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Outro partido

The other party

Resumo

Este trabalho faz parte dos esforços de revisão da fortuna crítica a respeito da obra tardia de Carlos Drummond de Andrade, especialmente de seu livro póstumo O amor natural. Nosso objetivo é refutar uma hipótese recorrente em análises dedicadas a esse livro. Comumente, reconheceu-se na coletânea de poemas eróticos de Carlos Drummond de Andrade o “desaparecimento do mundo” e a recusa da história. De fato, na maioria dos poemas, a inscrição do mundo não é evidente. Contudo, defendemos que, mesmo se os conflitos sociais não sejam apresentados nos versos, a preocupação com os problemas públicos se faz presente. Buscaremos comprovar essa proposição por meio de uma breve revisão do tema do sentimento do mundo em Drummond, o qual será cotejado com a inscrição do contexto histórico em “O que o bairro Peixoto”, poema de O amor natural em que o desconcerto do mundo ronda a cena erótica.

Palavras-chave
Carlos Drummond de Andrade; O amor natural; erotismo; lírica e sociedade

Abstract

This work is part of the efforts to review the critical fortune regarding the late work of Carlos Drummond de Andrade, especially from his posthumous book O amor natural. Our goal is to refute a recurring hypothesis in analyzes devoted to this book. The “disappearance of the world” and the refusal of history were commonly recognized in the collection of erotic poems by Carlos Drummond de Andrade. In fact, in most poems, the inscription of the world is not self-evident. However, we argue that even if social conflicts are not evident in the verses, concern about public problems is present. We will try to prove this proposition by means of a brief review of the theme of world feeling in Drummond, which will be compared with the inscription of the historical context in "O que o bairro Peixoto”, poem of O amor natural in which the world’s bewilderment round the erotic scene.

Keywords
Carlos Drummond de Andrade; O amor natural; eroticism; lyric poetry and society

Resumen

Este trabajo forma parte de los esfuerzos de revisión de la fortuna crítica acerca de la obra tardía de Carlos Drummond de Andrade, especialmente de su libro póstumo El amor natural. Nuestro objetivo es refutar una hipótesis recurrente en análisis dedicados a ese libro. Comúnmente, se reconoció en la colección de poemas eróticos de Carlos Drummond de Andrade la “desaparición del mundo” y el rechazo de la historia. De hecho, en la mayoría de los poemas, la inscripción del mundo no es evidente. Sin embargo, defendemos que, incluso si los conflictos sociales no se presentan en los versos, la preocupación por los problemas públicos se hace presente. Buscaremos comprobar esta proposición mediante una breve revisión del tema del sentimiento del mundo en la poesia de Drummond, el cual será cotejado con la inscripción del contexto histórico en "O que o bairro Peixoto", poema de O amor natural en que el desconcierto del mundo ronda la escena erótica.

Palabras clave
Carlos Drummond de Andrade; O amor natural; erotismo; poesia lírica y sociedade

Carlos Drummond de Andrade registrou, com rara coerência, os conflitos vivenciados pelo homem do século XX. Havendo testemunhado grande parte dos acontecimentos centrais do período, o poeta não se limitou a observá-los à distância ou a criar um sujeito poético que apenas ficasse “torto em um canto”. Também seu canto tornou-se torto1 1 Retomamos verso de “Segredo” (Brejo das Almas), em que se lê “Fique torto no seu canto.” O possessivo permite depreender a ambiguidade do “canto”, poesia fraturada a inscrever os eventos e o espaço a partir dos quais o sujeito marginalizado observa o mundo. ao inscrever o tiroteio, os anseios pela revolução, o “Menino chorando na noite”, o “Favelário nacional” ou o terrível “estoque de riquezas” podres das crianças e mulheres magras no “Fim de feira”. A poesia fraturada, multifacetada e excêntrica foi o correlato perfeito do gauche, com que o escritor inaugurou sua obra. Deslocado, fora de lugar, o “eu todo retorcido” raramente se retirou do mundo em desconcerto. Desde a ambivalente postura do filho de fazendeiros em relação à modernização incipiente nos anos 1920 até a escrita biográfica da maturidade, quando narrou a violência histórica das oligarquias mineiras, a literatura de Carlos Drummond dramatizou problemas tanto mais universais quanto tecidos nas dores individuais de Carlos, personagem eternizada pela obra drummondiana.

Nesse sentido, já no livro de estreia, em que o escritor reconheceu “uma deleitação ingênua com o próprio indivíduo” (2003, p. 197), encontram-se ecos de anseios e angústias que extrapolam o âmbito pessoal. Em Alguma poesia, estão presentes linhas de força que se desdobrariam nos livros subsequentes: o registro da urbanização destruidora e desterritorializante, a violência urbana, os efeitos nocivos da guerra, os desmandos de governantes. Nos anos 1940, os embates entre literatura e história se tornariam ainda mais densos ao exporem os conflitos de um sujeito em confronto, mesmo se tentasse a conjunção, com os outros homens. À procura das mãos dadas, o eu canhestro deparou-se com a ausência de dedos limpos, em “mão incurável”.2 2 Citamos expressão encontrada em “A mão suja” (José). De fato, o anseio de comunicação não era frustrado somente pelas nódoas do mundo, insistentes na escrita drummondiana. O “eu todo retorcido” reconhecia em si faltas insuperáveis. Contrastando com a ordem ideal projetada, o sujeito se apequenava, degradava-se, dando a ver seus culposos dedos sujos. Em “reciprocidade de perspectivas”, nos termos de Candido (2004a, p. 76) CANDIDO, Antonio. Fazia frio em São Paulo. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul , 2004b, p. 23-26. , a deformação subjetiva contaminava o mundo na mesma medida em que se contagiava por ele.

Esse projeto poético, de uma densidade rara, não perdurou. Nas obras subsequentes, também de grande riqueza literária, ganhou vulto uma visada de tal modo melancólica do mundo, do eu e da palavra, que o sujeito já não confiava nas possibilidades de intervir em seu tempo. Ainda assim, o desconcerto do mundo se fez sentir. A epígrafe de Claro enigma, que confirmaria o tom melancólico crescente em Novos poemas, não deixa dúvidas acerca da importância dos acontecimentos para o poeta mesmo após sua retirada da “praça de convites”: “Les événements m’ennuient”. Quando se dá a devida importância ao sujeito de “ennuir”, não se pode negar que o tédio e a melancolia não são somente a manifestação do olhar disfórico a respeito da condição humana, mas também a resposta subjetiva aos episódios recentes da política nacional e internacional.3 3 A esse respeito, confiram-se os trabalhos de Betina Bischof (2005) e Vagner Camilo (2001). Sobretudo este explicita que acontecimentos poderiam ter levado o poeta ao tédio. Estes se ofuscariam como tema dos versos para tornarem-se o motor negativo da “ingaia ciência” da maturidade.

