Acessibilidade / Reportar erro

ISOMORFISMO MIMÉTICO EM ESTRATÉGIA: UMA FERRAMENTA PARA INVESTIGAÇÃO1 Pontifícia Universidade Católica do Paraná Programa de Mestrado e Doutorado em Administração Curitiba PR fernando.gimenez@pucpr.br Doutor em Administração pela Universidade de Manchester, Inglaterra. Professor Adjunto do Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Rua Marechal Hermes, 946, ap. 73, Centro Cívico - Curitiba - PR - CEP 80530-230 E-mail: fernando.gimenez@pucpr.br

MIMETIC ISOMORPHISM IN STRATEGY: A TOOL FOR INVESTIGATION

RESUMO

O propósito do artigo é ilustrar como uma ferramenta de análise de posicionamento estratégico, baseada na Psicologia dos Construtos Pessoais, pode auxiliar na identificação de isomorfismo estratégico, contribuindo para maior integração entre as abordagens institucionalista e cognitiva da estratégia. O artigo contribui, também, na constituição de instrumentos de pesquisa que possam ser usados em estudos sobre formação de estratégia, tanto sob a abordagem institucionalista quanto sob a cognitiva. Uma amostra, por conveniência, de quatorze dirigentes de pequenas empresas que estavam participando de um programa de educação continuada para executivos forneceu dados sobre suas empresas e sobre a concorrência com base em um formulário de coleta de dados construído em estudos anteriores. Os dados coletados ilustram a possibilidade de uso da ferramenta, demonstrando a utilização e a operacionalização da grade de repertório, que parece ser adequada para evidenciar a existência de processos isomórficos no nível estratégico entre organizações. A principal contribuição do artigo reside na apresentação de uma forma sistematizada de coleta de dados sobre percepções da concorrência permitindo uma menor interferência da subjetividade do pesquisador na identificação de processos isomórficos em nível estratégico.

PALAVRAS-CHAVE
Institucionalização; Ferramenta de pesquisa; Isomorfismo; Estratégia; Posicionamento competitivo

ABSTRACT

The aim of this paper is to illustrate how a tool for analyzing strategic positioning, based on Personal Constructs Psychology, may help in identifying strategic isomorphism, adding to a greater integration between institutional and cognitive approaches to strategy. The paper also contributes in the development of research instruments that may be applied in studies of strategy formation under the institutional and cognitive approaches. A convenience sample of 14 small business owner-managers, who were attending an executive education program, supplied information about their firms and competitors. The collected data evidenced the possibility of using the research tool, demonstrating the operationalization and use of repertory grid, that seems to be adequate for evidencing of isomorphic process at the strategic level. The main contribution of the paper is the systematization of procedures for data collection of perceptions of competitors allowing for a lesser degree of interference of researchers’ subjectivity in identifying isomorphic processes.

KEYWORDS
Institutionalization; Research tool; Isomorphism; Strategy; Competitive position

1 INTRODUÇÃO

A escolha de uma direção estratégica qualquer pode ser associada com a avaliação e atribuição de significados que dirigentes fazem de seu ambiente competitivo. De fato, a maior parte da literatura sobre estratégia indica a necessidade de avaliar o ambiente competitivo como um passo importante no processo de formulação estratégica (ANSOFF, 1979ANSOFF, H. I. Strategic management. London: Macmillan, 1979.; PORTER, 1980PORTER, M. E. Competitive strategy. New York: Free Press, 1980.; JOHNSON; SCHOLES, 1989JOHNSON, G.; SCHOLES, K. Exploring Corporate Strategy. 2. ed. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1989.; JENKINS; AMBROSINI, 2002JENKINS, M.; AMBROSINI, V. Strategic management - a multi-perspective approach. Basingstoke: Palgrave, 2002). A avaliação competitiva insere-se em um pro- cesso mais amplo de configuração organizacional que, para Miles e Snow (1978)MILES, R. E.; SNOW, C. C. Organizational strategy, structure and process. New York: McGraw-Hill, 1978. depende das percepções de coalizões dominantes sobre condições ambientais e das decisões tomadas no que diz respeito a como a organização lidará com essas condições, de modo que se entende que o ambiente dá forma e é formado pelas ações dos dirigentes organizacionais - um processo de construção do ambiente (WEICK, 1979______. The social psychology of organising. Reading: Addison Wesley, 1979.).

O processo de construção do ambiente se materializa mediante uma série de escolhas que dizem respeito a mercados, produtos, tecnologia, escala desejada de operações, entre outros, que levam à construção de um ambiente específico pelas organizações. Essa construção, contudo, é restringida pelo conhecimento existente de formas alternativas de organização e pelas crenças dos administradores sobre como pessoas podem ser administradas (MILES; SNOW, 1978MILES, R. E.; SNOW, C. C. Organizational strategy, structure and process. New York: McGraw-Hill, 1978.).

Uma análise surpreendente que surge do estudo da literatura sobre estratégia diz respeito à falta de clareza no que diz respeito à adequação de estratégias e processos de formação estratégica a diferentes contextos ambientais (SEGEV, 1987SEGEV, E. Strategy, strategy making and performance - an empirical investigation. Management Science, v. 33, n. 2, p. 258-269, 1987.; GIMENEZ, 2000______. O estrategista na pequena empresa. Maringá: edição do autor, 2000.; MEYER et al. 2002MEYER, G. D. et al. The entrepreneurship-strategic management interface. In: HITT, M. A. et al. Strategic entrepreneurship - creating a new mindset. Oxford: Blackwell, 2002.). Estudos que se voltaram para a análise da relação entre condições ambientais, estratégias corporativas ou competitivas e desempenho econômico - principal questão que tem atraído a atenção de pesquisadores - não conseguiram ser conclusivos (FAHEY; CHRISTENSEN, 1986FAHEY, L.; CHRISTENSEN, H. K. Evaluating the research on strategy content. Journal of Management, v. 12, n. 2, p. 167-183, 1986.). Por sua vez, estudos voltados para a análise dos processos de formação estratégica também não indicaram uma clara associação entre sucesso empresarial e processos específicos de formação de estratégia (HUFF; REGER, 1987HUFF, A. S.; REGER, R. K. A review of strategic process. Journal of management, v. 13, n. 2, p. 211-236, 1987.).

Pode-se supor que as dificuldades encontradas na área de administração estratégica para a formalização de modelos conceituais mais conclusivos apresentam-se, mais fortemente, em dois aspectos. Em primeiro lugar, a própria complexidade do fenômeno em estudo impede a sua apreensão em uma abordagem científica ortodoxa, cuja característica básica é a busca da causalidade. Em segundo, a mensuração do fenômeno está intimamente vinculada aos pressupostos ontológicos sobre ele. Dependendo do posicionamento do pesquisador, serão buscadas ferramentas mais quantitativas ou mais qualitativas. Esse fato gera uma amplitude de abordagens ao estudo da estratégia, com argumentos tão diversos, tornando sua integração praticamente impossível.

Assim, percebe-se que uma grande parte dos trabalhos sobre administração estratégica, considerando, pelo menos, a perspectiva do posicionamento,2 ou mesmo a corrente que integra as linhas executiva, formal e de posicionamento, conforme percebemos em Mintzberg (1990)______. Strategy formation schools of thought. In: FREDRICKSON, J. W. (Ed.). Perspectives on strategic management. Boston: Ballinger, 1990. p. 105-235., aprofundada em Mintzberg et al. (2000)MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000., tem usado desenhos quantitativos de pesquisa. Mais recentemente, no entanto, mesmo nessa linha, ou corrente, de pensamento, alguns pesquisadores têm aplicado métodos qualitativos na tentativa de gerar quadros mais ricos do processo de formação de estratégia (DOZ; THANHEISER, 1993DOZ, Y.; THANHEISER. H. Regaining competitivenes: a process of organisational renewal. In: HENDRY, J.; JOHNSON, G.; NEWTON, J. (Eds.). Strategic thinking: leadership and the management of change. Chichester: John Wiley, 1993.; LEITE; PORSSE, 2003LEITE, J. B. D.; PORSSE, M. de C. S. Competição baseada em competências e aprendizagem organizacional: em busca da vantagem competitiva. Revista de Administração Contemporânea, v. 7, ed. especial, p. 121-141, 2003.). Seja, porém, na abordagem da linha cognitiva seja na da linha institucional, em geral, os estudos e pesquisas se dão por meio de entrevistas em profundidade que buscam revelar os processos e as estruturas mentais que executivos adotam na tomada de decisões estratégicas (HUFF, 1990HUFF, A. S. Mapping strategic thought. Chichester: Wiley, 1990.), com forte influência da interpretação dos pesquisadores sobre os dados coletados.

