Acessibilidade / Reportar erro

Estudo de imunoglobulinas, complementos e auto-anticorpos em 58 trabalhadores expostos à sílica

Resumos

INTRODUÇÃO: A silicose é a doença pulmonar ocupacional de maior prevalência em nosso meio. O agente patogênico da silicose é a poeira de sílica-livre ou dióxido de silício (SiO2) na forma cristalina. O processo inflamatório envolvendo o sistema imunológico na silicose ainda não está bem esclarecido. OBJETIVO: Estudar o perfil de IgG, IgM, IgA, C3, C4 e alguns auto-anticorpos no soro de trabalhadores expostos à sílica, com ou sem silicose, através de avaliação laboratorial imunológica, abrangendo tanto a imunidade inespecífica quanto a específica. MÉTODO: Foi examinada uma amostra de 58 pacientes ambulatoriais, do sexo masculino, constituída por trabalhadores expostos à sílica. Foram realizadas avaliações imunológica, radiológica e funcional pulmonar. Foram dosadas as imunoglobulinas IgG, IgA e IgM, os componentes C3 e C4 do sistema complemento e determinados auto-anticorpos. RESULTADOS: Vinte trabalhadores apresentaram radiograma normal e 38 apresentaram-no alterado, compatível com silicose. As médias dos valores de IgG no grupo com silicose foi maior que no grupo com radiograma normal (p < 0,05). Para a IgA e IgM, assim como para o C3 e C4, não houve diferença estatisticamente significativa nas médias (p > 0.05). O percentual de positividade dos auto-anticorpos foi maior no grupo silicótico em relação ao grupo com radiograma normal. CONCLUSÃO: O aumento de IgG nos doentes com silicose constitui um achado importante pois pode indicar a continuidade da reação granulomatosa, mesmo com o trabalhador afastado da exposição. Entretanto, ainda são necessários estudos que possibilitem a compreensão do processo imunogênico na silicose.

pneumopatias; Silicose; Doenças ocupacionais; Imunoglobulinas


BACKGROUND: The primary work-related lung disease in Brazil is silicosis. Its pathogenic agent is the dust of crystalline free silica (SiO2; silicon dioxide). The inflammatory process of silicosis is not yet well understood. OBJECTIVE: To analyze, through immunologic laboratory evaluation, including nonspecific and specific immunity, the profile of IgG, IgM, IgA, C3, C4 and autoantibodies in the serum of workers, with or without silicosis, exposed to silica. METHODS: Fifty-eight male workers were studied. All had been exposed to silica. Immunologic, radiologic and functional evaluations were made. The immunoglobulins IgG, IgA, and IgM, the complement system components C3 and C4, and the autoantibodies were assessed. RESULTS: Chest X-rays were normal in 20 of the 58 workers and compatible with silicosis in 38. Among the 38 who were positive, IgG values were, on average, higher than in the group with normal X-rays (p < 0.05). There were no significant differences in average values of IgA, IgM, C3 or C4 (p > 0.05). The percentage of autoantibody positivity was higher in the silicosis group than in the group with normal X-rays. CONCLUSION: The increased levels of IgG in patients with silicosis constitutes an important discovery. It may represent continuity of the granulomatous reaction, even when the individual is no longer being exposed to silica. However, further studies are necessary in order to increase understanding of the mechanism involved in the silicosis immunologic process.

Lung diseases; Silicosis; Occupational diseases; Immunoglobulins


ARTIGO ORIGINAL

Estudo de imunoglobulinas, complementos e auto-anticorpos em 58 trabalhadores expostos à sílica

Hermano Albuquerque de CastroI; Carolina Gimenes da SilvaI; Alfred LemleII

ICESTEH/ENSP/FIOCRUZ

IIFaculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Endereço para correspondência Endereço para correspondência CESTEH/ENSP/FIOCRUZ Rua Leopoldo Bulhões, 1480 Manguinhos, RJ Cep: 21041-210 Email: castro@ensp.fiocruz.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A silicose é a doença pulmonar ocupacional de maior prevalência em nosso meio. O agente patogênico da silicose é a poeira de sílica-livre ou dióxido de silício (SiO2) na forma cristalina. O processo inflamatório envolvendo o sistema imunológico na silicose ainda não está bem esclarecido.