Os eventos públicos retornariam à superfície dos poemas nos anos seguintes. Perpassariam o experimentalismo de Lição de coisas, os poemas-noticiário de Versiprosa, a narrativa da violência patriarcal em Boitempo e o registro dos resultados daninhos do progresso técnico e das mazelas urbanas nos livros dos anos 1970 e 1980. A mudança parece acompanhar o arrefecimento das desconfianças em relação à palavra poética, novamente apta a registrar os fatos e, quiçá, a intervir no real. Anuncia, sobretudo, uma transformação que se confirmaria em O amor natural: o processo gradual de cerceamento dos poemas acerca do cotidiano em volumes específicos (como a coletânea de 1967) ou em seções próprias (conforme encontramos em Discurso de primavera e Amar se aprende amando).

No livro póstumo, essa cisão se tornaria omissão: os ruídos da rua já quase não têm lugar. Envolto pelas flores do púbis,4 4 Chama atenção a variedade de imagens florais na construção do jardim edênico dos corpos em O amor natural. Um dos textos divulgados na imprensa como prenúncio à coletânea publicada postumamente intitulava-se, aliás, “Jardim”. Como informamos no primeiro ensaio, trata-se de “Em teu crespo jardim, anêmonas castanhas”, publicado anteriormente n’O cometa itabirano. o eu parece evitar alegremente o problemático convívio com os homens na “praça de convites”. A análise mais detida não permite defender a total dissolução da história e do sentimento do mundo, no entanto. Uma das epígrafes do livro anuncia: o sexo “contém todos os governos, juízes, deuses, pessoas perseguidas da terra”.5 5 Verso citado em inglês: “Sex contains all, bodies, delicacies, results, promulgations,/ [...]/ All the governments, judges, gods, follow’d persons of the earth,/ These are contain’d in sex as parts of itself and justifications of itself.” A presença do tempo histórico no sexo, explicitada pelo verso de Walt Whitman, ecoa também na citação de Apollinaire nas epígrafes: “fazer dançar nossos sentidos sobre os escombros do mundo”.6 6 Em francês nas epígrafes de O amor natural: “Faire danser nos sens sur les débris du monde”. Embora o mundo esteja destruído ou reduzido a destroços, ele não deixará de comparecer na coletânea erótica.

O leitor habituado à obra de Carlos Drummond de Andrade não se espantará com essa permanência. De fato, na poesia drummondiana, o amor pode ser uma “procura desajeitada de mão”.7 7 Citamos “América” (A rosa do povo). Nos versos eróticos, a busca do outro transmuta-se em encontro: “o corpo dois em um o gozo pleno/ que não pertence a mim nem te pertence/ um gozo de fusão difusa transfusão”.8 8 Trecho de “Sugar e ser sugado pelo amor”. O sexo constitui, portanto, uma força de comunhão. Atado ao estreito círculo do abraço carnal, o laço que outrora a poesia drummondiana quisera vislumbrar ou construir no espaço social mais amplo quiçá passe a ser figurado pela cópula.

Ruínas, fechamento: o “sentimento do mundo” parece retrair-se, apequenar-se. Em certa medida, esse julgamento é sustentável, mas se faz necessário pô-lo à prova, avaliando sua adequação e também suas fragilidades. Com efeito, talvez, sob o evidente recuo, oculte-se uma nova face das preocupações públicas, a que transforma os fragmentos da sociedade subsistentes em meio ao sexo na imagem de um mundo depauperado. Em um gesto de renúncia aos procedimentos de inscrição do mundo consagrados pelos leitores e pela crítica, O amor natural expõe uma poesia e um sujeito poético que goza contra a distopia generalizada.

Vislumbrar o sentimento do mundo na comunhão dos amantes não é escopo distante das reflexões de Carlos Drummond de Andrade acerca da poesia amorosa. Tal expansão dos signos referentes ao espaço público na lírica erótica foi defendida pelo escritor em ensaio crítico publicado em Passeios na ilha, de 1952. Em “Maria Isabel: canto amoroso”, o escritor observa que o amor em Visão de paz (MARIA ISABEL, 1948MARIA ISABEL. Visão de paz. Rio de Janeiro: Agir, 1948. ) “só à primeira vista é físico e individual; logo se adivinha que se reveste de sentido coletivo, e que Maria Isabel ama os homens no seu conjunto, e quer uni-los todos” (ANDRADE, 1975, p. 131) ANDRADE, Carlos Drummond de. Passeios na ilha. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975. .9 9 O ensaio citado está na primeira edição do livro, de 1952, e na segunda, de 1975. Na prosa seleta pelo autor, o texto foi excluído. Ele acrescenta: “Maria Isabel é solidária e fraterna; o fundo de sua natureza se nos revela tanto mais puro quanto mais despida de ênfase socializante é a sua expressão” (ibidem, p. 132). O trecho, embora se detenha em obra alheia, parece uma defesa do revés sofrido pela poesia drummondiana em 1951, com Claro enigma, e já anunciada em 1948, em Novos poemas. Nesses livros, Drummond afasta-se da “ênfase socializante” de Sentimento do mundo (1940), José (1942) e A rosa do povo (1945). De acordo com excelente estudo de Vagner Camilo (op. cit.), embora a tensão entre transitividade e intransitividade do texto literário vigore nas coletâneas da década de 1950, a transformação foi acusada, em diferentes críticas publicadas na imprensa, de alheamento das lutas concretas, subjetivismo, recusa à comunicação. Os ataques ajudam a compor o cenário em que surgem os receios de Drummond em relação à sua poesia erótica, pungentes ao menos desde 1954, quando o poeta escreve esta carta a Abgar Renault: “A ideia da publicação en secret dos poemas eróticos foi posta de lado: iria desmoralizar-me até a décima geração. Imagine que a notícia chegou a ser publicada nos jornais!”.10 10 Documento pertencente ao Arquivo Abgar Renault, preservado pelo Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Ao ocultar seus versos eróticos de outrora, Carlos Drummond não demonstrava somente preocupações acerca da difamação do homem que escreve, mas, antes de tudo, inquietava-se com a leitura de sua poesia. Lembramos que a crítica de esquerda vinculada ao Partido Comunista Brasileiro, fonte de parte dos ataques à obra de Drummond na década de 1950, estigmatizava o amor como tema próprio dos que se entregam a “sobressaltos egoístas”.11 11 A expressão, de Cárrera Guerra, é citada por Dênis de Moraes em O imaginário vigiado. Conforme resume o autor, o realismo socialista, endossado pelo PCB, recusava abertamente o erotismo. O principal promotor dessa doutrina estética, Jdanov, reconheceu no misticismo, no clericalismo e na pornografia, “característicos do declínio e da corrupção dominantes no capitalismo” (apud MORAES, 1994, p. 117), as causas da suposta má qualidade da literatura ocidental. No ensaio sobre o livro de Maria Isabel, o escritor rebate as possíveis acusações de alheamento e individualismo contra poemas centrados na temática amorosa. Conforme fariam depois diferentes estudos sobre a sua poesia dos anos 1950, ele reconhece que o retraimento do sujeito participativo é também um fato social.

