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A relação hostil entre poeta e público - uma leitura de "O Cão e o Frasco", de Charles Baudelaire1 1 O presente texto é desenvolvimento de alguns tópicos abordados em comunicação apresentada no Congresso Internacional da Associação Brasileira de Literatura Comparada (ABRALIC), em agosto de 2018.

The hostility between poet and public - a reading of "Le Chien et le Flacon", de Charles Baudelaire

Resumo

Na produção de Charles Baudelaire, a relação entre poeta e público tende a ser marcada pela violência, hostilidade ou desencontro. O caráter dialógico, fundamental para a poética do autor, é abordado mais diretamente no poema em prosa "O Cão e o Frasco", em que o endereçamento ao leitor surge permeado pela agressividade, ironia e revestido de ambiguidades. Por meio da investigação de alguns aspectos deste poema em prosa, bem como do comentário de outros textos do autor, o presente trabalho pretende delinear como a hostilidade entre poeta e público, atravessada pela violência direcionada a si mesmo e à composição da obra, parece constituir ambivalências interessantes, alicerces de uma poética baudelairiana da contradição. Além de promover a indeterminação dos sentidos, esse dispositivo seria capaz de gerar matizes críticos direcionados não só à maneira como artista e público se relacionam com a poesia mas também à forma como a lírica se constitui.

Palavras-chave
Charles Baudelaire; poema em prosa; violência; leitor

Abstract

In the work of Charles Baudelaire, the relation between the poet and his public tends to be marked by violence, hostility or mismatch. The dialogical trait, fundamental to the poetics of the author, is openly addressed in the prose poem "Le Chien et le Flacon", in which the approach to the reader is permeated by aggression, irony and coated with ambiguities. By the study of certain aspects of this prose poem, along with the commentary of other texts from the author, this work aims to show how the hostility between the poet and his public, crossed by the violence also addressed to himself and the production of his work, seems to create ambivalences that would be the groundwork of a baudelairian poetics of contradiction. Besides promoting the indetermination of the senses, this artifice would be capable of creating critical hues directed not only to the relations between the artist, the public and his composition, but also aimed to the manner lyric itself is conceived.

Keywords
Charles Baudelaire; prose poem; violence; reader

Résumé

Dans l'œuvre de Charles Baudelaire, la relation entre le poète et le public a tendance à être marquée par la violence, l'hostilité ou le désaccord. Le caractère dialogique, base fondamentale de la poétique de l'auteur, est traité plus directement dans le poème en prose "Le Chien et le Flacon", où l'adresse au lecteur se présente enlacée par l'agressivité, l'ironie et est recouverte d'ambiguïtés. Par l'étude de différents aspects de ce poème en prose, ainsi que par le commentaire d'autres textes de l'auteur, on se propose d'esquisser comment l'hostilité entre poète et public, associée à la violence qui a pour destinataire l'auteur lui-même et la composition de son œuvre, semble constituer des ambivalences qui seraient les charpentes d'une poétique baudelairienne de la contradiction. Outre la promotion de l'indétermination des sens, ce dispositif serait capable de créer des nuances critiques non seulement orientées vers les rapports entre l'artiste, le public et la poésie, mais aussi à la manière dont la lyrique s'établit.

Mots-clé
Charles Baudelaire; poème en prose; violence; lecteur

Na obra de Charles Baudelaire uma certa violência, hostilidade ou "desencontro" tendem a surgir nos poemas que abordam a ligação com o leitor. O diálogo entre autor e público, um dos sustentáculos da poesia baudelairiana, é retratado nos textos do poeta revestido de provocações e ironia, figurando uma espécie de convite ao confronto bastante ambivalente. Os golpes, que têm como alvo não apenas o leitor, mas também o próprio autor, aparentam estar envoltos em artifícios sedutores e agressivos, construindo uma relação contraditória. Reunidos nesse paradoxo, artista e público parecem tramar a obra poética por meio de atos brutais. No poema em prosa "Espanquem-se os pobres", o narrador apresenta uma luta que faz com as duas personagens se tornem "iguais" - é como um "semelhante" que Baudelaire se refere ao leitor no poema dedicado a este em As Flores do Mal ("- Hipócrita leitor, meu igual, meu irmão!" LARANJEIRA, 2011: 24BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Martin Claret, 2011.). Talvez o texto com a abordagem mais direta à difícil relação com o público seja o poema em prosa "O cão e o frasco", provavelmente "o poema mais agressivo que Baudelaire já escreveu2 2 Os textos em língua estrangeira terão a tradução da autora, salvo exceções, como os textos e poemas em prosa e em verso de Baudelaire, em que o tradutor será mencionado com a indicação entre parênteses do sobrenome seguido pelo ano e página da edição. " (THÉLOT, 1993: 19) THÉLOT, Jérôme. Baudelaire, Violence et poésie. Paris: Éditions Gallimard, 1993.. A última de suas frases compara o leitor a um cão "a quem nunca se devem apresentar perfumes delicados que o exasperem, mas somente imundícies cuidadosamente escolhidas" (MOTTA, 1995: 31) BAUDELAIRE, Charles. O Spleen de Paris: pequenos poemas em prosa. Apresentação e tradução de Leda Tenório da Motta. Rio de Janeiro: Imago, 1995., sentença que costuma ser empregada pela crítica para reafirmar o divórcio existente entre o poeta e seus leitores. O texto foi publicado como o oitavo da primeira série de nove poemas em prosa reunidos sob o título "Pequenos poemas em prosa", veiculada em 26 de agosto de 1862 no jornal de grande circulação La Presse, precedida da dedicatória a Arsène Houssaye. Retomado na edição póstuma O Spleen de Paris, que foi organizado em 1869 e reuniu 50 poemas em prosa, "O Cão e o Frasco" ocupa a mesma posição e, junto a outros textos do autor que consideram a aliança com o público, parece contribuir para a constituição dessa relação como um espaço permeado pela violência, ou o descompasso. Porém, mais que reiterar o desentendimento entre autor e leitor, esse laço agressivo seria capaz de criar ambiguidades interessantes, que constituiriam os pilares de uma poética fundada na contradição, ligada não apenas à indeterminação dos sentidos, mas também a uma modalidade de espírito crítico direcionada à maneira como a lírica se estabelece.

