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Resistência à compressão do solo-cimento com substituição parcial do cimento Portland por resíduo cerâmico moído

Compressive strength of soil-cement with partial replacement of the Portland cement by crushed ceramic waste

Resumos

Neste trabalho, apresenta-se o estudo experimental da resistência à compressão do solo-cimento, com substituição parcial do cimento Portland por resíduo cerâmico moído. Para tanto, foram ensaiados 81 espécimenes cilíndricos desse material à compressão, em que parte do cimento foi substituída por material cerâmico moído. Realizou-se uma programação fatorial, na qual três variáveis foram selecionadas para estudo: o teor de material ligante (cimento + resíduo cerâmico), a umidade do solo e o teor de resíduo cerâmico adicionado. É apresentado um estudo estatístico através de análise de variância da massa específica do material e da resistência a compressão. Tal estudo permitiu concluir-se que substituições de 25 e 57% do teor de cimento por material cerâmico podem produzir blocos de solo-cimento com resistências superiores a 2 MPa, com teor de material ligante de 6 e 8%, respectivamente.

estabilização do solo; resíduo cerâmico; resistência a compressão


In this paper, an experimental study of the compressive strength of soil-cement with partial replacement of the Portland cement by crushed ceramic waste is presented and discussed. For this, eighty-one cylindrical specimens of soil-cement were tested, where part of cement percentage was replaced by crushed ceramic waste. The experiment was conducted in factorial design and three variables were selected and studied: the binding material content (cement + ceramic waste), soil moisture content and the ratio of ceramic waste. A statistical study using variance analysis of the specific mass and compressive strength of the material is presented. This study concluded that replacement ratios of 25 and 57% of the Portland cement by crushed ceramic material can be used to fabricate soil-cement bricks with strength higher than 2 MPa, for a binding material content of 6 and 8% respectively.

soil stabilization; ceramic waste; compressive strength


CONSTRUÇÕES RURAIS E AMBIÊNCIA

Resistência à compressão do solo-cimento com substituição parcial do cimento Portland por resíduo cerâmico moído

Compressive strength of soil-cement with partial replacement of the Portland cement by crushed ceramic waste

Rivanildo DallacortI; Humberto C. Lima JúniorII; Fábio L. WillrichIII; Normando P. BarbosaIV

ILab. de Modelos Reduzidos/CCET/UNIOESTE. Rua Universitária 2069, CEP 85814-110, Cascavel, PR. Fone: (45) 220-3221. E-mail: rivanildo@unioeste.br

IILab. de Modelos Reduzidos. E-mail: correialima@unioeste.br

IIILab. de Modelos Reduzidos. E-mail: flwillrich@unioeste.br

IVUFPB/CT. CEP 58059-900, João Pessoa, PB. Fone: (83) 246-2669. E-mail: npperazzo@lsr.ct.ufpb.br

RESUMO

Neste trabalho, apresenta-se o estudo experimental da resistência à compressão do solo-cimento, com substituição parcial do cimento Portland por resíduo cerâmico moído. Para tanto, foram ensaiados 81 espécimenes cilíndricos desse material à compressão, em que parte do cimento foi substituída por material cerâmico moído. Realizou-se uma programação fatorial, na qual três variáveis foram selecionadas para estudo: o teor de material ligante (cimento + resíduo cerâmico), a umidade do solo e o teor de resíduo cerâmico adicionado. É apresentado um estudo estatístico através de análise de variância da massa específica do material e da resistência a compressão. Tal estudo permitiu concluir-se que substituições de 25 e 57% do teor de cimento por material cerâmico podem produzir blocos de solo-cimento com resistências superiores a 2 MPa, com teor de material ligante de 6 e 8%, respectivamente.

Palavras-chave: estabilização do solo, resíduo cerâmico, resistência a compressão

ABSTRACT

In this paper, an experimental study of the compressive strength of soil-cement with partial replacement of the Portland cement by crushed ceramic waste is presented and discussed. For this, eighty-one cylindrical specimens of soil-cement were tested, where part of cement percentage was replaced by crushed ceramic waste. The experiment was conducted in factorial design and three variables were selected and studied: the binding material content (cement + ceramic waste), soil moisture content and the ratio of ceramic waste. A statistical study using variance analysis of the specific mass and compressive strength of the material is presented. This study concluded that replacement ratios of 25 and 57% of the Portland cement by crushed ceramic material can be used to fabricate soil-cement bricks with strength higher than 2 MPa, for a binding material content of 6 and 8% respectively.