A proposição do escritor poderia mesmo ser embasada pelo pensamento adorniano. Em sua célebre “Palestra sobre lírica e sociedade”, o filósofo alemão postula estar o poder de socialização da lírica na mais densa individuação. Desde que inscrito em uma composição em que vigore a primazia da linguagem, o recolhimento subjetivo difunde o antagonismo social. Concepção semelhante da lírica é expressa pela obra de Carlos Drummond antes ainda de sua aparente exclusão do convívio social. Em “América”, de A rosa do povo, o eu poético em busca dos outros homens conclui: “Portanto, é possível distribuir minha solidão, torná-la meio de conhecimento./ Portanto, solidão é palavra de amor./ Não é mais um crime, um vício, o desencanto das coisas.” (2002, p. 199ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar , 2002. )

A aproximação não pode ser automática, contudo. No pensamento adorniano, quanto menos um poema tematiza a relação histórica entre o sujeito e a objetividade, mais densos são os sedimentos sociais ali observados. Logo, a poesia não comunicativa é a que mais bem abala a reificante linguagem prosaica. Em um aspecto, seria preciso ir adiante, ou arriscaríamos ocultar os versos sob uma teoria tornada rija. Não faríamos jus à poesia de Drummond ou ao pensamento de Adorno.

A inadequação parcial reside na importância da literatura drummondiana para a sociedade e - ao revés - na relevância do contexto para o intelectual Carlos Drummond de Andrade. O testemunho mais contundente do trânsito dessa poesia foi legado por Antonio Candido no belíssimo ensaio “Fazia frio em São Paulo”. Nesse texto, Candido narra o poder aglutinador das cópias de Sentimento do mundo e de poemas de A rosa do povo, divulgadas fora do comércio devido ao caráter contestatório dos versos em tempos de ditadura:

Naquele tempo Drummond difundia os seus poemas políticos impublicáveis por meio de cópias remetidas aos amigos; este, por sua vez, as multiplicavam e elas corriam o país, datilografadas e mimeografadas. Assim se espalharam: ‘Depois que Barcelona cair’; ‘Carta a Stalingrado’; ‘Telegrama de Moscou’; ‘Com o russo em Berlim’; ‘Mas viveremos’; ‘Visão 1944’ - recolhidos mais tarde em A rosa do povo, menos o primeiro. Por este meio o chefe de gabinete exercia uma atividade constante e decidida, animando muita gente com o exemplo de uma participação tão alta, naquele momento que para muitos deveria levar ao ‘mundo novo’ que um dos poemas queria ajudar a nascer. (2004bCANDIDO, Antonio. Fazia frio em São Paulo. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul , 2004b, p. 23-26. , p. 25-26)

Em nome de sua “atividade decidida” contra o fascismo, Drummond publicou poemas que feririam parte dos preceitos adornianos, especialmente no que tange à linguagem. “Depois que Barcelona cair”, veiculado na Tribuna popular a 17 de junho de 1945 após circular em versões copiadas por amigos, é talvez o exemplo mais óbvio dessa inadequação. Poesia sobretudo participante, os versos não apresentam a súmula de preocupação social, inquietação individual e trabalho expressivo que caracterizaria a escrita drummondiana dos anos 1940. Nesse sentido, fere também os preceitos drummondianos e talvez por isso não tenha sido publicado em livro.12 12 As críticas à qualidade de um dos poemas mencionados são registradas pelo próprio Carlos Drummond de Andrade na parcela publicada de seu diário: “O poema da anistia apareceu simultaneamente no Correio da Manhã, no Diário Carioca, e em O Jornal (iniciativa da campanha pela decretação da medida). João Cabral comenta que onde está ‘anistia’ ficaria bem ‘melhoral’ ou ‘aspirina’.” (2003, p. 982) Essas concessões, feitas em nome da comunicação com o público amplo e questionadas no interior da própria obra drummondiana, chegaram a ser apontadas como seu traço central por Flora Süssekind: “É como se o poeta enfatizasse, nesses trechos, a sua trilha preferencial - de poeta-cronista -, num momento em que parecia caber à figura do poeta-crítico a função de personagem-chave da poesia moderna. É como se Drummond, em meio ao trabalho sistemático com parte dos recursos dessa poesia, com o circunstancial, o fato e os efeitos de prosa, se visse obrigado a olhar sempre com certa desconfiança os volteios autorreflexivos da literatura e da crítica contemporâneas, descartando-os em prol de uma maior cumplicidade com o leitor. E, nesse sentido, o seu trabalho como cronista de jornal foi uma peça fundamental na formação desse pacto de não estranhamento, de um modo de ver as coisas, o cotidiano, semelhante ao de qualquer leitor potencial do Diário de Minas, da Tribuna Popular, de A Manhã, do Correio da Manhã ou do Jornal do Brasil, jornais em que trabalhou regularmente desde os anos 20 até 1984 quando abandonou o ofício de cronista.” (2003, p. 281-282) Embora seja inegável a face cronista do poeta Carlos Drummond, não podemos recusar-lhe o título de poeta-crítico. É provável que, justo por sua lucidez, o autor tenha contraposto o factual ao autorreferencial de forma tão aguda.

Por sua vez, o contexto de publicação da poesia também foi alvo das inquietações drummondianas: testemunha de importantes acontecimentos artísticos e sociais do século XX, o escritor esteve atento às transformações, respondendo a elas de forma muitas vezes irônica. As preocupações contextuais ficam particularmente claras na prosa de Carlos Drummond acerca da lírica amorosa. No ensaio já citado, “Maria Isabel: canto amoroso”, o escritor afirma: “Os poetas se iludem como os outros homens, e este livro de Maria Isabel é fruto de generosa ilusão. Ela antecipou a hora da canção feliz” (op. cit., p. 133). Para o poeta mineiro, as circunstâncias sociais impedem a expansão do sentido coletivo subjacente à comunhão pelo amor. O senso de inadequação entre o canto radioso e os tempos sombrios persistiu por décadas. Nova carta de Drummond a Abgar Renault confirma essa inquietude:

Já ia escrever-lhe reclamando o poema do rapaz, mencionado em seu último cartão, quando ele me chegou em outro envelope. Gostei da coisa, simples e marcante, mas acho um pouco difícil que alguma revista o publique. Primeiro, porque praticamente não existem mais revistas literárias neste Brasil já tão desenvolvido em petróleo, automóveis e biquínis. Depois, porque uma ou outra publicação que circula por aí, com algum espaço reservado à poesia, continua observando aqueles mesmos critérios morais estritos de antes da era espacial e que são hoje uma forma final de hipocrisia impressa. 13 13 Documento pertencente ao Arquivo Abgar Renault, preservado pelo Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, da Fundação Casa de Rui Barbosa.

