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Mudança do modo VVI para DDD ("upgrade") na troca eletiva do gerador de pulsos: análise comparativa clínico-funcional

Resumos

OBJETIVO: Comparar o comportamento clínico e funcional dos modos de estimulação ventricular e atrioventricular na troca eletiva do gerador de pulsos em pacientes com cardiopatia chagásica e bloqueio atrioventricular. MÉTODOS: Foram estudados comparativamente sob estimulação ventricular e atrioventricular 27 pacientes, inicialmente na inclusão do estudo e alternadamente no modo ventricular e atrioventricular em duas fases com duração de 90 dias, considerando: o comportamento clínico, avaliado pela qualidade de vida e classe funcional, e o comportamento funcional, avaliado pela ecocardiografia transtorácica e pelo teste de caminhada de seis minutos. A análise estatística foi realizada na condição basal, modo ventricular e modo atrioventricular, utilizando-se o teste qui-quadrado e a análise de variância para medidas repetidas, considerando-se nível de significância de 0,05. RESULTADOS: A média das medidas avaliadas na qualidade de vida foram: capacidade funcional (VVI 71,3+/-18,2 , DDD 69,3+/-20,4), estado geral (VVI 68,1+/-21,8 , DDD 69,4+/-19,4) e vitalidade (VVI 64,8+/-24,6 , DDD 67,6+/-25,5); na ecocardiografia: FEVE (VVI 52,5+/-12,8 , DDD 51,8+/-14,9), DDFVE (VVI 53,0+/-7,7 , DDD 42,4+/-7,8), AE (VVI 38,6+/-5,4 DDD 38,5+/-5,1) e no teste de caminhada de seis minutos: distância percorrida (VVI 463,4+/-84,7 , DDD 462,6+/-63,4). Houve quatro casos de complicações: três associadas à mudança de modo de estimulação. CONCLUSÃO: Não houve diferença entre os dois modos de estimulação, no comportamento clínico, avaliado pela qualidade de vida e classe funcional e no comportamento funcional, avaliado pela ecocardiografia e pelo teste de caminhada de seis minutos.

Miocardiopatia chagásica; bloqueio cardíaco; marcapasso artificial; estimulação cardíaca artificial; qualidade de vida


OBJECTIVE: Evaluate the clinical and functional behavior of the ventricular and atrioventricular stimulation modes in the elective replacement of pulse generator in patients with chagasic cardiopathy and atrioventricular block. METHODS: Twenty-seven patients under ventricular and atrioventricular stimulation were comparatively evaluated at the beginning of the study, and alternately in ventricular and atrioventricular modes in two 90-day phases, with regard to: the clinical behavior evaluated according to quality of life and functional class, and the functional behavior evaluated by transthoracic echocardiography and the six-minute walk test. The statistical analysis was performed with patients at baseline, and under ventricular and atrioventricular modes, using the chi-square test and the repeated measures analysis of variance, and taking into consideration a 0.05 level of significance. RESULTS: The mean quality-of-life scores were: functional capacity (VVI 71.3+/-18.2 , DDD 69.3+/-20.4); overall health status (VVI 68.1+/-21.8, DDD 69.4+/-19.4) and vitality (VVI 64.8+/-24.6 , DDD 67.6+/-25.5); on echocardiography: LVEF (VVI 52.5+/-12.8 , DDD 51.8+/-14.9), LVDD (VVI 53.0+/-7.7 , DDD 42.4+/-7.8), LA (VVI 38.6+/-5.4 DDD 38.5+/-5.1), and in the six-minute walk test: distance walked (VVI 463.4+/-84.7, DDD 462.6+/-63.4). There were four cases of complications, three of them associated with the change in stimulation mode. CONCLUSION: This study showed no differences between the two stimulation modes in the clinical behavior assessed by quality of life and functional class, and in the functional behavior, evaluated according to the ecochardiographic findings and the six-minute walk test.

Chagas’ cardiomiopathy; atrioventricular block; Cardiac pacemaker; quality of life


ARTIGO ORIGINAL

Mudança do modo VVI para DDD ("upgrade") na troca eletiva do gerador de pulsos. Análise comparativa clínico-funcional

Luiz Antonio Castilho Teno; Roberto Costa; Martino Martinelli Filho; Fabian Cecchi Teno Castilho; Ivan Ruiz

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas – FMUSP e Hospital Beneficência Portuguesa de Ribeirão Preto - São Paulo, SP – Ribeirão Preto, SP

Correspondência Correspondência: Luiz Antonio Castilho Teno Rua Prudente de Moraes, 1084 14015-100 - Ribeirão Preto, SP E-mail: lteno@cardiol.br

RESUMO

OBJETIVO: Comparar o comportamento clínico e funcional dos modos de estimulação ventricular e atrioventricular na troca eletiva do gerador de pulsos em pacientes com cardiopatia chagásica e bloqueio atrioventricular.