Para nos concentrarmos no comentário mais detido desse aspecto de "O Cão e o Frasco", iremos inicialmente desenvolver alguns elementos que consideramos centrais para a compreensão da forma pela qual a agressividade é empregada na poética baudelairiana. A princípio, é preciso lembrar que esse tipo de hostilidade, "combate", ou "desencontro" não é uma invenção de Baudelaire ou do século XIX. A sugestão de que poeta e público não se compreendem, de que fazer literatura é uma "batalha" ou um ato agressivo pode ser considerada um topos literário que remonta à Antiguidade grega e latina3 3 O crítico Antoine Compagnon tratou da maneira como diversos autores abordaram o topos da "batalha" literária ao longo da história em um curso chamado Da literatura como esporte de combate, no Collège de France, em Paris, entre 2016 e 2018. O resumo do curso traz alguns exemplos de como a "luta" em literatura rende frutos: "De uma pena de ferro sobre um papel de aço", é dessa maneira que Ronsard, combatente da causa católica e real, se dirige à Catarina de Médicis em 1562. 'A caneta é mais forte que a espada', resume Edward Bulwer-Lytton em seu drama Richelieu, em 1839. Gautier dizia de Scudéry, o capitão Fracasse, que ele "deixaria a espada pela pena e não usaria pior uma que a outra". Desde Homero e Hesíodo, a poesia é também uma agonística [termo que designa, na Antiguidade greco-romana, a ciência e prática dos combates ou lutas corporais; na retórica, diz respeito a antigos jogos dialéticos, técnica de argumentação usada para fazer valer uma opinião]. No século XIX, a questão do duelo, das duras críticas literárias está por toda a parte. No século XX, ela foi substituída pelo boxe em Hemingway ou Montherlant. A longa história da metáfora da "pena de ferro", depois da "esgrima", do "boxe literário" será explorada." Disponível em <https://www.college-de-france.fr/site/antoine-compagnon/course-2016-2017.htm>, consultado em 10 de janeiro de 2018. . Na tradição em língua portuguesa, o lugar-comum surge nos versos finais de Os lusíadas, poema épico de Camões do século XVI. Na estrofe 145, o poeta se lamenta por ter "a Lira destemperada" e a "voz enrouquecida", não em razão da longa extensão do poema, mas por cantar para "gente surda e endurecida", envolvida no "gosto da cobiça e da rudeza", e que por esse motivo não ouve ou dá valor ao que é oferecido pelo autor.

Em Baudelaire, no entanto, a relação desencontrada entre poeta e público parece ser atravessada por outras duas vertentes: a violência contra si próprio e em direção à criação da obra. O "carrasco de si mesmo" é abordado em um conhecido poema do autor, "O Heaut ontimoroumenos", parte da seção "Spleen e Ideal", de As Flores do Mal. Baudelaire possivelmente teve acesso ao termo, que tem o sentido de "algoz de si próprio", por intermédio de Joseph de Maistre, que o emprega na terceira palestra de As Noites de São Petesburgo4 4 De acordo com o comentário ao poema da edição francesa das Obras Completas, com notas e comentários de Claude Pichois da coleção “Bibliothèque de la Pléiade” : BAUDELAIRE, C. Œuvres Complètes, Org. Claude Pichois. Paris : Gallimard, 1975 (reimpressão em 2010), 2 volumes. A obra será utilizada como referência para os textos em francês de Baudelaire e citada com a abreviação “OC”, o algarismo romano designa o volume, e o número arábico a página. Pichois reproduz a citação de J. de Maistre em As Noites de São Petesburgo: "tout méchant est un Heautontimoromenos", indicando que o termo é também o título bastante conhecido de uma comédia de Terêncio, dramaturgo e poeta romano que viveu entre 185 a.C. - 159 a.C. (OC I: 985). . No poema, o autor lista uma série de atitudes violentas dirigidas contra o outro e contra si:

