Acessibilidade / Reportar erro

O retorno ao trabalho de mulheres após a experiência do câncer de mama: uma metassíntese

Women’s return to work after experiencing breast cancer: a metasynthesis

Resumo

Introdução:

o câncer de mama (CM) é a neoplasia mais comum em mulheres no mundo e o número de casos vem aumentando na população economicamente ativa. Por isso, o retorno ao trabalho após CM tem despertado interesse da comunidade científica.

Objetivo:

sistematizar e sintetizar os estudos qualitativos que abordam a experiência do retorno ao trabalho após o CM.

Métodos:

metassíntese qualitativa com busca dos estudos primários nas bases ASSIA, BIREME, CINAHL, Embase, PsycInfo, SciELO, Scopus e Web of Science. Foram localizados 779 artigos, dos quais, nove atenderam aos critérios de seleção.

Resultados:

seis conceitos de segunda ordem foram gerados: os efeitos da doença na reabilitação; questões financeiras; medo de recidivas; apoio da família, amigos e profissionais de saúde; e mudanças do significado do trabalho após CM.

Conclusão:

o retorno ao trabalho não deve se limitar aos aspectos relacionados aos obstáculos e facilitadores da reabilitação Os “mundos da vida” evidenciados nos fatores contextuais mais abrangentes revelam que o enfrentamento do retorno ao trabalho implica no aprimoramento do suporte às trabalhadoras no ambiente de trabalho, na vida familiar, na relação com os sistemas de saúde e seguridade social e na esfera individual, a fim de prevenir aposentadorias precoces e incapacidade prolongada.

Palavras-chave:
metassíntese; retorno ao trabalho; câncer de mama; mulheres trabalhadoras; saúde do trabalhador

Abstract

Introduction:

breast cancer (BC) is the most common cancer in women worldwide and the number of cases has increased among the economically active population. Therefore, issues related to returning to work after BC has aroused the interest of the scientific community.

Objective:

To systematize and synthesize qualitative studies that address the experience of returning to work after BC.

Methods:

qualitative meta-synthesis with search for primary studies in ASSIA, BIREME, CINAHL, Embase, PsycInfo, SciELO, Scopus and Web of Science databases. The total of 779 articles were found, of which only nine met the inclusion criteria.

Results:

six second-order concepts were generated: the effects of the disease on rehabilitation; financial problems; fear of recurrences; support from family, friends and health professionals; and changes in the meaning of work after BC.

Conclusion:

the return to work should not be limited to aspects related to obstacles and facilitators of rehabilitation. The “worlds of life” shown in the broader contextual factors reveal that facing the return to work implies improving support for workers in the work environment, in family life, in the relationship with the health and social security systems and in the individual sphere, to prevent early retirements and prolonged disability.

Keywords:
metasynthesis; return to work; breast cancer; working women; occupational health

Introdução

O câncer de mama (CM) é a neoplasia que possui a maior incidência na população feminina mundial. Em 2012, ele representou 25% de todos os tipos de câncer diagnosticados nas mulheres e 15% de todas as mortes por câncer em mulheres no planeta11. Jemal A, Vineis P, Bray F, Torre L, Forman D, editores. The cancer atlas [Internet]. 2a ed. Atlanta: American Cancer Society; 2014 [citado em 3 jun 2020]. Disponível em: www.cancer.org/canceratlas.
www.cancer.org/canceratlas...
),(22. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2018: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro; 2017.. No Brasil, estimou-se para cada ano do biênio 2018-2019, 59.700 casos novos de CM, com um risco estimado de 56,33 casos a cada 100 mil mulheres22. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2018: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro; 2017..

O diagnóstico precoce, as tecnologias relacionadas ao tratamento e as mobilizações sociais no enfrentamento da doença são algumas das mudanças na abordagem do CM das três últimas décadas33. Verbeek J, Spelten E. Work. In: Feuerstein M, editor. Handbook of cancer survivorship. New York: Springer International Publishing; 2007. p. 381-96..

As transformações vivenciadas pelas “sobreviventes do câncer de mama” (nomenclatura dada pela literatura especializada para mulheres que resistem ao tratamento da doença44. Sandberg JC, Strom C, Arcury TA. Strategies used by breast cancer survivors to address work-related limitations during and after treatment. Womens Health Issues. 2014;24(2):197-204.), têm sido investigadas, principalmente, no que se refere à experiência de se afastar do trabalho e, posteriormente, retornar às atividades laborativas55. Mehnert A. Employment and work-related issues in cancer survivors. Crit Rev Oncol Hematol. 2011;77(2):109-30.. Nesse sentido, o retorno ao trabalho (RT) tem se configurado como um objeto importante, pois, o voltar a ser produtiva tem um valor simbólico que se contrapõe ao rótulo de incapacidade conferido pelas condições crônicas de saúde em geral. Mais que isso, representa também inclusão social66. Pransky G, Gatchel R, Linton SJ, Loisel P. Improving return to work research. J Occup Rehabil. 2005;15(4):453-7..

Por outro lado, ainda são insuficientes os conhecimentos sobre os facilitadores e obstáculos enfrentados por trabalhadoras que se afastam devido ao CM e posteriormente voltam a trabalhar77. Banning M. Employment and breast cancer: a meta-ethnography. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):708-19.. Isso porque o RT precisa ser investigado para além de seus resultados exitosos ou não, medidos por: intensidade da dor, capacidade física, capacidade psíquica, permanência no emprego com limitações e estresse no ambiente laboral88. Wells M, Williams B, Firnigl D, Lang H, Coyle J, Kroll T, et al. Supporting "work-related goals" rather than "return to work" after cancer? A systematic review and meta-synthesis of 25 qualitative studies. Psychooncology. 2013;22(6):1208-19..

Sabe-se que mudanças na carga horária semanal, realização de outras tarefas ou redução de atividades físicas ou mentais, o auxílio dos colegas e gestores e as alterações estruturais e organizacionais no ambiente de trabalho têm sido estratégias utilizadas pelas sobreviventes do CM para gerenciar as limitações no RT44. Sandberg JC, Strom C, Arcury TA. Strategies used by breast cancer survivors to address work-related limitations during and after treatment. Womens Health Issues. 2014;24(2):197-204.. No entanto, questões referentes ao retorno ao trabalho dependem de uma interação complexa de fatores individuais e ambientais99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54. que também precisam ser melhor compreendidas para apoiar as trabalhadoras com CM na sua retomada das atividades laborais1010. Loisel P, Buchbinder R, Hazard R, Keller R, Scheel I, van Tulder M, et al. Prevention of work disability due to musculoskeletal disorders: the challenge of implementing evidence. J Occup Rehabil. 2005;15(4):507-24..

Este trabalho tem como objetivo sistematizar e sintetizar os estudos qualitativos que abordam a experiência do RT após o CM e compreender os elementos, tidos como facilitadores ou obstáculos, presentes nesse processo.

Métodos

Adotou-se o modelo de Young et al.1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68., que toma o RT como processo, para orientar esta pesquisa. Destarte, quando do retorno ao contexto laboral, o trabalhador deveriam passar por fases não lineares que incluiriam o enfrentamento da lesão ou doença crônica fora do trabalho (off work), a reentrada propriamente dita com estabelecimento de metas acordadas entre empregado e empregador (re-entry), a manutenção do empregado no ambiente de trabalho (maintenance) e o progresso no trabalho incluindo o avanço na carreira até a sua aposentadoria no tempo certo (advancement). Esse processo reforça a suposição de que as experiências de quem se afastou do trabalho por causa do CM podem revelar aspectos específicos a depender da fase em que a pessoa se encontre no RT.

