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Percepção de estudantes do curso de fisioterapia sobre sua formação profissional para atuação na atenção básica no Sistema Único de Saúde

Percepción de estudiantes del curso de fisioterapia sobre su formación profesional para actuación en la atención básica en el Sistema Único de Salud

Resumos

A implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a busca dos seus princípios têm suscitado mudanças nas práticas de saúde, promovendo alterações no processo de formação e desenvolvimento de profissionais da área. Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo verificar a percepção de estudantes do Curso de Fisioterapia de uma Instituição de Ensino Superior (IES) pública, na cidade de Teresina (PI), sobre sua formação para prestação de serviços na área de atenção básica no SUS. Estudo transversal com aplicação de questionário especificamente elaborado para o estudo. A amostra foi composta por 42 dos 54 acadêmicos do Curso de Fisioterapia, matriculados do 6º ao 10º período. Os resultados mostram que 81% dos alunos afirmaram ter conhecimentos sobre o SUS proporcionados pela IES. Observou-se que somente os alunos integrantes da amostra que cursavam o 10º período (28,6%) realizaram estágio em saúde coletiva e fisioterapia comunitária. Foi verificado que 91,7% dos alunos do último ano e 43,3% dos alunos representativos dos demais períodos se julgaram aptos para atuar no sistema de saúde. Assim, constatou-se que, em sua maioria, os acadêmicos entrevistados detêm conhecimentos sobre o SUS, adquiridos em sua graduação, e acreditam estar preparados para atuar no sistema, principalmente após a realização do estágio supervisionado.

formação de recursos humanos; fisioterapia; atenção primária à saúde; Sistema Único de Saúde


La implantación del Sistema Único de Salud (SUS) y la búsqueda de sus principios han suscitado cambios en las prácticas de salud, promoviendo alteraciones en el proceso de formación y desarrollo de profesionales del área. En ese contexto, este trabajo tuvo como objetivo verificar la percepción de estudiantes del Curso de Fisioterapia de una Institución de Enseñanza Superior (IES) pública, en la ciudad de Teresina (PI), sobre su formación para prestación de servicios en el área de atención básica en el SUS. Estudio transversal con aplicación de cuestionario específicamente elaborado para el estudio. La muestra fue compuesta por 42 de los 54 académicos del Curso de Fisioterapia, matriculados del 6º al 10º período. Los resultados muestran que 81% de los alumnos afirmaron tener conocimientos sobre el SUS proporcionados por la IES. Se observó que solamente los alumnos integrantes de la muestra que cursaban el 10º período (28,6%) realizaron pasantía en salud colectiva y fisioterapia comunitaria. Fue verificado que 91,7% de los alumnos del último año y 43,3% de los alumnos representativos de los demás períodos se juzgaron aptos para actuar en el sistema de salud. Así, se constató que, en su mayoría, los académicos entrevistados poseen conocimientos sobre el SUS, adquiridos en su graduación, y creen estar preparados para actuar en el sistema, principalmente después de la realización de la pasantía supervisada.

formación de recursos humanos; fisioterapia; atención primaria a la salud; Sistema Único de Salud


The implementation of the Unified Health System in Brazil (Sistema Único de Saúde - SUS) and the search for its principles have led to changes in health practices, promoting alterations in the formation and development processes of the professionals of the field. In this context, this study aims to determine the perception of Physical Therapy students from a Higher Education Institution in the city of Teresina, Piauí, Brazil, on their training to provide services for SUS, by means of the application of a questionnaire specifically designed for this study. The research sample was composed of 42 out of the 54 students of Physical Therapy enrolled from the 6th to the 10th periods, which is also the last period of the course. The results show that 81% of academicians reported knowing something about SUS because of higher education institution. It was observed that only members of the sample attending the 10th period (28.6%) were interns in the public health system and community physical therapy. It was found that 91.7% of students from the 10th period and 43.3% of the students representing the other periods judged themselves to be able to work with the system. Thus, it appears that most interviewed students are aware of SUS, because of graduation, and believe to be prepared to work with the health system, especially after the supervised internship.

