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Análise comparativa do controle postural de indivíduos com e sem lesão do ligamento cruzado anterior do joelho

Resumos

O equilíbrio é o processo de manutenção do centro de pressão (CP), projeção do centro de gravidade no solo, dentro da área da base de suporte do corpo. Este estudo avalia o controle postural em pacientes portadores de lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho e de indivíduos saudáveis, através de parâmetros do centro de pressão. Dezenove indivíduos saudáveis entre 18 e 30 anos e dezenove pacientes portadores de lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho entre 15 e 33 anos foram avaliados empregando sensores FSCAN MAT® (Tekscan®, Boston, MA, USA). Todos os indivíduos realizaram quatro testes estáticos diferentes com apoio unilateral, variando os lados e a abertura e o fechamento dos olhos. Os parâmetros comprimento total da trajetória, amplitude antero-posterior, amplitude médio-lateral e velocidade máxima do centro de pressão foram calculados. Os resultados mostraram que a dominância dos membros inferiores não exerce influência significativa no equilíbrio dos indivíduos saudáveis, que a visão é um fator importante na estabilização do controle postural e que a lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho compromete o equilíbrio em apoio unilateral e em ambos os lados, porém, de modo mais evidente, no lado lesado.

Equilíbrio; Ligamento cruzado anterior; Joelho


Standing balance is the process which keeps the pressure center, vertical projection of the centre of gravity on ground inside the body weight-bearing. This study evaluates posture control in patients with unilateral lesion of anterior cruciate ligament of knee and in healthy individuals (control group), through parameters of pressure center. Nineteen healthy individuals (11 men, 8 women, age ranged from 18 to 30 years) and nineteen patients with unilateral lesion of anterior cruciate ligament of knee (18 men, 1 woman, age ranged from 15 to 33 years) were evaluated by FSCAN MAT® version 3848 (Tekscan® , Boston, MA, USA) sensors. Four different static tests with unilateral bearing were made, alternating the sides (dominant and non dominant) and keeping open or closed eyes. The parameters were calculated: total length path, antero-posterior amplitude, medio-lateral amplitude and maximum speed of pressure center. The results have pointed out that: the dominance of inferior limbs does not affect in a special way the balance of healthy individuals, the vision is an important factor in posture control and the unilateral lesion of anterior cruciate ligament of knee affects the balance in unilateral weight bearing, on both sides, however more evident on the side with the lesion.

Balance; Anterior cruciate ligament; Knee


ARTIGO ORIGINAL

Análise comparativa do controle postural de indivíduos com e sem lesão do ligamento cruzado anterior do joelho

Karla Sayuri TookuniI; Raul Bolliger NetoII; César Augusto Martins PereiraIII; Daniel Rúbio de SouzaIV; Julia Maria D' Andrea GreveV; Artêmio D' Agosto AyalaVI

IFisioterapeuta, aluna do Curso de Aprimoramento em Biomecânica do Aparelho Locomotor do Programa de Aprimoramento Profissional do Núcleo de Capacitação e Desenvolvimento do HC-FMUSP

IIMédico ortopedista, assistente doutor e vice-responsável pelo Laboratório de Biomecânica do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HC-FMUSP

IIITecnólogo em saúde, especialista em Biomecânica e coordenador da área de mecânica do Laboratório de Biomecânica do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HC-FMUSP

IVMédico fisiatra do Laboratório de Estudos de Movimento do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HC-FMUSP

VMédica fisiatra, Professora livre docente da FMUSP

VIFisioterapeuta, aluno do Curso de Aprimoramento em Fisioterapia em Ortopedia do Programa de Aprimoramento Profissional do Núcleo de Capacitação e Desenvolvimento do HC-FMUSP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Raul Bolliger Neto Rua Ovidio Pires de Campos, 333 Cerqueira Cesar – São Paulo CEP 05403-010 – Laboratório de Biomecânica E-mail: lim.iot@hcnet.usp.br

RESUMO

O equilíbrio é o processo de manutenção do centro de pressão (CP), projeção do centro de gravidade no solo, dentro da área da base de suporte do corpo. Este estudo avalia o controle postural em pacientes portadores de lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho e de indivíduos saudáveis, através de parâmetros do centro de pressão.