Nos últimos 25 anos, o reconhecimento da importância das percepções dos executivos no estudo da associação entre ambiente, estratégia e estrutura e do papel que a cognição exerce no diagnóstico e formulação de problemas tem levado a uma crescente preocupação com os processos e estruturas mentais adotados por estrategistas (SCHWENK, 1988aSCHWENK, C. R. The cognitive perspective on strategic decision making. Journal of Management Studies, v. 25, n. 1, p. 41-55, 1988a.). Esse foco de estudos teve uma boa síntese em uma publicação coordenada por Huff (1990)HUFF, A. S. Mapping strategic thought. Chichester: Wiley, 1990. que dá suporte à tese de que a cognição atua como uma intermediadora nos processos estratégicos. Mais recentemente, essa preocupação dos pesquisadores foi sintetizada em um capítulo de Jenkins e Ambrosini (2002)JENKINS, M.; AMBROSINI, V. Strategic management - a multi-perspective approach. Basingstoke: Palgrave, 2002.

Essa nova abordagem, denominada cognitiva, é representada por um número significativo de trabalhos que usam uma ferramenta metodológica - mapas mentais - tentando capturar a essência dos processos de pensamento que estrategistas utilizam (FIOL; HUFF, 1992FIOL, C. M.; HUFF, A. S. Maps for managers: where are we? Where do we go from here? Journal of Management Studies, v. 29, n. 3, p. 267-285, 1992.). Um pressuposto comum à maior parte dos estudos cognitivos sobre formação de estratégia é o de racionalidade limitada, isto é, estrategistas são tidos como possuidores de capacidades cognitivas limitadas que os impedem de avaliar uma situação estratégica em sua totalidade (SIMON, 1979SIMON, H. A. Models of thought. New Haven, Yale University Press, 1979.).

Uma abordagem, contudo, que vem sendo cada vez mais influente nos estudos estratégicos é a da institucionalização. Tolbert e Zucker (1998, p. 196)TOLBERT, P. S.; ZUCKER, L. G. A institucionalização da teoria institucional. In: CLEGG, S. R. et al. Handbook de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 1998. v. 1. alertam, porém, que a teoria institucional ainda não desenvolveu um conjunto central de variáveis padrão, não tem metodologia de pesquisa padronizada, tampouco conjunto de métodos específicos. Especificamente, em relação ao isomorfismo - uma das idéias centrais da institucionalização -, Slack e Hinings (1994)SLACK, T.; HININGS, B. Institutional pressures and isomorphic change: an empirical test. Organization Studies, v. 15, n. 6, 1994. lembram que há poucos estudos que focam a dinâmica do isomorfismo.3 3 Conforme será explicado mais adiante no texto, isomorfismo é tido como um processo restritivo que força a homogeneização da população de organizações que compartilham de um mesmo campo de negócio, podendo tomar a forma de normativo, coercitivo ou mimético.

Mintzberg et al (2000)MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000., ao exporem as diversas escolas de pensamento sobre formação de estratégia, sugerem que a escola cognitiva pode ser vista como uma ponte entre abordagens mais objetivas e subjetivas da formação de estratégia. Em contribuição recente, Crubellate et al. (2005)CRUBELLATE, J. M. et al. Estratégia como configuração: uma versão construtivista da estratégia em organizações. In: XXIX ENANPAD 2005, Anais... Brasília: Anpad, 2005. abordam a noção de estratégia sob o ângulo de configuração, e propõem uma abordagem construcionista do fenômeno que indica a possibilidade de integração das abordagens cognitiva e institucional do estudo de estratégia organizacional. Desenvolvimentos recentes da abordagem institucional evidenciam, também, essa possibilidade. Por exemplo, Machado-da-Silva et al. (2005)______. Unlocking the institutionalization process: insights for an institutionalizing approach. Brazilian Administration Review, v. 2, n. 1, p. 1-20, 2005. apontam para o conceito de intersubjetividade como mais adequado, em oposição a objetividade e subjetividade, para explicar o processo de institucionalização por meio de uma abordagem recursiva. Para esses autores, a noção de intersubjetividade permite o estabelecimento de pontes com os conceitos de objetividade e subjetividade, ao se referirem ao compartilhamento de significados entre atores sociais.

Nesse sentido, o propósito deste artigo é ilustrar como uma ferramenta de análise de posicionamento estratégico, baseada em idéias da Psicologia dos Construtos Pessoais (cf. KELLY, 1955KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v.; 1991)______. The Psychology of Personal Constructs. London: Routledge, 1991. 2 v. pode auxiliar na identificação de isomorfismo estratégico,4 4 Adota-se a idéia de isomorfismo estratégico por entender-se que o processo isomórfico pode se dar mediante a homogeneização de escolhas estratégicas que levarão à adoção de posições competitivas muito semelhantes entre empresas atuantes em um mesmo campo de negócio. contribuindo para uma maior integração entre as abordagens institucionalista e cognitiva da estratégia. Dessa forma, o artigo pretende contribuir, também, para auxiliar na constituição de instrumentos de pesquisa que possam ser usados em estudos sobre formação de estratégia tanto sob a abordagem institucionalista quanto sob a cognitiva.

O texto está estruturado em cinco seções adicionais. As abordagens institucional e cognitiva são exploradas, de forma resumida, nas duas próximas seções. Em seguida, abordam-se a operacionalização da ferramenta de análise de posicionamento estratégico e os procedimentos metodológicos que foram adotados para compor uma ilustração, que é exemplificada na seção seguinte. Por fim, conclui-se o artigo com algumas considerações finais sobre as implicações desse trabalho para o estudo do isomorfismo em nível estratégico e a utilização da ferramenta de coleta de dados e análise.

2 ABORDAGEM INSTITUCIONAL EM ESTUDOS ORGANIZACIONAIS

A perspectiva interpretacionista, comum nas abordagens tanto cognitiva quanto institucional, adota uma postura de ambiente diferente da visão considerada tradicional ou moderna. Para esta, o ambiente é algo que está fora das fronteiras da organização, é o conjunto de elementos externos à empresa, enquanto para aquela, é o conjunto de construtos pessoais formado pelas crenças sobre sua existência e constituídas por expectativas e ações relacionadas a essas crenças. Tal diferença engloba questões teóricas e epistemológicas de importância para o desenvolvimento do campo organizacional, indo muito além da diferença entre percepção objetiva e subjetiva da realidade (SCOTT, 1992SCOTT, W. R. Organizations rational, natural, and open systems. New Jersey: Englewood Cliffs, 1992.; HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.). Destarte, para os interpretacionistas, o ambiente é majoritariamente simbólico, embora venha a ter conseqüências materiais (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.). Weick (1973, p. 64)WEICK, K. A psicologia social das organizações. São Paulo: Edgard Blucher, 1973. sugere que participantes não apenas percebem e reagem, mas ativamente constroem ou enact5 5 Esse termo procura sintetizar a idéia de que o ambiente ao mesmo tempo que dá forma às organizações é formado por essas também, por meio de uma série de escolhas que impõem limites de atuação em um campo de negócio. seus ambientes; ou seja, o ser humano cria o ambiente ao qual o sistema depois se adapta.