human resources formation; physical therapy; primary health care; Sistema Único de Saúde


PESQUISAS ORIGINAIS

Percepção de estudantes do curso de fisioterapia sobre sua formação profissional para atuação na atenção básica no Sistema Único de Saúde

Percepción de estudiantes del curso de fisioterapia sobre su formación profesional para actuación en la atención básica en el Sistema Único de Salud

Kajena Nascimento SerianoI; Vivianne Ramos da Cunha MunizII; Maria Ester Ibiapina Mendes de CarvalhoI,III

IDepartamento de Fisioterapia da UESPI – Teresina (PI), Brasil

IIFaculdade Internacional de Curitiba (FACINTER) – Curitiba (PR), Brasil

IIIUniversidade Camilo Castelo Branco (UNICASTELO) – São Paulo (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Kajena Nascimento Rua Aclimação, 2661 CEP: 64028-265 – Teresina (PI), Brasil E-mail: kajenans@hotmail.com

RESUMO

A implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a busca dos seus princípios têm suscitado mudanças nas práticas de saúde, promovendo alterações no processo de formação e desenvolvimento de profissionais da área. Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo verificar a percepção de estudantes do Curso de Fisioterapia de uma Instituição de Ensino Superior (IES) pública, na cidade de Teresina (PI), sobre sua formação para prestação de serviços na área de atenção básica no SUS. Estudo transversal com aplicação de questionário especificamente elaborado para o estudo. A amostra foi composta por 42 dos 54 acadêmicos do Curso de Fisioterapia, matriculados do 6º ao 10º período. Os resultados mostram que 81% dos alunos afirmaram ter conhecimentos sobre o SUS proporcionados pela IES. Observou-se que somente os alunos integrantes da amostra que cursavam o 10º período (28,6%) realizaram estágio em saúde coletiva e fisioterapia comunitária. Foi verificado que 91,7% dos alunos do último ano e 43,3% dos alunos representativos dos demais períodos se julgaram aptos para atuar no sistema de saúde. Assim, constatou-se que, em sua maioria, os acadêmicos entrevistados detêm conhecimentos sobre o SUS, adquiridos em sua graduação, e acreditam estar preparados para atuar no sistema, principalmente após a realização do estágio supervisionado.

Descritores: formação de recursos humanos; fisioterapia; atenção primária à saúde; Sistema Único de Saúde.

RESUMEN

La implantación del Sistema Único de Salud (SUS) y la búsqueda de sus principios han suscitado cambios en las prácticas de salud, promoviendo alteraciones en el proceso de formación y desarrollo de profesionales del área. En ese contexto, este trabajo tuvo como objetivo verificar la percepción de estudiantes del Curso de Fisioterapia de una Institución de Enseñanza Superior (IES) pública, en la ciudad de Teresina (PI), sobre su formación para prestación de servicios en el área de atención básica en el SUS. Estudio transversal con aplicación de cuestionario específicamente elaborado para el estudio. La muestra fue compuesta por 42 de los 54 académicos del Curso de Fisioterapia, matriculados del 6º al 10º período. Los resultados muestran que 81% de los alumnos afirmaron tener conocimientos sobre el SUS proporcionados por la IES. Se observó que solamente los alumnos integrantes de la muestra que cursaban el 10º período (28,6%) realizaron pasantía en salud colectiva y fisioterapia comunitaria. Fue verificado que 91,7% de los alumnos del último año y 43,3% de los alumnos representativos de los demás períodos se juzgaron aptos para actuar en el sistema de salud. Así, se constató que, en su mayoría, los académicos entrevistados poseen conocimientos sobre el SUS, adquiridos en su graduación, y creen estar preparados para actuar en el sistema, principalmente después de la realización de la pasantía supervisada.

Palabras clave: formación de recursos humanos; fisioterapia; atención primaria a la salud; Sistema Único de Salud.