Key words: soil stabilization, ceramic waste and compressive strength

INTRODUÇÃO

Solo-cimento é definido como a mistura de solo pulverizado, cimento Portland e água que, sob compactação a um teor de umidade ótima, forma um material estruturalmente resistente, estável, durável e de baixo custo (Freire, 1976). O início da utilização deste material no Brasil data de 1936 e, atualmente, uma vasta literatura sobre o assunto pode ser encontrada (Barbosa et al., 1997). Nos últimos anos diversas pesquisas têm sido realizadas visando à redução do custo, tanto do concreto quanto da estabilização do solo, através da substituição parcial do cimento Portland por diversas adições minerais, tais como: cinza de casca de arroz, sílica ativa, metacalinita e cinza volante, entre outros (Rolim & Freire, 1998; Akasaki & Silva, 2001 e Farias Filho et al., 2001). Essas adições minerais possuem alguma sílica e alumínio em forma amorfa que, na presença da água, podem combinar-se quimicamente com a cal oriunda da hidratação do cimento, para formar compostos semelhantes aos silicatos e aluminatos de cálcio hidratado, o que se denomina de reação pozolânica. Este fato tem sido explorado por alguns pesquisadores visando, além de melhorar as propriedades mecânicas do solo estabilizado, diminuir a alcalinidade desse material, quando da utilização de fibras naturais. Outras adições usadas no cimento, como o pó de calcário moído, não possuem ação pozolânica porém, devido à elevada finura, seus grãos podem preencher os vazios entre as partículas maiores do cimento aumentando, assim, a compacidade do solo e, por conseqüência, sua resistência. A este efeito dá-se o nome de efeito fíler. Outro fator de incentivo da utilização das adições minerais é que a maioria delas é subproduto ou resíduo industrial.

Um material que se enquadra dentro dos especificados acima e que pode ser utilizado como estabilizante do solo, é o resíduo cerâmico, proveniente da construção civil e de olarias (Ay & Ünal, 2000). Atualmente, o Brasil gera cerca de 90 kg por habitante por ano desse resíduo, que é quase todo lançado ao meio ambiente, sem nenhum tratamento (Pinto, 1999). A maioria das argilas, com as quais se fabricam blocos cerâmicos, em estado natural possui pequena atividade pozolânica porém, quando calcinada a uma temperatura da ordem de 700 a 900 ºC, torna-se reativa. O tratamento térmico destrói a estrutura cristalina da argila e a transforma em uma estrutura sílico-aluminosa amorfa. Este material, quando moído, apresenta composição físico-química dentro das especificadas pela ASTM 618 (ASTM, 1992) para uso como adição mineral em misturas com cimento Portland.

O presente trabalho tem como objetivo principal investigar o comportamento à compressão do solo estabilizado com cimento Portland, no qual parte do cimento foi substituída por resíduos cerâmicos finamente pulverizados. Assim, foi analisado o efeito da substituição na capacidade portante do solo estabilizado com diversas combinações das variáveis: umidade, teor de material ligante e taxa de substituição do cimento por resíduo cerâmico. São apresentadas análises estatísticas e equações da variação da massa específica aparente e do comportamento à compressão desse material em relação às variáveis estudadas.

MATERIAL E MÉTODOS

Solo

Utilizou-se o solo Latossolo Bruno Disftrófico, oriundo de lixiviação intensa, com pH ácido e altos teores de óxido de ferro e alumínio, obtido na Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus de Cascavel, tendo sido retirada a camada superficial de cerca 60 cm, rejeitada devido à presença de matéria orgânica. Foram extraídos cerca de 1200 kg do material, que foi levado ao laboratório e deixado para secar sobre lona plástica, à sombra, pelo período de um mês. Neste tempo, o solo foi revirado a cada dois dias. Após a secagem, foi ensacado e, em seguida, foram retiradas seis amostras para análise granulométrica, realizada segundo a NBR 7181 (ABNT, 1984d) e mais seis para determinação dos limites de plasticidade e de liquidez e do índice de plasticidade, obtidos segundo a NBR 7180 (ABNT, 1984b) e NBR 6459 (ABNT, 1984a). A análise granulométrica mostrou que se tratava de um solo argiloso, com 80,02% de argila, 17,5% de silte e 2,3% de areia fina, bem como com limites de liquidez e de plasticidade e índice de plasticidade de 53, 32 e 21%, respectivamente.

