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Literatura indígena para crianças: o desafio da interculturalidade

Indigenous literature for children: the challenge of interculturality

Literatura indígena para niños: el desafio de la interculturalidad

resumo

O objetivo deste artigo é realizar uma reflexão crítica sobre a produção literária infantil indígena. Para isso, recorre-se à problematização teórica centrada no conceito de transculturação, conforme Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., articulado aos estudos sobre literatura infantil e juvenil brasileira, segundo estudos de Mortatti (2001)MORTATTI, Maria do Rosário Longo (2001). Leitura crítica da literatura infantil. Itinerários, Araraquara, n. 17, p. 179-187., Ceccantini (2010)CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set. e Martha (2016)MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica.. Como objeto de análise, são abordadas as obras Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs, de Cléo Busatto, e Karú Tarú: o pequeno pajé, de Daniel Munduruku, ambas editadas em 2009. Essa análise permite a proposição da hipótese de que, na literatura indígena mais recente, direcionada ao público infantil, encontram-se opções estéticas condicionadas a um intento de divulgação cultural nem sempre afeito à construção de textos literários de qualidade estética relevante. Assim, torna-se necessário refletir, no caso das narrativas, sobre ideias e concepções colocadas a serviço de um engajamento ideológico cujos reflexos, no texto literário, mostram-se contraditórios na relação com o leitor, o qual tende a enxergar na cultura indígena um elemento exótico e estereotipado, o que pouco contribui para uma relação intercultural democrática e humanizadora.

Palavras-chave:
literatura infantil indígena; Cléo Bussato; Daniel Munduruku; engajamento ideológico

abstract

The purpose of this article is to engage in a critical reflection about indigenous children’s literature. To do so, embarks on a theoretical questioning that is guided by the concept of transculturation, as articulate by Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., in conjunction with studies on Brazilian children’s and young adult literature, as formulated by Mortatti (2001)MORTATTI, Maria do Rosário Longo (2001). Leitura crítica da literatura infantil. Itinerários, Araraquara, n. 17, p. 179-187., Ceccantini (2010)CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set. and Martha (2016)MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica.. As the object of our analysis, we use the texts Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs, by Cléo Busatto, and Karú Tarú: o pequeno pajé, by Daniel Munduruku, both published in 2009. This analysis proposes that, in recent indigenous literature, directed to young readers, esthetic options are conditioned by the goal of cultural dissemination, at times, at the expense of the texts’ literary quality. Thus, in the case of the narratives examined by this article, it is necessary to weigh the texts’ ideological engagement. This engagement appears contradictory in that it can reinforce readers’ conceptions of indigenous culture as exotic and stereotyped. This perception contributes very little to a democratic and humanizing intercultural relationship.

Keywords:
indigenous children's literature; Cléo Bussato; Daniel Munduruku; ideological engagement

resumen

El objetivo de este artículo es realizar una reflexión crítica acerca de la producción literaria infantil indígena. Para eso, se recurre a la problematización teórica centrada en el concepto de transculturación, conforme a Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., articulada a los estudios sobre literatura infantil y juvenil brasilera de Moratti (2001)MORTATTI, Maria do Rosário Longo (2001). Leitura crítica da literatura infantil. Itinerários, Araraquara, n. 17, p. 179-187., Ceccantini (2010)CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set. y Martha (2016)MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica.. Como objeto de análisis son abordadas las obras Paiquerê: el paraíso de los Kaingangs, de Cléo Busatto, y Karú Tarú: el pequeño chamán, de Daniel Munduruku, ambas editadas en 2009. Este análisis permite la proposición de la hipótesis de que, en la literatura indígena más reciente, direccionada al público infantil, se encuentran opciones estéticas condicionadas a un intento de divulgación cultural no siempre afecto a la construcción de textos literarios de mejor cualidad. Así, se torna necesario reflexionar, en el caso de las narrativas, acerca de ideas y concepciones puestas al servicio de un compromiso ideológico cuyos reflejos, en el texto literario, se muestran contradictorios en relación con el lector, el cual tiende a percibir en la cultura indígena un elemento exótico y estereotipado, lo que poco contribuye para construir una relación intercultural democrática y humanizadora.

Palabras-clave:
literatura infantil indígena; Cléo Bussato; Daniel Munduruku; compromiso ideológico

A literatura indígena nas escolas

Desde 2008, a história e a cultura indígenas foram estimuladas a figurar nas escolas, após terem sido regulamentadas pela Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008, que cria a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura dos povos indígenas nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio do país. A alteração da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, por sua vez modificada pela Lei nº 11.645/2008BRASIL (2008). Lei nº 11.645, de 10 março de 2008. Altera a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília., significou não apenas o reconhecimento dos indígenas no processo de formação da sociedade brasileira, mas também o estabelecimento de novas diretrizes para viabilizar ações para a implementação e efetivação de (novas) práticas pedagógicas no currículo escolar, mais especificamente no âmbito do ensino de história, literatura brasileira e educação artística.

Após (quase) nove anos da regulamentação da Lei nº 11.654/2008BRASIL (2008). Lei nº 11.645, de 10 março de 2008. Altera a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília., entende-se que o percurso para a incorporação do indígena e suas respectivas culturas no currículo escolar está ligado às determinações da Constituição Federal para assegurar ao povo brasileiro os direitos sociais e individuais - a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça -, bem como condenar toda sorte de preconceitos - de raça, sexo, cor, idade -, tratando o racismo como crime inafiançável (Brasil, 1988BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal.).