O texto, datado de 28 de março de 1966, atesta a permanência do pessimismo em relação a leituras poéticas não moralistas. As hesitações registradas em prosa a respeito do erotismo indiciam a especificidade do discurso amoroso no interior da poesia drummondiana, pouco afeita aos acordos ou à submissão ao senso comum. A obra, que imprimiu o desconcerto do mundo através de uma linguagem gauche, celebrizou-se por versos que causaram escândalo, como “Uma pedra no meio do caminho”. Apesar disso, Carlos Drummond viu na inadequação ao contexto uma das fraquezas da poesia sobre o amor. A discordância da escrita literária estaria ameaçada em um tempo que massifica as diferenças, as obras distintas, cindindo os homens? Circunstâncias pouco apropriadas ameaçariam enfraquecer a força transgressora da literatura erótica e do canto amoroso? A partir da interação do epistolário com a escrita ensaística de Drummond, podemos responder que o próprio aspecto jubiloso dos poemas de amor arrisca revelar-se uma ilusão se não se coaduna com condições sociais favoráveis à leitura da fusão dos corpos como um modo de solidariedade. O erotismo também põe em perigo sua dissonância quando igualado a outras obras que diluem o sexo em uma linguagem simplória, conforme defende o escritor:

“Já me advertiram que a demora em publicar vai importar talvez num futuro próximo, em que os meus poemas já não ofereçam nenhuma curiosidade porque o tema já estará tão batido, já se esgotou tanto essa série de assuntos e a educação sexual de forma errada ou certa se generalizou de tal modo - na escola, na televisão e na casa de família - que o meu livro de poemas correrá o risco de constituir-se em livro de classe para jardim de infância...”14 14 Entrevista concedida a Maria Lucia do Pazo Ferreira, 1992, p. 317.

A desconfiança em relação à potência da literatura erótica recompõe, décadas depois, a inquietude de Carlos Drummond de Andrade a respeito do amor em “tempo de homens partidos”. Na poesia drummondiana dos anos 1940, há uma retração na lírica amorosa, pouco propícia à criação de um “mundo grande” por meio da literatura. Nesse período, o amor e o corpo tornam-se alvo da consciência alerta contra a “subjetividade tirânica”, para retomar a expressão de Antonio Candido. Em Sentimento do mundo, esse afeto é rejeitado porque inócuo para a construção da “vida futura”: “Tempo em que não se diz mais: meu amor./ Porque o amor resultou inútil.”, lemos em “Os ombros suportam o mundo” (op. cit., p. 79). A recusa é reafirmada em “A noite dissolve os homens” (op. cit., p. 83): “E o amor não abre caminho/ na noite. [...]”. Porém, o conteúdo rejeitado - subjetividade e corpo insistentes - irrompem em versos dedicados a temáticas diversas. No poema que dá título ao livro de 1940, a comunicação se estabelece por meio do sexo: “e o corpo transige/ na confluência do amor”. Em “O lutador”, de José, a luta com as palavras é descrita em termos próprios da conquista amorosa. Além disso, a corrosão do amor é um sintoma da negatividade do tempo “de homens partidos”. Quando o amor, a carne, o beijo não têm importância, também o cântico se torna indiferente.15 15 Parafraseamos versos de “Canção de berço” (SM, op. cit., p. 75-76): “Mas também a carne não tem importância./ E doer, gozar, o próprio cântico afinal é indiferente.” A despeito da irônica descrença no poder da poesia, o poeta segue produzindo. A literatura torna-se, então, um dos meios de criar o tempo em que o amor sairá dos subterrâneos.16 16 Remetemos a “Congresso Internacional do Medo” (SM, op. cit., p. 73): “Provisoriamente não cantaremos o amor,/ que se refugiou abaixo dos subterrâneos.” A manutenção do investimento na palavra em tempos conflituosos é defendida por John Gledson, em seu belo estudo sobre a poesia de Carlos Drummond: “Nada tem um sentido final, ‘esta vida não presta’. Esta ‘opacidade’ da experiência (servindo-nos do termo de Luís Costa Lima), a sua tendência a levar-nos para um beco-sem-saída, está vigente aqui como em toda a poesia de Drummond; só que aqui é o fundo negro contra o qual a riqueza e a variedade da experiência se destacam. Unimo-nos totalmente só na morte, mas podemos por enquanto ‘evitar a morte’ pelas ‘palavras, intuições e símbolos’ que também unem a humanidade, mostrando-nos a nossa natureza comum.” (1981, p. 117) Não sem conflitos.

Há um ambivalente adensamento dos laços entre o eu e o mundo: tal conquista favorece a confiança na poesia, embora frequentemente minada pela dúvida; por sua vez, expõe as cadeias de que o sujeito gostaria em vão de se libertar. De um lado, ele pode gritar “sempre/ que abafe um prazer”;17 17 Citamos versos de “Idade madura” (RP, op. cit., 191). de outro, deve suportar, como os outros homens, o tempo “de cortinas pardas”, em que a política e o comércio invadem o gozo.18 18 Retomamos estes versos da quarta parte de “Nosso tempo” (RP, op. cit., p. 128): “É tempo de cortinas pardas,/ de céu neutro, política/ na maçã, no santo, no gozo,/ amor e desamor, cólera/ branda, gim com água tônica,/ olhos pintados, dentes de vidro,/ grotesca língua torcida./ A isso chamamos: balanço.” Essa fusão crescente acaba por resultar, segundo Gledson (op. citGLEDSON, John. Poesia e poética de Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Duas Cidades , 1981. ., p. 115), na poesia bastante distinta dos anos 1950, quando a hipótese da separação entre o eu e o mundo perde valor. Também a fé na palavra está minada a partir de então. A literatura já não se afirma um meio para difundir esta força de união entre os homens: a compreensão pelo amor. O sentimento é registrado agora em clave distinta da que valorizava sobretudo sua face social. O vulto assumido pela lírica amorosa é uma manifestação da virada subjetivante ocorrida na poesia do período.

Vagner Camilo (op. cit.CAMILO, Vagner. Drummond: da Rosa do Povo à Rosa das Trevas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. ) expôs brilhantemente as articulações entre tal transformação e o contexto político de meados do século XX. O pesquisador demonstrou como a frustração do projeto participante dos anos 1940 é indissociável do radicalismo ideológico do pós-guerra, que levou ao afastamento por Carlos Drummond dos preceitos comunistas. O poeta deixou diversas marcas do sofrimento decorrente de sua aproximação ao Partido Comunista Brasileiro, em 1945. Registros em seu diário revelam o abismo que separa o ser particular e a impessoalidade do partido. As decisões do PCB tornariam peremptória a recusa da conjunção com os outros homens por vias partidárias. O apoio de Prestes a Vargas, associado ao sectarismo dos dirigentes, suscitou o rompimento mantido até o fim da vida do intelectual. Contra os partidos, o escritor elegerá, anos depois, o sentimento amoroso:

Meu partido está tomado. Não da Arena nem do MDB, sou desse partido congregacional e superior às classificações de emergência, que encontra na banda o remédio, a angra, o roteiro, a solução. Ele não obedece a cálculos da conveniência momentânea, não admite cassações nem acomodações para evitá-las, e principalmente não é um partido, mas o desejo, a vontade de compreender pelo amor, e de amar pela compreensão.