L'HÉAUTONTIMOROUMÉNOS À J. G. F. Je te frapperai sans colère Et sans haine, comme un boucher, Comme Moïse le rocher! Et je ferai de ta paupière, Pour abreuver mon Sahara, Jaillir les eaux de la souffrance. Mon désir gonflé d'espérance Sur tes pleurs salés nagera Comme un vaisseau qui prend le large, Et dans mon cœur qu'ils soûleront Tes chers sanglots retentiront Comme un tambour qui bat la charge! Ne suis-je pas un faux accord Dans la divine symphonie, Grâce à la vorace Ironie Qui me secoue et qui me mord? Elle est dans ma voix, la criarde! C'est tout mon sang, ce poison noir! Je suis le sinistre miroir Où la mégère se regarde. Je suis la plaie et le couteau! Je suis le soufflet et la joue! Je suis les membres et la roue, Et la victime et le bourreau! Je suis de mon cœur le vampire, - Un de ces grands abandonnés Au rire éternel condamnés Et qui ne peuvent plus sourire!5 5 Sem cólera em ti baterei/ Como o açougueiro, sem sanha,/ Como Moisés na montanha,/ E de tua pupila farei,// Para molhar meu Saara,/ Brotar as águas do sofrer./ Meu desejo com esperança/ No amargo pranto nadará// Como um navio no mar vaga,/ E no peito que embriagarão/ Teus caros ais reboarão/ Como um tambor que bate a carga.// Não sou acaso um falso acorde/ Nessa divina sinfonia,/ Graças à vivaz ironia/ Que me sacode e que me morde?// Está na minha voz gritante!/ É o sangue que negro gira!/ Sou o espelho deformante/ Em que a megera se mira.// Eu sou a chaga e a espada!/ Sou o rosto e o bofete atroz!/ Sou o membro e a roda dentada,/ E sou a vítima e o algoz!// Do meu coração um vampiro,/ - Um desses grandes largados/ Ao riso eterno condenados/ E que não tem mais sorriso! (LARANJEIRA, 2011: 97-98). (OC I: 78-79)

Os versos são ricos em imagens que compõem a estética de Baudelaire, mas o que vale ressaltar neste trabalho é uma de suas ideias principais, que surge na parte final, de "agressor de si mesmo". Questionando-se sobre seu "descompasso" ("Não sou acaso um falso acorde") com origem na "Ironia" - escrita com a capitular, sugerindo o potencial alegórico do termo -, o eu-poético afirma ser o "espelho deformante", após o qual se sucedem as imagens de agressão a si mesmo multiplicadas por meio do "Eu sou...". Em linhas gerais, o sujeito poético inicia os versos dirigindo sua violência ao outro, traz para dentro si os efeitos do sofrimento alheio, questiona-se a respeito da Ironia que o "sacode", e pluraliza-se pelo reflexo em figuras que voltam os ataques para si mesmo. No poema, parece estar em jogo a consciência da hostilidade contra o outro, "espelhada" ou mediada pela agressividade contra si mesmo. O crítico Jean Starobinski faz uma leitura bastante detida do poema, pela chave da melancolia, e indica que nele "Baudelaire substitui uma agressividade humoral pela agressividade de um ato de consciência" (STAROBINSKI, 2014STAROBINSKY, Jean. A melancolia diante do espelho: três leituras de Baudelaire. Tradução Samuel Titan Jr. São Paulo: Editora 34, 2014.: 29), transmutando a melancolia e privilegiando sua ponta mais afiada, fazendo com que assuma feições bestiais. Ou seja, por meio dessa conversão da melancolia em um ato lúcido, o poeta se reconhece, identifica a atividade do eu-poético e se torna também alvo dos próprios ataques.

Esse ato de consciência agressivo em relação a si repercute também no modo como o poeta trata a criação de suas obras. O gesto de construir um poema é visto como um trabalho difícil e violento, descrito nos poemas e ensaios do autor como uma "luta" ou uma tarefa dolorosa, em que o autor se fere na medida em que compõe e carrega as marcas do "combate". Uma das imagens empregada pelo escritor para descrever a atividade literária é a "fantástica esgrima", que surge na primeira estrofe de "O Sol", poema da seção "Quadros Parisienses" de As Flores do Mal:

Le long du vieux Faubourg, où pendent aux masures Les persiennes, abri des secrètes luxures, Quand le soleil cruel frappe à traits redoublés Sur la ville et les champs, sur les toits et les blés, Je vais m'exercer seul à ma fantasque escrime, Flairant dans tous les coins les hasards de la rime, Trébuchant sur les mots comme sur les pavés, Heurtant parfois des vers depuis longtemps rêvés.6 6 Pela velha avenida, onde pende aos tugúrios/ Muita persiana, abrigo de atos espúrios,/ Quando esse sol cruel bate em raios fatais/ Sobre a cidade e o campo, os tetos e os trigais,/ Exerço-me sozinho a fantástica esgrima,/ Cheirando em todo canto os acasos da rima,/ Tropeçando em palavras como em chão calçado,/ Chocando muita vez em verso já sonhado. (LARANJEIRA, 2011: 104) (OC I: 83)