Para March (1989)MARCH, J. Footnotes to organizational change. In: MARCH, J. Decisions and organizations. Oxford: Basil Blackwell, 1989., as organizações criam seus próprios ambientes para interpretar e agir num mundo confuso, e os atos são tomados como resulta- dos de crenças sobre o próprio ambiente que eles mesmos auxiliam a construir. A idéia de que a realidade é socialmente construída também é respaldada por Berger e Luckmann (1973)BERGER, P. L.; LUCKMANN, T. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 1973., que afirmam que, embora seja possível dizer que o homem tem uma natureza, é mais significativo dizer que o homem constrói sua própria natureza, ou, mais simplesmente, que o homem se produz a si mesmo. Para eles, a realidade é construída à medida que o homem se desenvolve como ser social. Ademais, os autores consideram que a sociedade é um produto humano, uma realidade social e o homem é um produto social.

A realidade social é uma construção baseada nas interações sociais, as quais vão produzindo ações que, caso venham a ser repetidas, vão ganhando estabilidade e sendo reforçadas como válidas, sendo esse processo chamado de institucionalização (SCOTT, 1995b______. Symbols and organizations: from Barnard to the institutionalists. In: WILLIAMSON, O. E. (Ed.). Organization theory: from Chester Barnard to the present and beyond. New York: Oxford University Press, 1995b.). Para Selznick (1957)SELZNICK, P. Leadership in administration. New York: Harper & Row, 1957., a institucionalização acontece constantemente sobre as organizações, e ainda reflete as pessoas que lá estão, ou estiveram, os grupos e seus interesses, a história da empresa, bem como o modo que eles se adaptam ao ambiente. Conforme Prates (2000)PRATES, A. A. P. Organização e instituição no velho e novo institucionalismo. In: RODRIGUES, S. B.; CUNHA, M. P. Estudos organizacionais: novas perspectivas na administração de empresas. Uma coletânea luso-brasileira. São Paulo: Iglu Editora, 2000, p. 90-106., o “ator estratégico” ou “agente” da ação dentro da teoria institucional é o ambiente organizacional, tornando compreensível sua inclusão na escola ambiental do Safári de Estratégia de Mintzberg et al. (2000)MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000., ainda que os neonstitucionalistas, baseados em versão neoweberiana, contemplem esforços de ordem cognitiva e do contexto microestrutural da ação organizacional.

Para um melhor entendimento do ambiente, faz-se necessário, segundo Meyer e Rowan (1991)MEYER, J. W.; ROWAN, B. Institutionalized Organizations: Formal Structure as Myth and Ceremony. In: POWEL, W. W.; DIMAGGIO, P. J. The new institutionalism in organizational analysis. Chicago: The University of Chicago Press, 1991., ter uma visão do fluxo e das trocas técnicas do ambiente complementada por sua parte composta por regras sociais e sistema de crenças, uma vez que, com a expansão das organizações para outras esferas da vida social, aquelas tenderão a refletir, cada vez mais, regras institucionalizadas em suas estruturas. Ou seja, é necessário compreender o que os institucionalistas chamam de ambiente técnico e ambiente institucional. Segundo Scott (1992SCOTT, W. R. Organizations rational, natural, and open systems. New Jersey: Englewood Cliffs, 1992., 1995a______. Institutions and organizations. Thousand Oaks: Sage, 1995a., 1995b)______. Symbols and organizations: from Barnard to the institutionalists. In: WILLIAMSON, O. E. (Ed.). Organization theory: from Chester Barnard to the present and beyond. New York: Oxford University Press, 1995b. e DiMaggio e Powell (1983)DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, v. 48, n. 2, p. 147-169, 1983., podemos diferenciar ambiente técnico do institucional da seguinte maneira: ambiente técnico é caracterizado pelas trocas de bens e serviços com o mercado, para recompensar segundo a eficiência e eficácia da performance; e ambiente institucional é caracterizado pela legitimação social das organizações decorrente da submissão às regras e normas de atuação formadas. Ou seja, em um ambiente institucionalizado, as empresas precisam se submeter a regras, normas, requerimentos para receber legitimidades sociais (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.).

Por conseguinte, uma empresa posta à prova nesses dois ambientes será avaliada em relação à sua eficiência e conformidade às exigências sociais. E eles variam em intensidade, indo do mais fraco ao mais forte, como um continuum (não uma dicotomia). No Quadro 1, ilustram-se conseqüências para as organizações, dos diferentes níveis de intensidade dos ambientes institucional e técnico.

QUADRO 1
CONSEQÜÊNCIAS PARA AS ORGANIZAÇÕES DA INTENSIDADE DOS AMBIENTES

Para Scott (1992)SCOTT, W. R. Organizations rational, natural, and open systems. New Jersey: Englewood Cliffs, 1992. e Machado-da-Silva et al. (1999)MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999., pode-se chegar a uma razoável operacionalização do conceito de ambiente técnico por meio das variáveis incerteza e dependência. E ainda, ambas são vistas como pontos de relevância na análise de estratégias competitivas e mecanismos de adaptação organizacionais. No que diz respeito à incerteza, pode-se dizer que essa é afetada por: a) grau de homogeneidade-heterogeneidade: similaridades entre os elementos ambientais; b) grau de estabilidade-variabilidade: possibilidades de mudança; c) grau de ameaça-segurança: vulnerabilidade organizacional em relação ao ambiente; d) grau de interconexão-isolamento: relacionamento da organização com o ambiente; e e) grau de coordenação-não coordenação: ordenamento/estruturação do ambiente.

Por sua vez, as dimensões que afetam a dependência são: a) grau de abundância-escassez: disponibilidade de recursos necessários à organização presentes no ambiente; b) grau de concentração-dispersão: a distribuição dos recursos no ambiente; e c) grau de coordenação-não coordenação: ordenamento/estruturação do ambiente. Deve-se assinalar, segundo Machado-da-Silva et al. (1999)MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999., que ambas as dimensões, além de caracterizarem a estrutura do ambiente, também estabelecem formas estruturais de comportamento para as organizações que nele se inserem.

Por instituição, Richard Scott (1995b)______. Symbols and organizations: from Barnard to the institutionalists. In: WILLIAMSON, O. E. (Ed.). Organization theory: from Chester Barnard to the present and beyond. New York: Oxford University Press, 1995b. trata de estruturas e atividades de caráter normativo, regulativo e cognitivo que promovem estabilidade e significado ao comportamento social. Já institucionalização seria o processo em que o significado é compartilhado por outros em razão da repetição das ações, e isso pode se dar por três motivos diferentes. Poderá existir alguma regra ou lei que ordene a repetição das ações, ou então, poderá acontecer em razão dos valores culturais (normas, tradição), e, por fim, pela observação de alguma característica alheia à organização e ao desejo de possuí-la para fazer frente à incerteza (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.; SCOTT, 1992SCOTT, W. R. Organizations rational, natural, and open systems. New Jersey: Englewood Cliffs, 1992.). Tais motivos podem ser considerados pilares do processo de institucionalização, tal como verificado no Quadro 2, adaptado de Scott (1995a)______. Institutions and organizations. Thousand Oaks: Sage, 1995a..

QUADRO 2
TRÊS PILARES DAS INSTITUIÇÕES

Diante disso, DiMaggio & Powell (1983)DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, v. 48, n. 2, p. 147-169, 1983. rotulam três mecanismos que pressionam as instituições ao isomorfismo, que é um processo restritivo que força a homogeneização da população de organizações que compartilham de um mesmo campo de negócio, ainda que algumas organizações estejam mais sujeitas que outras. Além disso, muito da literatura sobre mudanças organizacionais versa sobre as organizações se tornarem isomórficas com seus ambientes (SLACK; HININGS, 1994SLACK, T.; HININGS, B. Institutional pressures and isomorphic change: an empirical test. Organization Studies, v. 15, n. 6, 1994.).

O primeiro mecanismo identificado por DiMaggio e Powell (1983)DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, v. 48, n. 2, p. 147-169, 1983. é o isomorfismo coercitivo. Esse resulta de pressões formais e informais exercidas por organizações sobre outras que podem se encontrar em situações de dependência. Trata-se da pressão feita sobre a organização, sendo relacionado à influência política ou de problemas de legitimação. Tais pressões podem ser tanto formais quanto informais, segundo Slack e Hinings (1994)SLACK, T.; HININGS, B. Institutional pressures and isomorphic change: an empirical test. Organization Studies, v. 15, n. 6, 1994..