A crônica, publicada a 10 de outubro de 1966 no Correio da Manhã, explicita a possibilidade de o amor redimir um contexto político desolador. Carlos Drummond de Andrade investiu publicamente, portanto, no viés socializante do sentimento amoroso. Afrontando um mundo de “conveniências momentâneas”, esse afeto recusa o cálculo, pois se funda na consonância. Reencontramos aqui a verdade exposta nas epígrafes de O amor natural: “sobre os escombros do mundo”, a solidariedade em meio ao fechamento das relações íntimas pode traçar o negativo de uma sociedade avessa à conjunção.

Em um poema da coletânea, fica especialmente evidente a relação negativa entre o erotismo e a negatividade do contexto histórico. “O que o Bairro Peixoto” narra como a cidade moderna e desumana macula o gozo.

O QUE O BAIRRO PEIXOTO O que o Bairro Peixoto sabe de nós, e esqueceu! Rua Anita Garibaldi e Rua Siqueira Campos. (Francisco Braga, Décio Vilares nos espiando, fingem que não?) O calçadão na penumbra andança que vai e volta voltivai a derivar para o túnel em busca do hímen? Volta: banco de praça. Bambus. Bambuzal de brisa em ais. O bardo e a garota amavam-se nas guerras da Dependência. Seria brinco de amor ou era somente brinco. 5 de julho (fronteira do reino escuro) à face de casas desprevenidas jogávamos nos jardins e nas caixas de correio volumes indesculpáveis de alheias dedicatórias pedacinhos. Se salta o cachorro? Credo. Saltam quinhentos mastins. Ganem a traça de amor sem regulamento. Prende mata esfola queima. Viu? É dentro de mim, é dentro do bardo que estão ganindo. Bobeira de bobo besta. Passa de nove mil horas, urge voltar ao sacrário de virgem. Só mais um tiquinho. Não. Sou eu, rei sábio, que ordeno. Ri. Rimos de mim. Ficamos. Dedos entrelaçados e desejos geminados no parque tão pueril. Praça Edmundo, olá, Bittencourt de berros brabos. Se acaso nos visse aos beijos babados, reincidentes, protestava no jornal? Menina mais sem juízo rindo riso sem motivo no jogo de diminutivos, sabe o que estamos fazendo? Amor. Não é nada disso. Apenas primícias cálidas. Calo-me. Viajar nos seios. Embaixo. Por trás. Se vou mais longe, quem vai me segurar? Se fico por aqui mesmo, quem vem me ressenerar? Passo vinte anos depois no mesmo Bairro Peixoto. Ele que a tudo assistia, nada lembra, no sol posto, deste episódio canhoto. (idem, ibidem, p. 1384-1386)

Duas estrofes emolduram a cena íntima: a primeira anuncia que a grande cidade olvidou os prazeres relembrados; a última recompõe a consciência do obscurecimento da memória no espaço urbano. O recuo da memória é amplo, visto que o objeto do saber perdido não se limita aos amantes. “O que o Bairro Peixoto sabe de nós e esqueceu” está inscrito nos nomes das ruas a narrar revoltas dia a dia obscurecidas, como tantos acontecimentos na história nacional. Por conseguinte, o dêitico “nós”, que surge no segundo verso, remete à comunhão do homem e da mulher e também aos cidadãos irmanados pela destruição de seu patrimônio imaterial.

Ao esquecimento se contrapõe, em nove estrofes de intenso pathos lírico, a atualização do deleite da carne no corpo urbano. Na segunda estrofe, o poema localiza o espaço em que ocorrem as “primícias sexuais”: “Rua Anita Garibaldi/ e Rua Siqueira Campos.” Os versos isométricos recuperam o paralelismo das ruas. Enlaçam, ainda, os revolucionários irmanados pela contestação política, em diferentes momentos da história brasileira e mundial. A esses versos, contrapõem-se os quatro seguintes, mais curtos, tetrassilábicos: “(Francisco Braga/ Décio Vilares/ nos espiando,/ fingem que não?)”. Entre parênteses, eles cindem o espaço revolucionário delineado anteriormente. Os nomes aqui registrados, de ruas também paralelas, revelam figuras menos afeitas à inovação temática e formal. Francisco Braga e Décio Vilares, símbolos de uma tradição incontestada, encarnam os intrusos da cena ainda não explicitamente sexual. Traçam também os limites da transgressão ou a coexistência de forças conservadoras com as subversivas. A invasão inaugura, por fim, o tempo da recordação: já não o passado da memória apresentado na primeira estrofe, mas o presente de um tempo intensamente revivido. Tal estado apaixonado, que se funde à vida de nossas ruas, constitui um aspecto da escrita poética refratário à imobilização conservadora das cidades.

As estrofes seguintes tornarão ainda mais abrangente a revitalização urbana por associarem a alma das ruas ao erotismo dos amantes. Graças a esse vínculo inusitado, o poema construirá uma cidade compreendida como objeto de uso, isto é: como espaço valorado, ao mesmo tempo fruto da experiência coletiva e fundamento da vivência individual. Os versos abrem-se, assim, para uma concepção das áreas citadinas que não as reconheça como lugares inertes em um traçado geométrico inanimado. Se, como quer Renato Cordeiro Gomes, o espaço urbano é uma combinação de cristal e chama, de tendência geometrizante e emaranhado de existências, a recomposição apaixonada da memória gravada na urbe pode constituir uma das forças sociais da poesia urbana. Em “O que o Bairro Peixoto”, o poeta-urbanista projeta um espaço humano em contraposição ao apagamento do “emaranhado da existência” nas ruas das cidades modernas. Desse modo, a escrita do poema revela uma importante dimensão política: trata-se de um registro urbano não só pelo tema, mas principalmente porque a linguagem permite a constituição de uma outra cidade, diversas vezes soterrada pelas forças modernizantes.

Na terceira estrofe, a grafia dessa outra urbanidade se realiza por meio da duplicação dos jogos sexuais no percurso pelas vias cariocas. Tendo partido das ruas Francisco Braga e Décio Vilares, o eu poético dirige-se certamente ao Túnel Velho, que une Copacabana a Botafogo. No caminho penumbroso, tenta investir também no túnel resistente do corpo virginal. As carícias assumem o caráter de um jogo cujo prêmio são os avanços masculinos.