O desenho de estudo utilizado neste trabalho foi a metassíntese qualitativa. Trata-se de uma abordagem metodológica onde pesquisas qualitativas empíricas têm seus achados comparados e sintetizados a fim de produzir uma nova síntese sobre determinado tema1212. Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90.),(1313. Thorne S, Jensen L, Kearney MH, Noblit G, Sandelowski M. Qualitative metasynthesis: reflections on methodological orientation and ideological agenda. Qual Health Res. 2004;14(10):1342-65.. Esta metodologia permite a clarificação de conceitos, pois resulta num refinamento do estado do conhecimento, tendo o potencial de aprimorar saberes além de fornecer informações que subsidiarão novas pesquisas e a agenda de debates sobre determinados temas de interesse público1414. Stergiou-Kita M, Grigorovich A, Tseung V, Milosevic E, Hebert D, Phan S, et al. Qualitative meta-synthesis of survivors' work experiences and the development of strategies to facilitate return to work. J Cancer Surviv. 2014;8(4):657-70..

Estratégia de pesquisa e critérios de inclusão

A busca dos estudos envolveu as seguintes bases de dados: ASSIA, BIREME, CINAHL, Embase, PsycInfo, SciELO, Scopus e Web of Science (WoS). A escolha dessas bases foi em razão da abrangência de publicações na área da saúde e suas interações com aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais que também cercam o problema em questão (Figura 1). Foi estabelecido como recorte temporal, artigos publicados entre janeiro de 1999 a janeiro de 2015, utilizando como descritores: “breast cancer” combinado pelo operador booleano “AND” com “return to work” (ambos os termos indexados pelos Medical Subject Headings (MeSH)).

Figura 1
Fluxograma de seleção dos artigos

Foram identificados 779 artigos originais, completos, publicados em inglês, revisados por pares. Nas bases eles estavam assim distribuídos: ASSIA: 16, BIREME: 113, CINAHL: 152, Embase: 35, PsycInfo: 47, SciELO: 194, Scopus: 138, WoS: 84. Também foram adicionados artigos relevantes sobre o tema localizados nas referências dos artigos incluídos, através de busca manual. Como critérios de inclusão, foram selecionados estudos qualitativos que tratavam do RT de sobreviventes do CM. Foram excluídos artigos que abordavam o ingresso no mercado de trabalho de pessoas que tiveram câncer, mas que não estavam trabalhando antes da doença e artigos que tratavam de RT de pessoas com múltiplos tipos de câncer, incluindo o CM.

Os trabalhos foram selecionados inicialmente pelos seus títulos e resumos, e, após verificar se os artigos cumpriam os critérios de elegibilidade, a leitura do texto completo foi realizada por dois pesquisadores. Nos casos divergentes, um terceiro pesquisador com experiência em pesquisas qualitativas no campo da saúde do trabalhador auxiliou na solução do impasse.

Após a retirada das duplicatas pelo sistema de gerenciamento de documentos em PDF e organizador de referências Mendeley 1.12.1 versão livre para Windows, os estudos incluídos foram submetidos a avaliação de qualidade por meio do Critical Appraisal Skills Programme (CASP)1515. Unit PHR. Critical Appraisal Skills Programme (CASP): making sense of evidence - 10 questions to help you make sense of qualitative research. [Internet]. Londres: Public Heal Resour Unit; 2006 [citado em 16 fev 2017]. Disponível em: http://esquiresheffield.pbworks.com/f/WeChecklists.pdf.
http://esquiresheffield.pbworks.com/f/We...
e tiveram seu rigor metodológico avaliado pelo Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ)1616. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criterio for reporting qualitative research (COREQ): a 32- item checklist for interviews and focus group. Int J Qual Heal Care. 2007;19(6):349-57..

Foram considerados artigos de qualidade aqueles que atendessem todos os temas do CASP e que atingissem o maior número de itens contidos em cada domínio do COREQ. Ao final, os artigos que atenderam às exigências do CASP e do COREQ e que cumpriram os critérios de elegibilidade foram submetidos ao processo de análise.

Análise dos dados

Os dados foram análisados através da Tradução Recíproca como Síntese desenvolvida por Noblit e Hare1717. Noblit GW, Hare RD. Meta-ethnography: synthesizing qualitativa studies. London: Newbury Park; 1988.. Traduções recíprocas são geradas pela leitura repetida e interpretação dos conceitos de primeira ordem encontrados nos artigos originais, os quais, após analisados, forneceram os temas de onde se extrai a síntese77. Banning M. Employment and breast cancer: a meta-ethnography. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):708-19..

O método, descrito por Neves, Nunes e Magalhães1212. Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90., que envolve três ordens de organização e análise dos dados, foi utilizado para guiar esta metassíntese: a primeira ordem envolveu o reconhecimento dos conceitos contidos nos artigos originais, a segunda ordem correspondeu ao processo interpretativo a partir da comparação dos achados que se repetem em pelo menos dois estudos originais e a terceira ordem ou síntese consistiu numa reinterpretação dos conceitos de segunda ordem em relação às questões que guiam o objeto de estudo e as teorias e/ou conceitos que suscitaram desse novo sentido. Dois pesquisadores experientes examinaram o processo de síntese e avaliaram as construções de terceira ordem para confirmar se foi produzida uma reconceitualização final que refletisse os achados de primeira e segunda ordem88. Wells M, Williams B, Firnigl D, Lang H, Coyle J, Kroll T, et al. Supporting "work-related goals" rather than "return to work" after cancer? A systematic review and meta-synthesis of 25 qualitative studies. Psychooncology. 2013;22(6):1208-19..

Tomamos a noção de contexto de Patricia Munhall1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007. descrita como uma unidade inter-relacional daquilo que ela chama “mundos da vida”, a saber: a espacialidade, a corporalidade, a temporalidade e a relacionalidade para guiar a organização do material de análise dessa metassíntese. Para Munhall, corporalidade se refere tanto ao corpo que habitamos como à própria ideia que temos de nossos corpos. Já a espacialidade é compreendida como o material fenomenológico que precisa ser processado através da lente do ambiente. A relacionalidade consiste nos nossos encontros com os outros que são construídos e reconstruídos em contextos dinâmicos que dependem das relações sociais formadas e das contingências singulares que são vivenciadas ao longo dessa jornada, enquanto a temporalidade representa a forma como experienciamos nossos corpos encarnados, ocupando espaços localizados no tempo, mas que muitas vezes podem trazer ao tempo do mundo da vida experiências já vividas e aquelas que ainda queremos vir a ter1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007..

Dessa forma, ao utilizar a fenomenologia hermenêutica para sustentar essa metassíntese, entende-se que esse referencial fornece uma compreensão daquilo que foi interpretado nos estudos originais compondo agora uma reinterpretação do contexto ou dos mundos da vida, no qual se deu o RT de trabalhadoras sobreviventes do CM1919. Halkett GKB, Arbon P, Scutter SD, Borg M. The phenomenon of making decisions during the experience of early breast cancer: original article. Eur J Cancer Care. 2007;16(4):322-30.),(2020. Nelms T. Phenomenological philosophy and research. In: Chesnay M, editor. Nursing research using phenomenology: qualitative designs and methods in nursing. New York: Springer Pub Com; 2014. p. 1-23..

