delivery, diverging from the Brazilian women's most common position. This study can contribute with knowledge about the Bolivian women's health conceptions, especially about pregnancy, so that the Health Service's actions, mainly in primary care, can be improved, increasing the organization capacity for receiving Bolivian immigrants.

Keywords: Social Representations; Bolivian Immigrant Women; Women's Health; Pregnancy; Childbirth.

Introdução

O processo imigratório dos bolivianos para o Brasil tem trazido uma série de questionamentos e necessidades de intervenção por parte dos serviços de saúde na cidade de São Paulo. Muito particularmente, a gravidez nas mulheres bolivianas tem constituído um importante objeto de atenção dos serviços de saúde, pois, nos últimos anos, tornou-se uma preocupação constante dos serviços de saúde nessa região. Aspectos socioeconômicos do trabalho, vida doméstica, vida conjugal, situação jurídica instável de permanência no país e dificuldades decorrentes da ausência de acesso livre e desimpedido aos serviços públicos de saúde somam-se às barreiras impostas pelas diferenças culturais que delimitam as concepções sobre o processo saúde-doença, as práticas em saúde no ambiente doméstico e, particularmente, no tocante à saúde reprodutiva e às concepções sobre o desenvolvimento do processo de gravidez.

As barreiras impostas pela cultura trazem uma série de dificuldades, tais como a linguagem de origem das bolivianas, o acesso dos agentes comunitários de saúde ao ambiente doméstico - que normalmente também constitui o ambiente de execução das suas atividades de trabalho, e o receio que elas normalmente têm de manter contato com os serviços públicos de saúde em decorrência da situação de ilegalidade no país (Levy e col., 2005).

Segundo Helman (1994), a "parte da vigilância contínua da saúde da comunidade envolve uma consciência do papel das crenças e dos comportamentos culturais nas melhorias de saúde ou na causa da doença", desse modo, torna-se importante entender e conhecer elementos da cultura dessas mulheres para se estabelecer políticas adequadas tanto na situação da atenção básica de promoção e prevenção de saúde, quanto na situação de doença. Situação econômica, estrutura familiar, papéis de gênero, padrões de contracepção, gravidez, práticas de parto e condições de moradia são exemplos dos aspectos culturais que envolvem o debate sobre o processo saúde-doença.

Segundo Paim (1998), os fenômenos biológicos são sempre vivenciados mediante um universo cultural particular. Tal afirmação permite construir um conjunto de questionamentos acerca da situação em que vivem as imigrantes bolivianas e, tendo por base o contexto sociocultural de experiência de vida, verificar quais comportamentos foram adotados e os problemas sofridos.

Nos grupos populares, reconhecidos como aqueles que possuem baixos níveis de renda e de escolaridade, a experiência da maternidade é o que garante o ser mulher no sentido pleno da palavra, experiência identificada pela especificidade do corpo feminino e a determinação de seu posicionamento, status e função na sociedade (Paim, 1998). A fragilidade vivida durante a gravidez pode ter sua expressão maior na condição de submissão, frequentemente encontrada no ambiente familiar e de trabalho (Citeli e col., 1998).

Objetivos

Caracterização do perfil demográfico e de condições de vida das imigrantes bolivianas grávidas e/ou que já tiveram filhos, que frequentam o Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" (CSEBF) - uma unidade de saúde pública, no nível da atenção primária, responsável por ações médico-sanitárias à população de sua área de abrangência, articulada ao restante da rede pública de serviços de saúde por meio das seguintes variáveis: nível de escolaridade, descrição da estrutura familiar, descrição do tipo de moradia e do espaço de trabalho, descrição do trabalho realizado no espaço doméstico.

Levantamento das concepções sobre gestação em mulheres bolivianas no contexto da atenção básica em saúde, tendo em vista os seguintes aspectos: identificar conhecimentos sobre concepção biológica, período gestacional, parto e métodos contraceptivos; relacionar com possíveis transformações decorrentes da gravidez na vida pessoal e no trabalho.

Métodos

O universo populacional da pesquisa ficou circunscrito às mulheres imigrantes bolivianas, em idade fértil, que estivessem grávidas quando da realização da pesquisa (podendo ou não ser sua primeira gestação), matriculadas no CSEBF. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, com roteiro pré-estabelecido aplicado individualmente para levantamento e registro dos discursos das mulheres. As entrevistas foram gravadas em aparelhos de áudio (digital) e transcritas para leitura e análise. Os critérios de inclusão na pesquisa foram os seguintes: mulheres em idade fértil a partir dos 18 anos de idade que estivessem grávidas no momento da pesquisa.