Dezenove indivíduos saudáveis entre 18 e 30 anos e dezenove pacientes portadores de lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho entre 15 e 33 anos foram avaliados empregando sensores FSCAN MAT® (Tekscan®, Boston, MA, USA). Todos os indivíduos realizaram quatro testes estáticos diferentes com apoio unilateral, variando os lados e a abertura e o fechamento dos olhos. Os parâmetros comprimento total da trajetória, amplitude antero-posterior, amplitude médio-lateral e velocidade máxima do centro de pressão foram calculados.

Os resultados mostraram que a dominância dos membros inferiores não exerce influência significativa no equilíbrio dos indivíduos saudáveis, que a visão é um fator importante na estabilização do controle postural e que a lesão unilateral do ligamento cruzado anterior do joelho compromete o equilíbrio em apoio unilateral e em ambos os lados, porém, de modo mais evidente, no lado lesado.

Descritores: Equilíbrio; Ligamento cruzado anterior; Joelho.

INTRODUÇÃO

O equilíbrio é o processo de manutenção da projeção do centro de gravidade (CG) dentro da área da base de suporte do corpo(1), que requer ajustes constantes da atividade muscular e do posicionamento articular. O centro de pressão (CP) do indivíduo, ponto onde está localizado o vetor resultante da força vertical de reação do solo, que representa a média ponderada de todas as pressões da área da superfície em contato com o solo, deve mover-se continuamente em relação aos deslocamentos do CG, de acordo com o modelo do pêndulo invertido apresentado por Winter(2).

Os três sistemas envolvidos no controle do equilíbrio são: a visão, o sistema vestibular e o sistema somatossensorial. O sistema vestibular é sensível às acelerações lineares e angulares, enquanto o sistema somatossensorial é composto por vários receptores que percebem a posição e a velocidade de todos os segmentos corporais, seu contato com objetos externos, inclusive o chão, e a orientação da gravidade(2). Através da visão, uma pessoa consegue manter razoavelmente o equilíbrio, mesmo após a destruição do aparelho vestibular ou depois da perda da maioria das informações proprioceptivas(3).

Praticamente todas as perturbações no sistema nervoso e músculo-esquelético levam à degeneração do controle do equilíbrio. Este fato pode não ser aparente até que o indivíduo seja privado do seu sistema de compensação, pelo qual os sistemas íntegros suprem aquele que está deficitário devido à capacidade de adaptação do Sistema Nervoso Central (SNC)(2).

A estabilidade da articulação do joelho depende da interação entre a sua geometria, a restrição dos tecidos moles e as cargas do peso corporal e da ação muscular aplicadas. Enquanto a arquitetura óssea e as características dos meniscos propiciam pouca estabilidade ao joelho, as propriedades do material e de orientação dos ligamentos, cápsula e tecidos moles contribuem significativamente para sua estabilidade. As forças compressivas, resultantes do peso corporal e da atividade muscular, proporcionam forças adicionais que previnem uma sobrecarga dos ligamentos quando o joelho é submetido a cargas excessivas em atividades mais agressivas(4).

Além da estabilidade mecânica, o joelho possui receptores nervosos em sua estrutura. Os sensores do sistema de controle neuromuscular, chamados de mecanorreceptores(4), encontrados nas articulações, na pele e nos músculos, informam ao SNC sobre as mudanças de posição, a percepção do movimento e a tensão da articulação(5). A perda de informações dos mecanorreceptores do ligamento cruzado anterior (LCA) pode ser compensada pelas informações provenientes das demais estruturas do joelho, através de um treinamento específico(6).

A função neurofisiológica proprioceptiva do LCA tem sido considerada tão importante quanto o seu papel biomecânico na manutenção da estabilidade articular(7). As complicações ocorridas após a lesão do LCA, como a osteoartrose, parecem acontecer devido não somente à instabilidade mecânica, mas também à diminuição ou à alteração das informações proprioceptivas(5,8). Várias teorias sugerem que os receptores do LCA e de outras estruturas do joelho exerçam um papel fundamental na manutenção da estabilidade dinâmica desta articulação, baseadas nas vias reflexas existentes entre o joelho e a musculatura da coxa(4).