Segundo Freire (1976) solos com altas concentrações de argila necessitam de teores de cimento elevados, devido à grande área superficial dos grãos. A ABCP (1989) sugere que, para um consumo mínimo de cimento, o solo deve apresentar teores de argila mais silte e areia, da ordem de 35 e 65%, e limite de liquidez, limite de plasticidade e índice de plasticidade inferiores a 45, 18 e 10%, respectivamente.

Com base no exposto, decidiu-se realizar uma correção granulométrica do solo, de forma a satisfazer os limites sugeridos pela ABCP (1989). Esta correção consistiu em se adicionar, para cada 35 kg de solo seco em estufa, 65 kg de areia quartzosa extraída do Rio Paraná, com módulo de finura de 2,11, diâmetro máximo característico de 2,4 mm e massa específica aparente de 2,65 kg dm-3. A mistura foi realizada em uma betoneira de 250 L, por um período de 10 min. Após a mistura, foram retiradas novamente seis amostras para análise granulométrica e mais seis para determinação dos limites de plasticidade e liquidez e do índice de plasticidade. A Figura 1 apresenta a curva granulométrica do solo obtido após a mistura, que resultou em um solo areno-argiloso, dentro dos padrões sugeridos pela ABCP (1989) com 0,2% de pedregulho, 19,9% de areia grossa, 43,8% de areia fina, 8,1% de silte e 28,0% de argila. Os limites de liquidez e plasticidade deste solo, bem como o seu índice de plasticidade, eram de 19,01, 11,96 e 7,05%, respectivamente.


Cimento

Utilizou-se cimento Portland de alta resistência inicial - CP V ARI, cuja caracterização físico-química foi realizada pelo fabricante e tem os resultados apresentados na Tabela 1.

Resíduo cerâmico

Os resíduos cerâmicos foram obtidos em olaria local da cidade de Cascavel, PR, e eram constituídos por blocos cerâmicos com pequenas trincas, provocadas pelo processo de queima e que, por isso, foram rejeitados no controle de qualidade da empresa. Os blocos utilizados foram calcinados a uma temperatura de 800 a 900 ºC por um período de 10 h. Os mesmos foram selecionados, levados ao laboratório e moídos na máquina para ensaio de Abrasão Los Angeles (NBR-6465 - ABNT, 1984b). Após a moagem, os resíduos foram peneirados, de maneira que foi utilizado apenas o material passante na peneira ABNT 300 (0,05 mm). O material retido na peneira era devolvido à máquina Los Angeles, para mais um ciclo de moagem. Após a moagem de todo o material, este foi armazenado em sacos plásticos e amostras foram retiradas para análise físico-química. Os ensaios físicos consistiram-se na determinação da massa, da área específica e do índice de atividade pozolânica do material; já os químicos, na análise de espectrometria de raio X.

Ensaio de compactação

Para a obtenção da umidade ótima do solo, foi utilizado o ensaio de Proctor Modificado. O teste consistiu em compactar amostras de solos com diferentes umidades em um molde cilíndrico metálico, com 96,2 mm de diâmetro e 127,3 mm de altura, em três camadas, por meio de 25 golpes de um soquete de 5 kg, caindo de uma altura de 45 cm. Após a compactação, o cilindro de solo era retirado do molde e pesado em uma balança eletrônica com precisão de 0,1 g; em seguida, três amostras do solo foram extraídas do cilindro, pesadas em balança eletrônica com precisão de 0,001 g e levadas à estufa a uma temperatura de 100 ºC, por 24 h. Ao término deste período, as amostras eram novamente pesadas e suas umidades calculadas. Com os valores das massas dos cilindros de solo e as respectivas umidades, foi possível obter-se a curva de compactação do material, que está representada na Figura 2. Analisando-se esta, verifica-se que a umidade ótima e a respectiva massa específica aparente são iguais a 15,34% e 1938,10 kg m-3, respectivamente. Devido à variação de umidade do solo seco ao ar, foram selecionados três níveis de umidade para análise, de modo que a umidade ótima se localizasse entre os valores escolhidos. Foram escolhidas, então, as umidades de 12, 14 e 16%, cujas massas específicas aparentes são 1830,62, 1919,63 e 1933,29 kg m-3, respectivamente.