Sob essa perspectiva, a promulgação da Constituição tornou premente a ampliação e o aprofundamento das perspectivas conceituais capazes de dar conta da complexidade das dinâmicas culturais e, desse modo, impeliu a sociedade brasileira a estar, de um lado, atenta à multiplicidade de formas de vida e, de outro, desenvolver atitudes tolerantes. É, então, nesse contexto e fruto de demandas históricas dos movimentos sociais organizados, que estas leis, de caráter afirmativo, reconhecem a escola como lugar de formar cidadãos e, portanto, lócus para promover a valorização das matrizes culturais brasileiras e superar representações identitárias pautadas em concepções redutoras, preconceituosas e/ou estereotipadas da cultura indígena, bem como a invisibilidade histórica desses grupos, que se estende até os dias de hoje.

“Um, dois, três indiozinhos...”

Termômetro do teor do ensino dispensado aos povos indígenas nas escolas brasileiras é o relato de experiência de pesquisa desenvolvida em duas escolas públicas de ensino fundamental das redes estadual e municipal de Porto Alegre, que buscou conhecer como está sendo trabalhada a temática indígena nos dias atuais. Para tanto, professores, coordenação pedagógica e alguns alunos foram entrevistados e, além de apenas entrevistá-los, segundo Bergamaschi e Gomes (2012)BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GOMES, Luana Barth (2012). A temática indígena na escola: ensaios de educação intercultural. Cidade, Círculo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 53-64, jan./abr., optou-se também por ministrar oficinas a fim de criar situações que provocassem o rompimento com ideias preconcebidas que circulam no âmbito escolar: “nas oficinas foram propostas atividades para gerar conflitos, propiciando aos alunos o estabelecimento de relações, bem como propiciar possíveis identificações com a temática indígena” (2012, p. 59).

Segundo as autoras, na primeira oficina, foram selecionadas imagens de pinturas antigas e fotografias atuais relacionadas aos diversos povos indígenas em diferentes momentos, desde a colonização até o momento atual e, na segunda, tomou-se como objeto de estudo a leitura de trechos do livro de Daniel Munduruku, Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória (2005MUNDURUKU, Daniel (2005). Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória. São Paulo: Nobel.).

Ainda como etapa da pesquisa, os alunos foram convidados a desenhar os povos indígenas; representações que não surpreenderam, afirmam as estudiosas, pois reprodutoras de parâmetros já conhecidos. Nos desenhos das crianças os indígenas aparecem frequentemente nus, com os corpos pintados e, em geral, em contato com a natureza. Para as autoras, o fato de os alunos não representarem os povos indígenas na situação social contemporânea deve-se às imagens que mais frequentemente retratam esses povos nos livros didáticos: “com pinturas corporais, com cocares nas cabeças e em geral sem ou com pouca roupa” (Bergamaschi e Gomes, 2012BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GOMES, Luana Barth (2012). A temática indígena na escola: ensaios de educação intercultural. Cidade, Círculo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 53-64, jan./abr., p. 56). Em geral, os desenhos mostram indígenas em relação idílica com a natureza, cercados de pássaros, entre árvores e rios, vivendo em ocas. Outra imagem comum é a do indígena guerreiro, portando arco e flecha. A conclusão a que chegaram as pesquisadoras é que os alunos reproduzem os indígenas da época da colonização, estereótipo construído pelo colonizador europeu ao longo dos séculos de dominação e perpetuado pela educação escolar:

Muitas vezes essa imagem de índio que é constituída na infância permanece para o resto da vida, pois são escassos os contatos com a temática indígena no restante do período de escolarização e na vida adulta, tendo várias mídias a veicular imagens não condizentes com os modos de vida contemporâneos dos povos ameríndios. Essa visão deformada dos indígenas se perpetua justamente pelo fato da nossa história ser contada até hoje a partir da visão do colonizador, sem dar oportunidade para que os diferentes povos apresentem a sua visão em relação a si mesmo e à História do nosso país (Bergamaschi e Gomes, 2012BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GOMES, Luana Barth (2012). A temática indígena na escola: ensaios de educação intercultural. Cidade, Círculo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 53-64, jan./abr., p. 57-58).

Já os professores, quando questionados, reconheceram saber da existência da lei, sendo que a maioria afirmou conhecê-la pelos meios de comunicação, pois uma discussão mais séria ainda não havia sido implementada no espaço escolar. Apenas os professores que atuavam na escola pertencente à rede municipal de Porto Alegre, segundo asseguram as autoras, puderam apontar a experiência com formações específicas sobre o tema, propiciadas por cursos ou por discussões e estudos realizados na escola; porém, reclamaram sobre a falta de informações e materiais.

Quanto à literatura, isto é, à promoção da literatura, sobretudo no espaço escolar, vale ressaltar que, desde o surgimento do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), em 1997, várias produções literárias que abordam a temática indígena ou incorporam personagens indígenas têm sido selecionadas e incluídas nos acervos que chegam às escolas públicas brasileiras, sendo que algumas dessas obras têm sido objeto de análise de pesquisas que, de uma perspectiva culturalista, examinam as representações dos povos indígenas em produções que chegam às nossas crianças e jovens.

Nesse espectro de pesquisas, contam-se trabalhos como o artigo de Martins e Gomes (2010)MARTINS, Aracy Alves; GOMES, Nilma Lino (2010). Literatura infantil/juvenil e diversidade: a produção literária atual. In: PAIVA, Aparecida; MACIEL, Francisca; COSSON, Rildo. Literatura: ensino fundamental. Brasília: MEC., que examinam sete livros de acervos do PNBE, entre 2004 e 2009, quais sejam: A última batalha dos paratintins, de Luiz Braz (2005); Pindorama: terra das palmeiras, de Marilda Castanha (2008); A terra dos mil povos: história indígena brasileira contada por um índio, Kaká Werá Jecupe (1998); Cobra-Grande: histórias da Amazônia, de Sean Taylor (2008); A primeira estrela que vejo é a estrela do meu desejo e outras histórias indígenas de amor; Crônicas de São Paulo: um olhar indígena, ambas publicadas em 2004, e Catando piolhos - Contando histórias, de 2006, os três de Daniel Munduruku.