INTRODUÇÃO

As lutas dos movimentos sociais e sanitários brasileiros foram as responsáveis pela criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o que mudou a forma de gestão, participação social e da concepção de saúde. Do SUS emergem princípios básicos como universalidade, equidade e resolutividade, sendo que as ações e serviços de saúde devem ser desenvolvidos de acordo com estes e com as diretrizes existentes no Artigo 198 da Constituição Federal: descentralização, atenção integral à saúde e participação social1-3.

A implantação do SUS e a busca dos seus princípios têm suscitado diversas elaborações e proposições referentes aos modelos assistenciais adotados, à lógica de financiamento e às práticas profissionais. No que tange à atuação profissional, tem se tornado crescente o debate em torno da necessidade de adequação da formação dos profissionais à nova lógica de organização dos sistemas de serviços de saúde baseada nos princípios e diretrizes do SUS4.

Durante muito tempo, o ensino de graduação no Brasil foi caracterizado pela aquisição de conhecimentos técnico-científicos, a partir de disciplinas desarticuladas e sem integração entre teoria e prática. Modelo de ensino que não se mostra capaz de proporcionar formação do profissional com o perfil necessário para atuar na perspectiva da atenção integral à saúde, incluindo as ações de promoção, proteção, prevenção, atenção precoce, cura e reabilitação5,6.

Nesse contexto, um dos cursos da área da saúde que passa por esse processo de mudança, a fim de formar profissionais aptos para trabalhar com o SUS, é o de Fisioterapia. Desde o surgimento da profissão, que objetivava o tratamento de pessoas com lesões físicas decorrentes das guerras, a Fisioterapia teve um caráter essencialmente curativo e reabilitador. Tal visão, durante muito tempo, excluiu da rede básica os serviços de fisioterapia, resultando em grande dificuldade de acesso da população a esses serviços7,8.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o ensino de Graduação em Fisioterapia destacam que "a formação do fisioterapeuta deve contemplar as necessidades sociais da saúde, com ênfase no SUS". Este não deve ser confundido com atenção básica. É de competência dele a atenção a saúde com a integração de intervenções no âmbito da promoção, proteção e recuperação da saúde, contudo, o primeiro nível de atenção constitui-se porta de entrada para o sistema, devendo ter grande resolutividade, de aproximadamente 90%, tornando-o assim prioritário2,7,9.

Partindo desta premissa e considerando que o SUS é um grande empregador dos trabalhadores em saúde, merece destaque a preocupação com a formação dos profissionais da Fisioterapia. Essa formação deve estimular o pensamento crítico e produtivo, ser baseada nos problemas da população assistida e valorizar o conhecimento que é cotidianamente produzido nas unidades de saúde, articulando-o com o que é criado na universidade. Profissionais formados dessa maneira, e que conhecem o sistema de saúde brasileiro e as políticas de saúde, frequentemente adquirem uma postura de compromisso com esse sistema, o que é importante para o seu efetivo engajamento nas propostas de transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho10.

Nesse contexto de mudanças no ensino de Graduação em Fisioterapia, esta pesquisa teve como objetivo analisar a percepção de estudantes do curso de Fisioterapia de uma Instituição Pública de Ensino Superior da cidade de Teresina (PI) sobre sua formação para prestação de serviço ao SUS, permitindo conhecer de que maneira os estudantes, atores principais no processo, estão vendo a sua formação em relação ao SUS, assim como suas expectativas e conhecimentos sobre o sistema de saúde brasileiro.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa do tipo transversal, de caráter quantitativo e descritivo, que teve como sujeitos os estudantes do Curso de Fisioterapia do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Estadual do Piauí (CCS/UESPI), localizado na cidade de Teresina (PI).

O Curso de Fisioterapia da IES pesquisada conta com uma carga horária de 5.220 h/a, sendo destas 1.440 h/a de estágio supervisionado. A grade curricular está constituída de disciplinas teóricas que abordam o tema de saúde coletiva no 4º período, que são saúde pública e fisioterapia comunitária, as quais somam uma carga horária de 120 h/a, e todos os acadêmicos abordados na pesquisa já haviam realizado tais disciplinas. Os estágios supervisionados ocorrem no último ano do curso, sendo divididos em ambulatoriais e em saúde pública no 9º período, e hospitalares no 10º período.