Variáveis estudadas e preparação dos corpos-de-prova

O procedimento de escolha das variáveis e os níveis de investigação foram obtidos através de uma programação fatorial de experimentos (Montgomery, 1984). Três variáveis foram escolhidas como fatores principais de avaliação: a percentagem de material ligante (cimento + material cerâmico) adicionada (X1), o teor de umidade da mistura (X2) e o teor de material cerâmico em substituição ao cimento (X3). Foram escolhidos três níveis de estudo para cada variável, resultando em um projeto fatorial 33. Os três níveis de estudo do material ligante adicionado, foram 6, 8 e 10%; do teor de umidade foram 12, 14 e 16%; e do teor de material cerâmico, foram 0, 25 e 50%. Para cada combinação de variáveis foram ensaiados três espécimenes.

Os espécimenes foram moldados em formas metálicas cilíndricas, com altura de 20 cm e diâmetro de 10 cm. O solo apresentava umidade natural da ordem de 4,5%; entretanto, para a verificação exata da umidade, três amostras de solo de cada masseira foram extraídas, segundos antes da mistura, e levadas à estufa para secagem a 100 ºC, por um período de 24 h, para futuras correções. Então, os materiais (solo, cimento, resíduo cerâmico e água) foram misturados em uma betoneira de 150 L por um período de 15 min; em seguida, a mistura foi lançada dentro dos moldes em três camadas, e cada camada compactada com 25 golpes do soquete do ensaio de Proctor. Foi utilizado um funil metálico, com diâmetro de 10 cm, para auxiliar a compactação da última camada. Ao término da compactação, um centímetro da parte superior dos espécimenes foi extraído com uma espátula e preenchido com argamassa de cimento Portland, no traço 1:2, fator água-cimento 0,3 e resistência à compressão média igual a 40,25 MPa. Este procedimento visou garantir a uniformidade na compactação do solo-cimento, ao longo de toda a altura dos espécimenes e permitir, também, um acabamento melhor da superfície superior desses. Após a moldagem, os espécimenes foram deixados nas formas e cobertos com uma lona plástica, durante sete dias. Após o término do período de cura, os espécimenes foram desmoldados, pesados e tiveram suas extremidades inferior e superior capeadas com enxofre. Na Figura 3A apresenta-se o aspecto dos espécimenes analisados.



Ensaio e instrumentação

Os espécimenes foram ensaiados em um pórtico metálico rígido (Fig. 3B), com capacidade de carga de 100 kN. Ao pórtico foi associado um atuador hidráulico, com capacidade de carga de 100 kN e controle de carregamento manual. Uma célula de carga de 50 kN foi acoplada ao sistema e as leituras foram obtidas por um sistema de aquisição de dados. Placas rígidas de aço foram dispostas nas extremidades dos espécimenes e uma rótula bidirecional na extremidade inferior. Antes do posicionamento de cada espécime no sistema de ensaio, as placas superior e inferior eram limpas e lubrificadas com óleo, e películas de teflon de 0,4 mm eram posicionadas entre as placas e os espécimenes. O carregamento foi aplicado continuamente até o colapso dos corpos-de-prova, a uma taxa da ordem de 0,5 kN s-1. A leitura da carga máxima era obtida através do bloqueador de pico do sistema de aquisição de dados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise físico-química do resíduo cerâmico moído

A composição química, finura e densidade do material cerâmico moído, são apresentadas na Tabela 2. A composição química do material indica que o mesmo apresenta teor de SiO2+ Al2O3+ Fe2O3 superior a 70%, MgO inferior a 3%, SO3 inferior a 3% e CaO inferior a 10%, limites esses estabelecidos pela ASTM 618 C (ABNT, 1992) para o uso como adição mineral em misturas com cimento Portland. O índice de atividade pozolânica calculada segundo a NBR - 5752 (ABNT, 1992) foi de 84,21%. Esses resultados mostram que o resíduo cerâmico moído pode ser utilizado com material pozolânico.