Para quantificar o equilíbrio, vários autores vêm estudando o deslocamento do CP. Através do rastreamento da trajetória dos CPs instantâneos durante o apoio, o equilíbrio do paciente e o padrão de progressão podem ser determinados(9).

Inúmeras maneiras de mensuração do controle neuromuscular do joelho instável devido à lesão do LCA ou após sua reconstrução cirúrgica foram relatadas, entre elas os testes de posição articular, os testes de cinestesia, o recrutamento muscular associado ao tempo de reação após estímulos internos ou externos, o controle postural e a análise da marcha(10,11). Os testes que simulam atividades funcionais e as mensurações do equilíbrio e da oscilação corporal para os membros inferiores são os meios mais adequados de avaliação da combinação das contribuições periféricas, vestibular e visual para o controle neuromuscular.

Os testes de propriocepção consciente, como os de posição articular e os de cinestesia, são os mais utilizados, porém não reproduzem uma função empregada nas atividades habituais. São realizados em equipamentos como: o dinamômetro isocinético, o eletro-goniômetro ou o aparelho de movimentação passiva contínua. Nos testes de posição articular é enfocada a habilidade do indivíduo reproduzir ângulos articulares, enquanto nos testes de cinestesia é avaliada a habilidade do indivíduo perceber o movimento dos segmentos periféricos. Os testes podem ser realizados tanto de modo ativo quanto passivo(11). O principal teste é aquele que determina o limiar de detecção de movimentação passiva, em que o joelho é movimentado passivamente tanto para a flexão quanto para a extensão, e os sujeitos respondem tão logo percebem o movimento(10).

O tempo de reação é uma das formas de estimar a latência entre um estímulo externo e a contração muscular reflexa. São mensuradas as características da ativação muscular (início, término e magnitude) através de eletromiografia(10,11).

Durante a postura estática, a principal medida utilizada para mensurar o equilíbrio é a oscilação do CP, apesar de não existir um consenso em relação à importância da mesma nas lesões do LCA.

Os equipamentos mais comumente utilizados na mensuração do CP sob diversas patologias, encontrados na literatura, são a plataforma de força (12,13,14,15) ou equipamentos similares de plataformas extensométricas(8,16,17,18). Entretanto, há outros equipamentos capazes de medir o CP, como os sensores de pressão.

O objetivo deste trabalho foi verificar o controle pastoral em apoio unipodal dos indivíduos com lesão unilateral do LCA através de variáveis derivadas do CP, medido através de sensores de pressão, assim como observar a influência da dominância dos membros inferiores e da visão no equilíbrio.

MATERIAL E MÉTODOS

O sistema utilizado para registrar o deslocamento do CP foi o FSCAN MAT, versão 3848 (Tekscan®, Boston, MA, EUA) com sensores pressóricos de alta resolução, cada qual distando 0,8382 centímetros de cada sensor adjacente, e duas unidades transdutoras acopladas ao sistema computadorizado IBM-PC através de cabos condutores coaxiais. Este equipamento registra a força vertical exercida sob o pé do indivíduo (pressão) em cada ponto de uma rede resistiva de linhas e colunas sobrepostas. Ele mostra em tempo real o deslocamento do CP, chamado pelo aparelho de "centro de força" (Figura 2). A freqüência de aquisição foi de 30 Hz. O teste pode ser visualizado em forma gráfica e numérica em relação ao CP, à força ou à pressão. O CP, que foi o parâmetro analisado neste estudo, pode ser determinado pelas coordenadas de linhas e colunas do sensor. Sabendo-se a distância entre cada duas linhas ou colunas adjacentes (0,8382 cm), pode-se posteriormente calcular as distâncias entre os pontos, determinando seu deslocamento.



Foram avaliados dois grupos: um grupo controle (GCON) e outro composto por pacientes com diagnóstico de lesão unilateral do LCA (GLES). O membro inferior preferido para o chute foi apontado como o dominante.