MÉTODOS: Foram estudados comparativamente sob estimulação ventricular e atrioventricular 27 pacientes, inicialmente na inclusão do estudo e alternadamente no modo ventricular e atrioventricular em duas fases com duração de 90 dias, considerando: o comportamento clínico, avaliado pela qualidade de vida e classe funcional, e o comportamento funcional, avaliado pela ecocardiografia transtorácica e pelo teste de caminhada de seis minutos. A análise estatística foi realizada na condição basal, modo ventricular e modo atrioventricular, utilizando-se o teste qui-quadrado e a análise de variância para medidas repetidas, considerando-se nível de significância de 0,05.

RESULTADOS: A média das medidas avaliadas na qualidade de vida foram: capacidade funcional (VVI 71,3+/-18,2 , DDD 69,3+/-20,4), estado geral (VVI 68,1+/-21,8 , DDD 69,4+/-19,4) e vitalidade (VVI 64,8+/-24,6 , DDD 67,6+/-25,5); na ecocardiografia: FEVE (VVI 52,5+/-12,8 , DDD 51,8+/-14,9), DDFVE (VVI 53,0+/-7,7 , DDD 42,4+/-7,8), AE (VVI 38,6+/-5,4 DDD 38,5+/-5,1) e no teste de caminhada de seis minutos: distância percorrida (VVI 463,4+/-84,7 , DDD 462,6+/-63,4). Houve quatro casos de complicações: três associadas à mudança de modo de estimulação.

CONCLUSÃO: Não houve diferença entre os dois modos de estimulação, no comportamento clínico, avaliado pela qualidade de vida e classe funcional e no comportamento funcional, avaliado pela ecocardiografia e pelo teste de caminhada de seis minutos.

Palavras-chave: Miocardiopatia chagásica, bloqueio cardíaco, marcapasso artificial, estimulação cardíaca artificial, qualidade de vida.

Introdução

A estimulação seqüencial de átrios e ventrículos possibilita a reconstituição do sincronismo atrioventricular, perdido com a instalação do bloqueio da condução e não recuperado com a estimulação VVI1. As potenciais vantagens hemodinâmicas atribuídas a esse modo de estimulação, também denominado de fisiológico (DDD) são: o melhor enchimento ventricular pela contribuição da sístole atrial e o controle fisiológico da freqüência cardíaca pelo aproveitamento das ondas "P" espontâneas do paciente2,3, e por isso as diretrizes nacionais e internacionais sugerem esse modo para o implante inicial, por ser, teoricamente, mais fisiológico que o marcapasso unicamente ventricular4,5. Essa conduta tem sido utilizada nos pacientes cuja indicação do implante de marcapasso se dá por doença do nó sinusal, porém, ela não tem sido aplicada nos pacientes portadores de bloqueios atrioventriculares, pois não existem evidências de vantagens com esse modo de estimulação nesse grupo de pacientes, principalmente na troca eletiva do gerador de pulsos.

Este estudo busca responder se as conseqüências e efeitos clínico-hemodinâmicos, decorrentes da mudança do modo de estimulação ventricular para atrioventricular na troca eletiva do gerador de pulsos em pacientes com cardiopatia chagásica e bloqueio atrioventricular, justificam a sua utilização rotineiramente.

Métodos

Trata-se de estudo clínico controlado, prospectivo, randomizado e duplo-cego. Os pacientes foram orientados quanto ao tipo de procedimento que seria realizado, seus riscos e potenciais benefícios. Após convenientemente esclarecidos, concordaram em participar do protocolo de pesquisa, tendo assinado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O estudo foi realizado com 27 pacientes selecionados, de 8 de setembro de 2001 a 18 de março de 2004. Foram incluídos pacientes portadores de marcapasso ventricular exclusivo, implantado há pelo menos 24 meses, com cardiopatia chagásica e bloqueio atrioventricular e idade acima de 18 e abaixo de 80 anos, de qualquer sexo. Foram exclusos do estudo pacientes com fibrilação ou flüter atrial paroxístico, persistente ou permanente, sintomas sugestivos de síndrome de marcapasso, gravidez, doença limitante associada ou expectativa de vida reduzida.