A brincadeira se diversifica na quinta estrofe, quando ocorre na Cinco de julho, rua próxima ao Bairro Peixoto, cujo nome comemora a data da Revolta dos 18 do Forte. Novamente, a história social e a narrativa amorosa se entrelaçam. Entre parênteses, o eu poético revela os avanços de suas investidas sexuais: “(fronteira/ do reino escuro)”. O bardo se aprofunda no corpo da garota desejada. Ao mesmo tempo, os versos aprofundam a leitura da história brasileira. Marco da violência militar, que determinou a execução dos revoltosos nas ruas de Copacabana, 5 de julho pode ser uma fronteira além da qual se avança na noite, símbolo dos conflitos sociais tantas vezes reiterado na obra de Drummond.19 19 Confiram-se, por exemplo, “A noite dissolve os homens”, “Elegia 1938”, “A bruxa”, O boi”, “Passagem da noite”, “Notícias”, “Anoitecer” e “Jardim”. Vale lembrar que “as casas desprevenidas” em face do amor também foram pegas de surpresa quando da revolta de 1922. Porém, os volumes lançados foram muito mais aterradores do que as dedicatórias deixadas pelos amantes.20 20 Notícias da época confirmam o pânico da população. Na edição de 06 de julho de 1922, o jornal A Pátria publicou: “O despertar dos moradores dos lindos bairros atlânticos de Copacabana, Leme e Ipanema foi, na madrugada de ontem, terrível. As famílias dispunham-se a abandonar as suas residências apressadamente, na imminência do forte que estava revoltado, ser bombardeado pelas tropas legais. Desde as primeiras horas do dia, um inumerável cortejo de todas as características sociais, em automóveis, bonds, caminhões do Corpo de Bombeiros e carroças, desfilava pela rua Barroso, direção a Botafogo, pelo Tunel Velho.// Os moradores do Leme cujo bairro estava sendo alvejado pelos 7 ½ do forte de Copacabana retiravam-se a conselho da própria autoridade. O forte de cinco a cinco minutos disparava para a entrada do Tunel Novo, onde estavam alojadas as tropas do 3º Regimento de Infantaria..” Disponível em: http://www1.uol.com.br/rionosjornais/rj28.htm Acesso em: 12 maio 2018.

Na oitava estrofe, o retorno dos significantes urbanos carregados de conteúdo histórico se imbrica ao tom lúdico generalizado. Na Praça Edmundo Bitencourt, área central no Bairro Peixoto, os amantes encontram-se em harmonia, com “os dedos entrelaçados” e “desejos geminados”. O sujeito poético dirige-se ao espaço público, novamente dando vida à cidade: “Praça Edmundo, olá,/ Bitencourt de berros brabos”. Ao interpor entre os nomes a interjeição, o eu dialoga também com a figura homenageada pela praça: o fundador do jornal Correio da Manhã, um dos grandes opositores da República Velha. A interpelação ao jornalista “de berros brabos” reitera o caráter destrutivo do amor sem freios: “Se acaso nos visse aos beijos,/ babados, reincidentes,/ protestava no jornal?” Os jogos sexuais a avançar pelas ruas ameaçam a ordem pública. A interrogação deixa aberta a possibilidade de uma resposta negativa, que faça ver no sentimento amoroso seu caráter demolidor, tantas vezes assumido pelo periódico.21 21 A 09 de junho de 1975, na versão publicada de seu diário, Carlos Drummond de Andrade registrou a agressividade dos tempos áureos do Correio da Manhã: “O nome do Correio despertava susto e medo entre políticos e governantes, embora o jornal já não fosse o mesmo dos tempos do seu fundador Edmundo Bittencourt, que se distinguiu pela terrível agressividade. A imprensa modernizada já não comportava clima demolidor. Ainda assim, um editorial ou mesmo um tópico do Correio deixava marca na pele do atingido.” (OE, op. cit., p. 1088). O escritor reconhece no Correio um jornal “combatente” (idem, p. 1088), “conservador de tendências liberais” (idem, p. 1089). O Correio da Manhã manteve a veia combatente até o seu fechamento em 1974, decorrência do repúdio à ditadura militar. Carlos Drummond de Andrade colaborou extensamente para o diário. Publicava em seu suplemento literário já em 1945. Desde 1954 até 1969 manteve no jornal a coluna de crônicas intitulada “Imagens”, editada três vezes por semana. Nesse espaço, o poeta - como Bitencourt - diversas vezes protestou no jornal contra as mazelas urbanas: a falta de água, as tragédias advindas com as chuvas, o embrutecimento humano nas grandes cidades.22 22 Seguimos reflexão de João Camillo Penna em Drummond, testemunho da experiência humana. De acordo com o crítico, no momento em que a poesia drummondiana tornou-se menos participativa, o escritor voltou sua pena interventiva para os escritos em prosa, publicados no Correio da Manhã: “É no momento em que se fixa a forma-crônica drummondiana que surge paralelamente algo como um Drummond cívico. É ele o cidadão morador da capital do Brasil, interessado nos acontecimentos da cidade, que utiliza a prerrogativa da escrita e do espaço de visibilidade que lhe é conferido para intervir nos negócios da urbe, falando do lugar republicano de qualquer um, e reivindicando os direitos de um qualquer - que se materializará nos anos seguintes na figura de João Brandão, espécie de figura genérica, vazia do cidadão.” (PENNA, 2011, p. 100) O poema erótico grafa um novo protesto, urdido a partir de ruas que olvidam as conturbações de outrora.

Na penúltima estrofe, as carícias chegam ao extremo, levando o sujeito poético a um impasse: “Se vou mais longe, quem vai/ me segurar?/ Se fico por aqui mesmo,/ quem vem me resserenar?”. A narrativa não segue adiante, pois a estrofe final interrompe a recordação. Ao leitor não é dado conhecer se o amante arrebatado rompe os limites, como fizeram alguns personagens históricos rememorados pelo poema. Nos primeiros versos do trecho, um sujeito crítico substitui o eu apaixonado. Ele percorre uma área cujo aspecto permaneceu idêntico: “vinte anos depois”, ele passa no “mesmo Bairro Peixoto”. As transformações afetam a escrita da história, e não tanto o espaço geográfico, protegido. Nos versos conclusivos, a relação entre o conhecimento e a memória inverte aquela expressa na abertura do poema: na primeira estrofe, convivia o presente marcado pelo saber com o passado de esquecimento; na última, o pretérito caracteriza a percepção, enquanto o presente a perda da memória. O Bairro Peixoto, “que a tudo assistia”, “nada lembra”. A reversão torna-se possível graças ao movimento realizado pelo texto: no princípio, ainda se fazia necessário revelar um saber em vigor nas ruas, mas ocultado pelo olvido; no fim, já se tornou evidente o que não é lembrado hoje pelas vias da cidade.

Poderíamos encontrar nessa estrofe um afã puramente restaurador ante a destruição. De acordo com essa leitura, o contraste entre o gozo nos versos centrais e a perda expressa nas estrofes inicial e final teriam o efeito de tornar mais pungente a narrativa do obscurecimento da história. A escrita poética se conceberia, então, como um gesto de salvaguarda dos monumentos, uma vez que os mecanismos estatais hajam se mostrado ineficazes.23 23 Funcionário do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional durante quase duas décadas, Carlos Drummond de Andrade deparou-se com o péssimo estado de conservação do patrimônio público ainda jovem, graças à influência de Mário de Andrade. Em carta ao amigo, datada de 1928, o jovem escritor mineiro indigna-se: “Estou positivamente desolado com o que acaba de suceder. Você me pede fotografias, datas de construção e mais informes sobre igrejas mineiras e eu lhe contesto com quase nada, pois quase nada me arranjaram.” O resultado da pesquisa é desolador: “Acabei verificando que não havia nada, e que a tradição em Minas é uma blague (como eu já suspeitava, aliás).” (ANDRADE & ANDRADE, 2002, p. 341)

Evidentemente, o poema revigora os significantes já disponíveis para a rememoração, mas que se vêm transformando sobretudo em sinais identificadores das vias urbanas. Porém, a celebração daqueles que foram outrora perseguidos por sua força contestadora segue um caminho em tudo diverso ao das narrativas oficiais: a revitalização dos nomes oposicionistas imiscui-se ao jogo, ao erotismo, às atividades quase sempre relegadas, porque egoicas, pelos grandes movimentos revolucionários. Dessa forma, a história social é atraída para o âmbito do vivido, das relações humanas museografadas pelo poema, sem que seja submetida aos marcos monumentais do poder. Com efeito, a poesia de Drummond denuncia antes um anseio de “preservação do social”24 24 Expressão cunhada por Henri-Pierre Jeudy em Memórias do social (1990) do que uma tentativa de restauração dos monumentos do passado.