O segundo é o normativo, que está relacionado à profissionalização, ou ao seu grau, e essa afeta principalmente de duas maneiras o isomorfismo: (i) construção e consolidação de uma base cognitiva e legitimação para a ocupação; e (ii) formação e manutenção de “networks” profissionais.

Por fim, mas não menos importante, o isomorfismo mimético que está baseado nas incertezas vindas do ambiente e na observação e imitação de características antes alheias à organização baseadas em organizações tidas como de sucesso.

Destarte, isomorfismo é o conceito que melhor captura a idéia de homogeneização. Tais processos, ou melhor, mecanismos de homogeneização, são relevantes para entender por que organizações que compartilham determinada linha de negócio são tão semelhantes, ainda que elas tentem mudar constantemente (DIMAGGIO; POWELL, 1983DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, v. 48, n. 2, p. 147-169, 1983.). Compreender os mecanismos de isomorfismo contribui para o entendimento das mudanças organizacionais e suas dinâmicas, especialmente quando relacionadas com questões cognitivas (MACHADO-DA-SILVA et al., 1999MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999.; MACHADO-DA-SILVA; BARBOSA, 2002MACHADO-DA-SILVA, C.; BARBOSA, S. de L. Estratégia, fatores de competitividade e contexto de referência das organizações: uma análise arquetípica. Revista de Administração Contemporânea, v. 6, n. 3, p. 7-32, 2002.). Ademais, a compreensão de processos isomórficos, em nível estratégico, pode contribuir para um aperfeiçoamento das teorias que buscam explicar diferenças e similaridades em posicionamentos competitivos, especialmente se for buscado um entendimento desses processos à luz das interpretações e significações atribuídas aos eventos pelos atores estratégicos. Note-se nesse ponto a contribuição seminal de Oliver (1991)OLIVER, C. Strategic responses to institutional processes. Academy of Management Review, v. 16, n. 1, p. 145-179, 1991., ao discutir diferentes respostas estratégicas a pressões ambientais do ponto de vista da abordagem institucional cujas proposições ilustram a necessidade de explicações mais abrangentes das escolhas estratégicas que levem em consideração aspectos institucionais e sociocognitivos.

Para esse fim, portanto, é importante compreender, ainda que de forma não exaustiva, como a literatura vem discutindo questões cognitivas no âmbito da administração estratégica. Esse é o tema da próxima seção, em que se busca enfatizar a possível relação entre a abordagem cognitiva e a institucionalista.

3 COGNIÇÃO, POSICIONAMENTO COMPETITIVO E INSTITUCIONALIZAÇÃO

É relativamente recente o interesse por estudos cognitivos dentro do campo estratégico-organizacional (SCHWENK, 1988b______. The essence of strategic decision making. New York: Macmillan, 1988b.; MACHADO-DA-SILVA et al., 1999MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999.) e ele está, principalmente, relacionado ao motivo pelo qual dirigentes tomam diferentes decisões estratégicas diante das influências de seus construtos e percepções ambientais. Na literatura há destaque para a importância dos estudos de Simon (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.; SCHWENK, 1988b______. The essence of strategic decision making. New York: Macmillan, 1988b.). Ele desenvolveu a teoria da racionalidade limitada, a qual serve de referência para a compreensão dos limites cognitivos humanos. A noção seminal é que todos os comportamentos racionalmente pretendidos são comportamentos restritos. Simon acrescentou à lista de restrições técnicas na tomada de decisão o homem como processador de informações e, ainda, como tomador de decisões (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.). Dessa maneira, num dado momento, uma pessoa poderá atender a um número limitado de assuntos.

Assim, em ambientes complexos, haverá a busca de modelos simplificados para a tomada de decisão, e essa sofrerá influência do sistema social (MACHADO-DA-SILVA et al., 1999MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999.; SCHWENK, 1988b______. The essence of strategic decision making. New York: Macmillan, 1988b.). Uma das características da simplificação é a substituição do ótimo pelo satisfatório (MARCH; SIMON, 1972MARCH, J. G.; SIMON, H. A. Teoria das organizações. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1972.). Os fatores que levam à limitação da racionalidade estão associados a: a) informações incompletas e imperfeitas; b) complexidade do problema; c) capacidade humana para processar informações; d) tempo disponível para a tomada de decisão; e) objetivos perseguidos pelos decisores (HATCH, 1997HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.). Dutton e Freedman (1985, p. 41)DUTTON, J. M.; FREEDMAN, R. D. External environment and internal strategies: calculating, experimenting, and imitating in organizations. Advances in Strategic Management, v. 3, p. 39-67, 1985. ressaltam que a racionalidade limitada, entretanto, sugere que os gestores não podem montar nenhum sistema que forneça uma avaliação abrangente do ambiente da empresa.

Lord e Maher (1990)LORD, R. G.; MAHER, K. J. Alternative information-processing models and their implications for theory, research, and practice. Academy of Management Review, v. 15, n. 1, p. 9-28, 1990. lembram que há diversos modelos que descrevem o processamento de informações na literatura administrativa, servindo de base para explicações cognitivas de processos organizacionais. Para eles, são quatro os modelos que podem ser encontrados na literatura:

  • Modelos racionais propõem que indivíduos processam integralmente toda informação relevante para maximizar um resultado desejado. Na pesquisa tradicional sobre estratégia esses modelos são explícita ou implicitamente aceitos pelos acadêmicos das escolas de Design, Planejamento e Posicionamento na classificação proposta por Mintzberg et al (2000)MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000..

  • Modelos de capacidade limitada, por sua vez, pressupõem a existência de heurísticas cognitivas e estruturas de conhecimento simplificadas que são aplicadas nas atividades de processamento de informação. Esses processos são caracterizados como comportamentos adequados, mas não ótimos. Essa tem sido a arena da maioria dos estudos cognitivos sobre estratégia (HUFF, 1990HUFF, A. S. Mapping strategic thought. Chichester: Wiley, 1990.).

  • Modelos de especialistas reconhecem a existência de procedimentos simplificadores na análise de informação, mas salientam as diferenças entre especialistas e noviços ou indivíduos inexperientes. Especialistas desenvolvem estruturas de conhecimento prévio que complementam os meios simplificados de análise de informação, enquanto os inexperientes inicialmente estão restritos às suas capacidades cognitivas limitadas. Nessa perspectiva, os estudiosos enquadrados na escola de aprendizagem e cultural parecem ser predominantes.

  • Modelos cibernéticos, por fim, descrevem o processamento de informação como interligado ao tempo. Em oposição aos três modelos anteriores, esses são dinâmicos no sentido de que processos cognitivos e comportamentos podem ser modificados por feedback.

Em resumo, há uma crescente preocupação com a cognição administrativa e sua influência no processo de formação de estratégia. Embora se reconheça o caráter único, no nível do indivíduo, nos processos cognitivos não se pode deixar de reconhecer a possibilidade de coordenação e significação compartilhada de cognições individuais, conforme se verá a seguir (LORD; MAHER, 1993______. Leadership & information processing - linking perceptions and performance. London: Routledge, 1993.).

Um dos fundamentos principais dos estudos cognitivos em Administração encontra-se na Psicologia Cognitiva. Essa tem como uma de suas estruturas básicas a teoria dos construtos pessoais de Kelly (1955)KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v., que busca compreender como entendemos o mundo, pois esse é passível de ser entendido de mais de uma maneira ou criação (Weick, 1973WEICK, K. A psicologia social das organizações. São Paulo: Edgard Blucher, 1973.) e que a interpretação não é separada da realidade. Os principais corolários dessa teoria podem ser resumidos conforme o Quadro 3.

QUADRO 3
COROLÁRIOS DA TEORIA DOS CONSTRUTOS PESSOAIS DE KELLY (1955)

Conforme destacam Machado-da-Silva et al. (1999)MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999., contudo, abordagens tradicionais de tomada de decisão têm sido consideradas distantes das ciências cognitivas. Mintzberg et al. (2000)MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000. expõem que a maioria das pesquisas sobre tomada de decisão partia inicialmente da ação, renegando a decisão em si. Ou seja, antes da abordagem cognitiva, o que ocorria na mente de dirigentes era uma grande incógnita. Segundo Machado-da-Silva et al. (1999)MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999., os vieses cognitivos provêm da organização, do indivíduo e das interações entre indivíduos e podem ser definidos como “fenômenos que interferem na racionalidade do estrategista”, sendo o seu entendimento fator fundamental para se compreender de maneira mais coerente a razão pela qual dirigentes escolhem certas opções em detrimento de outras.