A idade dos pacientes variou de 29 a 79 anos, com média de 55,9 ± 12,7 e mediana de 54 anos. O sexo era feminino em 15 e masculino em 12 enfermos. A cor era branca em 14 pacientes, negra em oito e parda em cinco.

Os pacientes eram portadores de marcapasso ventricular permanente por períodos que variaram de 3 a 30 anos com média de 11 ± 6 anos e mediana de 10 anos. Em 13 enfermos, o procedimento de troca iria substituir o primeiro sistema de estimulação implantado; em sete, o segundo gerador de pulsos utilizado; em três, o terceiro e, em quatro, o quarto.

O ritmo próprio de todos os pacientes era sinusal para os átrios com bloqueio completo da condução atrioventricular, constatado com o teste de diminuição da freqüência de estimulação do marcapasso.

Desenho do estudo - Após a seleção e avaliação clínico-funcional na condição basal, os pacientes foram submetidos ao procedimento cirúrgico: implante de cabo-eletrodo atrial e troca do gerador de pulsos unicameral por outro dupla-câmara. A seguir, o gerador foi programado para o modo de estimulação selecionado pela randomização.

Na condição A, os pacientes permaneceram, após a operação, no modo de estimulação ventricular durante 90 dias (fase I), sendo posteriormente reprogramados para o modo atrioventricular e mantidos por mais 90 dias (fase II). Na condição B, os pacientes foram programados, após a operação, no modo de estimulação atrioventricular, sendo mantidos durante 90 dias (fase I) e posteriormente reprogramados para o modo ventricular e mantidos por mais 90 dias (fase II) (fig. 1).


Programação do marcapasso - Modo VVI: a freqüência programada foi de 70bpm e, como os pacientes tinham bloqueio atrioventricular de grau avançado, não houve em nenhum momento o sincronismo AV. Modo DDD: A freqüência mínima de estimulação foi de 70bpm, sem resposta de freqüência, e a freqüência máxima foi calculada com base em 80% da freqüência máxima para a idade. O intervalo AV não foi individualizado e foi programado para 120ms após uma onda "p" espontânea e 180ms após uma onda "p" estimulada. A sensibilidade atrial foi programada em 0,5mV e a ventricular em 2,5mV. Ao final do estudo, todos os pacientes tiveram seu marcapasso reprogramado para o modo atrioventricular.

Qualidade de vida - O instrumento genérico de avaliação de qualidade de vida utilizado neste estudo foi o protocolo Medical Outcomes Study SF-36 Health Survey. As respostas ao questionário foram avaliadas num banco de dados (software específico) que mensurou as dimensões de qualidade de vida numa escala (Raw Scale) que varia de 0 (pior estado de saúde) a 100 (melhor estado de saúde).

Ecocardiograma transtorácico - Foram realizados ecocardiogramas transtorácicos em repouso nas mesmas ocasiões das avaliações clínicas. Foi solicitada ao ecocardiografista a exclusão da monitorização do eletrocardiograma durante o exame para impedir a identificação do modo de programação. Foram obtidas imagens em cortes convencionais para a obtenção dos diâmetros diastólico e sistólico final do ventrículo esquerdo, tamanho do átrio esquerdo e cálculo da fração de ejeção com utilização do método de Teicholz.

Teste de caminhada de seis minutos - O teste de caminhada de seis minutos foi utilizado para a avaliação funcional dos pacientes e a distância percorrida foi o marcador da condição clínica. Foram medidas as freqüências cardíacas antes do início e no final do teste e a distância que o paciente percorreu em 6 minutos de caminhada.

Análise estatística - A análise estatística dos efeitos da mudança do modo de estimulação foi realizada na condição pré (basal), modo VVI e modo DDD. As variáveis quantitativas foram comparadas com a análise de variância para medidas repetidas. Quando significantes, realizou-se teste complementar de contraste para discriminar as diferenças. Os valores de p<0.05 foram considerados significantes.

Resultados

Foram realizados com sucesso todos os procedimentos cirúrgicos e não houve óbitos no período estudado. A via de acesso para a introdução do eletrodo atrial foi a punção da veia subclávia em 25 pacientes (92,5%) e da veia jugular interna em dois (7.5%). Foram realizadas medidas de impedância dos eletrodos, sensibilidade para onda R e P e limiares de estimulação atrial e ventricular na condição unipolar e bipolar (tab. 1).

As complicações observadas foram - Deslocamento do eletrodo atrial, 1 caso (3.7%); taquicardia atrial, 1 caso (3,7%); flütter atrial, 1 caso (3,7%); Hematoma de bolsa do gerador, 1 caso (3,7%).