Em função da oferta das disciplinas teóricas e da vivência prática com o SUS no estágio supervisionado que habilita o acadêmico ao atendimento na atenção básica, e de acordo com o disposto na Resolução 139/92 do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), Art. 7º, inciso II, os estágios do curso de Fisioterapia somente poderão ser realizados "a partir do 6º período da graduação por ser parte do ciclo de matérias profissionalizantes"11. O 9º período não possuía alunos regularmente matriculados na instituição, por isso foi excluído do estudo. Assim, foram incluídos no estudo todos os alunos regularmente matriculados no 6º, 7º, 8º e 10º períodos do Curso de Fisioterapia do CCS/ UESPI, independente de gênero e com idade maior ou igual a 18 anos. Foram excluídos aqueles que não estavam presentes em sala de aula no momento da coleta dos dados.

Em obediência à resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, a pesquisa passou por apreciação ética pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Piauí (UESPI), sendo aprovada com registro do projeto (n° 059/11) e mediante a assinatura de duas vias de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo participante, ficando uma com o mesmo e outra com a pesquisadora responsável. Além disso, as pesquisadoras tomaram todas as precauções para que a confidencialidade, a privacidade e a autonomia dos sujeitos da pesquisa fossem preservadas.

A coleta de dados foi realizada mediante o preenchimento de questionário estruturado constituído por 14 questões, abertas e fechadas, elaborado pelos autores, que incluíam quatro questões sobre dados demográficos dos entrevistados, duas questões sobre as expectativas em relação ao SUS como mercado de trabalho, sete questões sobre a apropriação de conhecimentos acadêmicos, teóricos e práticos, sobre o SUS quanto à habilitação para o atendimento na atenção básica, e uma questão sobre a contribuição do Curso de Fisioterapia nesse contexto.

Os sujeitos foram recrutados em sala de aula e no campo de estágio por convite verbal. Após prévia explicação sobre a pesquisa e a autorização do professor, os questionários foram imediatamente respondidos e entregues à pesquisadora.

Para avaliação estatística dos dados coletados foi utilizado o software Epi Info versão 3.5.3, por meio da distribuição das frequências, porcentagens e de medidas de tendência central e dispersão.

RESULTADOS

Dos 54 alunos matriculados do 6º ao 10º período do curso de graduação em Fisioterapia da instituição pesquisada, 42 responderam ao questionário, correspondendo a 80,8% do universo da pesquisa. Amostra suficiente, considerando uma margem de erro de 10%, nível de confiança de 95% e nível de heterogeneidade de 50%.

A idade dos acadêmicos entrevistados variou de, no mínimo 18 e, no máximo, 28 anos, com média de 22,2 (±1,8) anos. Na amostra houve predominância do gênero feminino com 30 entrevistados (71,4%).

O Figura 1 expressa a opção dos entrevistados entre o serviço público e privado para atuação profissional após a graduação.


Quando indagados sobre a IES ter proporcionado conhecimentos sobre o SUS, 34 (81%) dos alunos entrevistados relataram ter recebido informações dessa natureza durante sua vida acadêmica.

Os acadêmicos responderam a duas questões relacionadas ao SUS, que avaliaram o conhecimento quanto a alguns princípios do SUS expressos na Tabela 1.

Todos os estudantes afirmaram que a comunidade tem algo a ensinar ao estudante de Fisioterapia.

A Tabela 2 mostra a vivência dos acadêmicos com o atendimento pelo Sistema Único de Saúde em hospital público, e a vivência na atenção básica nos estágios de saúde coletiva e fisioterapia comunitária.

Quando indagados sobre sentirem-se preparados para atuar no SUS, os resultados estão expressos no Figura 2.


Os motivos relatados pelos alunos do 6º ao 8º período que revelaram inaptidão para atuação no SUS foram a falta de experiência e o conhecimento ainda insuficiente para o SUS. Enquanto os alunos do 10º período relataram a falta de experiência.