Comportamento global do ensaio

Os procedimentos de ensaio e moldagem dos espécimenes mostraram-se adequados, e se observou uma aparente uniformidade entre as réplicas, quanto aos valores das resistências e das massas específicas. Dois modos de ruptura também foram observados: colapso por cisalhamento paralelo ao plano, a 45º com o eixo vertical, ocorrendo formação de cone nas extremidades dos espécimenes, e colapso por tração perpendicular ao eixo de aplicação da carga. Não foi observada, em nenhum espécime, a formação de linha de ruptura entre as camadas de compactação do solo nem entre o solo e a camada de argamassa. A camada de argamassa e a região de interação solo-argamassa permaneceram íntegras até a ruptura dos espécimes (Fig. 4).


A análise da umidade natural do solo, no instante da mistura com o cimento, apresentou valor médio de 4,30% e desvio padrão de 0,64%, valor pouco inferior ao adotado (4,5%). Apesar da pequena diferença, optou-se por corrigir os níveis de umidade estudados de 12, 14 e 16 para 11,8, 13,8 e 15,8%, durante a análise dos resultados.

Análise da massa específica aparente

Na Tabela 3 tem-se as massas específicas dos espécimes de solo-cimento. As massas específicas médias para as umidades de 11,8, 13,8 e 15,8% foram 1824,44, 1930,20 e 1980,75 kg m-3, respectivamente, valores que diferem menos que 3% dos obtidos no ensaio de Proctor e que comprovam compactação semelhante entre os dois procedimentos. Segundo PCA (1976) a massa específica é considerada alta quando se situa entre 2000 e 2320 kg m-3, e baixa quando se situa entre 1360 e 1600 kg m-3. Esta Associação afirma ainda que, quanto maior a massa específica, maior será a resistência do material para o mesmo solo e o mesmo teor de cimento, e que um decréscimo de 20 kg m-3 na massa específica aparente implica em um decréscimo de 0,11 MPa na resistência do solo-cimento. A maioria das prensas manuais utilizadas para fabricação de blocos de solo-cimento, aplica pressão estática na compactação do material, da ordem de 2 MPa, que leva a valores de massa específica média da ordem de 1800 kg m-3. Observa-se que os valores das massas específicas obtidos nos espécimes aqui testados, se situaram entre 1800 e 2000 kg m-3.

Para se analisar a influência de cada variável sobre a massa específica aparente do solo-cimento, realizou-se uma análise de variância. Os graus de significância do efeito de cada variável foram testados para um nível de confiabilidade de 95 e 99%, usando-se o teste F. Na Tabela 4 são apresentados os resultados da análise. Com base nesses resultados, observa-se que o fator de influência mais importante é a umidade do solo, seguida pelo teor de material ligante e pelo teor de material cerâmico moído. As três variáveis principais são significantes em um nível de confiabilidade de 99%. Observa-se, ainda, que todos os acoplamentos também apresentam significância em um nível de confiabilidade de 99%.

A influência da umidade do solo na massa específica do solo-cimento, até o valor ótimo, está ligada à lubrificação das partículas do solo, que lhes permite melhor rearranjo, de forma a ocupar o menor volume possível. Ultrapassado o valor ótimo, a água começa a ocupar espaço entre as partículas, provocando diminuição da densidade; já o material ligante, composto pelo cimento e pelo resíduo de blocos moídos, além de criar, com sua hidratação, um esqueleto sólido entre os grãos do solo, tem também o efeito de micro-filer, preenchendo os pequenos vazios entre as partículas de solo, interferindo na massa específica do material.

Com o objetivo de se obter uma equação que correlacione a massa específica do solo-cimento com as variáveis estudadas, realizou-se uma análise de regressão múltipla não-linear com os dados apresentados na Tabela 3. A equação obtida apresentou coeficiente de determinação, R2, de 0,95, e é dada pela Eq. (1):

(1)

na qual g é a massa específica aparente em kg cm-3. Na Figura 5 tem-se as curvas (relativas à Eq. 1) para os diferentes teores de material ligante. Observa-se que, para um teor de material cerâmico moído da ordem de 25% e de material ligante 6%, obtém-se uma massa específica máxima; entretanto, com o aumento do teor de material ligante, esta percentagem decresce. Observa-se, ainda, que para 0% de material cerâmico, a máxima massa específica é obtida com aproximadamente 8% de material ligante; porém, com a elevação do teor de material cerâmico, o teor ótimo de material ligante diminui