Resultados

Nove artigos cumpriram os critérios de elegibilidade (Quadro 1), atenderam às exigências do CASP (Quadro 2) e do COREQ (Quadro 3) e foram submetidos ao processo de análise.

Quadro 1
Descrição dos artigos selecionados na metassíntese de estudos sobre retorno ao trabalho de mulheres com câncer de mama

Quadro 2
Análise da qualidade dos estudos selecionados sobre retorno ao trabalho de mulheres com câncer de mama, segundo Critical Appraisal Skills Programme (CASP)1515. Unit PHR. Critical Appraisal Skills Programme (CASP): making sense of evidence - 10 questions to help you make sense of qualitative research. [Internet]. Londres: Public Heal Resour Unit; 2006 [citado em 16 fev 2017]. Disponível em: http://esquiresheffield.pbworks.com/f/WeChecklists.pdf.
http://esquiresheffield.pbworks.com/f/We...

Quadro 3
Avaliação do rigor metodológico dos estudos selecionados sobre retorno ao trabalho de mulheres com câncer de mama, segundo Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ)1616. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criterio for reporting qualitative research (COREQ): a 32- item checklist for interviews and focus group. Int J Qual Heal Care. 2007;19(6):349-57.

As publicações que compuseram esta metassíntese referem-se apenas a países do hemisfério norte: Bélgica2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.; Canadá2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.; Suécia2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.; Holanda99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.; e Reino Unido2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25., o que aponta a necessidade de ampliar os investimentos em pesquisas sobre essa temática em países com realidades econômicas, previdenciárias e sociais diferentes das referenciadas.

Foram observadas diferenças nas legislações dos países em que os estudos foram realizados. Países onde não existem legislações que obriguem os empregadores a orientar a retomada das atividades laborais, as sobreviventes do CM apresentam RT pobre, sobretudo em razão da falta de apoio dos empregadores2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Nestas circunstâncias, os trabalhos evidenciaram que as percepções das mulheres sobre o desejo de voltar a trabalhar estiveram associadas a sentimentos de dependência, vulnerabilidade e incertezas. Por outro lado, nos países onde a legislação implica tanto o empregador quanto o empregado(a) na responsabilidade pelo processo de RT, há um incremento de ajustes no ambiente de trabalho e nas tarefas para trabalhadores(as) que têm necessidades de readaptação funcional99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Verifica-se que as consequências biopsicossociais, do estar ou não na condição de trabalho, influenciaram no RT prematuro ou tardio de mulheres após o CM e que as legislações e os modelos de sistemas de saúde dos países em que elas estão inseridas interferiram diretamente em suas percepções de como os contextos institucionais as auxiliam ou não na retomada da atividade laborais99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Com base nos conceitos de primeira ordem que surgiram de cada estudo empírico selecionado, foi possível produzir seis conceitos de segunda ordem, que emergiram da comparação desses estudos, os quais serão apresentados por categoria, e a síntese (terceira ordem), que será discutida (Quadro 4).

Quadro 4
Conceitos de primeira ordem, de segunda ordem e a síntese (terceira ordem)

O Diagnóstico do câncer de mama e como as mulheres lidam com os efeitos da doença e do afastamento do ambiente de trabalho

Os estudos apresentaram a saída das mulheres das atividades laborais apenas por demandas pessoais em razão da doença, não foram claramente abordados os aspectos relacionados às condições gerais do ambiente de trabalho, que também pudessem justificar este afastamento99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Nos artigos, a saída do trabalho foi percebida como uma fase de interrupção e perdas, mediada pela incapacidade transitória e pela forma abrupta como foi afastada99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44., permeada ainda por mudanças físicas como perda do peito, queda de cabelo etc. e por entraves de ordem mental com destaque para tristeza e falta de concentração dentre outros fatores2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Tais eventos produziram uma ressignificação do trabalho no RT em diferentes sentidos99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Algumas mulheres perceberam o trabalho como fonte de bem-estar, como possibilidade de normalizar sua vida, suas emoções e expectativas positivas de superação da doença2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.. Outras sentiam que o CM havia mudado a percepção que tinham do trabalho, estando menos interessadas na vida profissional, tornando a vida social e familiar uma prioridade maior do que antes do diagnóstico99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.. Observa-se, portanto, que o diagnóstico, os efeitos da doença e o afastamento do trabalho em si não podem ser tomados como barreiras absolutas, mas como elementos de mudança de perspectiva em relação a várias dimensões da vida, inclusive o trabalho, podendo configurar-se ora como facilitadores ora como barreiras do processo de RT.

Expectativas do retorno ao trabalho frente à capacidade para o trabalho e o gerenciamento das tarefas

As apreensões frente ao empregador ou colegas sobre a capacidade de execução de tarefas, a própria percepção de que precisavam de um tempo para se readaptarem e o receio de induzirem a erro os empregadores ao pensarem que elas tinham se recuperado completamente foram elementos descritos na fase inicial de RT99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),)(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Algumas mulheres ao tentarem transparecer certa normalidade na capacidade para o trabalho, acabavam por se exceder no RT2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.. Outras desejavam o RT, mas sentiam medo de não conseguirem gerenciar bem suas tarefas2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Nenhum dos estudos que compõem esta metassíntese apresentou quais tarefas passaram a ser realizadas pelas trabalhadoras no RT99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Boa parte das pesquisas relatou apenas as alterações indesejadas nas tarefas99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23., as dificuldades com readaptações em tarefas complexas ou novas99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6. e que tarefas de trabalho não adaptadas para cada indivíduo dificultavam o processo de RT2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Outrossim, as necessidades pessoais impostas pela doença passaram a demandar negociações com empregadores quanto a flexibilização de horários, assimilação gradual das atividades e necessidade de mudanças nas tarefas de trabalho. Nesse processo, ora os supervisores produziam ajustes automaticamente2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74., ora foram solicitados pelas próprias trabalhadoras99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Este aspecto negocial deve ser analisado tanto como facilitador quanto como barreira ao processo de reabilitação, uma vez que os estudos realizados em países onde há um incentivo ao RT, este processo é facilitado pelos próprios gestores2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.. Já em países onde não se encontravam claras as regras de readaptação, tais ajustes apresentavam tensões entre as partes interessadas99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44..

Questões financeiras

Os estudos revelaram que as narrativas das mulheres com “retorno tardio” diferiram das narrativas das mulheres que conseguiram voltar mais rapidamente ao trabalho. Isso porque trabalhadoras que tiveram um RT tardio relatavam a necessidade de priorizar a recuperação pós-doença2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.; já aquelas que conseguiam voltar mais cedo, tinham o desafio de manterem seu lugar no mercado de trabalho99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.. Contudo, não ficou claro o que explicava ambas decisões. Suspeita-se que um dos elementos pode ser de ordem financeira.

Mulheres que receberam algum tipo de benefício relataram ter sorte de não ter que voltar a trabalhar imediatamente2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.. Por outro lado, insegurança e desespero surgiram em trabalhadoras que enfrentavam dificuldades financeiras durante a doença, o que as levavam, por vezes, a sofrerem em silêncio pela necessidade de RT mesmo sem se sentirem aptas para assumir suas atividades2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Aquelas que não possuíam empregos estáveis relataram que era difícil se ausentar do trabalho por vários meses e não serem substituídas. Elas acreditavam também que o CM implicaria em dificuldades para encontrar um novo emprego, pois o histórico de câncer levantaria dúvidas sobre a sua capacidade de trabalho2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44..