OBJETIVO: Estudar o perfil de IgG, IgM, IgA, C3, C4 e alguns auto-anticorpos no soro de trabalhadores expostos à sílica, com ou sem silicose, através de avaliação laboratorial imunológica, abrangendo tanto a imunidade inespecífica quanto a específica.

MÉTODO: Foi examinada uma amostra de 58 pacientes ambulatoriais, do sexo masculino, constituída por trabalhadores expostos à sílica. Foram realizadas avaliações imunológica, radiológica e funcional pulmonar. Foram dosadas as imunoglobulinas IgG, IgA e IgM, os componentes C3 e C4 do sistema complemento e determinados auto-anticorpos.

RESULTADOS: Vinte trabalhadores apresentaram radiograma normal e 38 apresentaram-no alterado, compatível com silicose. As médias dos valores de IgG no grupo com silicose foi maior que no grupo com radiograma normal (p < 0,05). Para a IgA e IgM, assim como para o C3 e C4, não houve diferença estatisticamente significativa nas médias (p > 0.05). O percentual de positividade dos auto-anticorpos foi maior no grupo silicótico em relação ao grupo com radiograma normal.

CONCLUSÃO: O aumento de IgG nos doentes com silicose constitui um achado importante pois pode indicar a continuidade da reação granulomatosa, mesmo com o trabalhador afastado da exposição. Entretanto, ainda são necessários estudos que possibilitem a compreensão do processo imunogênico na silicose.

Descritores: pneumopatias. Silicose. Doenças ocupacionais. Imunoglobulinas.

Siglas e abreviaturas utilizadas neste trabalho:

PFAN - Fator anti-nuclear

FR - Fator reumatóide

SiO2 - Dióxido de silício ou sílica-livre

Introdução

A silicose é a principal pneumopatia ocupacional existente no país e no mundo. É uma doença respiratória profissional cujo agente patogênico é a poeira de sílica-livre ou dióxido de silício na forma cristalina (Si02). A presença da sílica no pulmão desencadeia uma resposta celular inflamatória, a qual é iniciada no macrófago alveolar pulmonar(1,2).

A silicose é uma doença granulomatosa que envolve um afluxo de células inflamatórias e estimula a produção de anticorpos. Exames histológicos mostram a participação de complexos antígeno-anticorpos precipitados(3), especialmente de auto-anticorpos anti-nucleares. Freqüentemente estão presentes doenças auto-imunes em pacientes com a forma acelerada e aguda da doença(1,4), como por exemplo, entre jateadores de areia portadores de silicose, os quais apresentam grandes opacidades e cavitações, e níveis séricos elevados de anticorpos anti-nucleares(5,6).

Alguns estudos mostram um aumento de polimorfonucleares neutrófilos em trabalhadores expostos à sílica livre. Lugano et al. (7) relataram que macrófagos expostos in vitro à sílica liberavam um fator quimiotáxico para neutrófilo, que poderia ser o leucotrieno B4.

Outro fator presente no adoecimento é a susceptibilidade individual, através da qual se tenta explicar a presença ou ausência da doença entre os trabalhadores expostos às mesmas condições. As diferenças individuais caracterizam-se pela falta de uniformidade na relação dose-resposta e na presença de alterações imunológicas.

A exuberância da resposta imunológica local e sistêmica demonstra a importância da partícula de sílica como estimulador imunogênico, manifestada pela presença de hipergamaglobulinemia sérica e de auto-anticorpos circulantes no soro(8,9). Além disso, tem sido descrito por diversos autores(8,10,11) que o aumento do número de linfócitos no lavado broncoalveolar está associado ao aumento sérico de todas as classes de imunoglobulinas (até três vezes mais que o normal), componentes do complemento, imunocomplexos circulantes e fator reumatóide.