DISCUSSÃO

A criação do SUS provocou mudanças nas práticas de saúde, impondo alterações no processo de formação e desenvolvimento de profissionais da área. Como entidades fundamentais nesse processo, as universidades devem voltar-se a resolução dos problemas e necessidades sociais com destacada responsabilidade na produção de novos conhecimentos e formação de profissionais críticos e socialmente comprometidos. Neste contexto, a formação do fisioterapeuta deve se basear não em especialidades, mas sim em políticas de saúde12-14.

Alguns passos foram dados para a formação de um perfil profissional que atenda a demanda do SUS com resolutividade e qualidade. Uma iniciativa foi a reformulação das Diretrizes Curriculares Nacionais, integrando trabalho e ensino, prática e teoria, ensino e comunidade. Outro passo foi a integração do serviço público como campo de prática para o ensino e pesquisa por meio de visitas, estágios ou projetos de extensão, reconhecido no Artigo nº 27 da Lei 8080/906,12,15.

O SUS institucionaliza os serviços de saúde no Brasil, sendo considerado o maior mercado de trabalho em saúde do país12. Segundo Oliveira16, o aumento de vagas ofertadas em concursos, a qualidade dos cargos, a não discriminação por sexo, idade ou experiência, torna este setor uma ótima alternativa para muitos jovens recém-saídos da faculdade. Na pesquisa foi observado que 19% dos alunos desejam trabalhar exclusivamente no setor público e 78,6% desejam ingressar tanto no serviço público como no privado. Resultado semelhante também foi encontrado por Pinheiro et al.6, uma vez que 87,5% dos alunos consultados revelaram o desejo de trabalhar em ambos os setores.

Os alunos mostraram domínio em questões teóricas relacionadas à participação social e, principalmente, quanto ao local de ações e procedimentos desenvolvidos pelo SUS. Pesquisa de cunho semelhante realizada com alunos de Fisioterapia da Universidade de Fortaleza (CE) também mostrou um bom desempenho dos estudantes quanto ao preparo teórico para questões relativas à origem, participação popular, princípios doutrinários e organizacionais do SUS6.

Tal situação é explicada quando se analisa a grade curricular do Curso de Fisioterapia da IES pesquisada, que conta com as disciplinas teóricas que abordam o tema de saúde coletiva, saúde pública e fisioterapia comunitária, no 4º período, e todos os acadêmicos abordados na pesquisa já haviam cursado tais disciplinas.

Pimentel17 observou em seu estudo com estudantes de IES na cidade de João Pessoa (PA) que, dos níveis de atenção à saúde, os estudantes de Fisioterapia são menos preparados em sua graduação para o nível primário (16%), enquanto o nível secundário teve a maior expressão entre as respostas dos estudantes (45,46%).

Como forma de distanciar a Fisioterapia do paradigma de ser uma profissão apenas reabilitadora, a educação deve-se basear na comunidade, o que possibilita o desenvolvimento e treinamento de habilidades e competências como liderança, trabalho em equipe multiprofissional, interação com a comunidade, resolução de problemas, comunicação e planejamento, buscando desta forma a integralidade do atendimento e a implantação real e efetiva dos princípios do SUS. Dessa forma, o domínio do conhecimento técnico é sem dúvida indispensável, porém não é suficiente para o modelo que se busca construir. Os campos de aprendizagem prática são de fundamental importância nesse aspecto. Corroborando com essa ideia, todos os acadêmicos pesquisados acreditam que a comunidade tem algo a ensinar ao estudante13,18.

Como visto na Tabela 2, houve no estudo a predominância dos campos de estágio em ambientes hospitalares, com a inserção neste campo de atuação desde o 6º período da graduação. Silva e Ros19, Gallo7 e Ferreira, Silva e Aguer20 encontraram situação semelhante em seus estudos. Diante disso, afirmaram que a centralização dos campos de estágio em hospitais e ambulatórios dificulta a estimulação de uma formação ampliada, generalista e humanista. O que demonstra que o ensino está voltado para o aspecto curativo e reabilitador, dando-se pouca atenção para o nível primário.