O GCON foi composto por 19 indivíduos, 11 homens e 8 mulheres com idade variando de 18 a 30 anos, 17 com dominância do membro inferior direito(15). Todos não apresentavam história de lesão músculo-esquelética dos membros inferiores (MMII) ou coluna e também não apresentavam história de disfunção neurológica, vestibular ou visual não corrigida; não faziam uso de drogas ou álcool nem de medicamentos que comprometessem o equilíbrio.

O GLES foi composto por 19 indivíduos com lesão do LCA acompanhados pelo ambulatório do Instituto de Ortopedia e Traumatologia (IOT) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). O diagnóstico de lesão do LCA foi realizado através de exame clínico e ressonância magnética (RM). Os critérios de inclusão do GLES foram idênticos aos do GCON, exceto a história de lesão músculo-esquelética dos membros inferiores (MMII), uma vez que os sujeitos necessariamente possuíam lesão unilateral do LCA.

Dos 19 indivíduos, 18 eram homens e uma era mulher, com idades variando entre 15 e 33 anos; 12 tinham dominância no membro inferior direito e 7 tinham-na no esquerdo; 8 tinham o membro inferior direito lesado e 11 o esquerdo.

Os sujeitos foram sempre avaliados primeiramente com os olhos abertos e depois com os olhos fechados. O membro inferior testado inicialmente foi alternado entre direito e esquerdo, seguindo a ordem das avaliações realizadas consecutivamente. Cada sujeito foi avaliado em quatro condições: olhos abertos e apoio no membro inferior direito (AD); olhos abertos e apoio no membro inferior esquerdo (AE); olhos fechados e apoio no membro inferior direito (FD); olhos fechados e apoio no membro inferior esquerdo (FE). O tempo de aquisição dos dados foi de 10 segundos em cada uma das condições. Antes do início dos testes, o indivíduo experimentava o equipamento e as posturas para que pudesse se familiarizar com os mesmos. Entre as avaliações, foram permitidos intervalos entre cada aquisição, de acordo com a necessidade de cada sujeito para evitar os efeitos da fadiga. Cada uma das condições foi repetida por três vezes, sendo considerada para análise a média das três medidas. Ao indivíduo era solicitado permanecer o mais imóvel possível durante a realização do teste. Antes do teste, foi realizada uma breve avaliação para assegurar os critérios de inclusão e exclusão do trabalho.

A postura adotada no teste foi: o sujeito em pé em apoio unipodal olhando para o horizonte (ou com a cabeça orientada para um olhar horizontal, no caso da condição de olhos fechados), o tronco em posição ereta e confortável com os membros superiores ao lado do corpo, enquanto o membro inferior não apoiado permanecia com o quadril posição neutra e o joelho fletido a 90º (Figura 1). O quadril e o joelho do membro inferior apoiado permaneciam em angulação neutra. Os pés estavam sempre descalços.

Os dados obtidos a partir do F-MAT foram convertidos para o programa Microsoft Excel, no qual foram analisados os seguintes parâmetros: o comprimento total da trajetória do deslocamento do CP (CT); a amplitude dos deslocamentos do CP nos sentidos ântero-posterior (AP) e médio-lateral (ML) e a velocidade máxima atingida pelo CP (VM).

Uma vez que o CP era dado através de coordenadas X e Y, o comprimento da trajetória do deslocamento do CP entre dois quadros consecutivos (CTinst) foi calculado pelo teorema de Pitágoras:

CTinst2 = ((Yb '" 0,8382) - (Ya '" 0,8382)) 2 + ((Xb '" 0,8382) (Xa '" 0,8382)) 2

Onde,

CTinst (cm) = comprimento da trajetória do deslocamento do CP do ponto "a" ao ponto "b"

Yb= ordenada ântero-posterior final

Ya = ordenada ântero-posterior inicial

Xb = abscissa médio-lateral final

Xa = abscissa médio-lateral inicial 0,8382 (cm) = distância entre os sensores

Assim, o comprimento total da trajetória do deslocamento do CP (CT) foi obtido através da soma dos 300 "CTinst" de cada teste:

CT = CTinst (1º quadro) + CTinst (2º quadro) + ... + CTinst (300º quadro)