O objetivo deste trabalho foi analisar as dosagens de imunoglobulinas (IgA, IgG e IgM), de fatores do complemento (C3 e C4) e de auto-anticorpos (anticorpos anti-DNA, anti-mitocôndria, anti-tireoglobulina, anti-microssomial tireoidiano, anti-músculo liso e anti-nucleares) em trabalhadores expostos à sílica, com ou sem silicose, através de avaliação imunológica laboratorial.

Método

Examinou-se uma amostra de 58 pacientes ambulatoriais, do sexo masculino, constituída por trabalhadores expostos à sílica por um período superior a oito meses, em diversas atividades industriais. Foram excluídos os indivíduos com quadro clínico e radiológico sugestivo de infecções agudas, inclusive viroses respiratórias. A leitura radiológica foi realizada por três leitores, de acordo com os padrões preconizados pela Organização Internacional do Trabalho em 1980 (12).

Os pacientes foram divididos de acordo com os aspectos radiológicos em: categoria normal: radiogramas com leitura 0/-, 0/0 e 0/1; categoria 1: radiogramas com leitura 1/0, 1/1 e 1/2; categoria 2: radiogramas com leitura 2/1, 2/2 e 2/3; e categoria 3: radiogramas com leitura 3/2, 3/3 e 3/+. Foi considerada presença de silicose nos casos em que os radiogramas apresentavam média de leitura maior que 1/0.

As imunoglobulinas (IgG, IgA, IgM) foram determinadas pela técnica de imunodifusão radial. Foram utilizadas placas da Böehering Nor-Partigen® IgG-HC, IgA e IgM. Os componentes C3 e C4 do sistema complemento foram determinados pela técnica de imunodifusão radial. Utilizaram-se placas da Böehering Nor-Partigen C3® e Nor-Partigen C4®. A pesquisa de fator anti-nuclear (FAN) foi realizada pela técnica descrita por Lima et al. (13), que utiliza como substrato imprint, de cortes de fígado de rato conservados a -20°C. A pesquisa de auto-anticorpos tireoidianos (anti-microssomial e anti-tireoglobulina) foi realizada por determinação semi-quantitativa de anticorpos anti-microssomial tireoidiano e anti-tireoglobulina, pela técnica de micro-aglutinação. O teste é baseado na aglutinação de partículas de gelatina, acopladas aos antígenos microssomial e tireoglobulina, extraídas e purificadas de tecido tireoidiano humano. O soro dos indivíduos estudados foi testado em diluições iguais ou superiores a 1/100. O resultado normal do teste é o negativo. Anticorpos anti-DNA, anti-mitocôndria e anti-músculo liso foram pesquisados através de imunofluorescência indireta em lâminas com Crithidia Luciliae, fígado, e estômago de rato, respectivamente. A presença do fator reumatóide (FR) foi investigada através do teste do látex, e nos indivíduos que apresentaram látex positivo foi realizado o teste de Waller-Rose. Ambos foram realizados segundo técnica descrita por Lima et al. (13). Os soros foram conservados a -20°C, e diluídos a 1:30 na ocasião dos testes.

Alguns dados são expressos em médias e desvio padrão das médias e outros através da positividade. O teste estatístico aplicado para as análises de médias foi o teste t de Student onde havia distribuição normal (distribuição homogênea) dos dados. Como teste não paramétrico, foi aplicado o teste do qui-quadrado (x2) de Pearson para as tabelas de associação (2 x 2). Para todos os testes fixou-se o nível de significância em p < 0,05.

Todos os trabalhadores incluídos no estudo concordaram com a participação, após leitura em voz alta do termo de consentimento.