A imagem recompõe a maneira como o sujeito solitário se dedica a uma espécie de esgrima, uma luta ritmada em que os participantes visam atingir o oponente e se proteger dos ataques alheios. Nessa tarefa, os "golpes" necessários à criação artística acabam ferindo não apenas a obra, mas também o poeta. Na edição de 1857, "O Sol" era o segundo poema de As Flores do Mal (parte de "Spleen e Ideal"), posição que, em 1861, foi ocupada por "O Albatroz". Ambos, portanto, podem ser lidos como representações da figura do poeta. A ideia da esgrima, dos ataques direcionadas aos versos e do tormento infligido ao artista durante a atividade criativa está também em "O Pintor da Vida Moderna", no conhecido trecho em que Baudelaire aborda a atividade do pintor Constantin Guys:

[...] s'escrimant avec son crayon, sa plume, son pinceau, faisant jaillir l'eau du verre au plafond, essuyant sa plume sur sa chemise, pressé, violent, actif, comme s'il craignait que les images ne lui échappent, querelleur quoique seul, et se bousculant lui-même7 7 [...] esgrimindo com seu lápis, sua pena, seu pincel, respingando no teto a água do copo, limpando a pena na camisa, apressado, violento, ativo, como se temesse que as imagens lhe escapassem, brigando sozinho, debatendo-se consigo mesmo. . (OC II: 693)

Na passagem, em que a tarefa de criar se torna um árduo trabalho, o artista é figurado como alguém violento, agitado e cujas estocadas são direcionadas à obra e a si próprio, em um penoso esforço durante a composição. Essa imagem do poeta que se esforça e tropeça à procura da poesia é recuperada também em "O vinho dos trapeiros"8 8 "On voit un chiffonnier qui vient, hochant la tête,/ Butant, et se cognant aux murs comme un poète,/ Et, sans prendre souci des mouchards, ses sujets,/ Épanche tout son cœur en glorieux projets." (OC I: 106) "Vê-se um trapeiro vir, a cabeça meneando,/ A bater nas paredes qual poeta, tropeçando,/ E sem se preocupar com espiões, seus sujeitos,/ Expande o coração em gloriosos projetos." (LARANJEIRA, 2011: 130). , poema CV de As Flores do Mal (seção "O Vinho"), publicado pela primeira vez em 1854, e também no texto "Do vinho e do haxixe"9 9 "Il arrive hochant la tête et butant sur les pavés, comme les jeunes poètes qui passent toutes leurs journées à errer et à chercher des rimes" (OC I: 381) "Chega meneando a cabeça e tropeçando nas pedras. Como os jovens poetas que passam os dias a errar e a procurar rimas." , de 1851.

Seria interessante mencionar que esse gesto hostil contra si e que também compõe a atividade de criação é um ato de consciência estreitamente relacionado à visão baudelairiana do martírio. A percepção do poeta em relação ao sacrifício parece se constituir em um gesto contraditório e ambivalente, que consiste em reconhecer a entrega incondicional ao suplício e também em assistir conscientemente ao próprio aniquilamento10 10 "La peine de Mort est le résultat d'une idée mystique, totalement incomprise aujourd'hui. La peine de Mort n'a pas pour but de sauver la société, matériellement du moins. Elle a pour but de sauver (spirituellement) la société et le coupable. Pour que le sacrifice soit parfait, il faut qu'il y ait assentiment et joie de la part de la victime. Donner du chloroforme à un condamné à mort serait une impiété, car ce serait lui enlever la conscience de sa grandeur comme victime et lui supprimer les chances de gagner le Paradis." (OC I: 683). "A pena de morte é o resultado de uma ideia mística, totalmente incompreendida hoje em dia. A pena de morte não visa a salvar a sociedade, ao menos materialmente. Ela visa a salvar (espiritualmente) a sociedade e o culpado. Para que seja perfeito o sacrifício, cumpre haver assentimento e alegria, por parte da vítima. Dar clorofórmio a um condenado à morte seria uma impiedade, pois implicaria tirar-lhe a consciência da própria grandeza como vítima e suprimir-lhe as oportunidades de ganhar o Paraíso." (BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA, A., 1981: 72) . Ou seja, o sacrifício seria um ato consentido e apreciado pela vítima. A posição de Baudelaire em relação ao martírio não estaria baseada no modelo cristão da conquista da redenção ou, como em Joseph de Maistre, da restauração da ordem natural das coisas - em si mesmo, o sacrifício seria esse ato duplo, oximórico e consciente. A constituição da subjetividade poética estaria, assim, calcada nesse gesto ambíguo de enxergar-se como vítima, entregar-se ao sofrimento e contemplar a própria imolação. Esse processo, resgatado pelas palavras, fundaria o poema. A "contradição ou o oxímoro da morte vivida", de acordo com os termos do crítico Marcos Siscar (2010: 44) SISCAR, Marcos. Poesia e crise: ensaios sobre a "crise da poesia" como topos da modernidade. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2010., seria o dispositivo pelo qual a engrenagem poética de Baudelaire estaria refletindo a existência moderna, em que o eu-poético e a poesia se reconhecem como vítima e algoz de si mesmo, simultânea e conscientemente.