A amplitude do deslocamento ântero-posterior do CP (AP) e a amplitude do deslocamento médio-lateral do CP (ML) foram obtidas a partir da diferença entre o valor máximo e mínimo do deslocamento do CP, nos respectivos sentidos:

AP = (Ymáx '" 0,8382) - (Ymín'" 0,8382)

e

ML = (Xmáx '" 0,8382) - (Xmín'" 0,8382)

Onde,

AP (cm) = amplitude do deslocamento ântero-posterior do CP

Ymáx = valor máximo da ordenada ântero-posterior

Ymín = valor mínimo da ordenada ântero-posterior

ML (cm) = amplitude do deslocamento médio-lateral do CP

Xmáx = valor máximo da abscissa médio-lateral

Xmín = valor mínimo da abscissa médio-lateral

0,8382 cm = distância entre os sensores

A velocidade máxima atingida pelo deslocamento do CP (VM) entre dois quadros consecutivos foi calculada por:

VM = CTinstmáx / 0,033332

Onde,

VM (cm/s)= velocidade máxima atingida pelo CP entre dois quadros consecutivos

CTinstmáx (cm)= comprimento da trajetória do deslocamento máximo do CP entre dois pontos consecutivos.

0,033332 (s)= intervalo entre a aquisição dos dois quadros consecutivos

Foi realizada a estatística descritiva dos parâmetros quantitativos medidos, calculando-se: média, desvio-padrão, erro-padrão, valor mínimo e valor máximo.

A comparação entre os grupos controle e caso foi feita através do teste "t" de Student nas amostras paramétricas e do teste "U" de Mann-Whitney nas amostras não paramétricas. Para comparação entre os lados dominante e não-dominante do grupo controle, entre os lados lesado e não-lesado do grupo caso e entre as condições de olhos abertos e olhos fechados, foi aplicado o teste "t" pareado nas amostras paramétricas ou a prova de Wilcoxon nas amostras não paramétricas. Em todos os testes foi adotado nível de significância de 5% (a = 0,05).

RESULTADOS

Os resultados estão expressos nas Tabelas 1 e 2 e nas Figuras de 3 a 8. Foram encontradas diferenças significativas em relação à visão, tanto no GCON como no GLES.







Quanto à dominância dos membros inferiores, não foram encontradas diferenças significativas em nenhum dos parâmetros analisados; sendo agrupados os resultados dos membros inferiores dominante e não dominante do GCON para comparação com o GLES.

Na comparação entre o membro inferior lesado e o membro inferior não lesado do GLES foram observadas diferenças significativas apenas no CT e AP com os olhos abertos.

O membro inferior não lesado (GLES) apresentou diferenças em relação aos indivíduos normais em todos os parâmetros exceto no CT (olhos abertos e fechados) e nos AP e VM (olhos abertos).

As diferenças foram estatisticamente significativas em todos os parâmetros analisados quando feita a comparação do CCON e do membro inferior lesado do GLES.

DISCUSSÃO

A instabilidade é uma manifestação freqüente em indivíduos que sofrem lesão do LCA, sendo um fator limitante das atividades de vida diária. Vários métodos vêm sendo utilizados para avaliar o controle postural com o intuito de quantificar este distúrbio, para possibilitar um melhor acompanhamento da evolução do tratamento cirúrgico ou conservador de pacientes com esta lesão.

A plataforma de força e suas adaptações são os instrumentos mais freqüentemente utilizados para medir o equilíbrio de indivíduos com lesão de LCA ou submetidos a algum tipo de tratamento(8,10,17,18,19). Não foram encontrados trabalhos que utilizassem os sensores de pressão, como o F-SCAN MATT, para tal fim.

Foram avaliados indivíduos jovens para evitar a interferência de problemas de equilíbrio ou de maior oscilação corporal, apresentados pelos idosos(20). A separação pelo sexo, quando se trata de um grupo de indivíduos jovens, não é necessária.

O CP é considerado o vetor resultante de reação da força vertical do solo e o deslocamento do CP relaciona-se com a aceleração do CG(2). Alguns autores consideram que a localização do CP corresponde à localização do CG(17); no entanto, apesar das diferenças de conceituação, todos levam em conta, para avaliação, o ponto indicado pela plataforma de força como o "centro de força", independente da denominação CP ou CG utilizada. Há outros autores que estimam o CG através da "magnetometria da oscilação"(21,22) ou por sistema de análise do movimento(22).