Resultados

Do total de 58 trabalhadores expostos estudados, 20 apresentaram radiograma normal e 38 apresentaram alterações radiológicas compatíveis com silicose, e foram assim classificados: 24 na categoria 1, 9 na categoria 2 e 5 trabalhadores na categoria 3.Nenhum trabalhador apresentava sinais de doença do colágeno no momento do estudo. A média de idade de todos os indivíduos estudados foi de 43,3 ± 9,9 anos.

Quanto ao tempo de trabalho em meses, a média foi de 191,60 ± 102,30, com a maior média de tempo na categoria 1 (213,41 ±143,68) e a menor no grupo com radiograma normal (142,80 ± 80,63). Quanto ao tabagismo, houve 81% de fumantes na população estudada.

As médias dos valores de IgG, IgA e IgM no grupo estudado encontram-se na Tabela 1.Essa tabela mostra que a diferença entre as médias do grupo com radiograma normal e do grupo com silicose foi estatisticamente significativa apenas para a IgG (p = 0.03).

As médias e desvios padrão dos valores dos componentes C3 e C4 do sistema complemento do grupo estudado encontram-se na tabela 2.Nessa tabela as diferenças entre todas as médias para C3 e C4 não foram estatisticamente significativas (p > 0,05).

O percentual de positividade no grupo estudado foi de 20,6% para o FAN, 3,4% para o FR ou teste do látex, 3,4% para o Waller-Rose, 20,6% para o anticorpo anti-DNA, 1,7% para o anticorpo anti-mitocôndria, 1,7% para o anticorpo anti-tireoglobulina, 3,4% para o anticorpo anti-microssomial tireoidiano e 1,7% para o anticorpo anti-músculo liso. As proporções são mostradas na Tabela 3 e os resultados do teste não paramétrico entre o grupo com radiograma normal e o grupo com silicose (radiograma alterado) não foram estatisticamente significativos.

Discussão

Os distúrbios da imunidade parecem estar estreitamente relacionados com o processo de adoecimento de trabalhadores expostos à sílica livre nos ambientes de trabalho.

A importância da resposta específica humoral tem sido documentada por diversos autores no processo de adoecimento da silicose(2). Descreve-se o aumento policlonal das imunoglobulinas tanto no sangue quanto no lavado broncoalveolar(5,10,14).

Karnick et al. (15) encontraram uma média de 1835,44 mg/dl de IgG nos trabalhadores expostos, com ou sem silicose, com uma diferença estatisticamente significativa quando comparados com o grupo controle (média de 1373 mg/dl), tendendo a aumentar levemente quanto maior o tempo de exposição à sílica. Entretanto, observando as diferenças de médias das imunoglobulinas no grupo de trabalhadores expostos, verificaram uma diferença nos valores para IgM no grupo com silicose simples (144,64 mg/dl) comparado ao grupo de expostos sem silicose (187,53 mg/dl). Neste caso ocorreu um aumento de IgM no grupo exposto sem doença. O mesmo não aconteceu com a IgG e a IgA. Observaram ainda uma diferença entre os valores de IgG no grupo de expostos: média de 2193,68 mg/dl no grupo de silicóticos com conglomerados e grandes opacidades dos tipos A, B e C ao radiograma de tórax, e média de 1860,85 mg/dl no grupo exposto sem silicose.

Nigam et al. (4) avaliaram 19 trabalhadores expostos à sílica, dos quais 7 com silicose e 12 sem silicose, e 19 controles não expostos, e encontraram diferença estatisticamente significativa apenas entre as médias no soro para IgG entre o grupo de expostos (2318,00 mg/dl) e o grupo controle (1663,00 mg/dl). A IgM, a IgA e os complementos C3 e C4 estavam ligeiramente aumentados nos trabalhadores expostos, mas esses aumentos não eram estatisticamente significativos. Os autores ainda encontraram uma elevação significativa de IgA no grupo exposto com silicose quando comparado com o grupo exposto sem silicose.