Ao que parece, reunindo a hostilidade contra si e a violência contida na criação da obra, por meio da perspectiva singular do sacrifício, Baudelaire retoma o topos, a figura da luta em literatura e do desencontro entre autor e leitor da tradição, promovendo uma releitura do lugar-comum e abrindo uma espécie de fenda crítica em seus poemas. São alguns desses princípios, constituintes da poética baudelairiana, que aparentam estar em jogo em "O Cão e o Frasco", poema em prosa que traz a espinhosa relação com o público e costuma ser citado para exemplificar a fúria que o poeta podia demonstrar contra os contemporâneos e os leitores que não lhe faziam justiça:

LE CHIEN ET LE FLACON "- Mon beau chien, mon bon chien, mon cher toutou, approchez et venez respirer un excellent parfum acheté chez le meilleur parfumeur de la ville." Et le chien, en frétillant de la queue, ce qui est, je crois, chez ces pauvres êtres, le signe correspondant du rire et du sourire, s'approche et pose curieusement son nez humide sur le flacon débouché; puis, reculant soudainement avec effroi, il aboie contre moi, en manière de reproche. "- Ah! misérable chien, si je vous avait offert un paquet d'excréments, vous l'auriez flairé avec délices et peut-être dévoré. Ainsi, vous-même, indigne compagnon de ma triste vie, vous ressemblez au public, à qui il ne faut jamais présenter des parfums délicats qui l'exaspèrent, mais des ordures soigneusement choisies."11 11 "Meu belo cão, meu bom cão, meu querido totó, aproxime-se e venha respirar um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade."/ E o cão, mexendo o rabo, o que é, acho, nesses pobres seres, o sinal correspondente ao riso e ao sorriso, aproxima-se e curiosamente pousa o úmido nariz no frasco aberto; depois, subitamente recuando de pavor, late para mim, à guisa de reprovação./ "Ah, miserável cão, se lhe tivesse oferecido um embrulho de excrementos o teria farejado com delícia e talvez devorado. Assim, até você, indigno companheiro de minha triste vida, se parece com o público, a quem nunca se devem apresentar perfumes delicados que o exasperem, mas somente imundícies cuidadosamente escolhidas. (MOTTA, 1995: 31) (OC I: 284)

Em linguagem aparentemente simples, composto por invectivas diretas, o texto resultaria em um conjunto tão banal e evidente, que dispensaria longos comentários, levantando até mesmo à dúvida se poderia ser chamado de poema em prosa. Para parte da crítica, ele seria um dos "menos interessantes" (HIDDLESTON, 1987: 88) HIDDLESTON, J. A. Baudelaire and Le Spleen de Paris. Oxford: Clarendon Press, 1987. da reunião de O Spleen de Paris. Uma porção considerável das leituras do texto tende a considerá-lo como uma alegoria bastante clara da situação do artista no século XIX, como exemplificam os comentários das Obras Completas francesas, bem como da edição dos Pequenos Poemas em Prosa, organizada e anotada pelo crítico Robert Kopp: "Esse poema, alegoria e boutade de uma só vez, retoma um tema de que a obra e a correspondência de Baudelaire oferecem inúmeras variações: o do isolamento e da impopularidade do gênio, do divórcio entre o artista e o público". (BAUDELAIRE, 1969: 207) BAUDELAIRE, Charles.Petits poèmes en prose. Édition critique par Robert Kopp. Paris: Librairie José Corti, 1969.

É a mesma posição de Sonya Stephens, que afirma que o texto, que parece ter um sentido bastante claro, pode ser lido como uma "alegoria da recepção" (STEPHENS 1999: 21) STEPHENS, S. Baudelaire's prose poems - The Practise and Politics of Irony. Oxford: Oxford University Press, 1999.. Stephens retoma as palavras do crítico Henri Lemaître que, em sua edição dos Petits Poèmes en Prose12 12 BAUDELAIRE, C. Petits Poèmes en Prose. Introduction, notes, bibliographie et choix des variantes par Henri Lemaître. Paris: Garnier, 1962. , considerou "O Cão e o Frasco" como um "poème-boutade", uma espécie de gênero literário em que toda a desilusão e rancor do poeta se expressam de maneira breve e incisiva. Em seu rápido comentário, Stephens cita este poema em prosa como constituinte de uma entrada textual que parece representar o "limite mais baixo da poesia, não mais sugestiva, mas fortemente explicada" (STEPHENS, 1999: 22STEPHENS, S. Baudelaire's prose poems - The Practise and Politics of Irony. Oxford: Oxford University Press, 1999.).