De acordo com Mintzberg (1979, p. 25)MINTZBERG, H. Structuring the organizations. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1979., a estratégia pode ser vista como a força mediadora entre a organização e seu ambiente, e a interpretação do ambiente é base para a própria organização da empresa. Mesmo em movimentos aparentemente isomórficos, em razão dos processos de interpretação e re-significação, que são únicos para os atores estratégicos, é possível encontrar variações. Haunschild e Miner (1997)HAUNSCHILD, P. R.; MINER, A. S. Modes of inter-organizational imitation: the effects of outcome salience and uncertainty. Administrative Science Quarterly, v. 42, p. 472-500, 1997. afirmam que os primeiros neo-institucionalistas enfatizavam o isomorfismo como instrumentos apenas de homogeneização. No entanto, ainda conforme esses autores, a imitação pode gerar variação, especialmente em relação a mudanças incrementais, no que se alinha com neo-institucionalistas mais recentes.

Estudos recentes sobre isomorfismo têm utilizado predominantemente uma abordagem interpretacionista (HAUNCHILD, 1993HAUNSCHILD, P. R. Interorganizational imitation: the impact of interlocks on corporate acquisition activity. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 4, p. 564-593, 1993.; HAVERMAN, 1993HAVERMAN, H. A. Follow the leader: mimetic isomorphism and entry to a new market. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 4, p. 593-628, 1993.; PALMERS; DEVEREAUX, 1993PALMER, D. A.; DEVEREAUX, J. P. Late adoption of multidivisional form by large US corporations: institutional, political and economic accounts. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 1, p. 100-132, 1993.; BARBOSA, 2001BARBOSA, S. de L. Padrões de competitividade e estratégias organizacionais na indústria moveleira do Paraná. Curitiba, 2001. Dissertação (Mestrado em Administração) - Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná.; ROSSETTO; ROSSETTO, 2002ROSSETO, C. R.; ROSSETO, A. M. O isomorfismo como balizador da formulação estratégica organizacional: um estudo multi-caso de empresas familiares do setor de edificações. In: XXVI ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Salvador, 2002.; COCHIA, 2002COCHIA, C. B. R. Contexto ambiental, esquemas interpretativos e posicionamento estratégico: um estudo em pequenas empresas paranaenses. Curitiba, 2002. Dissertação (Mestrado em Administração) - Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná.; SERRALHEIRO; ROSSETTO, 2004SERRALHEIRO, W. A. O.; ROSSETO, C. R. O isomorfismo como ferramenta para a análise de adaptação estratégica: um estudo de caso das empresas Eliane. In: XVII CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE ESTRATÉGIA, Anais... Itapema, 2004.), identificando tendências de movimentos isomórficos, mas sem uma quantificação do impacto desses no posicionamento estratégico das organizações. As abordagens têm sido qualitativas, dependendo, invariavelmente, de uma significativa dose de interpretação de seus autores.

Assim, para que se possa entender o isomorfismo, necessita-se dispor de mecanismos que possam auxiliar no processo de sua identificação e mensuração, guiados por uma avaliação dos processos e conteúdos cognitivos pelos quais passam os atores estratégicos. Há alguma possibilidade de realizar essa tarefa, mediante procedimentos sistematizados que sejam menos dependentes do observador? Uma possível resposta a essa questão é a que será apresentada na próxima seção.

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: FERRAMENTA DE ANÁLISE DE POSICIONAMENTO ESTRATÉGICO

George Kelly (1955KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v., 1991)______. The Psychology of Personal Constructs. London: Routledge, 1991. 2 v., ao propor sua Psicologia dos Construtos Pessoais, afirmou que parte do entendimento de um indivíduo sobre o mundo que o cerca toma a forma de categorizações de elementos e eventos percebidos, conforme evidenciado na seção anterior. Essas categorias são baseadas em semelhanças e diferenças entre elementos, e constituem o que é chamado de estrutura de referência. Um ponto-chave na teoria de Kelly é a relativa estabilidade dos construtos permitindo o surgimento de um sistema cognitivo capaz de manter a crença em uma estratégia de forma persistente.

Associada à Psicologia dos Construtos Pessoais, Kelly (1955)KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v. desenvolveu uma técnica de entrevista - grade de repertório. Essa técnica tem sido amplamente utilizada em pesquisas na área de Administração (WACKER, 1981WACKER, G. J. Toward a cognitive methodology of organisational assessment. Journal of Applied Behavioral Science, v. 17, p. 114-129, 1981.; DUNN; GINSBERG, 1986DUNN, W.; GINSBERG, A. A sociocognitive network approach to organisational analysis. Human Relations, v. 40, n. 11, p. 955-975, 1986.; GINSBERG, 1989GINSBERG, A. Construing the business portfolio: a cognitive model of diversification. Journal of Management Studies, v. 26, n. 4, p. 417-438, 1989.; REGER, 1990REGER, R. K. The repertory grid technique for eliciting the content and structure of cognitive constructive systems. In: HUFF, A. S. (Ed.). Mapping strategic thought, Chichester: Wiley, 1990. p. 301-309.). No Brasil, encontramos sua aplicação em trabalhos de Gimenez (1998)GIMENEZ, F. A. P. et al. A construção da concorrência por dirigentes de pequenas empresas. Caderno de Administração, v. 6, n. 4, p. 27-46, 1998., Gimenez et al. (1998)GIMENEZ, F. A. P. Escolhas estratégicas e estilo cognitivo: um estudo com pequenas empresas. Revista de Administração Contemporânea, v. 2, n. 1, p. 27-45, 1998. e Ramos (2005)RAMOS, S. C. Isomorfismo mimético e contexto de referência: um estudo em pequenas empresas de Curitiba/Pr. Curitiba, 2005. Dissertação (Mestrado) - Programa de Mestrado em Administração, Pontifícia Universidade Católica.. A técnica consiste em um conjunto de procedimentos cujo objetivo é revelar os construtos usados por indivíduos quando interpretam seu ambiente. Enfocando-se na derivação de um conjunto de elementos e construtos relacionados à estratégia de uma empresa, a técnica combina uma elicitação exaustiva de estruturas mentais dos respondentes com um mínimo de intromissão do pesquisador, a não ser para definir um amplo contexto inicial. Wacker (1981)WACKER, G. J. Toward a cognitive methodology of organisational assessment. Journal of Applied Behavioral Science, v. 17, p. 114-129, 1981. argumenta que a técnica incorpora procedimentos ordenados para uma análise em série, assegurando assim que os dados obtidos por um pesquisador são relativamente concisos, confiáveis e comparáveis com aqueles obtidos por outro pesquisador engajado em um processo de coleta de dados semelhante.

A utilização da grade de repertório como ferramenta de análise de posicionamento estratégico foi exemplificada por Gimenez e Grave (2002)GIMENEZ, F. A. P.; GRAVE, P. S. E-diagnóstico estratégico: uma ferramenta para posicionamento estratégico em tempo real. In: XXVI ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Salvador, 2002.. Sua aplicação envolve quatro etapas, resumidas no Quadro 4.

QUADRO 4
ETAPAS DE APLICAÇÃO DA GRADE DE REPERTÓRIO

Para ilustrar o funcionamento da ferramenta, serão utilizados os dados obtidos em uma amostra, por conveniência, de quatorze dirigentes de pequenas empresas que estavam participando de um programa de educação continuada para executivos. Os respondentes aceitaram fornecer dados sobre suas empresas e analisar a concorrência com base em um formulário de coleta de dados construído por meio de estudos anteriores que buscaram revelar os construtos utilizados por dirigentes de pequenas empresas na categorização de seus concorrentes (Gimenez, 1996______. Patterns of strategic choice of small firm owners and managers. Manchester, 1996, 335 (PhD thesis) - Manchester Business School, University of Manchester.).