Estudos como os de Nagaoka et al. e Miossec et al. (16,17) mostram uma diferença significativa de IgG entre o grupo de expostos à sílica (com ou sem doença) e o grupo controle não exposto. Esses estudos elucidam a participação de algumas imunoglobulinas no processo de adoecimento pela sílica.

O fator limitante deste trabalho é a ausência de grupo controle não exposto, o que impede uma abordagem comparativa com outros estudos, tanto para imunoglobulinas, quanto para os auto-anticorpos. Entretanto, a análise intragrupo, ou seja, no grupo de expostos à sílica livre, de silicóticos e não silicóticos fornece uma visão indicativa de alterações imunológicas. Chama-se a atenção ainda ao fato de apresentar um número maior de casos com alterações radiológicas compatíveis com silicose na sua fase inicial, que representam os casos mais leves.

No caso da IgG, este estudo revela uma diferença significativa do nível dessa imunoglobulina entre o grupo com radiograma normal e o grupo com radiograma compatível com silicose. O mesmo não ocorre com a IgA e a IgM. Entretanto, no caso da IgM, obteve-se um padrão com valores maiores no grupo com radiograma normal, o que mostra uma tendência à diminuição, à medida que aumenta a categoria de doença, ou seja, a sua gravidade.

A IgG é uma imunoglobulina que aparece numa fase mais tardia da exposição ao agente agressor. O aumento de IgG nos doentes com silicose pode representar uma resposta inflamatória conseqüente à exposição à poeira de sílica, indicando a continuidade da reação granulomatosa, mesmo com o trabalhador afastado da exposição. No caso da IgM, deve-se considerar que ela é a primeira imunoglobulina circulante produzida pelo plasmócito durante a resposta imunológica. Sua elevação ocorre logo após o primeiro contato com o antígeno. A IgM é também a mais eficiente na fixação de complemento, por possuir a capacidade de iniciar a cascata do sistema, juntamente com a IgG (18). O aumento de IgM talvez represente uma das primeiras respostas imunológicas dos trabalhadores expostos à sílica.

Karnik et al. (15) sugerem, na conclusão de seus estudos, a hipótese de envolvimento de disfunção humoral na silicose. Ressaltam que ocorre, de alguma forma, um aumento na produção de anticorpos, e que quanto maior for a duração da exposição à sílica, maior é a resposta humoral, principalmente no grupo com silicose que apresenta grandes opacidades.

Em relação aos valores séricos dos fatores do complemento C3 e C4, as médias encontradas no grupo com radiograma normal foram menores do que as médias encontradas nos trabalhadores com silicose, mas essa diferença não foi estatisticamente significativa. A categoria 3 apresentou valores maiores para C3 e C4. O aumento sérico de componentes do sistema complemento, particularmente do C3, é fundamental, tanto na via clássica quanto na via alternativa de ativação da cadeia do sistema(18). Durante o processo de ativação do sistema complemento, ocorre liberação de pequenos fragmentos (C3a, C4a e C5a) com características peculiares, gerados a partir do C3, C4 e C5. Tais fragmentos agem no sistema imunológico e, segundo alguns autores, podem ter um papel na patogenia da silicose(1,2,19).

Foi encontrada uma maior proporção de indivíduos com FAN e anticorpo anti-DNA positivos (20,6%). Outros autores têm encontrado prevalências diversas, tais como 44% em 39 jateadores de areia com silicose(5), 26% em 53 silicóticos(8), 13,4% em 134 silicóticos(16) e 11% em 58 silicóticos(20). As prevalências elevadas de FAN positivo têm sido relatadas, de um modo geral, em pacientes com doença avançada(5,16). O FR é um anticorpo com atividade anti-IgG, pertencente principalmente ao grupo das IgM. Embora este estudo tenha revelado apenas dois casos com FR positivo na categoria 1 (3,4%), ele tem sido descrito com uma freqüência maior na literatura. Doll et al. (8) detectaram FR com título acima de 1:40 em 28% de 53 pacientes com silicose, enquanto que Nagaoka et al. (16) observaram 10,4% de FR positivo em 134 pacientes. Por outro lado, Subra et al. (20) não encontraram um aumento significativo de FR, C3 ou C4.