O método empregado neste estudo foi considerado de fácil aplicação e sensível à instabilidade causada pela lesão do LCA. A utilização de testes estáticos não é recomendada(18). Testes dinâmicos, como os que utilizam uma prancha de equilíbrio, são mais apropriados.

Verificamos que a falta de informações visuais resulta em um pior equilíbrio, tanto no grupo controle quanto no grupo lesado.

Acredita-se que as diferenças significativas observadas no CT e no AP entre o membro inferior lesado e o membro inferior não lesado do GLES sejam devidas à grande instabilidade causada pela lesão do LCA no sentido ântero-posterior. Nos estudos de Zätterström et al.(19) e O'Connell et al.(18) não foram observadas diferenças entre os membros lesados e não lesado e os autores acreditam que tal fato seja devido a um comprometimento bilateral dos indivíduos com lesão unilateral de LCA. Em indivíduos submetidos à reconstrução de LCA, Harrison et al.(8) e Henriksson et al.(17) também não verificaram diferenças significativas.

Deve-se ter cautela ao se considerar o membro inferior não lesado como um parâmetro de normalidade. E ainda, para um programa de reabilitação, o membro inferior não lesado não deve ser negligenciado.

As diferenças verificadas em todos os parâmetros na comparação entre o CGON e o membro inferior lesado do GLES foram também encontradas por Fridén et al.(23) e Zätterström et al.(19) ; ao contrário de O'Connell et al.(18) que não encontraram diferenças neste tipo de comparação. Harrison et al.(8) e Henriksson et al.(17) não encontraram diferenças entre pessoas normais e indivíduos com reconstrução do LCA.

O déficit do equilíbrio encontrado neste estudo poderia ser explicado por fatores biomecânicos, como a frouxidão ou a atrofia muscular, bem como pela deficiência proprioceptiva encontrada em indivíduos com lesão de LCA. Zätterström et al.(19) verificaram que a melhora isolada da força muscular não é capaz de restaurar integralmente o equilíbrio de indivíduos com lesão de LCA. Henriksson et al.(17) observaram que, mesmo em indivíduos com frouxidão do lado lesado em relação ao não lesado, não é encontrada diferença na oscilação postural entre os membros. O grau de influência dos fatores biomecânicos e proprioceptivos não foi avaliado neste trabalho.

Sugerimos que, em trabalhos futuros, o teste empregado neste estudo seja utilizado para o acompanhamento do tratamento cirúrgico ou conservador dos indivíduos com lesão do LCA. A avaliação de outros distúrbios músculo-esqueléticos de membros inferiores ou de outras condições que levem a uma alteração do equilíbrio também é de grande utilidade. O emprego do teste poderia não se restringir somente a uma avaliação do tratamento efetuado, podendo ele também constituir meio preventivo ou prognóstico, caso, por exemplo, relacione um pior controle postural a uma predisposição a lesões ou quedas. Há, ainda, uma carência de estudos que relacionem o equilíbrio com o grau de influência da força muscular, da propriocepção, da frouxidão articular e do tempo de resposta a estímulos.

CONCLUSÕES

1) O método testado com o F-SCAN MATT mostrou-se eficaz na mensuração do controle postural de indivíduos com lesão de LCA.

2) A dominância de membros inferiores não exerce influência no controle postural de indivíduos jovens saudáveis.

3) A visão é um fator importante na estabilização do controle postural.

4) A lesão de LCA compromete o equilíbrio bilateralmente; porém, de modo mais intenso quando se apóia sobre o membro inferior lesado.

5) A utilização do membro inferior não lesado de indivíduos com lesão unilateral de LCA como lado controle deve ser considerada com cautela.

Trabalho recebido em: 02/08/04 aprovado em 06/05/05

Trabalho realizado no Laboratório de Biomecânica e Laboratório de Estudos de Movimento do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2005
    • Data do Fascículo
      2005

    Histórico

    • Recebido
      02 Ago 2004
    • Aceito
      06 Maio 2005
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