Além disso, em “O que o Bairro Peixoto”, a recusa das transformações convive com o gozo das áreas citadinas. No poema, o passado recente, vivido intensamente pelos amantes, é contemporâneo dos signos de uma história de violência. Não prevalece a repulsa ao presente, mas a atualização dos tempos idos pela memória e por uma obra a investir no que lhe é coetâneo. Ainda as disputas sociais se desenvolvem. Também agora o gozo revive na literatura, tornando atual a “vontade de compreender pelo amor”, este “outro partido”. A rua certamente está mudada: em sua superfície visível, não aparecem mais amantes enlaçados ou as lutas sociais; entretanto, esses textos não foram apagados pela cidade. Compõem camadas de signos menos evidentes. A escrita do poema decodifica tal palimpsesto. O sol posto - perda revertida em potência literária pelos versos eróticos - suscita a iluminação dos momentos de gozo individual e de luta política exaltada. A recusa das perdas dá forma, portanto, a um passado renovado, que se conclama a partir da escuridão presente. Não é possível, após ler esse poema, os outros poemas, manter a posição corrente de que O amor natural pouco tem a dizer.

Referências

  • ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003.
  • ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar , 2002.
  • ANDRADE, Carlos Drummond de. Passeios na ilha. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.
  • ANDRADE, Carlos Drummond de; ANDRADE, Mário de. Carlos e Mário: correspondência entre Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Prefácio e notas de Silviano Santiago. Rio de Janeiro: Bem-Te-Vi, 2002.
  • BISCHOF, Betina. Razão da recusa. São Paulo: Nankin Editorial, 2005.
  • CAMILO, Vagner. Drummond: da Rosa do Povo à Rosa das Trevas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
  • CANDIDO, Antonio. Inquietudes na poesia de Drummond. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 4ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul; São Paulo: Duas Cidades, 2004a, p. 67-95.
  • CANDIDO, Antonio. Fazia frio em São Paulo. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul , 2004b, p. 23-26.
  • FERREIRA, Maria Lucia do Pazo. O erotismo nos poemas inéditos de Carlos Drummond de Andrade. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro em. 1992
  • GLEDSON, John. Poesia e poética de Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Duas Cidades , 1981.
  • JEUDY, Henri-Pierre. Memórias do social. Tradução de Márcia Cavalcanti. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990.
  • MARIA ISABEL. Visão de paz. Rio de Janeiro: Agir, 1948.
  • MORAES, Dênis de. O imaginário vigiado: a imprensa comunista e o realismo socialista no Brasil (1947-53). Rio de Janeiro: José Olympio, 1994.
  • PENNA, João Camillo. Drummond, testemunho da experiência humana. Brasília: Abravídeo, 2011.
  • SÜSSEKIND, Flora. Um poeta invade a crônica. In: SÜSSEKIND, Flora. Papéis colados. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003, p. 281-284.
  • 1
    Retomamos verso de “Segredo” (Brejo das Almas), em que se lê “Fique torto no seu canto.” O possessivo permite depreender a ambiguidade do “canto”, poesia fraturada a inscrever os eventos e o espaço a partir dos quais o sujeito marginalizado observa o mundo.
  • 2
    Citamos expressão encontrada em “A mão suja” (José).
  • 3
    A esse respeito, confiram-se os trabalhos de Betina Bischof (2005BISCHOF, Betina. Razão da recusa. São Paulo: Nankin Editorial, 2005. ) e Vagner Camilo (2001CAMILO, Vagner. Drummond: da Rosa do Povo à Rosa das Trevas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. ). Sobretudo este explicita que acontecimentos poderiam ter levado o poeta ao tédio.
  • 4
    Chama atenção a variedade de imagens florais na construção do jardim edênico dos corpos em O amor natural. Um dos textos divulgados na imprensa como prenúncio à coletânea publicada postumamente intitulava-se, aliás, “Jardim”. Como informamos no primeiro ensaio, trata-se de “Em teu crespo jardim, anêmonas castanhas”, publicado anteriormente n’O cometa itabirano.
  • 5
    Verso citado em inglês: “Sex contains all, bodies, delicacies, results, promulgations,/ [...]/ All the governments, judges, gods, follow’d persons of the earth,/ These are contain’d in sex as parts of itself and justifications of itself.”
  • 6
    Em francês nas epígrafes de O amor natural: “Faire danser nos sens sur les débris du monde”.
  • 7
    Citamos “América” (A rosa do povo).
  • 8
    Trecho de “Sugar e ser sugado pelo amor”.
  • 9
    O ensaio citado está na primeira edição do livro, de 1952, e na segunda, de 1975. Na prosa seleta pelo autor, o texto foi excluído.
  • 10
    Documento pertencente ao Arquivo Abgar Renault, preservado pelo Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, da Fundação Casa de Rui Barbosa.
  • 11
    A expressão, de Cárrera Guerra, é citada por Dênis de Moraes em O imaginário vigiado. Conforme resume o autor, o realismo socialista, endossado pelo PCB, recusava abertamente o erotismo. O principal promotor dessa doutrina estética, Jdanov, reconheceu no misticismo, no clericalismo e na pornografia, “característicos do declínio e da corrupção dominantes no capitalismo” (apud MORAES, 1994MORAES, Dênis de. O imaginário vigiado: a imprensa comunista e o realismo socialista no Brasil (1947-53). Rio de Janeiro: José Olympio, 1994. , p. 117), as causas da suposta má qualidade da literatura ocidental.
  • 12
    As críticas à qualidade de um dos poemas mencionados são registradas pelo próprio Carlos Drummond de Andrade na parcela publicada de seu diário: “O poema da anistia apareceu simultaneamente no Correio da Manhã, no Diário Carioca, e em O Jornal (iniciativa da campanha pela decretação da medida). João Cabral comenta que onde está ‘anistia’ ficaria bem ‘melhoral’ ou ‘aspirina’.” (2003, p. 982) Essas concessões, feitas em nome da comunicação com o público amplo e questionadas no interior da própria obra drummondiana, chegaram a ser apontadas como seu traço central por Flora Süssekind: “É como se o poeta enfatizasse, nesses trechos, a sua trilha preferencial - de poeta-cronista -, num momento em que parecia caber à figura do poeta-crítico a função de personagem-chave da poesia moderna. É como se Drummond, em meio ao trabalho sistemático com parte dos recursos dessa poesia, com o circunstancial, o fato e os efeitos de prosa, se visse obrigado a olhar sempre com certa desconfiança os volteios autorreflexivos da literatura e da crítica contemporâneas, descartando-os em prol de uma maior cumplicidade com o leitor. E, nesse sentido, o seu trabalho como cronista de jornal foi uma peça fundamental na formação desse pacto de não estranhamento, de um modo de ver as coisas, o cotidiano, semelhante ao de qualquer leitor potencial do Diário de Minas, da Tribuna Popular, de A Manhã, do Correio da Manhã ou do Jornal do Brasil, jornais em que trabalhou regularmente desde os anos 20 até 1984 quando abandonou o ofício de cronista.” (2003ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa seleta. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003., p. 281-282) Embora seja inegável a face cronista do poeta Carlos Drummond, não podemos recusar-lhe o título de poeta-crítico. É provável que, justo por sua lucidez, o autor tenha contraposto o factual ao autorreferencial de forma tão aguda.