No estudo original (Gimenez, 1996______. Patterns of strategic choice of small firm owners and managers. Manchester, 1996, 335 (PhD thesis) - Manchester Business School, University of Manchester.), o uso da grade de repertório tomou como elementos um conjunto de concorrentes que o empreendedor considerasse mais significativos no seu ramo de negócio. A elicitação dos construtos baseou-se na apresentação de tríades de concorrentes seqüencialmente. Os entrevistados foram instruídos a descrever a forma como dois deles eram semelhantes e o terceiro diferente. Isso é conhecido como a forma do conteúdo mínimo para elicitação de construtos (REGER, 1990REGER, R. K. The repertory grid technique for eliciting the content and structure of cognitive constructive systems. In: HUFF, A. S. (Ed.). Mapping strategic thought, Chichester: Wiley, 1990. p. 301-309.). Os respondentes usaram uma escala de sete pontos para avaliar os elementos (concorrentes) em cada um dos construtos elicitados. Cada grade, assim, produziu uma comparação entre os concorrentes percebidos pelo dirigente da pequena empresa como salientes no mercado.

Para o estudo aqui relatado, com o propósito de ilustrar a aplicação da ferramenta, o formulário de coleta de dados sobre concorrência apresentava sete colunas para análise de empresas concorrentes e duas colunas para análise da empresa do respondente em duas situações - no momento da entrevista, e como o respondente gostaria que a empresa estivesse posicionada futuramente, considerando um horizonte de cinco anos.

Além disso, o formulário de coleta de dados, cuja intenção era revelar a visão do respondente sobre o posicionamento estratégico da concorrência e de sua empresa em determinado setor de negócios, envolvia fazer avaliações, em uma escala tipo Likert das empresas em dez dimensões competitivas que se mostraram as mais freqüentes em estudos realizados por Gimenez (1996)______. Patterns of strategic choice of small firm owners and managers. Manchester, 1996, 335 (PhD thesis) - Manchester Business School, University of Manchester.. Essas dimensões eram apresentadas como construtos bipolares com as seguintes descrições, sendo a primeira parte um dos pólos, e a segunda parte o pólo oposto:

  • Grau de diversificação: Empresa diversificada x empresa não diversificada

  • Amplitude da linha de produtos: Empresa com linha de produtos estreita x linha de produtos ampla

  • Idade da empresa: Empresa nova no mercado x empresa madura no mercado

  • Tamanho das empresas: Empresa pequena x empresa grande

  • Preço dos produtos e serviços: Preço baixo x preço alto

  • Qualidade dos produtos e serviços: Qualidade baixa x qualidade alta

  • Força da competição: Competidor fraco no mercado x competidor forte no mercado

  • Imagem da empresa: Imagem de pouco prestígio no mercado x imagem de alto prestígio no mercado

  • Tipo de produtos: Produto padrão x produto premium

  • Intensidade dos esforços de marketing: Esforços de marketing mínimos x esforços de marketing agressivos

A escala de avaliação abrangeu sete pontos com as seguintes gradações:

  • (1) - 1o pólo do construto se aplica fortemente à empresa

  • (2) - 1o pólo do construto se aplica moderadamente à empresa

  • (3) - 1o pólo do construto se aplica fracamente à empresa

  • (4) - Empresa neutra ou eqüidistante de ambos os pólos do construto

  • (5) - 2o pólo do construto se aplica fracamente à empresa

  • (6) - 2o pólo do construto se aplica moderadamente à empresa

  • (7) - 2o pólo do construto se aplica fortemente à empresa

Os dados coletados foram analisados para a identificação de Clusters pelo Método de Ward. O procedimento de análise Clusters foi efetuado em duas etapas. Na primeira etapa, utilizaram-se os dados das empresas concorrentes em conjunto com a empresa do respondente no momento da coleta de dados. Na segunda etapa, repetiu-se o procedimento substituindo-se os dados da empresa do respondente pelos dados da empresa como esse gostaria que ela fosse no futuro. Esse procedimento permitiu a construção de um indicador da associação entre a posição estratégica da empresa do respondente e de seus concorrentes. Esse indicador tomou a forma do número de empresas concorrentes que se localizaram no mesmo Cluster da empresa do respondente em dois momentos - presente e futuro.

Finalmente, a comparação entre os dois indicadores de associação de posições estratégicas entre concorrência pode ser tomada como um indicador da existência ou não de movimentos isomórficos na estratégia das empresas.

A escala utilizada na avaliação do posicionamento estratégico dos concorrentes teve sua validade testada por meio da análise fatorial, usando o método de extração de componentes principais e rotação Varimax. Após três iterações, foram identificados dois fatores. O primeiro fator foi composto pelos itens: imagem da empresa, qualidade dos produtos e serviços, preços dos produtos e serviços e tipos de produtos. O segundo fator reuniu os itens: amplitude da linha de produtos e serviços, grau de diversificação, tamanho da empresa, intensidade de esforços de marketing, força da competição e idade das empresas. A análise de validade da escala indicou um coeficiente Alpha de 0,88, e para os dois fatores de 0,87 e 0,85, respectivamente.

5 ILUSTRAÇÃO DOS RESULTADOS DA APLICAÇÃO DA GRADE DE REPERTÓRIO

A amostra utilizada neste estudo foi composta por sete empresas da indústria de produtos eletrônicos e sete empresas de indústrias mais tradicionais (confecções, metalurgia e produtos de lazer). O tempo médio de experiência na indústria de cada respondente foi de 15,4 anos, e em média 8,1 anos no cargo. O número médio de empregados foi de 38,4 e o faturamento médio no último ano foi de R$ 10.230.000,00. A taxa média de crescimento do faturamento nos últimos três anos foi de 11%. A Tabela 1 apresenta uma síntese das características da amostra.

TABELA 1
CARACTERÍSTICAS DA AMOSTRA

No que diz respeito ao indicador de associação da posição estratégica empresas com os concorrentes, os dados foram os seguintes:

Esses resultados parecem indicar que a posição estratégica de uma empresa está associada com a percepção do dirigente de uma estratégia modal, mais freqüente, percebida entre os seus concorrentes. Isso é evidenciado quando se comparam os resultados da localização da posição estratégica em relação aos Clusters de concorrentes. A posição estratégica atual para nove empresas ficou próxima de mais da metade de seus concorrentes, ao passo que para a posição estratégica futura de 12 empresas o mesmo aconteceu. Esses resultados parecem ser uma indicação de isomorfismo mimético no nível estratégico.

A Figura 1 ilustra a representação gráfica da análise dos dados fornecidos por um dos respondentes. Conforme nela evidenciado, esse respondente indicou oito concorrentes significativos em seu espaço de atuação (representados pelas letras). No momento da entrevista, sua empresa (Empresa 10) encontrava-se muito próxima a três concorrentes (A, G e H). Análises gráficas da posição estratégica atual e pretendida foram feitas para cada uma das empresas que participaram do estudo e resultaram nos dados apresentados na Tabela 2.

TABELA 2
MUDANÇA DE POSIÇÃO ESTRATÉGICA

FIGURA 1
POSIÇÃO ESTRATÉGICA ATUAL DA EMPRESA 10

6 CONCLUSÃO

O trabalho procurou demonstrar a utilização e a operacionalização da grade de repertório desenvolvida por Kelly (1955)KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v., e que parece ser adequada para evidenciar a existência de processos isomórficos no nível estratégico entre organizações. A importância de evidenciar tal existência se prende ao fato de que proposições teóricas sobre a homegeneização de processos organizacionais em geral (isomorfismo), e, nesse caso, em nível estratégico, contribuem para uma explicação mais abrangente da formação de estratégia nas organizações. Todavia, mecanismos empíricos de identificação do isomorfismo são pouco relatados na literatura.