Do conjunto das obras analisadas, as autoras expõem que alguns livros trazem informações histórico-etnográficas cuja intenção preponderante é informar e ensinar. É o caso de A terra dos mil povos: história indígena brasileira contada por um índio, de Jecupé. Assim, observam que “nem sempre os livros produzidos para as temáticas ligadas à diversidade, assim como outras temáticas, portam em si características de obras efetivamente literárias” (2010, p. 167).

A estreita vinculação entre índio e natureza é apontada como tendência temática de obras dedicadas ao público infantil e juvenil, como Pindorama: terra das palmeiras (PNBE, 2009) e Cobra-grande: histórias da Amazônia (PNBE, 2009). Destacam-se ainda obras que apresentam lendas incorporadas à tradição popular brasileira; caso dos livros de Daniel Munduruku e Luiz Brás, codinome de Nélson de Oliveira. Do conjunto das obras analisadas, as autoras chamam atenção para a presença marcante da cultura e da tradição indígenas, que se refletem nas imagens, nos desenhos e nas cores, bem como para os contextos de produção dessas obras, que são variáveis, produzidas por autores indígenas e não indígenas.

Na mesma trilha analítica, situa-se o ensaio de Silveira e Bonin (2012)SILVEIRA, Rosa Maria Hessel; BONIN, Iara Tatiana (2012). A temática indígena em livros selecionados pelo PNBE: análises e reflexões. Educação, Porto Alegre, v. 35, n. 3, p. 329-339, set/dez., “A temática indígena em livros selecionados pelo PNBE: análises e reflexões”, cujo objetivo é analisar representações de índios e da vida indígena trazidas por sete obras de literatura infantil, selecionadas para integrar os acervos do PNBE nas seleções de 2008 a 2012. Do acervo de 2008, para anos iniciais do ensino fundamental, foi analisada a obra de Daniel Munduruku, ilustrada por Maté, Catando Piolhos - contando histórias (2006); do acervo selecionado para anos finais do ensino fundamental, em 2009, analisou-se a obra de Sean Taylor, ilustrada por Fernando Vilela, Cobra Grande: histórias da Amazônia (2009); do acervo selecionado para anos iniciais, PNBE 2010, examinou-se a obra de Eucanaã Ferraz, ilustrada por Andrés Sandoval, Poemas da Iara (2008). Dos acervos selecionados para 2012, foram analisadas as obras Telefone sem fio (2010), de Ilan Brenman e Renato Moriconi, assim como Abaré (2009), de Graça Lima, ambas indicadas para a pré-escola (4 a 5 anos); Mitos e lendas do Brasil em cordel, da autoria de Nireuda Longobardi (2009), indicada para a educação de jovens e adultos e, finalmente, de Ziraldo, A turma do Pererê: 365 dias na Mata do Fundão (2006), selecionada para os anos iniciais do ensino fundamental.

Da leitura das obras, as autoras identificaram três tendências representacionais que se acham mescladas e superpostas em algumas delas. A primeira caracterizada como “enlaces entre povos indígenas, identidade nacional e folclore”, compreende narrativas que referendam os povos indígenas como ícones da nacionalidade e, portanto, de identificação com as raízes nacionais. Exemplo são os livros de Ziraldo e Sean Taylor. Igualmente identificada no artigo de Martins e Gomes (2010)MARTINS, Aracy Alves; GOMES, Nilma Lino (2010). Literatura infantil/juvenil e diversidade: a produção literária atual. In: PAIVA, Aparecida; MACIEL, Francisca; COSSON, Rildo. Literatura: ensino fundamental. Brasília: MEC., a segunda tendência representacional promove e naturaliza o lugar do índio - integrado e fundido harmonicamente ao meio natural; consideram particularmente as obras Abaré, Catando piolhos - Contando histórias, Telefone sem fio e Poemas da Iara. Na terceira e última tendência, “lições sobre a vida indígena”, as autoras destacam especialmente as obras de Daniel Munduruku e Eucanaã Ferraz, contempladas também na tendência anterior: “suas narrativas parecem confrontar a noção de índios primitivos, ingênuos, indolentes, e referendar uma representação de povos e etnias distintas, com saberes, crenças e tradições específicas, que teriam muito a nos ensinar” (2012, p. 338).

Considerando a produção literária infantojuvenil de 2008, Ceccantini (2010)CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set., em artigo veiculado pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), analisa dados da produção editorial direcionada a crianças e jovens, registrando que, em 2008, o reconto correspondeu acerca de 11% do total de títulos nacionais lançados no mercado. Segundo o autor, a tendência antes circunscrita a adaptações da tradição dos contos de fadas europeus e da mitologia greco-latina, deu lugar a outras tradições, que passaram a constituir os principais matizes para a produção nacional, tais como a africana, a indígena, a oriental e a latino-americana. Para o estudioso, “esse aspecto é, certamente, fruto da valorização de enfoques multiétnicos e culturais de nosso tempo presente, inclusive, em diretrizes educacionais variadas, que estimulam que os leitores em formação tenham acesso a esses conteúdos” (Ceccantini, 2010CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set., p. 11). Entre os recontos de origem indígena, dois são destacados: Ao pé das fogueiras acesas: fábulas indígenas brasileiras, de Elias José (2008), com ilustração de André Neves; e A criação do mundo e outras lendas da Amazônia, recontados por Vera do Val (2008) e ilustradas por Geraldo Valério. Destas obras, o pesquisador realça, sobretudo, o tratamento gráfico-editorial dos livros, ambos inspirados “em lendas de diferentes tribos indígenas sobre a criação do mundo” (Ceccantini, 2010CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set., p. 11).