  • 13
    Documento pertencente ao Arquivo Abgar Renault, preservado pelo Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, da Fundação Casa de Rui Barbosa.
  • 14
    Entrevista concedida a Maria Lucia do Pazo Ferreira, 1992FERREIRA, Maria Lucia do Pazo. O erotismo nos poemas inéditos de Carlos Drummond de Andrade. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro em. 1992 , p. 317.
  • 15
    Parafraseamos versos de “Canção de berço” (SM, op. cit., p. 75-76): “Mas também a carne não tem importância./ E doer, gozar, o próprio cântico afinal é indiferente.”
  • 16
    Remetemos a “Congresso Internacional do Medo” (SM, op. cit., p. 73): “Provisoriamente não cantaremos o amor,/ que se refugiou abaixo dos subterrâneos.” A manutenção do investimento na palavra em tempos conflituosos é defendida por John Gledson, em seu belo estudo sobre a poesia de Carlos Drummond: “Nada tem um sentido final, ‘esta vida não presta’. Esta ‘opacidade’ da experiência (servindo-nos do termo de Luís Costa Lima), a sua tendência a levar-nos para um beco-sem-saída, está vigente aqui como em toda a poesia de Drummond; só que aqui é o fundo negro contra o qual a riqueza e a variedade da experiência se destacam. Unimo-nos totalmente só na morte, mas podemos por enquanto ‘evitar a morte’ pelas ‘palavras, intuições e símbolos’ que também unem a humanidade, mostrando-nos a nossa natureza comum.” (1981, p. 117)
  • 17
    Citamos versos de “Idade madura” (RP, op. cit., 191).
  • 18
    Retomamos estes versos da quarta parte de “Nosso tempo” (RP, op. cit., p. 128): “É tempo de cortinas pardas,/ de céu neutro, política/ na maçã, no santo, no gozo,/ amor e desamor, cólera/ branda, gim com água tônica,/ olhos pintados, dentes de vidro,/ grotesca língua torcida./ A isso chamamos: balanço.”
  • 19
    Confiram-se, por exemplo, “A noite dissolve os homens”, “Elegia 1938”, “A bruxa”, O boi”, “Passagem da noite”, “Notícias”, “Anoitecer” e “Jardim”.
  • 20
    Notícias da época confirmam o pânico da população. Na edição de 06 de julho de 1922, o jornal A Pátria publicou: “O despertar dos moradores dos lindos bairros atlânticos de Copacabana, Leme e Ipanema foi, na madrugada de ontem, terrível. As famílias dispunham-se a abandonar as suas residências apressadamente, na imminência do forte que estava revoltado, ser bombardeado pelas tropas legais. Desde as primeiras horas do dia, um inumerável cortejo de todas as características sociais, em automóveis, bonds, caminhões do Corpo de Bombeiros e carroças, desfilava pela rua Barroso, direção a Botafogo, pelo Tunel Velho.// Os moradores do Leme cujo bairro estava sendo alvejado pelos 7 ½ do forte de Copacabana retiravam-se a conselho da própria autoridade. O forte de cinco a cinco minutos disparava para a entrada do Tunel Novo, onde estavam alojadas as tropas do 3º Regimento de Infantaria..” Disponível em: http://www1.uol.com.br/rionosjornais/rj28.htm Acesso em: 12 maio 2018.
  • 21
    A 09 de junho de 1975, na versão publicada de seu diário, Carlos Drummond de Andrade registrou a agressividade dos tempos áureos do Correio da Manhã: “O nome do Correio despertava susto e medo entre políticos e governantes, embora o jornal já não fosse o mesmo dos tempos do seu fundador Edmundo Bittencourt, que se distinguiu pela terrível agressividade. A imprensa modernizada já não comportava clima demolidor. Ainda assim, um editorial ou mesmo um tópico do Correio deixava marca na pele do atingido.” (OE, op. cit., p. 1088). O escritor reconhece no Correio um jornal “combatente” (idem, p. 1088), “conservador de tendências liberais” (idem, p. 1089).
  • 22
    Seguimos reflexão de João Camillo Penna em Drummond, testemunho da experiência humana. De acordo com o crítico, no momento em que a poesia drummondiana tornou-se menos participativa, o escritor voltou sua pena interventiva para os escritos em prosa, publicados no Correio da Manhã: “É no momento em que se fixa a forma-crônica drummondiana que surge paralelamente algo como um Drummond cívico. É ele o cidadão morador da capital do Brasil, interessado nos acontecimentos da cidade, que utiliza a prerrogativa da escrita e do espaço de visibilidade que lhe é conferido para intervir nos negócios da urbe, falando do lugar republicano de qualquer um, e reivindicando os direitos de um qualquer - que se materializará nos anos seguintes na figura de João Brandão, espécie de figura genérica, vazia do cidadão.” (PENNA, 2011PENNA, João Camillo. Drummond, testemunho da experiência humana. Brasília: Abravídeo, 2011. , p. 100)
  • 23
    Funcionário do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional durante quase duas décadas, Carlos Drummond de Andrade deparou-se com o péssimo estado de conservação do patrimônio público ainda jovem, graças à influência de Mário de Andrade. Em carta ao amigo, datada de 1928, o jovem escritor mineiro indigna-se: “Estou positivamente desolado com o que acaba de suceder. Você me pede fotografias, datas de construção e mais informes sobre igrejas mineiras e eu lhe contesto com quase nada, pois quase nada me arranjaram.” O resultado da pesquisa é desolador: “Acabei verificando que não havia nada, e que a tradição em Minas é uma blague (como eu já suspeitava, aliás).” (ANDRADE & ANDRADE, 2002ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar , 2002. , p. 341)
  • 24
    Expressão cunhada por Henri-Pierre Jeudy em Memórias do social (1990JEUDY, Henri-Pierre. Memórias do social. Tradução de Márcia Cavalcanti. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. )

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2018
  • Aceito
    01 Abr 2019
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