Das entrevistas, quatro foram realizadas no CSEBF. A tranquilidade e a liberdade de expressão das gestantes, neste caso, garantiram entrevistas mais prolongadas e mais ricas em informações. As entrevistas aplicadas em domicílio, com agenda previamente estabelecida e acompanhamento da agente comunitária, foram conturbadas pela presença de animais domésticos, outros moradores da casa e condições precárias do ambiente físico. Além disso, o tempo de trabalho perdido pelas imigrantes bolivianas foi um fator impeditivo de entrevistas mais prolongadas.

Resultados

Quanto à cidade de origem das gestantes bolivianas entrevistadas: cinco eram de La Paz, uma de Oruro e uma de Sucre. Distritos administrativos atuais de domicílio: quatro bolivianas na Barra Funda, duas na Luz e uma no Bom Retiro. Em relação à orientação religiosa, seis disseram ser católicas e uma, apesar de não ter se declarado católica, disse acreditar em Deus. Quanto à formação escolar dessas mulheres, seis disseram ter estudado até o Ensino Médio (completo ou incompleto) e uma estudou até o final do Ensino Fundamental. Houve um caso de ensino profissionalizante.

As idades das gestantes entrevistadas variaram entre 18 e 29 anos. As entrevistadas relacionam-se com companheiros adultos jovens (com variação etária entre 20 e 39 anos). Observou-se que se relacionam tanto com homens mais novos, quanto com aqueles mais velhos do que elas. Todas as mulheres entrevistadas afirmaram ter uma relação estável com seu parceiro, independentemente de seu estado civil. Quando questionadas sobre a nacionalidade de seus parceiros, notou-se uma característica de endogamia, ou seja, os parceiros são sempre de origem boliviana, mesmo que o casal tenha se conhecido no Brasil. É também comum que tenham poucos parceiros durante a vida.

O motivo da imigração está associado à busca por trabalho no Brasil. Essas mulheres não imigraram para acompanhar seus parceiros, pelo contrário, imigraram na companhia de familiares bolivianos (irmãos, tios ou filhos).

Com relação à percepção sobre casamento, as gestantes responderam, em geral, que consideram o casamento uma "parceria para a vida", "uma tarefa muito importante" e o associam a uma condição para a construção de uma família.

Os conhecimentos das gestantes bolivianas sobre contracepção estão expostos no quadro apresentado a seguir:

Com relação à pergunta sobre os conhecimentos acerca de menstruação, todas as entrevistadas disseram entender o processo biológico da menstruação. Duas mulheres disseram ter controle sobre o próprio ciclo menstrual, porém as demais disseram não ter controle algum sobre isso. No que diz respeito aos conhecimentos sobre gravidez, apenas uma entrevistada disse não entender como se fica grávida. As demais disseram entender que a gravidez surge a partir de uma relação sexual durante os dias férteis. Os conhecimentos sobre contracepção, menstruação e gravidez foram adquiridos por algumas gestantes nas instituições escolares pelas quais passaram. Outras adquiriram também na família. Somente uma indicou ter participado de grupo de planejamento familiar na Bolívia.

Em relação ao planejamento da gestação, observou-se que a primeira gestação em todas as entrevistas foi desejada, sendo que apenas duas mulheres tiveram seu primeiro filho na Bolívia, e as demais no Brasil. A atual gestação para aquelas que já eram mães não foi planejada. Tal fato pode estar relacionado à busca pela legalização da cidadania brasileira, uma vez que, ao terem um filho nascido e registrado no Brasil, há mais garantias da conquista da cidadania.

Os parceiros, para algumas delas, tornaram-se mais cuidadosos e carinhosos durante a gravidez; outras responderam que os mesmos ficaram mais nervosos. Os demais filhos passaram a ajudar mais a mãe.

A situação de trabalho dessas mulheres é muito restrita, uma vez que exercem funções apenas relacionadas à costura ou à cozinha da oficina de confecções. O ambiente de trabalho é o mesmo ambiente que o residencial. Todas as gestantes entrevistadas referiram ter um trabalho atual, apesar de algumas estarem afastadas pela condição da gravidez. Questionou-se se elas gostavam da ocupação atual e todas responderam positivamente. No entanto, o trabalho pode ser uma condição desfavorável ao bem-estar da gestante e por esse motivo algumas se afastam momentaneamente de suas atividades ou passam a trabalhar em outra função menos exaustiva. Por exemplo, passaram a trabalhar na cozinha em detrimento do trabalho com a costura, pois são menos horas de trabalho intercaladas com momentos de descanso entre as refeições.