O deslocamento do eletrodo foi corrigido cirurgicamente com o reposicionamento no terceiro mês após o implante e o paciente reiniciou o protocolo do estudo. A taquicardia atrial ocorreu no ato operatório e o flütter atrial duas semanas após. Ambas as arritmias foram tratadas por estimulação atrial rápida. O hematoma de loja ocorreu no pós-operatório imediato (24 horas) e foi causado pelo uso de heparina subcutânea profilática. Foi tratado apenas com suspensão da heparina e acompanhamento clínico.

Avaliação clínica - Não houve diferença no número de pacientes agrupados por classe funcional (NYHA) nas condições de avaliação pré (basal), VVI e DDD (P=0,334) (fig. 2).


Achados ecocardiográficos - As medidas de fração de ejeção (TEICHOLZ) (P=0,216), do DDFVE (P=0,095) e do AE (P=0,290) realizadas no início do estudo (basal), ao final do modo VVI e ao final do modo DDD não apresentaram diferença entre as médias (tab. 2).

Teste de caminhada de seis minutos - A distância percorrida durante os seis minutos do teste pelos pacientes durante a condição basal, em modo de estimulação ventricular e em modo de estimulação DDD não mostrou diferença significativa entre a média nos dois modos (P=0,945), porém a distância percorrida em ambos foi significantemente superior à condição basal (P=0,0006) (tab. 3).

A média da freqüência cardíaca inicial do teste não apresentou diferença estatística entre os dois modos de estimulação, porém a média da freqüência na condição basal foi significativamente menor que nas fases VVI e DDD. A freqüência cardíaca final no modo DDD não mostrou um aumento importante, porém a média foi maior em relação a condição basal e ao modo VVI.

Qualidade de vida - A qualidade de vida avaliada pela capacidade funcional (P=0,489), pelo estado geral (P=0,546) e pela vitalidade (P=0,593) não mostrou diferença significativa na média dessas dimensões em nenhuma condição do estudo (fig. 3, tab. 4).


Discussão

O uso do marcapasso cardíaco artificial no tratamento do bloqueio atrioventricular em pacientes com cardiopatia chagásica está definitivamente consagrado, porém a decisão sobre o modo de estimulação mais adequado ainda permite discussões.

Existem vários estudos na literatura em que se comparam os efeitos dos modos de estimulação cardíaca VVI e DDD em pacientes não chagásicos 6-10, porém a cardiopatia chagásica apresenta características clínicas e eletrofisiológicas próprias com comprometimento da função autonômica, que a diferencia de outras patologias 11,12.

Neste estudo, a análise da freqüência de estimulação dos nossos pacientes, sob a programação DDD, sem ativação de sensor de resposta de freqüência, mostrou discreta variação cronotrópica no teste de caminhada de seis minutos e, portanto, pode-se deduzir que os achados comparativos entre as programações VVI isolada e DDD foram conseqüências do sincronismo atrioventricular recuperado.

Existe muita polêmica a respeito do tema central deste estudo, pois a mudança do modo de estimulação na troca eletiva do gerador com o objetivo de se obter melhor função hemodinâmica, nem sempre resulta em benefício clínico. A mudança do modo de estimulação VVI para DDD (upgrade) foi proposta pela primeira vez em 1992, por Sulke e cols., num estudo randomizado que incluía 16 pacientes assintomáticos, com marcapasso VVI implantado há mais de três anos por doença do nó sinusal e bloqueio atrioventricular. O modo DDD promoveu melhora da capacidade física e de bem estar (avaliação subjetiva), mas não foi diferente do ponto de vista ecocardiográfico13.

Hildick-Smith e cols., em 1998, avaliando retrospectivamente 44 casos de upgrade de MP ventricular observaram que apenas os sintomáticos (maioria dos inclusos) se beneficiaram, mas a taxa de complicações de 45% foi considerada muito elevada14. Gribbin e cols., em avaliação de sua experiência, observaram também taxa exagerada (36%)15, e por isso concluíram que a mudança do modo de estimulação na troca eletiva do gerador deveria ser realizada apenas por motivos bem definidos. No presente estudo, as complicações foram muito menos expressivas, talvez porque, diferentemente dos estudos retrospectivos, o estudo prospectivo permite a escolha de examinadores pré-selecionados e a possibilidade de melhores resultados.