Das análises das obras aqui apresentadas, salta aos olhos a proposta de veicular uma visão de mundo que permanece (aparentemente) inalterada, sem trocas, perdas ou ganhos, no contato com o “mundo branco”. Não por acaso, as narrativas fecham-se, de um lado, em propagar uma visão social e histórica do povo indígena, daí os registros histórico-etnográficos; e, de outro, na recolha de mitos indígenas, cujos narradores se debruçam sobre uma “memória coletiva”, a fim de resgatar e perpetuar, pela escrita, as tradições indígenas.

Segundo Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., os indígenas são, hoje, os povos mais preparados para o diálogo intercultural. Para ele, os povos ameríndios construíram um “patrimônio para a interculturalidade”, do qual resultam, por exemplo, conhecer ao menos uma língua nacional, para estabelecer o diálogo com outras sociedades e, assim, transitar entre saberes tradicionais e modernos, lidar com economias de mercado e manter valores próprios da economia da reciprocidade; enfim, aceitar o desafio de apreender os modos de vida de outros povos. O autor faz pensar que interculturalidade não é só se dispor ao diálogo com o outro, mas lançar mão de conhecimentos e saberes desse outro que permitam estabelecer e qualificar o diálogo.

Para Martha (2016)MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica., que analisou três obras de Olívio Jekupé - Ajuda do saci: Kamba’i (2006); A mulher que virou urutau: Kunha Uratau re ojepota (2011), autoria em parceria com sua mulher, Maria Kerexu; e As queixadas e outros contos guaranis (2013) -, a produção literária do autor indígena “revela forte traço de resistência e valorização cultural, aspectos compreensíveis em momentos cruciais de afirmação identitária”. Por isso, assegura a autora, “podemos compreender a ausência de histórias que tematizem, por exemplo, a inserção do jovem indígena na sociedade contemporânea brasileira, o lugar ocupado por eles nas regiões urbanas” (Martha, 2016MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica., p. 191).

Se nos livros analisados os autores indígenas e não indígenas passam ao largo de concretizar o diálogo intercultural, é possível que ainda estejam presos a um conceito de transculturação, em que o contato de uma cultura com a outra se traduzia em perdas e apagamentos (Ortiz, 1963ORTIZ, Fernando (1963). Contrapuento cubano del tabaco y el azúcar. La Habana: Universidad Central de las Villas.). À luz da ideia de interação e inter-relação, Candido defende, a propósito das literaturas latino-americanas, o deslocamento da noção de dependência para a de interdependência cultural:

Aí o romancista do país subdesenvolvido recebeu ingredientes que lhe vêm por empréstimo cultural de outros países de que costumamos receber as fórmulas literárias. Mas ajustou-as em profundidade ao seu desígnio para representar problemas do seu próprio país, compondo uma fórmula peculiar. Não há imitação nem reprodução mecânica. Há participação nos recursos que se tornaram bem comum através do estado de dependência, contribuindo para fazer deste uma interdependência (Candido, 1987CANDIDO, Antonio (1987). Literatura e subdesenvolvimento. In: CANDIDO, Antonio. A educação pela noite e outros ensaios. São Paulo: Ática., p. 155).

Não parece ser outra a concepção de transculturação para Zilá Bernd (2005)BERND, Zilá (2005). Estudos canadenses e transculturalismos. In: ALMEIDA, Sandra Regina Goularr (Org.). Perspectivas transnacionais. Belo Horizonte: Editora da UFMG., para quem a formação cultural é um produto híbrido, que resulta da mescla provocada pelo choque entre culturas: “o processo de transculturação parece ser aquele que melhor se ajusta à realidade da condição pós-moderna, onde há trocas, perdas e ganhos nas passagens de uma cultura à outra” (2005, p. 150).

Ainda que “construídos” pela íntima conexão entre a experiência primitiva e a cultura dominante, os indígenas parecem resistentes em assumir o pressuposto da alteridade; dinâmica social segundo a qual interagimos e somos interdependentes de outros indivíduos. No afã da busca pela autoafirmação e no esforço de fazer conhecer sua história e sua cultura e, mais especialmente, afirmar uma presença que supere a invisibilidade e/ou o silenciamento histórico que se estende até o presente, é que as obras de temática indígena veiculam uma concepção que predomina nas sociedades não indígenas: a de povos ligados ao passado. Gritante ambiguidade. Pois, se por um lado, verifica-se o redimensionamento do lugar das populações indígenas, por outro lado, nota-se a permanência de certas representações que aproximam os indígenas de uma antiga concepção histórica e cultural, como a relação intrínseca com a natureza.

Nesse sentido, não se pode afirmar que as concepções e/ou imagens formuladas sobre os povos indígenas sejam resultado apenas dos discursos dos livros didáticos, conforme discussão apresentada por Bergamaschi e Gomes (2012)BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GOMES, Luana Barth (2012). A temática indígena na escola: ensaios de educação intercultural. Cidade, Círculo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 53-64, jan./abr., ou ainda por Zamboni e Bergamaschi (2009)ZAMBONI, Ernesta; BERGAMASCHI, Maria Aparecida (2009). Povos indígenas e ensino de história: memória, movimento e educação. In: CONGRESSO DE LEITURA NO BRASIL - COLE, 17., 20-24 jul. 2009, Unicamp, Campinas. Anais... Campinas: Editora da Unicamp.. Se, de acordo com Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., os povos indígenas empreendem esforços para concretizar o diálogo intercultural e a proposta educacional sustenta-se na ideia de integração entre índios e não índios, torna-se de fundamental importância colocar o discente em contato com produções culturais que possam se identificar e se reconhecer como indígenas. Entre essas produções, está a literatura, sobre a qual cabe destacar que, como afirma Jouve (2012)JOUVE, Vicent (2012). Por que estudar literatura? Tradução de Marcos Magno e Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola.: “uma das características fundamentais do texto literário (como de toda obra de arte) passa essencialmente pela forma”, já que “a forma não pode ser isolada do conteúdo: ela faz parte do sentido”. Para o estudioso, portanto, “entender uma obra de arte é, então examinar as complexas relações entre o que é mostrado e o modo como se mostra” (Jouve, 2012JOUVE, Vicent (2012). Por que estudar literatura? Tradução de Marcos Magno e Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola., p. 90-91). Nesse contexto, para avançar no campo da reflexão aqui proposta, recorre-se a dois títulos da literatura, ambos identificados com adjetivos historicamente carregados de traços semânticos que justificam esta abordagem: infantil e indígena.