Dessa forma, o principal propósito do trabalho centrou-se na necessidade apontada por Tolbert e Zuccker (1998)TOLBERT, P. S.; ZUCKER, L. G. A institucionalização da teoria institucional. In: CLEGG, S. R. et al. Handbook de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 1998. v. 1. e Slack e Hinings (1994)SLACK, T.; HININGS, B. Institutional pressures and isomorphic change: an empirical test. Organization Studies, v. 15, n. 6, 1994. de sanar as deficiências encontradas nos métodos de pesquisa da Teoria Institucional, especialmente relacionadas às questões de operacionalização do isomorfismo e na identificação de movimentos isomórficos.

Embora se tenham exemplificado as possibilidades da ferramenta proposta com um estudo realizado em uma amostra muito pequena, não se pode deixar de reconhecer o aparente vigor dos resultados. A posição estratégica atual indicou isomorfismo para 64% das empresas analisadas, ao passo que a posição estratégica futura elevou esse porcentual para 86%. Os dados apontam para uma crescente homogeneização estratégica, pelo menos ao nível da intenção. Todavia, há ainda espaço para fugas da homogeneização, difíceis de serem explicadas pela abordagem institucional. A diferenciação nas escolhas estratégicas pode, talvez, ser explicada por um enfoque na cognição dos estrategistas. A cognição, por estar intimamente associada aos processos de percepção ambiental, pode levar à construção de um ambiente particular na mente do estrategista, que ajude a explicar fugas da homogeneização. Assim, pode-se esperar que estudos que integrem as abordagens institucionalista e cognitiva possam oferecer explicações mais abrangentes do processo de formação de estratégia.

Uma limitação da ferramenta proposta, talvez, refere-se à sua utilização apenas como identificadora do isomorfismo mimético, não se podendo afirmar nada sobre outras formas de isomorfismo. O foco da ferramenta sobre o ambiente competitivo das empresas dificulta a visualização de pressões normativas ou coercitivas, já que essas, geralmente, estão menos relacionadas ao comportamento de concorrentes.

No que diz respeito à possibilidade de integração das abordagens cognitiva e institucional, sugerem-se algumas questões que estudos futuros precisam considerar:

  1. É possível desenvolver medidas mais precisas do isomorfismo em nível estratégico? Por exemplo, a utilização de distâncias euclidianas no espaço competitivo pode ser vista como medidas de movimentos isomórficos e não isomórifcos?

  2. Considerando que a ilustração apresentada não diferenciou tipos de negócios, será que, do ponto de vista estratégico, a abordagem cognitiva pode explicar diferenças de grau de isomorfismo mimético entre setores industriais diferentes?

  3. Quais as implicações de movimentos isomórficos e não isomórficos para o desempenho das empresas?

  4. Quais as possibilidades de explicações do ponto de vista cognitivo e institucional para diferenças de desempenho em movimentos isomórficos e não isomórficos?

  5. Em ambientes hipercompetitivos (D’AVENI, 1994D’AVENI, R. A. Hypercompetition: managing the dynamics of strategic maneuvering. New York: Free Press, 1994.) será possível encontrar movimentos isomórficos na mesma intensidade de ambientes competitivos mais plácidos?

As questões aqui listadas podem ser investigadas utilizando-se da grade de repertório desenvolvida por Kelly como ferramenta básica de coleta de dados. O tratamento dos dados coletados por meio das grades de repertório, preservando a unicidade de cada respondente nas suas percepções e atribuições de significados, permite a mensuração de movimentos isomórficos e não isomórficos em um espaço competitivo. Especificamente, no que diz respeito à questão 1, Ramos (2005)RAMOS, S. C. Isomorfismo mimético e contexto de referência: um estudo em pequenas empresas de Curitiba/Pr. Curitiba, 2005. Dissertação (Mestrado) - Programa de Mestrado em Administração, Pontifícia Universidade Católica. deu importante contribuição para o aperfeiçoamento da ferramenta, ao elaborar medidas médias de distância entre empresas que ocupam um mesmo espaço competitivo, evidenciando movimentos isomórficos e de diferenciação entre pequenas empresas industriais.

É oportuno notar que a grade de repertório adapta-se bem a qualquer processo de investigação que tenha por foco a identificação de significados atribuídos a atores e/ou eventos organizacionais, bem como ao posicionamento dos respondentes em relação a eles. Assim, pode-se, por exemplo, aplicar a grade de repertório para identificação de atributos relacionados a clientes, produtos, processos organizacionais, entre outros.

Por fim, nesta conclusão, resgatamos nosso propósito inicial. A possibilidade de identificação de movimentos isomórficos, em nível estratégico, pela utilização da grade de repertório proposta por Kelly (1955)KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs. New York: W. W. Norton, 1955. 2 v. foi ilustrada em um estudo empírico de pequena escala. Replicações desse estudo poderão aperfeiçoar a aplicação da ferramenta, bem como poderão confirmar a existência de processos isomórficos em nível estratégico.

  • 1
    Texto modificado com base em publicação e apresentação no 2º Encontro de Estudos em Estratégia. Rio de Janeiro: Anpad, 8-10 de junho, 2005.
  • 2
    Queremos observar que, apesar de usarmos o conceito de “posicionamento”, tendo Porter (1980)PORTER, M. E. Competitive strategy. New York: Free Press, 1980. como uma de suas principais referências modernas, nossa linha de pensamento não é rigorosamente afiliada a ela, apesar de levarmos em conta algumas de suas considerações.
  • 3
    Conforme será explicado mais adiante no texto, isomorfismo é tido como um processo restritivo que força a homogeneização da população de organizações que compartilham de um mesmo campo de negócio, podendo tomar a forma de normativo, coercitivo ou mimético.
  • 4
    Adota-se a idéia de isomorfismo estratégico por entender-se que o processo isomórfico pode se dar mediante a homogeneização de escolhas estratégicas que levarão à adoção de posições competitivas muito semelhantes entre empresas atuantes em um mesmo campo de negócio.
  • 5
    Esse termo procura sintetizar a idéia de que o ambiente ao mesmo tempo que dá forma às organizações é formado por essas também, por meio de uma série de escolhas que impõem limites de atuação em um campo de negócio.