Além da crítica à linguagem trivial e óbvia, o comentário especializado ressalta a relação com o leitor, claramente figurada pelo texto. Sabe-se que a ligação com o público ocupa um papel central na obra de Baudelaire, um autor que "pretendia ser compreendido; por isso dedica seu livro àqueles que lhe são semelhantes" (BENJAMIN, 1989: 103) BENJAMIN, Walter. Charles Baudelaire um lírico no auge do capitalismo (Obras escolhidas v.3). Tradução de José Martins Barbosa, Hemerson Alves Baptista. São Paulo: Brasiliense, 1989. . Desde sua primeira edição, As Flores do Mal trazem em sua abertura o poema já citado dedicado ao leitor - "hipócrita", "semelhante" e "irmão" -, colocando a figura do público em posição fundamental e inaugurando a provocação ambivalente e sarcástica que marcaria a ligação do poeta com seu público. É também na primeira série publicada em periódicos que Baudelaire posiciona "O Cão e o Frasco", ressaltando a relevância da solicitação do destinatário, da relação dialógica de sua poesia, bem como da violência e ironia que constituem esse laço. Face ao convite do poeta, o leitor é instado a sair de uma posição confortável e reagir aos textos.

Comentando a obra poética de Baudelaire, o crítico Claude Pichois afirma que no autor

a poesia não é mais um jogo, o mais nobre dos divertimentos; ela se torna agressão. O leitor não pode se contentar em ser o espectador inteligente e sensível do que oferece o poeta [...] Ele deve 'entrar no jogo'. Ele deve viver o sofrimento, purificá-lo por seu próprio canto, recriar o êxtase, experimentar o longo remorso, maldizer, rezar e suplicar. (PICHOIS, 1967: 216) PICHOIS, Claude. Études et Teimognages. Neuchâtel, La Baconnière, 1967.

O crítico afirma que Baudelaire transformou o poeta em um artista responsável por uma poesia feita pelo poeta bem como pelo leitor, conceito que remonta às origens antigas da poesia e é, por sua vez, bastante moderna. É nesse sentido que poderia ser entendido o verso final do poema "Ao Leitor": um convite urgente à comunicação poética ou à "ação poética" feita em conjunto por autor e público.

Essa atitude ativa do leitor se dá, principalmente, por intermédio da hostilidade. A violência de que trata "O Cão e o Frasco", no entanto, está não apenas na provocação, na comparação mais explícita do público ao cão farejador de excrementos, mas também no conflito entre os interesses do narrador-dono e do leitor-cão: o narrador oferece um "excelente perfume", presente que é rejeitado e cujo doador é reprovado. Só então o narrador classifica o cão de "miserável" e o compara ao público.

Os termos que Baudelaire emprega para compor esse embate podem ser aproximados a um trecho de "Meu coração desnudado", também agressivo, em que o poeta descreve "o Francês" com quase as mesmas palavras que utiliza para retratar o cão do pequeno poema em prosa:

Le Français est un animal de basse-cour, si bien domestiqué qu'il n'ose franchir aucune palissade. Voir ses goûts en art et en littérature. C'est un animal de race latine; l'ordure ne lui déplaît pas dans son domicile, et en littérature, il est scatophage. Il raffole des excréments. Les littérateurs d'estaminet appellent cela le sel galois. Bel exemple de bassesse française, de la nation qui se prétend indépendante avant toutes les autres.13 13 O francês é um animal de galinheiro tão bem domesticado que não ousa transpor nenhuma paliçada. Ver os seus gostos em arte e em literatura./ É um animal de raça latina; a imundície não lhe desagrada, no seu domicílio, e, em literatura, é escatófago. É doido por excrementos. A isso as literaturas de botequim chamam o sal gaulês. Belo exemplo de baixeza da França, da nação que se pretende independente acima de todas as demais. (BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA, A., 1981: 114). (OC I: 698)

No fragmento, Baudelaire compara "o Francês", um modo de se referir aos franceses em geral - e a si próprio, pois o poeta também é francês -, a um "animal de galinheiro" com gostos artísticos e literários pouco arrojados, a quem as imundícies são agradáveis. Em literatura, "o Francês" é escatófago, ou seja, ingere excrementos e sente prazer nisso. Além da aproximação dos compatriotas aos animais, a passagem também compara a literatura aos excrementos consumidos pelos franceses. O trecho, que contém textos escritos por volta de 1859, não exime o poeta e a obra composta por ele dos próprios insultos: além de francês, Baudelaire é produtor de textos literários - os excrementos ingeridos com gosto pelos franceses.