A qual tribo pertences?

Texto bastante conhecido nos estudos da hermenêutica, Teoria da interpretação (1996), do filósofo Paul Ricoeur, aborda, entre outros tópicos, a interpretação frente às obras literárias. No quarto ensaio, o autor escreve: “os textos literários implicam horizontes potenciais de sentido que podem atualizar-se de diversos modos. Este traço relaciona-se mais diretamente com o papel dos sentidos segundos, metafórico e simbólico” (Ricoeur, 1996RICOEUR, Paul (1996). Teoria da interpretação. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70., p. 89). A explicação sobre o modus operandi do texto literário remete-nos para a dimensão ontológica da literatura, tão bem formulada por Candido (1972)CANDIDO, Antonio (1972). A literatura e a formação do homem. Ciência e Cultura, São Paulo, v. 4, n. 9, p. 803-809, set., ao defender que o texto literário atua em diferentes funções - psicológica, formadora e de conhecimento de mundo -, favorecendo, mais que qualquer outro gênero, a descoberta de sentidos pela sua capacidade de reinscrever e/ou reinventar o mundo pela força da palavra.

Na perspectiva de Hunt (2010)HUNT, Peter (2010). Crítica, teoria e literatura infantil. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify., uma vez que encaremos o livro como um grande libertador da mente humana - a outra opção seria encará-lo como um dominador das massas -, para que o livro sobreviva a seus amigos, bem como a seus inimigos, “é preciso que haja mudança em algo além do que o tema, e é importante que todo o impulso das que podem ser chamadas de as verdadeiras pessoas da fronteira da literatura infantil esteja na forma inovadora” (Hunt, 2010HUNT, Peter (2010). Crítica, teoria e literatura infantil. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify., p.216). Volta-se, pois, à dicotomia clássica dos estudos literários, a correlação estrutural e funcional entre forma e conteúdo, as quais serão analisadas em dois textos inscritos sob as categorias infantil e indígena: de Cléo Busatto, Paiquerê: o paraíso dos Kaingang (2009), ilustrado por Joãocaré e editado pela Edições SM; de Daniel Munduruku, Karú Tarú: o pequeno pajé (2009), ilustrado por Marilda Castanha e editado pela Edelbra.

Como objeto de análise, interessa-nos perceber, ainda que nos limites da reflexão aqui proposta, como essas obras articulam-se com um contexto maior, o que explica sua presença como literatura no sistema cultural brasileiro. Para isso, cabe a proposição de Mortatti como método de abordagem das obras em questão:

Desse ponto de vista, o trabalho do pesquisador não se restringe à recuperação e descrição dos textos do corpus. Tampouco se deve reduzir o processo analítico a aspectos isolados da configuração dos textos selecionados, como, por exemplo, aqueles constitutivos de sua “camada mais aparente” (Candido, 1995) - o quê e como - ou aqueles que remetem à sobredeterminação do contexto histórico ou social - quando e onde - e suas marcas ideológicas: por quê e para quê. Dada sua condição de texto verbal escrito, resultado de um tipo específico de atividade de, com e sobre linguagem, os textos não escondem nada “por trás”, não demandando operações de “desvelamento” ou “desnudamento”. Os sentidos e as explicações podem ser “encontrados” dentro da configuração textual, ponto de partida e de chegada do trabalho investigativo (Mortatti, 2001MORTATTI, Maria do Rosário Longo (2001). Leitura crítica da literatura infantil. Itinerários, Araraquara, n. 17, p. 179-187., p. 184).

Alocadas no filão “infantil”, as obras merecem a atenção do leitor criança ao primeiro contato. As ilustrações coloridas e sugestivas em relação ao tema tendem a atrair o olhar, contribuindo para a ambientação da narrativa. Passando, então, ao texto verbal, foco desta análise, percebe-se que, em Paiquerê, os paratextos ocupam grande parte do volume, o que corresponde a certa redundância do papel por eles exercido: na introdução, lê-se uma explicação que indica ao leitor como se apropriar da narrativa que tem em mãos, isto é, o leitor recebe a definição de que está diante de uma “narrativa mítica” - “Os povos indígenas interpretam o mundo de maneira diferente do homem branco. Eles possuem um pensamento particular sobre a própria origem, a do universo e a das coisas. Esse pensamento expressa-se em suas narrativas míticas” (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 4). Ao final da obra, “Cantos dos Kaingang” traz ao leitor, entre as páginas 38 e 47, informações que, a partir da apresentação de um mapa geográfico adaptado (p. 38), dividem-se em “Contato com o homem branco”, “Registro da história”, “População”, “Organização política”, “Língua”, “Sobrevivência”, “Cosmogonia”, “Culto aos mortos”, “Kuiã” e “Pequeno vocabulário Kaingang”.

A busca por explicar o próprio texto que se pretende literário parece atender à preocupação de se buscar legitimidade cultural entre os não índios. E isso afeta inclusive a relação da voz narrativa com o leitor: a quem a introdução se dirige? A um possível mediador? Se assim é, mostra-se aquém em termos de informação e suporte para um trabalho mais denso com textos de temática indígena. Ou seria para a criança? Para ela, a dualidade, por exemplo, como topos da cultura kaigang, não se apresenta em uma abordagem pertinente: “O sistema dual está presente não só na cosmogonia, como também na estrutura social e em diferentes práticas do povo Kaingang” (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 5). De qualquer modo, o leitor infantil já está informado de que se trata de uma narrativa mítica, que será contada em uma forma que remete às histórias narradas ao pé da fogueira. Ressurge, porém, a redundância das explicações como consequência de elementos da estrutura narrativa, que compõe o segundo aspecto a ser analisado.