As complicações referentes ao marcapasso DDD são mais comuns do que no VVI, e se devem principalmente ao cabo-eletrodo atrial, como demonstra o estudo UKPACE16. Neste nosso estudo, entre as quatro complicações cirúrgicas observadas, três se relacionaram com a mudança do modo de estimulação. Tanto o deslocamento do cabo-eletrodo atrial como a ocorrência de taquiarritmias atriais conduzidas pelo marcapasso são exclusivamente inerentes ao sistema de estimulação atrioventricular.

Recentemente, Hoijer e cols. publicaram os achados de 19 pacientes submetidos à mudança do modo VVI para atrioventricular após randomização e mostraram maior preferência dos pacientes pelo tipo DDDR, assim como melhor qualidade de vida e função cardíaca17. A nosso ver, entretanto, esse estudo incluiu inadequadamente pacientes com síndrome de marcapasso, o que significa um viés de seleção que compromete os achados de qualquer avaliação comparativa de modos de estimulação. Esse efeito pôde ser observado no estudo MOST em que a qualidade de vida melhorou após implante de marcapasso, com discreta vantagem para a estimulação atrioventricular. Entretanto a avaliação realizada com exclusão do grupo que realizou crossover, por intolerância ao modo VVI, não revelou diferença entre as duas situações18. O grupo de pacientes avaliados neste estudo eram bem adaptados ao modo de estimulação ventricular, o que isenta o estudo dessas críticas.

No teste de caminhada de seis minutos, apesar de não ter havido diferença estatística entre a distância percorrida nos dois modos de estimulação, ficou claro que existe um efeito de treino pelo aprendizado do teste pelo paciente, pois nos dois modos à distância percorrida foi significativamente maior comparada à condição basal. A média da freqüência cardíaca inicial na condição basal foi significativamente menor comparada aos modos VVI e DDD pela falência do gerador de pulsos, principal motivo para a indicação eletiva da troca. A freqüência cardíaca final foi maior na condição DDD, porém não suficiente para repercutir clinicamente, provavelmente pela cardiopatia de base.

A maioria dos pacientes portadores de marcapasso cardíaco não realizam exercícios tão intensos durante sua atividade diária, por isso a avaliação da qualidade de vida expressa melhor o dia-a-dia desse grupo de pacientes. A qualidade de vida dimensionada pela capacidade funcional, estado geral e vitalidade certamente propiciou achados confiáveis porque estabelecem as correlações consistentes com pacientes com boa evolução clínica.

Outros autores, como Martinelli e cols. em 2001, e Newman e cols. em 2003, também compararam, com o mesmo protocolo para qualidade de vida, o comportamento clínico-funcional dos modos de estimulação ventricular e atrioventricular e obtiveram resultados semelhantes ao nosso, em que não houve diferença entre os modos19,20.

Foram comparadas em todos parâmetros utilizados no estudo as medidas obtidas separadamente nas situações A e B, para se eliminar o efeito da tendência ao primeiro modo de estimulação programado, e os resultados foram semelhantes. O mesmo ocorreu quando se compararam os pacientes com fração de ejeção acima e abaixo ou igual a 40% e com uso de marcapasso em tempo maior ou menor de 10 anos. A semelhança estatística nas subanálises comparativas das condições que poderiam influenciar os resultados deram mais consistência aos resultados.

No presente estudo demonstramos que, quando se trata de pacientes com cardiopatia chagásica, bloqueio atrioventricular e marcapasso VVI, evoluindo clinicamente bem e sem sinais de insuficiência cardíaca crônica, o implante de cabo-eletrodo atrial adicional para mudança do modo, além de não ser isento de riscos, não proporcionou mudanças clínico-funcionais em seguimento de curto prazo. Torna-se importante ressaltar que a mudança de modo de estimulação ventricular para atrioventricular tem indicação absoluta quando houver intolerância ao modo ventricular, o que não foi objeto do presente trabalho.

Agradecimentos

Aos colegas, Dra. Elizabeth Sartori Crevelari e Dr. Wagner Tetsuji Tamaki, do InCor; Dr. Ulisses Bruno Stella, Fisioterapeuta Paulo César Bosio e Enf. Cristiane K. P. Souza, do Hospital Beneficência Portuguesa/RP, a participação direta no estudo dos pacientes.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.

Artigo recebido em 28/12/05; revisado recebido em 06/03/06; aceito em 17/03/06.

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  • Correspondência:

    Luiz Antonio Castilho Teno
    Rua Prudente de Moraes, 1084
    14015-100 - Ribeirão Preto, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Mar 2007
    • Data do Fascículo
      Fev 2007

    Histórico

    • Aceito
      17 Mar 2006
    • Revisado
      06 Mar 2006
    • Recebido
      28 Dez 2005
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