A analogia entre obra literária e as "imundícies" é também empregada pelo poeta nos projetos de prefácio para o que seria a segunda ou terceira edição de As Flores do Mal:

J'avais mis quelques ordures pour plaire à MM. les journalistes. Ils se sont montrés ingrats. (Projet [II] OC I: 183)

Car moi-même, malgré les plus louables efforts, je n'ai su résister au désir de plaire à mes contemporains, comme l'attestent en quelques endroits, apposées comme un fard, certaines basses flatteries adressées à la démocratie, et même quelques ordures destinées à me faire pardonner la tristesse de mon sujet. Mais MM. les journalistes s'étant montrés ingrats envers les caresses de ce genre, j'en ai supprimé la trace, autant qu'il m'a été possible, dans cette nouvelle édition14 14 "Eu tinha colocado algumas imundícies para agradar aos jornalistas. Eles se mostraram ingratos." "Pois eu mesmo, apesar dos esforços mais louváveis, não soube resistir ao desejo de agradar aos meus contemporâneos, como atestam, em alguns lugares, aplicadas como uma maquiagem, certas baixas adulações dirigidas à democracia, e até algumas imundícies destinadas a fazer com que me perdoem a tristeza de meu assunto. Mas, como os jornalistas se mostraram ingratos com as carícias desse tipo, retirei todos os seus vestígios, tanto que me foi possível, nesta nova edição." . (Projet [III] OC I: 184)

As passagens, que juntamente ao excerto de "Meu coração desnudado", foram inicialmente identificados a "O Cão e o Frasco" pela edição crítica francesa dos Journaux Intimes, de Crépet et Blin (BAUDELAIRE, 1949BAUDELAIRE, Charles. Journaux Intimes: Fusées, Mon Cœur Mis à nu. Édition critique établie par Jacques Crépet et Georges Blin. Paris: José Corti, 1949.: 385-386), revelam de que maneira Baudelaire chama alguns de seus poemas de "imundícies" oferecidas ao público (ou aos "jornalistas", expressamente mencionados nos trechos) com o objetivo de lhes agradar, gesto que, contudo, não é valorizado, pois seu público se mostra "ingrato". Em vez de criar objetos de arte, o poeta se dedica à composição de "imundícies" ("ordures") e "excrementos" ("excréments"), violentando a obra que talvez pudesse ser inspirada por belos ideais estéticos.

Em um dos esboços de prefácio, o autor escreve ainda que não resistiu ao "desejo de agradar" a seus contemporâneos e menciona algumas "adulações" à democracia que foram adicionadas ao volume e outras "imundícies" - "carícias" não reconhecidas. É possível perceber o menosprezo ou desrespeito em relação ao poema e ao processo criativo, permeado pela relação descompassada com o público. Nos trechos, assim como em "O Cão e o Frasco", a hostilidade que atravessa a relação com o leitor se mescla à dificuldade em relação à apresentação da obra literária: por um lado, há violência nas mãos do autor, que cria "imundícies" ou "adulações" e as dirige a seu leitor esperando que ele as aceite como "carícias", e de outro lado há um leitor que não as reconhece e se mostra ingrato.

Mais que uma mera confissão de orgulho ferido, a atitude do poeta que trata sua obra como "imundícies" e a relaciona ao irresistível "desejo de agradar" (não correspondido) posiciona a arte no campo da sedução e da adulação, parecendo inserir um significativo questionamento do papel da poesia. Em linhas gerais, a adulação é parte da doutrina clássica da civilidade - sistema artificial elaborado nos cursos italianos do século XVI e nos salões parisienses do século XVII, composto de sofisticadas regras por meio das quais a violência intrínseca às relações humanas poderia ser não apenas sufocada como transformar-se em fonte de prazer15 15 A intenção aqui não é trazer uma análise profunda da doutrina da civilidade e do significado da adulação, mas mencionar apenas alguns aspectos que possam trazer pistas da relação estabelecida entre autor, obra e leitor em Baudelaire. Jean Starobinski dedicou-se ao assunto no ensaio "De la Flatterie", disponível em português no capítulo "Sobre a adulação" em STAROBINSKI, J. As máscaras da civilização: ensaios. Tradução de Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001: 57-85. . Por meio da artificialidade, as relações adquirem aspectos teatrais e construídos, que os indivíduos passam a administrar. Sendo assim, o jogo da civilidade ganha a possibilidade de se tornar puro divertimento estético, quando apenas as aparências e a prazerosa imagem fictícia que os sujeitos constroem para si e para o outro são consideradas. Na medida em que os participantes se esquivam de qualquer responsabilidade moral e abrem mão da essência verdadeira das relações, tem lugar a "adulação". Ela designa uma espécie de negociação em que "palavras" (lisonjeiras e elogiosas) são trocadas por "favores". Além do prazer do jogo estético, há o interesse que se soma ou se sobrepõe às relações.