Em fonte diferenciada (itálico), uma voz testemunhal explica - outra explicação - o que é o Paiquerê: “Essa terra desejada só se deixa ver por quem não tem cobiça; só se deixa habitar por quem a respeita e admira. Ela é o Paiquerê, o paraíso dos Kaingang” (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 7). Virando a página, outra voz se apresenta, a qual será identificada como a do pajé páginas adiante: “No início do mundo, num tempo que se perdeu no tempo, nosso povo vivia numa terra fértil que dava de tudo, mas os alimentos eram comidos crus ou secos ao sol” (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 8).

O excesso de explicações antes de expor o leitor à narrativa central contribui ainda mais para a preservação do caráter exótico da cultura indígena frente a leitores não indígenas. Entretanto, o primeiro conto consegue alçar voo tanto pelo ritmo acelerado da ação narrativa - o valente guerreiro Fíietó, transformado em gralha, consegue roubar o fogo de Minarã e distribuí-lo para os demais homens - quanto pela elaboração de uma linguagem que capta formas típicas de se narrar a cosmogonia indígena ao mesmo tempo que, capturada no âmbito da oralidade, passa a fazer parte da cultura escrita:

- Nunca esqueceremos o que você fez, Fíietó. Arriscou a própria vida para nos ajudar. Por isso, sua façanha será contada aos nossos filhos e netos, que a contarão aos seus filhos e netos e, assim, sua história permanecerá para sempre na memória e no coração do povo Kaingang. E foi assim que aconteceu (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 21).

No segundo texto, porém, a preocupação em explicar a cultura indígena (deduzimos pela leitura) traz à roda a voz de um menino que, em vez de dar mais dinamismo ao texto, serve a um diálogo artificioso com o pajé:

Nadavam em direção à montanha levando na boca tochas acesas. Afinal, o fogo tão desejado e conquistado com a astúcia de... - Fíietó - adiantou-se outra vez o garotinho, cada vez mais orgulhoso de pertencer àquele povo cuja história estava conhecendo (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 25).

Após o dilúvio, nosso povo reorganizou o mundo e começou a recriar os animais que tinham desaparecido nas águas. Dia e noite, em torno das fogueiras, moldaram no barro a fauna da floresta e do campo. - Arte de Kamé e Kairu, não é? - interrompeu outra vez o garotinho, revelando-se o futuro contador de histórias da tribo. Tudo o que ouvia à noite grudava em sua memória e ele tratava de contar as mesmas histórias na manhã seguinte para os amigos que ainda não as conheciam (Busatto, 2009BUSATTO, Cléo (2009). Paiquerê: o paraíso dos Kaingangs. Ilustração de Joãocaré. São Paulo: SM. (Cantos do mundo)., p. 29-30).

O apego ao passado como traço identitário fundamental para os indígenas, conforme se destacou anteriormente a partir de alguns estudos (Martins e Gomes, 2010MARTINS, Aracy Alves; GOMES, Nilma Lino (2010). Literatura infantil/juvenil e diversidade: a produção literária atual. In: PAIVA, Aparecida; MACIEL, Francisca; COSSON, Rildo. Literatura: ensino fundamental. Brasília: MEC.; Silveira e Bonin, 2012SILVEIRA, Rosa Maria Hessel; BONIN, Iara Tatiana (2012). A temática indígena em livros selecionados pelo PNBE: análises e reflexões. Educação, Porto Alegre, v. 35, n. 3, p. 329-339, set/dez.; Ceccantini, 2010CECCANTINI, José Luís (2010). Vigor e diversidade: a literatura infantil e juvenil no Brasil em 2008. Notícias - FNLIJ, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p. 1-15, set.), transparece em personagens como o garotinho curioso de Paiquerê. Completamente entregue à experiência mítica pelo narrar do pajé, seu comportamento traduz um mundo cuja temporalidade cronológica lança-o num contexto de eflúvios adâmicos. É assim que sua voz indica um sujeito imerso no universo das histórias contadas pelos mais velhos, vivendo num espaço-tempo que, ao leitor de hoje, surge como uma dimensão que não encontra respaldo na realidade indígena, comprometendo, desse modo, a verossimilhança do texto.

Indiciado por aquele diálogo artificioso, instala-se, pois, um tom escolar, em que o menino mimetiza o alunado, e os índios mais velhos, os professores, acompanhados de um narrador que tece comentários valorativos sobre a atuação da criança nessa roda. Subestimados em sua capacidade de compreensão, esses leitores são expostos a digressões que truncam o texto, transformando a possibilidade de uma experiência de alteridade fundamental para o leitor em formação em algo que titubeia em sua contradição, reiterada frente à preocupação em ensinar a cultura indígena em vez de assumi-la como elemento intrínseco e legítimo de um processo intercultural caro à identidade étnica.

É importante, nesse contexto de discussão, abordar outro texto, evitando-se escamotear questões que, embora se apresentem como defasadas diante dos movimentos mais recentes de questionamento sobre as representações das vozes das “minorias”, permeiam, nas sombras, o tema em foco. O discurso escolarizado poderia ser atribuído a um tipo de impossibilidade genética do texto produzido por um não índio de absorver e compreender uma vivência que lhe é impossível experimentar plenamente fora das representações culturais. Em outros termos, Cléo Busatto, por não ter identidade indígena, estaria falando “de fora”, por isso seu discurso não conseguiria se libertar da preocupação de naturalizar o exótico, o que leva ao efeito oposto. Contra esta tese, é interessante colocar em xeque outra obra, esta, por sua vez, de autoria indígena.