Percebe-se assim que as crenças, atitudes e influências de cada trabalhadora em relação ao RT estão atreladas aos contextos e contingências em que vivem sendo também influenciadas pelas políticas de reabilitação em que são inseridas e pela forma como percebem e reinterpretam seu mundo do trabalho ou a falta dele.

Medo de recorrência da doença

Além do diagnóstico e tratamento do CM terem sido concebidos como fatores perturbadores do curso normal da vida99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13., seja pela dificuldade de manter o segredo sobre a enfermidade para os colegas de trabalho, seja pela necessidade de ter que conciliar o tratamentos com a carga horária de trabalho99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44., o medo da recidiva consistiu num fenômeno que perpassou todos os estudos e também se apresentou como uma barreira ao RT, pois havia nas mulheres um receio de retornarem precocemente sem estarem completamente “curadas” por considerarem que, apesar de terem alta, a doença poderia a qualquer momento “atacá-las” novamente99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6..

Assim, a baixa imunidade e o medo de infecções influenciaram na decisão por trabalhar em tempo integral ou parcial quando do RT2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Além disso, dificuldades para dormir, fadigas, linfedemas, funções cognitivas afetadas foram associadas à perda da capacidade de trabalho99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Tais problemas significaram barreiras para o RT, pois para algumas mulheres era difícil aceitar que não teriam condições de trabalhar tanto quanto antes e pensar em mudar de emprego/atividade era concebido por muitas como uma situação ameaçadora por demandar a aquisição de novas habilidades físicas e psíquicas2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25..

Suporte dos profissionais de saúde, apoio da família e dos colegas no ambiente de trabalho

O suporte da família e amigos foi relatado como importante no processo de reabilitação2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6. uma vez que, além do RT, as mulheres tinham que gerir as demandas domésticas99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.. A influência dos depoimentos de amigos sobre possíveis problemas cognitivos após o CM e a falta de apoio dos colegas de trabalho, nas situações em que o empregador foi resistente ao processo de readaptação, foram preponderantes nos casos em que o RT não transcorreu da forma que a trabalhadora imaginava2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.).

Assim, declarações ofensivas, olhares constrangedores, perguntas irritantes ou um silêncio embaraçoso foram algumas das experiências negativas relatadas quando da retomada das atividades laborais após o CM2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.. Ficou evidenciada, em boa parte dos artigos, a satisfação das mulheres quando apoiadas por colegas e gestores. Esta experiência era mais intensa quando elas recebiam palavras de incentivo enquanto ainda estavam fora do trabalho99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.)-(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74..

Os estudos destacaram o papel dos profissionais de saúde no RT99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Em alguns casos tidos como solidários e encorajadores2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Mas encontrou-se também relatos de atitudes negativas, como pressionar as trabalhadoras a retornar ao trabalho quando elas não se sentiam ainda prontas. Nesses casos, essas mulheres encaravam estes comportamentos como rudes e produtores de descrédito e desconfiança quanto ao real estado de saúde da trabalhadora99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74..

Algumas pesquisas indicaram que trabalhadoras que discutiam questões pertinentes ao trabalho com seus médicos estruturavam melhor um plano de RT99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Tais aspectos relacionados ao apoio social puderam ser interpretados como facilitadores do RT, uma vez que ao serem encorajadas à reabilitação pelas equipes de saúde, amigos e familiares, havia uma diminuição da ansiedade dessas trabalhadoras quanto ao processo de retomada da vida profissional99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74..

Mudança do significado do trabalho após a doença

Os estudos evidenciaram que o CM mudou a percepção das trabalhadoras quanto ao conteúdo e às condições de trabalho99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Modificações no conteúdo das tarefas, redução nos ganhos, perdas de cargos anteriormente ocupados foram mudanças indesejadas após o câncer2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.. Algumas mulheres viram essas modificações como atos de discriminação, uma vez que não tiveram um diálogo e/ou apoio adequado no RT2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73., já outras consideraram um desdobramento natural da perda de suas capacidades produtivas2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23..

Assim, o fato de ter tido um CM mudou atitudes, prioridades, sentimentos e relacionamentos no trabalho após a doença99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Para algumas mulheres, o trabalho deixou de ser um fardo quando passaram a trabalhar menos horas por dia2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.) e reavaliaram suas preferências ocupacionais sobre no que e para quem elas queriam trabalhar99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.. Já outras expressaram o sentido de trabalho como uma “distração” frente à doença99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44. e um sinal de que haviam recuperado a saúde, pois pertencer ao mercado de trabalho representaria um “retorno à vida”99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.)-(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13..

Discussão

Nessa metassíntese, tomamos os significados interpretados dos estudos originais como expressões dos mundos da vida, como algo que foi submetido a um processo reflexivo, colocado em relevo e posteriormente traduzido pelos autores deste estudo.

Apoiando-se num importante pressuposto das teorias compreensivas de que “a experiência não é separada do participante, de modo que o contexto também precisa ser articulado”1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007., e, com base nos conceitos de segunda ordem anteriormente mencionados, nos aportes teóricos do RT e na noção de contexto de Munhall1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007., apresentamos a síntese deste estudo.

O Retorno ao trabalho como um processo significado pelas mulheres na reflexão e interconexão dos seus diferentes mundos da vida

O material reunido nos estudos descreve o RT num contexto dinâmico, que não se limita à reação destas mulheres frente aos obstáculos e facilitadores da reabilitação, mas à construção e reconstrução dos seus mundos da vida após o CM2929. Schutz A. Fenomenologia e Relações Sociais: textos escolhidos de Alfred Schutz. Wagner HR, editor. Rio de Janeiro: Zahar; 1979.. É nos diferentes mundos da vida dessas trabalhadoras, interpretados e descritos nos artigos, que é possível falar sobre as etapas da reabilitação e sobre seus novos significados reinterpretados.

Corporalidade: O conceito de segunda ordem: o diagnóstico do câncer de mama e como as mulheres lidam com os efeitos da doença e do afastamento do ambiente de trabalho forneceu elementos para pensar nesse aspecto do mundo da vida, pois as histórias pessoais apresentadas nos estudos deflagraram o impacto que a doença causou na vida dessas mulheres e quais julgamentos e perplexidades elas imprimiram nos colegas de trabalho e na sociedade. Acerca dessa significação inicial, Sontag3030. Sontag S. A doença como metáfora. Ramalho M, editor. Rio de Janeiro: Graal; 1984. ressalta que:

Nada é mais punitivo do que atribuir um significado a uma doença quando esse significado é invariavelmente moralista. Qualquer moléstia importante cuja causa é obscura e cujo tratamento é ineficaz tende a ser sobrecarregada de significação onde a própria doença se torna uma metáfora. E a doença (assim enriquecida de significados) é projetada no mundo. (p. 76)

Assim, o período de off work1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68., em razão da doença, é significado através dos contextos situados e das contingências do dia a dia que cada trabalhadora vive e que são marcados pelas suas histórias de vida pessoais1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007., podendo fazer com que elas vivenciem esse momento fora do ambiente de trabalho como um período de instabilidade que oscila entre a renovação e o desespero no contexto das relações interpessoais, em que cada mulher lida com os sintomas da doença e externaliza aos grupos sociais onde se encontra inserida de uma maneira muito particular3131. Tighe M, Molassiotis A, Morris J, Richardson J. Coping, meaning and symptom experience: a narrative approach to the overwhelming impacts of breast cancer in the first year following diagnosis. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):226-32..