Avaliação da resistência a compressão

Na Tabela 5 são apresentadas as resistências à compressão dos espécimenes de solo-cimento. Observa-se que, para 11,8% de umidade, a substituição de 25% de cimento por material cerâmico eleva a resistência do material, em 25,85% e, para substituição de 50%, ocorre decréscimo na resistência, de 35,17%. Para 13,8% de umidade, a substituição de 25% de cimento por material cerâmico eleva a resistência do material em 10,60% e, para substituição de 50%, acontece um decréscimo na resistência, de 30,32%. Finalmente, para 15,8% de umidade a substituição de 25 e 50% de cimento por material cerâmico reduz a resistência do material, em 16,07 e 40,69%, respectivamente.

Olivier et al. (1995) afirmam que a resistência mínima de 2 MPa é suficiente para garantir a qualidade de blocos de solo-cimento, porém na fabricação de blocos de solo-cimento com prensa manual, a energia de compactação do material é inferior à utilizada neste trabalho, o que significa que, para as mesmas proporções e mesmos materiais, os blocos apresentarão resistências inferiores àquelas aqui encontradas. Deste modo, pode-se utilizar a diferença das massas específicas entre os blocos e os espécimenes estudados para estabelecer coeficientes de correlação entre as resistências. Assim, para 6% de material ligante e umidades de 15,8%, a massa específica média dos espécimes foi 2003 kg m-3, isto é, aproximadamente 200 kg m-3 a mais que a massa específica média dos blocos. Considerando-se, então, que para um decréscimo de 20 kg m-3 implica em uma diminuição de 0,11MPa na resistência do solo-cimento (PCA, 1976) tem-se que as resistências dos espécimenes serão cerca de 1,1MPa superiores às dos blocos. Observa-se, assim, que teores de substituição do cimento por material cerâmico da ordem de 25%, são viáveis.

Para se analisar a influência de cada variável sobre a resistência dos espécimenes de solo-cimento, também se realizou uma análise de variância. Os graus de significância do efeito de cada variável foram testados para um nível de confiabilidade de 95 e 99%, usando-se o teste F. Na Tabela 6 são apresentados os resultados da análise. Observa-se novamente que o fator de influência mais importante é a umidade do solo, seguida pelos teores de material cerâmico moído e de material ligante. As três variáveis principais são significantes em um nível de confiabilidade de 99%. Constata-se, ainda, que todos os acoplamentos também apresentam significância em um nível de confiabilidade de 99%.

Seguindo-se o mesmo procedimento do item anterior, realizou-se uma análise de regressão múltipla não-linear com os dados apresentados na Tabela 5, objetivando-se a obtenção de uma equação que correlacionasse a resistência à compressão do material estudado com as variáveis analisadas. A equação obtida apresentou um coeficiente de determinação, R2, de 0,97 e é dada pela Eq. (2):

(2)

na qual s é a resistência à compressão do solo-cimento em (MPa). Na Figura 6 tem-se as curvas (relativas à Eq. 2) para os diferentes teores de material ligante e material cerâmico. Analisando-se as curvas da Figura 6 e se considerando uma perda de resistência de 0,14, 0,72 e 1,00 MPa para as umidades de 11,8, 13,8 e 15,8%, respectivamente, pode-se obter proporções ótimas para fabricação de blocos de solo-cimento-material cerâmico. Através da utilização deste procedimento sugerem-se duas proporções ótimas: 15,8% de umidade, 6% de material ligante e 38% de substituição do cimento por material cerâmico; e 15,8% de umidade, 8% de material ligante e 57% de substituição do cimento por material cerâmico.


CONCLUSÕES

1. Os resíduos de material cerâmico moído apresentaram ação pozolânica e efeito fíler. Obtiveram-se resistências superiores a 2MPa, com substituições de até 57%, para um teor de material ligante de 8%.

2. As curvas de superfície obtidas através das variações da massa específica e da resistência do solo estabilizado, podem ser utilizadas para estimativa de proporções ótimas com relação às variáveis estudadas, foram obtidas e podem ser utilizadas para obtenção de proporções ótimas para a fabricação de blocos de solo-cimento, com o solo em questão.

LITERATURA CITADA

Protocolo 59 - 29/4/2002

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2005
  • Data do Fascículo
    Dez 2002
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