Em Karú Tarú: o pequeno pajé (2009), de Daniel Munduruku, narra-se a iniciação de um menino aos segredos e saberes próprios de um pajé. O tema mostra-se instigante pela proposta de trazer ao leitor uma experiência peculiar, partindo do horizonte de uma criança que se vê predestinada a este importante papel em sua tribo: “O que o deixava mais triste era o fato de ele ter sido escolhido, ainda pequeno, para ser o sucessor do pajé, o mais poderoso personagem da vida de seu povo” (Munduruku, 2009MUNDURUKU, Daniel (2009). Karú Tarú: o pequeno pajé. Ilustração de Marilda Castanha. Erechim: Edelbra., p. 3).

O autor constrói, porém, um deus ex-machina, que a tudo vê e prevê, uma opção autoral que tolhe a possibilidade de uma voz mais afinada com o leitor infantil. Essa intervenção acaba comprometendo até mesmo a verossimilhança do protagonista, que tem sua voz reduzida e direcionada à concordância com o narrador, o que, consequentemente, reduz a intensidade do conflito, pois, desde o início, a voz do narrador forma um uníssono com a voz do pajé, reiterando uma autoridade adulta frente à infantil:

É verdade que o pequeno Karú Tarú não entendia quase nada, mas tinha convicção de que seu povo sabia o que estava fazendo. Por isso não ficava questionando toda vez que o velho pajé o convidava para ir até sua casa e lá permanecer por um bom tempo, ouvindo histórias antigas que só os mestres dos sonhos e da cura podiam saber. O velho sempre lhe confiava que tinha histórias que não poderiam passar a toda comunidade, porque eram elas que contavam os segredos dos sonhos. O menino ouvia atentamente as palavras do velho, mas tinha alguma dificuldade para compreender o porquê de tanto mistério (Munduruku, 2009MUNDURUKU, Daniel (2009). Karú Tarú: o pequeno pajé. Ilustração de Marilda Castanha. Erechim: Edelbra., p. 6).

Karú ouvia tudo atentamente, não interrompendo a fala de seu pai. Ficou muito orgulhoso em saber que ele se importava com seu aprendizado e estava preocupado com a tarefa que a comunidade tinha imposto a ele. Isso era muito importante, porque assim Karú se sentia mais seguro no desenvolvimento do dom que recebera (Munduruku, 2009MUNDURUKU, Daniel (2009). Karú Tarú: o pequeno pajé. Ilustração de Marilda Castanha. Erechim: Edelbra., p. 20).

Ainda que não seja o intento, configura-se um cerceamento à voz infantil, empobrecendo a experiência literária frente a um leitor criança, que poderia, aí sim, vivenciar o mundo de Karú Tarú por meio do pacto narrativo.

Em que pese as diferenças culturais, como no caso da relação da criança com o pajé, não se pode desconsiderar que a narrativa impressa em um livro colorido já é, pela própria materialidade do objeto, algo que se encontra de permeio entre a cultura indígena e a não indígena. Contudo, ao se apagarem nas narrativas as contradições e questionamentos possíveis e prováveis entre gerações, a visão do colonizador, como bem destacam Bergamaschi e Gomes (2012)BERGAMASCHI, Maria Aparecida; GOMES, Luana Barth (2012). A temática indígena na escola: ensaios de educação intercultural. Cidade, Círculo sem Fronteiras, v. 12, n. 1, p. 53-64, jan./abr., mantém-se, mesmo que dissimulada ou discreta; isso porque amalgamada a formas cristalizadas de se compreender o ser índio no contexto cultural brasileiro.

Assim, se a relação de uma liderança comunitária como o pajé implica determinados comportamentos dos infantes - na história, a obediência inquestionável ao mais velho -, isso não justifica a construção de um narrador pouco afeito à perspectiva infantil. Antes, transparece uma preocupação pragmática de divulgação cultural, de explicação sobre aquilo que supostamente está fora da compreensão cotidiana do leitor criança:

Pajé é um homem especial numa comunidade indígena. Especial porque ele concentra em si a responsabilidade pela cura das pessoas. Isso porque a gente indígena acredita que doenças são espíritos ruins que habitam a vida das pessoas e que podem ser manipulados por feiticeiros que não gostam dos outros. Essas entidades são chamadas de feiticeiras porque podem colocar sentimentos ruins nas pessoas. Esses sentimentos podem torná-las muito agressivas e colocar em risco a saúde de toda a comunidade. Quando elas estão assim, os pajés dizem que estão doentes. Por isso é preciso que ele seja muito forte, poderoso e grande conhecedor da sabedoria da floresta, que pode dizer-lhe o que o paciente tem, qual espírito ruim que o habita. Sabendo disso, o pajé prepara o remédio que será bom para curar aquela pessoa (Munduruku, 2009MUNDURUKU, Daniel (2005). Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória. São Paulo: Nobel., p.12).

Se, na perspectiva de Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ., os povos indígenas americanos estariam preparados para a interculturalidade por apresentarem, entre outros aspectos, domínio da língua oficial de seus países e conhecimento de suas línguas de origem, a qualificação do diálogo não alcança patamares mais exigentes na literatura para crianças, caso dos livros aqui analisados, na medida em que subestimam a capacidade do leitor infantil de perceber diferenças, comparar atitudes, questionar valores.

Explicações como as exemplificadas de Karú Tarú (2009) interrompem a trama, truncam o ritmo da narrativa, mantendo o tom escolar, tal qual na obra de Busatto - o qual, por sua vez, conduz a uma contradição. Se é necessário, num texto supostamente não didático, conduzir o leitor pelas ideias “certas” sobre a cultura indígena, então a ideia do exótico se instala e se mantém. Encontra-se, então, o atendimento ao senso comum - do não índio - sobre o que deve ser a vida cotidiana ou como deve se comportar a criança indígena, negando-se a concretização do diálogo intercultural apontado por Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ..