Os estudos evidenciaram que, apesar de existirem fatores pessoais, organizacionais e políticos de saúde que influenciam no RT3232. Saldanha JHS, Pereira APM, Neves RF, Lima MAG. Facilitadores e barreiras de retorno ao trabalho de trabalhadores acometidos por LER/DORT. Rev Bras Saúde Ocup. 2013;38(127):122-38., a reabilitação ainda permanece centrada em iniciativas individuais da própria trabalhadora enferma e numa baixa corresponsabilização dos demais atores envolvidos no processo de reabilitação99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Assim, a descoberta da doença refletiu num processo dinâmico de busca pessoal por equilíbrio à medida que o tratamento avançava e as trabalhadoras concebiam novos significados para o momento que estavam passando44. Sandberg JC, Strom C, Arcury TA. Strategies used by breast cancer survivors to address work-related limitations during and after treatment. Womens Health Issues. 2014;24(2):197-204.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13..

“Compreende-se assim que a doença, especialmente a doença crônica, é precisamente o tipo de experiência em que as estruturas da vida cotidiana e as formas de conhecimento que as sustentam se rompem” (p. 43)3333. Bury M. Doença crônica como ruptura biográfica Michael Bury. Tempus. 1979;edição esp:41-55.. Para essas mulheres, que experimentaram o CM, há uma nova inteligência corporal que necessita ser significada após as transformações físicas e psíquicas provocadas pela doença. É através dessa reconstrução da unidade mente/corpo que se torna possível compreender tal experiência, uma vez que significado e experiência não podem existir isoladamente1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007..

Este mundo da vida também pôde ser contemplado pelo conceito de segunda ordem: as expectativas do RT frente à capacidade para o trabalho e o gerenciamento das tarefas. Isso porque os estudos relatam diferentes expectativas sobre o voltar a trabalhar, tanto durante as semanas que antecedem essa reentrada1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68. quanto na fase inicial do RT.

Uma possibilidade fundamental na vida da pessoa estigmatizada é a colaboração que presta aos normais no sentido de atuar como se a sua qualidade diferencial manifesta não tivesse importância nem merecesse atenção especial. Entretanto, quando a diferença não está imediatamente aparente e não se tem dela um conhecimento prévio (ou, pelo menos, ela não sabe que os outros a conhecem), quando, na verdade, ela é uma pessoa desacreditável, e não desacreditada, nesse momento é que aparece a segunda possibilidade fundamental em sua vida. A questão que se coloca não é a da manipulação da tensão gerada durante os contatos sociais e, sim, da manipulação de informação sobre o seu defeito. Exibi-lo ou ocultá-lo; contá-lo ou não contá-lo; revelá-lo ou escondê-lo; mentir ou não mentir; e, em cada caso, para quem, como, quando e onde. (p. 51)3434. Goffman E. Estigma: Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4a ed. Rio de Janeiro: LTC; 1988.

Concordamos com as colocações de Goffman34, tendo em vista que há uma “borda” de imprevisibilidade dessas mulheres no RT, pois muitas sequer conhecem suas capacidades produtivas durante esta retomada da vida ocupacional2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Já outras trabalhadoras sabem que não conseguem mais se colocar na ativa como antes, mas preferem aparentar uma normalidade pelo medo de represálias ou demissões99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23..

Ajustes na carga horária de trabalho, permissões de saídas para consultas e exames e o gerenciamento de tarefas foram pontuados como características propiciadoras do RT após o CM99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.)-(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.. Já as elevadas cargas físicas e/ou psíquicas no trabalho, além do baixo apoio nos ambientes de trabalho (colegas, empregadores, médicos ocupacionais), foram identificados como barreiras para o processo de reabilitação99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.. Tais elementos reiteram os conhecimentos existentes em trabalhos anteriores sobre os facilitadores e obstáculos do RT após CM44. Sandberg JC, Strom C, Arcury TA. Strategies used by breast cancer survivors to address work-related limitations during and after treatment. Womens Health Issues. 2014;24(2):197-204.),(77. Banning M. Employment and breast cancer: a meta-ethnography. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):708-19.),(88. Wells M, Williams B, Firnigl D, Lang H, Coyle J, Kroll T, et al. Supporting "work-related goals" rather than "return to work" after cancer? A systematic review and meta-synthesis of 25 qualitative studies. Psychooncology. 2013;22(6):1208-19. e confirmam que o processo de RT é lento, desafiador e depende de múltiplos fatores, pois não ocorre através de uma sobreposição de importância entre estes, e, por ser individualizado, requer a identificação de quais fatores atuam como facilitadores e/ou barreiras para um RT sustentado3232. Saldanha JHS, Pereira APM, Neves RF, Lima MAG. Facilitadores e barreiras de retorno ao trabalho de trabalhadores acometidos por LER/DORT. Rev Bras Saúde Ocup. 2013;38(127):122-38..

Espacialidade: Tanto o conceito de segunda ordem suporte dos profissionais de saúde, apoio da família e dos colegas no ambiente de trabalho quanto o conceito mudança do significado do trabalho após a doença fundamentaram este aspecto da síntese. Isso porque realizada a reentrada no ambiente de trabalho, o desafio agora é manter (maintenance) esta trabalhadora em atividade e centrada nas metas a serem alcançadas no trabalho diário, considerando inclusive a possibilidade de progressão na carreira1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68.),(1212. Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90..

Essas trabalhadoras têm a necessidade de discutir suas limitações nos espaços onde ocorrem suas readaptações funcionais (situação que possibilita maior gerenciamento de seu trabalho). Políticas de reintegração, que visem ambientes de trabalho saudáveis, valorizem a trabalhadora com incapacidades enquanto sujeito e mantenham sua autonomia como indivíduos são propiciadores de maior efetividade ao RT sustentado3232. Saldanha JHS, Pereira APM, Neves RF, Lima MAG. Facilitadores e barreiras de retorno ao trabalho de trabalhadores acometidos por LER/DORT. Rev Bras Saúde Ocup. 2013;38(127):122-38., sendo que tais transformações somente são possíveis quando interligadas às trocas intersubjetivas que estas mulheres realizam nos diferentes ambientes onde estão situadas.

No entanto, Munhall3535. Munhall PL. Philosophical ponderings on qualitative research methods in nursing. Nurs Sci Q. 1989;2(1):20-8. nos alerta que a percepção da experiência é o que importa, não o que na realidade pode parecer contrário ou mais “verdadeiro”. Se o ambiente de trabalho é visto como perigoso pela trabalhadora (seja pela sua baixa imunidade e medo de recidivas ou necessidade de novos ajustes nas tarefas a serem executadas), ainda quando “de fato” não haja perigo mensurável por outrem, torna-se necessário compreender que, na realidade dessa mulher, há perigo e isso deve ser trabalhado em parceria com colegas e gestores quando da manutenção dessa mulher no local de trabalho.