O estudo encontrou uma menor proporção de alunos que afirmaram já ter realizado estágio na atenção básica antes do Estágio Supervisionado Obrigatório (Tabela 2), sendo todos do 10º período. Esse dado é explicado devido a IES, em suas diretrizes, compactuar os estágios supervisionados no último ano do curso, sendo divididos em ambulatoriais e em saúde pública no 9º bloco, e hospitalares no 10º bloco. Este fato reporta e justifica os achados do presente estudo, no qual a formação ambulatorial e hospitalar acontece em instituições públicas, hospitais escola que atendem apenas os usuários do SUS.

A tardia experiência dos alunos do referido curso, observada neste estudo, com as práticas em saúde coletiva e fisioterapia comunitária, que se referem à prática do SUS na atenção básica e no exercício da Fisioterapia, é compartilhada no estudo de Silva19 realizado com estudantes de Fisioterapia da Universidade do Sul de Santa Catarina, os quais relataram ter contato com o campo de atuação em saúde coletiva apenas no seu último ano de graduação e, no campo teórico, relataram ter disciplinas isoladas no início do curso na área da saúde coletiva voltadas para a prática no SUS na atenção básica à saúde.

Com relação à percepção dos alunos quanto à sua formação para atuar no SUS, os alunos do último ano do curso consideraram estar aptos, enquanto 56,7% dos alunos do 6º ao 8º período revelaram inaptidão para tal atuação. Os motivos relatados foram a falta de experiência e o conhecimento ainda insuficiente para o SUS, o que revela que mais esforços devem ser demandados para que as disciplinas possam assegurar a adequação dos alunos aos princípios e diretrizes do sistema de saúde vigente. A instituição pesquisada apresenta em sua grade curricular disciplinas isoladas no início do curso, sem uma relação com a prática em comunidade, que só é realizada no último ano da graduação, no estágio supervisionado, que totaliza 1.440 h/aula e apenas 72 h/aula abordam o tema de atenção básica com o estágio em fisioterapia comunitária.

Barbosa et al.13 encontraram pontos críticos descritos pelos profissionais fisioterapeutas em suas funções na atenção básica em equipes de Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), dentre eles a formação assistencialista e clínica foram citadas como empecilhos para que se adaptem às propostas do SUS, tornando-os mais presos às tecnologias para trabalhar.

Diante do que foi exposto, destaca-se a importância da formação pedagógica pautada nos princípios e diretrizes do SUS, devido à sua importância no cenário da saúde do país, a fim de operar mudanças no serviço posteriormente prestado. Suscitando a promoção de eventos envolvendo a IES (docentes e discentes) com a comunidade, desde o início da graduação, promovendo uma visão ampliada incluindo a Fisioterapia no campo da atenção básica além da atuação reabilitadora, enfatizando assim o princípio da integralidade das práticas de saúde, tais como mutirões, palestras e cursos.

CONCLUSÃO

Neste estudo foi constatado que a maioria dos acadêmicos almeja o serviço público como campo de atuação profissional. O estudo mostrou elevada porcentagem de acertos nas questões teóricas sobre o SUS, e que a instituição pesquisada não enfoca a prática na assistência básica para os períodos que antecedem ao estágio supervisionado. Essa prática só acontece nos estágios supervisionados, o que mostra que somente os acadêmicos do último período, em maior proporção, mostram ter capacidade para atuar com a assistência básica e, assim, para o SUS. Sugere-se aos dirigentes e professores desta instituição um maior compromisso com a prática na atenção básica nos períodos iniciais do curso.

Apresentação: jan. 2013

Aceito para publicação: jun. 2013

Fonte de financiamento: nenhuma

Conflito de interesses: nada a declarar − Parecer de aprovação no Comitê de Ética nº 059/11.

Estudo realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) – Teresina (PI), Brasil.

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  • Endereço para correspondência:

    Kajena Nascimento
    Rua Aclimação, 2661
    CEP: 64028-265 – Teresina (PI), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      Jan 2013
    • Aceito
      Jun 2013
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