A intenção da obra, evidenciada em seu próprio discurso, que tenta se aproximar do leitor criança, torna-se fragilizada, submetendo a força do relato a ser vivenciado pela experiência literária a um discurso emoldurador, reiterando a tão conhecida assimetria adulto versus criança no texto infantil. Convém, pois, lembrar as colocações de Zilberman e Magalhães, em obra dos anos 1980:

Assim, se os fatores de menoridade e inferioridade com que o gênero é aquilatado não são ocasionados pelos consumidores mirins, a tentativa de reproduzir a condição destes por parte do escritor, a fim de superar a assimetria mencionada, converte o texto numa impostura, que repercute no enfraquecimento da forma artística, justifica a acusação de simulacro ou pseudoliteratura e legitima o descrédito (Zilberman e Magalhães, 1987ZILBERMAN, Regina; MAGALHÃES, Ligia Cademartori (1987). Literatura infantil: autoritarismo e emancipação. 3. ed. São Paulo: Ática., p. 19).

O que fica é que os personagens indígenas aparecem aqui, bem como em várias outras narrativas, conforme apresentado anteriormente, habitando uma zona parda, indefinida, como em um universo paralelo em que de um lado as tradições indígenas mantêm-se intactas e, de outro, a relação com o homem não indígena permanece suspensa. Nesse contexto chama atenção o fato de que os livros aqui em análise tenham sido produzidos por um autor indígena e outro não indígena, isto é, o lugar de onde se fala para produzir o texto literário é diferente. Entretanto, reiteram-se, em ambas as obras, a mesma perspectiva étnico-racial, carregando um tom pedagógico e referendando uma representação que divisa nos povos indígenas saberes, crenças e tradições específicas que teriam muito a nos ensinar.

Não há dúvida sobre o valor cultural, antropológico, histórico, que esse saber ancestral, intimamente ligado à natureza, ocupa ou deva ocupar em nossa sociedade. Porém, temas candentes como a inserção da criança ou do jovem indígena na sociedade contemporânea brasileira, seus conflitos e dramas, por exemplo, também requerem espaço no contexto da produção de literatura indígena para o público em questão. Nessa perspectiva, parece privado de sentido as considerações que Martha (2016)MARTHA, Alice Áurea Penteado (2016). Olívio Jekupé: identidade indígena na produção contemporânea de literatura infantojuvenil paranaense. In: MARTHA, Alice Áurea Penteado; VALENTE, Thiago Alves (Org.). Produção cultural paranaense para crianças. Assis: Cultura Acadêmica. apresenta para justificar a ausência do diálogo intercultural na obra de Daniel Munduruku. Diante do exposto, o diálogo intercultural apontado por Canclini (2007)CANCLINI, Néstor García (2007). Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução de Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ. fica comprometido, o que, no contexto geral, corresponde a uma postura editorial de protelação para o estabelecimento desse diálogo que em muito fere a realidade vivida pelo indígena no Brasil e no mundo, já que não oportuniza ao leitor em formação experimentar, por meio do texto ficcional de maior fôlego, outras formas de compreensão da diversidade de culturas.

Considerações finais

O exótico e exógeno permanecem, assim, como traços de vozes que tentam legitimar a literatura indígena. Ao ser direcionada ao público infantil, essa produção literária padece de duas marginalizações simultâneas: sob a égide dos adjetivos infantil e indígena toma corpo uma concepção de fantasia “ingênua” - que seria típica do universo indígena -, em um construto ideológico que subestima a capacidade intelectual dos índios, ao mesmo tempo que a aproxima também de uma imagem subestimada de leitor infantil.

Ao discorrer sobre o termo “cultura”, Eagleton (2001) recorre à imagem do cultivo, uma ação que nos separa e nos integra ao mesmo tempo à natureza e à nossa própria natureza:

Como autocultivadores, somos argila em nossas próprias mãos, ao mesmo tempo redentores e impenitentes, padre e pecador em um e mesmo corpo. Deixada à própria conta, nossa natureza perversa não vai se elevar espontaneamente à graça da cultura; mas essa graça tampouco pode ser rudemente forçada sobre ela. Ao contrário, precisa cooperar com as tendências inatas da própria natureza, a fim de induzi-la a transcender a si mesma. Como a graça, a cultura já deve representar um potencial dentro da natureza humana, se for para que vingue. Mas a própria necessidade de cultura sugere que há algo faltando na natureza - que a nossa capacidade de ascender a alturas além daquelas de nossos pares na natureza, os outros animais, é necessária porque nossa condição natural é também bastante mais “inatural” do que a deles. Se existe uma história e uma política ocultas na palavra “cultura”, há também uma teologia (Eagleton, 2005EAGLETON, Terry (2005). A idéia de cultura. Tradução de Sandra Castello Branco. São Paulo: Unesp., p. 15-16).

Mesmo autores relevantes para a literatura infantil brasileira, como Busatto e Munduruku - com títulos reconhecidos pelo trabalho estético e emancipatório -, podem incorrer em escolhas que, amparadas por intenções legítimas, acabam submetendo a inventividade e a criatividade literária a discursos de efeito oposto ao pretendido. O amadurecimento da percepção do artefato literário como espaço de interculturalidade pode ser uma resposta mais interessante aos leitores infantis para os quais uma boa tessitura se coloca acima de tudo.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2017
  • Aceito
    28 Jul 2017
Grupo de Estudos em Literatura Brasileira Contemporânea, Programa de Pós-Graduação em Literatura da Universidade de Brasília (UnB) Programa de Pós-Graduação em Literatura, Departamento de Teoria Literária e Literaturas, Universidade de Brasília , ICC Sul, Ala B, Sobreloja, sala B1-8, Campus Universitário Darcy Ribeiro , CEP 70910-900 – Brasília/DF – Brasil, Tel.: 55 61 3107-7213 - Brasília - DF - Brazil
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