Ao compreender os diferentes espaços em que estas trabalhadoras se encontram e os significados que estes assumem nestas experiências, nota-se que o CM possibilita a estas mulheres contemplar diversos momentos de sua vida durante o período do adoecer. A ruptura de suas biografias permite, simultaneamente, relembrar o passado vivido e contemplar um futuro almejado ao mesmo tempo em que buscam redescobrir quem são após, por exemplo, a perda do peito1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007.. Tais experiências permitem que o trabalho possa ter, para algumas mulheres, um significado secundário após a sua recuperação, desejando, sim, voltar à atividade, mas conduzindo-a de forma diferente, acrescentando novas perspectivas e planos para sua existência77. Banning M. Employment and breast cancer: a meta-ethnography. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):708-19..

Relacionalidade: a relacionalidade foi identificada no conceito de segunda ordem: as expectativas do RT frente à capacidade para o trabalho e o gerenciamento das tarefas, uma vez que algumas trabalhadoras se sentiam como “um fardo” para os colegas ou “um peso” para os supervisores ou que “esbarraram em uma parede de tijolos” pela falta de conselhos úteis durante a reabilitação2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44., aspectos estes que também são tratados em outros trabalhos da literatura investigada33. Verbeek J, Spelten E. Work. In: Feuerstein M, editor. Handbook of cancer survivorship. New York: Springer International Publishing; 2007. p. 381-96.),(88. Wells M, Williams B, Firnigl D, Lang H, Coyle J, Kroll T, et al. Supporting "work-related goals" rather than "return to work" after cancer? A systematic review and meta-synthesis of 25 qualitative studies. Psychooncology. 2013;22(6):1208-19.),(3131. Tighe M, Molassiotis A, Morris J, Richardson J. Coping, meaning and symptom experience: a narrative approach to the overwhelming impacts of breast cancer in the first year following diagnosis. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):226-32..

Todas as pessoas vivem num mundo de encontros sociais que as envolvem, ou em contato face a face, ou em contato mediado com outros participantes. Em cada um desses contatos a pessoa tende a desempenhar o que às vezes é chamado de linha - quer dizer, um padrão de atos verbais e não verbais com o qual ela expressa sua opinião sobre a situação, e através disto sua avaliação sobre os participantes, especialmente ela própria. Não importa que a pessoa pretenda assumir uma linha ou não, ela sempre o fará na prática. Os outros participantes pressuporão que ela assumiu uma posição mais ou menos voluntariamente, de forma que se ela quiser ser capaz de lidar com a resposta deles a ela, ela precisará levar em consideração a impressão que eles possivelmente formaram sobre ela. (pág. 13)3636. Goffman E. Ritual de interação: ensaios sobre o comportamento face a face. Petrópolis: Vozes; 2011.

Assim, a experiência de RT pode ser contemplada de uma forma mais positiva ou mais negativa a depender do grau em que o ambiente de trabalho é capaz de reconhecer a vulnerabilidade da trabalhadora e tratar esta condição com o apoio adequado ou não2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23..

Outro conceito de segunda ordem que evidenciou a relacionalidade foi o suporte dos profissionais de saúde, apoio da família e dos colegas no ambiente de trabalho. Para as mulheres, o apoio de colegas e supervisores propicia encorajamento e faz a sobrevivente do CM sentir que voltou a um lugar seguro e familiar99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Em contrapartida, a carência de suporte do empregador e colegas de trabalho foi indicada como resultado da falta de informações por parte das organizações sobre políticas de reabilitação de trabalhadores(as) com adoecimentos crônicos, uma vez que os gestores também sentiram que precisavam de subsídios para lidar com as demandas destas mulheres99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.. Isso demonstra como os empregadores podem achar difícil encontrar o equilíbrio entre dar apoio exacerbado ou paternalista e permitir que a trabalhadora retorne à normalidade com o suporte necessário99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.. Em tais situações, o RT ao trabalho só foi concretizado quando a trabalhadora possuía um suporte de familiares, amigos e/ou profissionais de saúde99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.)-(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44..

Arman e Rehnsfeldt3737. Arman M, Rehnsfeldt A. Living with breast cancer: a challenge to expansive and creative forces. Eur J Cancer Care. 2002;11(4):290-6. apontam que a presença simultânea de benefícios e danos demonstra um processo de polarização das perspectivas de vida que são emanadas da experiência do CM. Assim, as descrições das mulheres formam um campo dialético (de tensão) entre a vida e a morte no qual são criados novos níveis de consciência e sabedoria. Nesse sentido, as transformações da perspectiva da vida no RT após a experiência do CM são parte de uma trama complexa e, neste processo, é importante perceber que todos os atores sociais: colegas, gestores, trabalhadora etc. estão interligados e implicados.

Neves, Nunes e Magalhães1212. Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90., ao estudar as interações entre atores no RT após afastamento por transtorno mental, destacam que normas socioculturais, conflitos socioeconômicos e políticos e as relações de interesse e poder produzem impactos na experiência de RT das pessoas que sofrem de transtornos mentais. Estas ponderações também são válidas no RT de sobreviventes do CM uma vez que a sociedade deve ser informada sobre a importância do trabalho para as mulheres e que elas são capazes de retornar para suas atividades laborativas durante ou após o tratamento desde que recebam o apoio que precisam99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13..

O apoio social deve, portanto, propiciar uma maior sensibilização de visões renovadas e aprofundadas do significado da vida. Um fator decisivo pode ser se a sobrevivente obtém o suporte de um companheiro, um amigo ou até mesmo um colega de trabalho. Esse compartilhamento de experiências, emoções e pensamentos com outras pessoas pode “salvar” sujeitos que estão passando por mudanças significativas na vida3737. Arman M, Rehnsfeldt A. Living with breast cancer: a challenge to expansive and creative forces. Eur J Cancer Care. 2002;11(4):290-6.. Lima e Trad3838. Lima MAG, Trad LAB. "Circuloterapia": uma metáfora para o enfrentamento da dor crônica em duas clínicas de dor. Physis Rev Saúde Coletiva. 2011;21(1):217-36., ao estudarem a dinâmica presente na circulação de doentes e terapeutas de uma clínica da dor, destacam a importância de múltiplas vozes e relações dialógicas e interdisciplinares do cotidiano de sujeitos em busca de tratamentos.

Tais colocações também são pertinentes na atuação do profissional de saúde que cuida da reabilitação de trabalhadoras com CM uma vez que os estudos que compõem essa metassíntese indicaram que o suporte da família, amigos, colegas de trabalho, profissionais de saúde fornece apoio prático, encorajamento e abre a discussão sobre o RT sustentado3232. Saldanha JHS, Pereira APM, Neves RF, Lima MAG. Facilitadores e barreiras de retorno ao trabalho de trabalhadores acometidos por LER/DORT. Rev Bras Saúde Ocup. 2013;38(127):122-38., permitindo que estas mulheres não se sintam sozinhas durante essa jornada99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.)-(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.. Assim, nas narrativas de RT também existem muitas “vozes”: da trabalhadora, da família, de amigos, colegas, gestores, profissionais de saúde etc. e é através dessa “espiral de intervenções”3838. Lima MAG, Trad LAB. "Circuloterapia": uma metáfora para o enfrentamento da dor crônica em duas clínicas de dor. Physis Rev Saúde Coletiva. 2011;21(1):217-36., construída por meio da intersubjetividade, que se torna possível a reabilitação.