Nigam et al. (4) encontraram um caso de FAN positivo em trabalhadores expostos sem silicose. Entretanto, revelaram uma incidência de imuno-complexos um pouco mais elevada no grupo exposto com alteração radiológica do que no grupo exposto sem alteração radiológica de silicose.

Os auto-anticorpos são anticorpos contra antígenos do próprio hospedeiro, e podem ou não causar algum dano ao organismo(21). Podem ser encontrados em pequena quantidade nos indivíduos saudáveis e, provavelmente, contribuem para a homeostase imunológica(22,23). Nas doenças do tecido conjuntivo existe uma exacerbação de fenômenos de auto-agressão imunológica que resultam em dano ao organismo.

Algumas pesquisas mostram um aumento dos níveis séricos de auto-anticorpos na silicose, sem que haja doença auto-imune(8), enquanto que outras observam o aumento da prevalência das próprias doenças auto-imunes na silicose(21,24,25). Ângelo Papi(26) apontou uma expressiva prevalência de esclerose sistêmica em trabalhadores de minas, com silicose ou antracose, levantando a hipótese de que a fibrose pulmonar poderia representar um elemento fundamental na gênese do processo esclerótico. SLuis-Cremer et al. (24), estudando a relação entre artrite reumatóide e silicose, mostraram que os mineiros com artrite reumatóide, quando expostos à sílica, tinham maior probabilidade de desenvolver silicose do que os mineiros expostos sem artrite reumatóide.

Com base neste, e nos diversos estudos encontrados na literatura, deve-se considerar a possibilidade de alteração das respostas imunológicas nos indivíduos expostos à sílica, tanto na imunidade específica quanto inespecífica.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Dra. Precy Grosmann e sua equipe do Laboratório de Imunologia da Faculdade de Medicina/UFRJ.

Recebido para publicação, em 25/6/2003.

Aprovado após revisão, em 17/3/2004.