Em relação ao parto, o parto normal ganhou destaque na expressão das mulheres: "É melhor ter parto normal. A mulher já não pode ser mais a mesma". Tal frase foi repetida diversas vezes durante as entrevistas e traduz um pensamento praticamente universal desse grupo de mulheres. De fato, para elas, o parto normal é uma prática menos prejudicial à saúde da mulher, que deve retomar rapidamente suas atividades diárias após o parto, dentre elas o trabalho, além de haver menores complicações no processo de cicatrização quando se compara com a cesárea. Por fim, outra ideia presente nos discursos das entrevistadas foi a de que "porque a mulher tenha tido cesárea já não se sente mais tranquila como antes, ou seja, perde muito de sua força por causa da cesárea". O planejamento com relação ao tipo de parto apontou para uma resposta comum a todas as entrevistadas "Sim, que seja normal". E, segundo elas, seus parceiros pensam da mesma maneira.

Sobre suas dificuldades em relação ao trabalho relataram: "É difícil trabalhar e atender às crianças". O tempo de retorno ao trabalho após o parto é muito curto, varia de uma semana a dois meses.

Conclusão

No âmbito da imigração as diferenças culturais tornam-se um impasse. "A cultura de um grupo étnico no contexto imigratório não se perde ou se funde simplesmente, mas sim tende a simplificar-se e a concentrar-se em alguns traços que se tornam diacríticos para um grupo. A língua é um deles, pois, como sistema simbólico capaz de organizar a percepção do mundo, constitui-se num diferenciador por excelência" (Cunha, 1986). Tal fato revelou-se significante no momento em que as pesquisadoras, antes de iniciarem as entrevistas, perguntavam sobre a preferência do idioma a ser utilizado no decorrer da conversa: as gestantes escolhiam o espanhol.

Notou-se um paradoxo no que diz respeito à gravidez em relação ao trabalho: as entrevistadas dizem ter planejado a primeira gestação, embora concordem que o trabalho é prejudicado pela gestação, pelo parto e pela maternidade. O planejamento sobre os demais filhos é divergente dessa primeira constatação pelo fato de alegarem não planejar as demais gestações, embora estas tenham sido inevitáveis por não utilizarem métodos contraceptivos, por escassez de informação ou mesmo por falta de acesso a esses meios. O trabalho excessivo é determinante na deterioração da saúde dessas mulheres. Além disso, as cargas físicas e emocionais dos afazeres domésticos não são poupadas durante a gestação, exceto no terceiro trimestre de gravidez, quando essas atividades tornam-se mais brandas porque as mulheres começam a relatar lombalgias e fadiga muscular decorrentes dessas atividades desgastantes.

A questão da prática de parto diverge de um posicionamento mais comum à medicina e prática de parto das mulheres brasileiras: enquanto as bolivianas desejam e acreditam que o parto normal seja melhor que o parto cesárea, uma vez que a recuperação é mais rápida e o comprometimento de sua saúde é menor, as brasileiras optam pelo parto cesárea (Potter, 2001). Quanto aos cuidados de alimentação na gravidez e os de rotina com o bebê, não houve relatos de rituais específicos da cultura boliviana.

Os relatos do próprio CSEBF sobre os maus tratos sofridos pelas mulheres bolivianas no ambiente de trabalho e familiar não puderam ser confirmados a partir das entrevistas realizadas, o que não exclui a possibilidade de que outras gestantes bolivianas sofram de violência, o que demanda uma investigação diferenciada e mais aprofundada sobre isso.

  • CITELI, M. T. et al. Reveses da anticoncepção entre mulheres pobres. In: DUARTE, L. F.; LEAL, O. F. Doença, sofrimento, perturbação: perspectivas etnográficas. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1998. p. 57-80.
  • CUNHA, M. C. Antropologia do Brasil São Paulo: Brasiliense/EDUSP, 1986. p. 99-100.
  • HELMAN, C. G. Cultura, saúde e doença Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
  • LEVY, D. et al. Estudo sobre o perfil das mulheres bolivianas no Centro de Saúde Escola Barra Funda "Dr. Alexandre Vranjac" 2005. Monografia (Graduação em Curso). São Paulo: Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 2005.
  • PAIM, H. H. F. Marcas no corpo: gravidez e maternidade em grupos populares. In: DUARTE, L. F.; LEAL, O. F. Doença, sofrimento, perturbação: perspectivas etnográficas. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1998. p. 31-48.
  • POTTER, J. E. et al. Unwanted caesarean sections among public and private patients in Brazil: prospective study British Medical Journal, Londres, v. 323, n. 7322, p. 1155-8, nov. 2001.
  • 1
    Trabalho de pesquisa desenvolvido com apoio do Programa de Iniciação Científica (PIBIC-CNPq), ano de 2007.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009
    Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. Av. dr. Arnaldo, 715, Prédio da Biblioteca, 2º andar sala 2, 01246-904 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: +55 11 3061-7880 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: saudesoc@usp.br