Temporalidade: Entende-se temporalidade não como o tempo cronológico, mas como o tempo da consciência, no qual passado, presente e futuro se fundem em três presentes: presente do passado, presente do presente e presente do futuro, todos mediados pelas contingências individuais1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007.. Este componente do mundo da vida foi significado pelos conceitos de segunda ordem: questões financeiras e o medo de recorrência da doença.

Estas categorias também trazem implicações inerentes à fase inicial de RT1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68., apontando que estas trabalhadoras muitas vezes vivenciam circunstâncias de vida adversas (pois algumas são provedoras do lar ou de parte significativa da renda familiar) e realidades do cotidiano que as impulsionam a querer voltar o quanto antes ao trabalho ainda que tenham medo de recidivas da doença. Por outro lado, o tempo é o tempo que estamos vivendo1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007.. Nesses termos, a percepção da passagem do tempo pode variar bastante, conforme a experiência1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007.),(3939. Neves RF. Experiência e significado no retorno ao trabalho para trabalhadores com transtorno mental [tese]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2016..

Outro conceito de segunda ordem que está presente neste componente contextual é a mudança do significado do trabalho após a doença. Ao interpretarem o seu próprio mundo e explicarem o processo da doença, as sobreviventes do CM compreendem as suas próprias experiências. E, apesar destas mulheres por vezes terem conseguido, ao longo do tempo, se readaptarem ao contexto do trabalho após o CM e terem alcançado condições para seguir o curso de suas carreiras (Advancement)1111. Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68.),(1212. Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90., a importância do trabalho mudou e perdeu parte do seu significado para muitas delas.

Percebe-se que a temporalidade envolta no RT se constrói e reconstrói, pois corresponde ao tempo da consciência mediada pelas experiências passadas, pelas vividas no agora e pelas projetadas ou antecipadas para o futuro. Então, é no processo chamado de RT que esse tempo é significado. Ora tido como lento ou insuficiente99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6., ora percebido como curto e desagradável, após o qual a vida cotidiana seria retomada2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.. Dessa forma, tal contemplação não pode ser vista como um caminho único e acabado, uma vez que o crítico do tempo é a própria história1818. Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007..

Considerações finais

Apesar de ter sido incluída a SciELO (onde são indexados estudos da América Latina e Caribe), não foram localizadas nessa biblioteca eletrônica pesquisas qualitativas que tratassem dos significados do RT após a experiência do CM, o que limita a comparabilidade e transferibilidade desses achados para cenários como os da América Latina e evidencia a necessidade de ampliar os investimentos em pesquisa sobre o RT entre sobreviventes de câncer de mama em outros contextos a fim de aferir se os achados apresentados noutros lugares guardam alguma correspondência com apresentados neste estudo.

Além disso, apesar dos artigos analisados informarem o interesse na compreensão da experiência de RT de sobreviventes do CM, nenhuma publicação apresentou um conceito de experiência com fundamentação teórica de base fenomenológica.

Nesta metassíntese, alguns autores99. Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.),(2121. Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.),(2222. Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.),(2424. Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.),(2727. Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44. adotaram uma abordagem mais descritiva do conceito de experiência relatando situações e fatores do trabalho que viabilizam ou não o RT das sobreviventes do câncer de mama. Outros2323. Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.),(2525. Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.),(2626. Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.),(2828. Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6., apesar de apresentarem realidades do cotidiano destas mulheres, não adotaram uma perspectiva clara de quais aportes teóricos embasaram a compreensão dessas experiências de reconstrução do mundo da vida de mulheres em RT após o câncer.

Contudo, os métodos desenvolvidos nos artigos forneceram subsídios aos seus resultados, havendo uma correspondência entre os dados registrados e as interpretações trazidas em cada estudo. Até porque os estudos investigados aqui fizeram uma aproximação das mulheres que vivenciaram o RT após o CM, adotando a perspectiva de que a palavra “experiência” pode ser contemplada de diferentes formas. Contudo, ficou claro que os autores exploraram a premissa de que “as respostas aos problemas criados pela doença constituem-se socialmente e remetem diretamente a um mundo compartilhado de práticas, crenças e valores”4040. Rabelo MCM, Alves PCB. Significação e metáforas na experiência da enfermidade. In: Rabelo MCM, Alves PCB, Souza IMA, editores. Experiência de doença e narrativa. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1999. p. 171-85..

Nenhum dos trabalhos apontou quais mudanças estruturais ocorreram nos ambientes após o RT das sobreviventes do CM. Além dos fatores psicossociais (identificados ora como barreiras, ora como facilitadores), não foram detalhados outros fatores de risco influenciadores do RT. Sugere-se que pesquisas posteriores explorem melhor as alterações estruturais dos ambientes de trabalho onde se situam essas trabalhadoras em RT, descrevendo inclusive aspectos organizacionais e outros fatores de risco (níveis de ruído, gases, vibrações, poeiras etc.) aos quais essas sobreviventes do CM são expostas, o que permitirá compreender melhor que condições de trabalho são facilitadoras do processo de reintegração.

Ao adotar a corporeidade, espacialidade, relacionalidade e temporalidade para a analisar a reabilitação de trabalhadoras após o CM, os estudos apontaram o RT como um processo complexo que é experienciado desde o diagnóstico, perpassa o tratamento da doença e a saída da mulher do ambiente de trabalho até que surjam os anseios e expectativas da retomada da vida laboral, sobretudo no que tange à capacidade produtiva e ao gerenciamento de tarefas e cuidados com a saúde.

Destacam-se, como componentes desta síntese, a influência das questões financeiras, o medo de recidivas, bem como as mudanças de significado que o trabalho sofre depois da doença. Os trabalhos apontaram que as principais dificuldades das sobreviventes do CM no RT estão relacionadas à falta de políticas de reabilitação mais eficazes no sentido de orientar colegas e gestores acerca das demandas e limitações dessas trabalhadoras. Como alternativas, os estudos reforçam a necessidade de valorização das relações intersubjetivas das partes interessadas no processo de reabilitação laboral.

A síntese também evidenciou o CM como uma doença crônica de longa duração que demanda intervenções nos ambientes laborais e implica no aprimoramento do suporte às trabalhadoras quando do RT, devendo ser apoiado por todas as partes interessadas a fim de permitir que cada mulher, de maneira singular, porém compartilhada com colegas e gestores, consiga se manter em situação de trabalho e em condições de prevenir a incapacidade prolongada.