  • 1. Davis GS. Pathogenesis of silicosis: current concepts and hypotheses. Lung. 1986;164:139-54.
  • 2. Ziskind M, Jones RN, Weill H. Silicosis. Am Rev Respir Dis. 1986;113:643-65.
  • 3. Schuyler M, Ziskind M, Salvaggio L. Cell-mediated immunity in silicosis. Am. Rev Respir Dis. 1977;116:147-51.
  • 4. Nigam SK, Saiyed HN, Malaviya R, Suthar AM, Desai UM, Venkaiah K, et al. Role of circulating immune complexes in the immunopathogenesis of silicosis. Toxicol-Lett. 1990;51:315-20.
  • 5. Jones RN, Turner-Warwick M, Ziskind M, Weill H. High prevalence of antinuclear antibodies in sandblasters silicosis. Am Rev Resp Dis 1976;113:393-4.
  • 6. Costallat LTL, De Capitani E, Zambon L. Pulmonary silicosis and systemic lupus erythematosus in men: a report of two cases. Joint Bone Spine. 2002;69:68-71.
  • 7. Lugano EM, Dauber JH, Elias JA. The Regulation of lung fibroblast proliferation by alveolar macrophages in experimental silicosis. Am Rev Respir Dis. 1984;129:767-71.
  • 8. Doll NJ, Stankus RP, Mughes J. Immune complexes and autoantibodies in silicosis. I Allergy Clin Immunol. 1981;68:281.
  • 9. Moseley PL, Monick M, Hunninghake GW. Divergent effects of silica on lymphocyte proliferation and immunoglobulin production. J Appl Physiol. 1988;65:350-7.
  • 10. Ferreira A, Moreira JS, Caetano R, Gabetto JM, Quirico-Santos T. Caracterização imunofenotípica das subpopulações de linfócitos do lavado broncoalveolar de pacientes com silicose. J Pneumol. 2000;26:107-12.
  • 11. Calhoun WJ, Christman JW, Ershler WB, Graham WG, Davis GS. Raised immunoglobulin concentrations in bronchoalveolar lavage fluid of healthy granite workers. Thorax. 1986;41:266-73.
  • 12
    ILO - International Labour Office. Guidelines for the use of ILO International Classification of Radiographs of Pneumoconiosis. Geneva: ILO; 1980. (Occupational safety and health Series, n. 22).
  • 13. Lima AO. Métodos de laboratório aplicados clínica. 5a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1977.
  • 14. Ueki A, Isozaki Y, Tomokuni A. Autoantibodies detectable in the sera of silicosis patients. The relationship between the anti-topoisomerase I antibody response and HLA-DQB1* 0402 allele in japanese silicosis patients. Sci Total Environ. 2001;270:141-8.
  • 15. Karnik AB, Saiyed HN, Nigan SK. Humoral immunologic dysfuction in silicosis. Indian J Med Res. 1990;92(B):440-2.
  • 16. Nagaoka T, Tobata M, Kobayashi K, Okada A. Studies on production of anticollagen antibodies in silicosis. Environ Res. 1993;60:12-29.
  • 17. Miossec P, Youinou P, Cledes J, Clavier J, Philippon P, Ferec C, et al. Lowered Fc IgG receptor-bearing T lymphocytes correlate with non-organ-specific autoantibodies in silicosis. Int Arch Allergy Appl Immunol. 1984;73:212-5
  • 18. Stites DP, Terr AI. Basic and clinical immunology. 7a ed. New Jersey: Prenttice-Hall; 1991.
  • 19. Warheit DB, Overly LA, George G. Pulmonary macrophages are att racted av inhaled particles through complement ativation. Exp Lung Res. 1988;14:51-66.
  • 20. Subra JF, Renier G, Reboul P, Tollis F. Lymphopenia in occupational pulmonary silicosis with or without autoimmune disease. Clin Exp Immunol. 2001;126:540-4.
  • 21. Naparstek Y, Plotz PM. The role of autoantibodies in autoimmune disease. Ann Rev Immunol. 1993;11:79-104.
  • 22. Nossal GJ. Current concepts: immunology - the basic components of the immune system. N Engl J Med. 1987;316:1320-5.
  • 23. Berneman A, Guilbert B, Eschrich S. IgG auto- and polyreactivities of normal human sera. Mol Immunol. 1993;30:1499-510.
  • 24. Sluis-Cremer GK, Hessel PA, Hnizdo E, Churchill AR. Relatonship between silicosis and rheumatoid arthritis. Thorax. 1986;41:596-601.
  • 25. Rustin MH, Bull HA, Ziegler V, Mehlhorn J, Haustein UF, Maddison PJ, et al. Silica-associated systemic sclerosis is clinically, serologically and immunologically indistinguishable from idiopathic systemic sclerosis. Br J Dermatol. 1990;123:725-34.
  • 26. Papi IA. Esclerose sistêmica. In: Bonomo I. Conhecimentos básicos de reumatologia. S.l. : s.n. ; 1974. 35-43.
  • Endereço para correspondência

    CESTEH/ENSP/FIOCRUZ
    Rua Leopoldo Bulhões, 1480
    Manguinhos, RJ Cep: 21041-210
    Email:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Set 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2004

    Histórico

    • Aceito
      17 Mar 2004
    • Recebido
      25 Jun 2003
    Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia SCS Quadra 1, Bl. K salas 203/204, 70398-900 - Brasília - DF - Brasil, Fone/Fax: 0800 61 6218 ramal 211, (55 61)3245-1030/6218 ramal 211 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: jbp@sbpt.org.br