REFERÊNCIAS

  • ANSOFF, H. I. Strategic management London: Macmillan, 1979.
  • BARBOSA, S. de L. Padrões de competitividade e estratégias organizacionais na indústria moveleira do Paraná Curitiba, 2001. Dissertação (Mestrado em Administração) - Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná.
  • BERGER, P. L.; LUCKMANN, T. A construção social da realidade Petrópolis: Vozes, 1973.
  • COCHIA, C. B. R. Contexto ambiental, esquemas interpretativos e posicionamento estratégico: um estudo em pequenas empresas paranaenses. Curitiba, 2002. Dissertação (Mestrado em Administração) - Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná.
  • CRUBELLATE, J. M. et al. Estratégia como configuração: uma versão construtivista da estratégia em organizações. In: XXIX ENANPAD 2005, Anais... Brasília: Anpad, 2005.
  • D’AVENI, R. A. Hypercompetition: managing the dynamics of strategic maneuvering. New York: Free Press, 1994.
  • DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, v. 48, n. 2, p. 147-169, 1983.
  • DOZ, Y.; THANHEISER. H. Regaining competitivenes: a process of organisational renewal. In: HENDRY, J.; JOHNSON, G.; NEWTON, J. (Eds.). Strategic thinking: leadership and the management of change. Chichester: John Wiley, 1993.
  • DUNN, W.; GINSBERG, A. A sociocognitive network approach to organisational analysis. Human Relations, v. 40, n. 11, p. 955-975, 1986.
  • DUTTON, J. M.; FREEDMAN, R. D. External environment and internal strategies: calculating, experimenting, and imitating in organizations. Advances in Strategic Management, v. 3, p. 39-67, 1985.
  • FAHEY, L.; CHRISTENSEN, H. K. Evaluating the research on strategy content. Journal of Management, v. 12, n. 2, p. 167-183, 1986.
  • FIOL, C. M.; HUFF, A. S. Maps for managers: where are we? Where do we go from here? Journal of Management Studies, v. 29, n. 3, p. 267-285, 1992.
  • GIMENEZ, F. A. P. Escolhas estratégicas e estilo cognitivo: um estudo com pequenas empresas. Revista de Administração Contemporânea, v. 2, n. 1, p. 27-45, 1998.
  • ______. Patterns of strategic choice of small firm owners and managers Manchester, 1996, 335 (PhD thesis) - Manchester Business School, University of Manchester.
  • ______. O estrategista na pequena empresa Maringá: edição do autor, 2000.
  • GIMENEZ, F. A. P.; GRAVE, P. S. E-diagnóstico estratégico: uma ferramenta para posicionamento estratégico em tempo real. In: XXVI ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Salvador, 2002.
  • GIMENEZ, F. A. P. et al. A construção da concorrência por dirigentes de pequenas empresas. Caderno de Administração, v. 6, n. 4, p. 27-46, 1998.
  • GINSBERG, A. Construing the business portfolio: a cognitive model of diversification. Journal of Management Studies, v. 26, n. 4, p. 417-438, 1989.
  • HATCH, M. J. Organizational theory: modern, symbolic and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997.
  • HAUNSCHILD, P. R. Interorganizational imitation: the impact of interlocks on corporate acquisition activity. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 4, p. 564-593, 1993.
  • HAUNSCHILD, P. R.; MINER, A. S. Modes of inter-organizational imitation: the effects of outcome salience and uncertainty. Administrative Science Quarterly, v. 42, p. 472-500, 1997.
  • HAVERMAN, H. A. Follow the leader: mimetic isomorphism and entry to a new market. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 4, p. 593-628, 1993.
  • HUFF, A. S. Mapping strategic thought Chichester: Wiley, 1990.
  • HUFF, A. S.; REGER, R. K. A review of strategic process. Journal of management, v. 13, n. 2, p. 211-236, 1987.
  • JENKINS, M.; AMBROSINI, V. Strategic management - a multi-perspective approach. Basingstoke: Palgrave, 2002
  • JOHNSON, G.; SCHOLES, K. Exploring Corporate Strategy 2. ed. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1989.
  • KELLY, G. A. The Psychology of Personal Constructs New York: W. W. Norton, 1955. 2 v.
  • ______. The Psychology of Personal Constructs London: Routledge, 1991. 2 v.
  • LEITE, J. B. D.; PORSSE, M. de C. S. Competição baseada em competências e aprendizagem organizacional: em busca da vantagem competitiva. Revista de Administração Contemporânea, v. 7, ed. especial, p. 121-141, 2003.
  • LORD, R. G.; MAHER, K. J. Alternative information-processing models and their implications for theory, research, and practice. Academy of Management Review, v. 15, n. 1, p. 9-28, 1990.
  • ______. Leadership & information processing - linking perceptions and performance. London: Routledge, 1993.
  • MACHADO-DA-SILVA, C.; BARBOSA, S. de L. Estratégia, fatores de competitividade e contexto de referência das organizações: uma análise arquetípica. Revista de Administração Contemporânea, v. 6, n. 3, p. 7-32, 2002.
  • MACHADO-DA-SILVA, C. et al. Um modelo e quatro ilustrações: em análise a mudança nas organizações. In: XXIII ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Foz do Iguaçu (PR), 1999.
  • ______. Unlocking the institutionalization process: insights for an institutionalizing approach. Brazilian Administration Review, v. 2, n. 1, p. 1-20, 2005.
  • MARCH, J. Footnotes to organizational change. In: MARCH, J. Decisions and organizations Oxford: Basil Blackwell, 1989.
  • MARCH, J. G.; SIMON, H. A. Teoria das organizações Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1972.
  • MEYER, G. D. et al. The entrepreneurship-strategic management interface. In: HITT, M. A. et al. Strategic entrepreneurship - creating a new mindset. Oxford: Blackwell, 2002.
  • MEYER, J. W.; ROWAN, B. Institutionalized Organizations: Formal Structure as Myth and Ceremony. In: POWEL, W. W.; DIMAGGIO, P. J. The new institutionalism in organizational analysis Chicago: The University of Chicago Press, 1991.
  • MILES, R. E.; SNOW, C. C. Organizational strategy, structure and process New York: McGraw-Hill, 1978.
  • MINTZBERG, H. Structuring the organizations Englewood Cliffs: Prentice-Hall, 1979.
  • ______. Strategy formation schools of thought. In: FREDRICKSON, J. W. (Ed.). Perspectives on strategic management Boston: Ballinger, 1990. p. 105-235.
  • MINTZBERG, H. et al. Safári de estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000.
  • OLIVER, C. Strategic responses to institutional processes. Academy of Management Review, v. 16, n. 1, p. 145-179, 1991.
  • PALMER, D. A.; DEVEREAUX, J. P. Late adoption of multidivisional form by large US corporations: institutional, political and economic accounts. Administrative Science Quarterly, v. 38, n. 1, p. 100-132, 1993.
  • PIDD, M. Modelagem empresarial: ferramentas para a tomada de decisão. Porto Alegre: Bookman, 1998.
  • PORTER, M. E. Competitive strategy New York: Free Press, 1980.
  • PRATES, A. A. P. Organização e instituição no velho e novo institucionalismo. In: RODRIGUES, S. B.; CUNHA, M. P. Estudos organizacionais: novas perspectivas na administração de empresas. Uma coletânea luso-brasileira. São Paulo: Iglu Editora, 2000, p. 90-106.
  • RAMOS, S. C. Isomorfismo mimético e contexto de referência: um estudo em pequenas empresas de Curitiba/Pr. Curitiba, 2005. Dissertação (Mestrado) - Programa de Mestrado em Administração, Pontifícia Universidade Católica.
  • REGER, R. K. The repertory grid technique for eliciting the content and structure of cognitive constructive systems. In: HUFF, A. S. (Ed.). Mapping strategic thought, Chichester: Wiley, 1990. p. 301-309.
  • ROSSETO, C. R.; ROSSETO, A. M. O isomorfismo como balizador da formulação estratégica organizacional: um estudo multi-caso de empresas familiares do setor de edificações. In: XXVI ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, Anais... Salvador, 2002.
  • SCHWENK, C. R. The cognitive perspective on strategic decision making. Journal of Management Studies, v. 25, n. 1, p. 41-55, 1988a.
  • ______. The essence of strategic decision making New York: Macmillan, 1988b.
  • SCOTT, W. R. Organizations rational, natural, and open systems New Jersey: Englewood Cliffs, 1992.
  • ______. Institutions and organizations Thousand Oaks: Sage, 1995a.
  • ______. Symbols and organizations: from Barnard to the institutionalists. In: WILLIAMSON, O. E. (Ed.). Organization theory: from Chester Barnard to the present and beyond. New York: Oxford University Press, 1995b.
  • SEGEV, E. Strategy, strategy making and performance - an empirical investigation. Management Science, v. 33, n. 2, p. 258-269, 1987.
  • SELZNICK, P. Leadership in administration New York: Harper & Row, 1957.
  • SERRALHEIRO, W. A. O.; ROSSETO, C. R. O isomorfismo como ferramenta para a análise de adaptação estratégica: um estudo de caso das empresas Eliane. In: XVII CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE ESTRATÉGIA, Anais... Itapema, 2004.
  • SIMON, H. A. Models of thought New Haven, Yale University Press, 1979.
  • SLACK, T.; HININGS, B. Institutional pressures and isomorphic change: an empirical test. Organization Studies, v. 15, n. 6, 1994.
  • TOLBERT, P. S.; ZUCKER, L. G. A institucionalização da teoria institucional. In: CLEGG, S. R. et al. Handbook de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 1998. v. 1.
  • WACKER, G. J. Toward a cognitive methodology of organisational assessment. Journal of Applied Behavioral Science, v. 17, p. 114-129, 1981.
  • WEICK, K. A psicologia social das organizações São Paulo: Edgard Blucher, 1973.
  • ______. The social psychology of organising Reading: Addison Wesley, 1979.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2007

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2006
  • Aceito
    31 Ago 2006
Editora Mackenzie; Universidade Presbiteriana Mackenzie Rua da Consolação, 896, Edifício Rev. Modesto Carvalhosa, Térreo - Coordenação da RAM, Consolação - São Paulo - SP - Brasil - cep 01302-907 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.adm@mackenzie.br