Referências

  • 1
    Jemal A, Vineis P, Bray F, Torre L, Forman D, editores. The cancer atlas [Internet]. 2a ed. Atlanta: American Cancer Society; 2014 [citado em 3 jun 2020]. Disponível em: www.cancer.org/canceratlas
    » www.cancer.org/canceratlas
  • 2
    Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estimativa 2018: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro; 2017.
  • 3
    Verbeek J, Spelten E. Work. In: Feuerstein M, editor. Handbook of cancer survivorship. New York: Springer International Publishing; 2007. p. 381-96.
  • 4
    Sandberg JC, Strom C, Arcury TA. Strategies used by breast cancer survivors to address work-related limitations during and after treatment. Womens Health Issues. 2014;24(2):197-204.
  • 5
    Mehnert A. Employment and work-related issues in cancer survivors. Crit Rev Oncol Hematol. 2011;77(2):109-30.
  • 6
    Pransky G, Gatchel R, Linton SJ, Loisel P. Improving return to work research. J Occup Rehabil. 2005;15(4):453-7.
  • 7
    Banning M. Employment and breast cancer: a meta-ethnography. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):708-19.
  • 8
    Wells M, Williams B, Firnigl D, Lang H, Coyle J, Kroll T, et al. Supporting "work-related goals" rather than "return to work" after cancer? A systematic review and meta-synthesis of 25 qualitative studies. Psychooncology. 2013;22(6):1208-19.
  • 9
    Tamminga SJ, de Boer AGEM, Verbeek JH, Frings-Dresen MHW. Breast cancer survivors' views of factors that influence the return-to-work process: a qualitative study. Scand J Work Environ Heal. 2012;38(2):144-54.
  • 10
    Loisel P, Buchbinder R, Hazard R, Keller R, Scheel I, van Tulder M, et al. Prevention of work disability due to musculoskeletal disorders: the challenge of implementing evidence. J Occup Rehabil. 2005;15(4):507-24.
  • 11
    Young AE, Roessler RT, Wasiak R, McPherson KM, van Poppel MNM, Anema JR. A developmental conceptualization of return to work. J Occup Rehabil. 2005;15(4):557-68.
  • 12
    Neves RF, Nunes MO, Magalhães L. As interações entre os atores no retorno ao trabalho após afastamento por transtorno mental: uma metaetnografia. Cad Saude Publica. 2015;31(11):2275-90.
  • 13
    Thorne S, Jensen L, Kearney MH, Noblit G, Sandelowski M. Qualitative metasynthesis: reflections on methodological orientation and ideological agenda. Qual Health Res. 2004;14(10):1342-65.
  • 14
    Stergiou-Kita M, Grigorovich A, Tseung V, Milosevic E, Hebert D, Phan S, et al. Qualitative meta-synthesis of survivors' work experiences and the development of strategies to facilitate return to work. J Cancer Surviv. 2014;8(4):657-70.
  • 15
    Unit PHR. Critical Appraisal Skills Programme (CASP): making sense of evidence - 10 questions to help you make sense of qualitative research. [Internet]. Londres: Public Heal Resour Unit; 2006 [citado em 16 fev 2017]. Disponível em: http://esquiresheffield.pbworks.com/f/WeChecklists.pdf
    » http://esquiresheffield.pbworks.com/f/WeChecklists.pdf
  • 16
    Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criterio for reporting qualitative research (COREQ): a 32- item checklist for interviews and focus group. Int J Qual Heal Care. 2007;19(6):349-57.
  • 17
    Noblit GW, Hare RD. Meta-ethnography: synthesizing qualitativa studies. London: Newbury Park; 1988.
  • 18
    Munhall PL, editora. Nursing research: a qualitative perspective. 4th ed. Sudbury: Jones amd Bartlett; 2007.
  • 19
    Halkett GKB, Arbon P, Scutter SD, Borg M. The phenomenon of making decisions during the experience of early breast cancer: original article. Eur J Cancer Care. 2007;16(4):322-30.
  • 20
    Nelms T. Phenomenological philosophy and research. In: Chesnay M, editor. Nursing research using phenomenology: qualitative designs and methods in nursing. New York: Springer Pub Com; 2014. p. 1-23.
  • 21
    Maunsell E, Brisson C, Dubois L, Lauzier S, Fraser A. Work problems after breast cancer: an exploratory qualitative study. Psychooncology. 1999;8(6):467-73.
  • 22
    Kennedy F, Haslam C, Munir F, Pryce J. Returning to work following cancer: a qualitative exploratory study into the experience of returning to work following cancer. Eur J of Cancer Care. 2007;16(1):17-25.
  • 23
    Johnsson A, Fornander T, Rutqvist LE, Olsson M. Factors influencing return to work: a narrative study of women treated for breast cancer. Eur J Cancer Care. 2010;19(3):317-23.
  • 24
    Nilsson M, Olsson M, Wennman-Larsen A, Petersson LM, Alexanderson K. Return to work after breast cancer: women's experiences of encounters with different stakeholders. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):267-74.
  • 25
    Tiedtke C, Casterlé BD, Rijk A, Christiaens MR, Donceel P. Breast cancer treatment and work disability: patient perspectives. Breast. 2011;20(6):534-8.
  • 26
    Tiedtke C, Rijk A, Donceel P, Christiaens MR, Casterlé BD. Survived but feeling vulnerable and insecure: a qualitative study of the mental preparation for RTW after breast cancer treatment. BMC Public Health. 2012;12(1):1-13.
  • 27
    Nilsson MI, Olsson M, Petersson L, Alexanderson K. Women 's reflections and actions regarding working after breast cancer surgery: a focus group study. Psychooncology. 2013;22:1639-44.
  • 28
    Tiedtke C, Casterlé BD, Donceel P, Rijk A. Workplace support after breast cancer treatment: recognition of vulnerability. Disabil Rehabil. 2015;37(19):1770-6.
  • 29
    Schutz A. Fenomenologia e Relações Sociais: textos escolhidos de Alfred Schutz. Wagner HR, editor. Rio de Janeiro: Zahar; 1979.
  • 30
    Sontag S. A doença como metáfora. Ramalho M, editor. Rio de Janeiro: Graal; 1984.
  • 31
    Tighe M, Molassiotis A, Morris J, Richardson J. Coping, meaning and symptom experience: a narrative approach to the overwhelming impacts of breast cancer in the first year following diagnosis. Eur J Oncol Nurs. 2011;15(3):226-32.
  • 32
    Saldanha JHS, Pereira APM, Neves RF, Lima MAG. Facilitadores e barreiras de retorno ao trabalho de trabalhadores acometidos por LER/DORT. Rev Bras Saúde Ocup. 2013;38(127):122-38.
  • 33
    Bury M. Doença crônica como ruptura biográfica Michael Bury. Tempus. 1979;edição esp:41-55.
  • 34
    Goffman E. Estigma: Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4a ed. Rio de Janeiro: LTC; 1988.
  • 35
    Munhall PL. Philosophical ponderings on qualitative research methods in nursing. Nurs Sci Q. 1989;2(1):20-8.
  • 36
    Goffman E. Ritual de interação: ensaios sobre o comportamento face a face. Petrópolis: Vozes; 2011.
  • 37
    Arman M, Rehnsfeldt A. Living with breast cancer: a challenge to expansive and creative forces. Eur J Cancer Care. 2002;11(4):290-6.
  • 38
    Lima MAG, Trad LAB. "Circuloterapia": uma metáfora para o enfrentamento da dor crônica em duas clínicas de dor. Physis Rev Saúde Coletiva. 2011;21(1):217-36.
  • 39
    Neves RF. Experiência e significado no retorno ao trabalho para trabalhadores com transtorno mental [tese]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2016.
  • 40
    Rabelo MCM, Alves PCB. Significação e metáforas na experiência da enfermidade. In: Rabelo MCM, Alves PCB, Souza IMA, editores. Experiência de doença e narrativa. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1999. p. 171-85.
  • Os autores informam que o trabalho não foi apresentado em evento científico.
  • Manuscrito baseado na dissertação de mestrado Sobreviventes: os significados do retorno ao trabalho após a experiência do câncer de mama, de Jamille Baultar Costa, apresentada em 2017 ao Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2018
  • Revisado
    17 Dez 2018
  • Aceito
    25 Fev 2019
Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - FUNDACENTRO Rua Capote Valente, 710 , 05409 002 São Paulo/SP Brasil, Tel: (55 11) 3066-6076 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbso@fundacentro.gov.br