Na história literária, o adulador e o adulado são aproximados a figuras de animais e relacionados à semântica do apetite e da alimentação - aquele que recebe as lisonjas se "alimenta" da ilusão fornecida pelo adulador e oferece, em retribuição, algum favor. As fábulas de La Fontaine, como "A raposa e o corvo", trazem pistas da aproximação dos termos, que é também sugerida pela etimologia da palavra latina adulari, da qual provém "aduler" em francês e "adular" em português. "O verbo parece ter tido na origem um sentido concreto, como o grego σαὶνω, e ser dito dos animais, particularmente dos cães, que, para testemunhar sua alegria ou adular seu dono, se aproximam (ad-) movendo a cauda."16 16 A. Ernout e A. Meillet, Dictionnaire étymologique de la langue latine, Paris, 1939: 15, apud STAROBINSKI, 2001: 71.

O cão abanando a cauda para lisonjear o dono é bastante semelhante à imagem descrita por Baudelaire em "O Cão e o Frasco". O poeta, entretanto, parece transpor a adulação para o campo literário e representar a ligação autor-público17 17 Dirigindo-se a um público coletivo e anônimo, seja o leitor de periódicos, jornalistas ou críticos, Baudelaire faz seu endereçamento de maneira diversa dos poetas que direcionavam suas obras aos soberanos ou a outras figuras individuais, aos quais as lisonjas eram orientadas. Boileau é um dos exemplos em língua francesa, dedicando um longo poema ao rei em Discours au roi. BOILEAU, N. Oeuvres complètes de N. Boileau et suivie du Bolaeana (Nouvelle édition). Précédées de la vie de l'auteur d'après des documents nouveaux et inédits par M. Edouard Fournier ; nouvelle édition illustrée par M. Émile Bayard...de M. de Losme de Monchesnay (1873), disponível em <www.gallica.bnf.fr>, consultado em 10 de janeiro de 2018. como uma relação de bajulação ambivalente e sem sucesso. A figura do cão remete ainda à canaille, cuja etimologia remonta ao termo latino canis, de onde se origina "chien", cão, em francês e também em português. A palavra era constantemente empregada por Baudelaire ao mencionar certas figuras do campo literário, tratadas por vezes de maneira claramente hostil, por vezes de forma ambivalente, com desprezo e o apreço:

Par Canaille j'entends les gens qui ne se connaissent pas en poésie. (OC II: 233) Portrait de la canaille littéraire. Doctor Estaminétus Crapulosus Pédantissimus. Son portrait fait à la manière de Praxitèle. (OC I: 688) Les directeurs de journaux, François, Buloz, Houssaye, Rouy, Girardin, Texier, de Calonne, Solar, Turgan, Dalloz. - Liste de canailles. Solar en tête.18 18 Por Canalha entendo as pessoas que são incompetentes em poesia. Retrato da Canalha literária. Doctor Estaminetus Crapulosus Pedantissimus. Seu retrato feito à maneira de Praxíteles. (BUARQUE FERREIRA DE HOLANDA, 1981: 82) Os diretores de jornais, François Buloz, Houssaye, Rouy, Girardin, Texier, de Calonne, Solar, Turgan, Dalloz. Lista de canalhas, encabeçada por Solar (BUARQUE FERREIRA DE HOLANDA, 1981: 102) (OC I: 694)

A canaille, tida como aqueles que têm dificuldades em compreender poesia, seriam as figuras com os quais o poeta convivia no âmbito artístico, indivíduos que Baudelaire agride, mas aos quais precisa submeter sua arte (como A. Houssaye, a quem o poeta dedica o ambíguo texto publicado como prefácio aos Pequenos Poemas em Prosa, em 1862).

A figura do cão, portanto, parece ter mão dupla: na medida em que rebaixa aqueles que são o alvo do poema, colocados na posição de quem apenas pretende receber lisonjas do autor, denigre também o poeta, que precisa forjar sua obra de maneira artificial para que ela seja agradável àqueles a quem será submetida. Os adjetivos carinhosos empregados pelo autor no início da primeira frase de "O Cão e o Frasco", que parecem clichês ordinários de sedução, atuariam de maneira a testemunhar a inscrição do poeta no âmbito da adulação: "Meu belo cão, meu bom cão, meu querido totó (...)".

Por meio dessa perspectiva, seria possível entrever a razão pela qual a hostilidade contida no poema em prosa de Baudelaire se torna tão evidente: a literatura, desmascarada como uma relação de bajulação entre autor e público, transfigura-se em um ato agressivo e ambíguo - de um lado parte do poeta, que pretende seduzir seu leitor, porém deixa claro que lhe oferece um engodo ("um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade", presente adquirido e que não seria conveniente aos "cães"; ou "imundícies cuidadosamente escolhidas", "excrementos" produzidos com o único objetivo de agradar); de outro parte do público, que trata o autor não como um artista, mas como alguém que teria como o objetivo banal de lisonjear seus leitores, sendo assim digno também de ser adulado. Nesse sentido, as funções de poeta e público estariam distantes da verdadeira fruição estética, resumindo-se a uma vazia troca de afagos.

No poema, no entanto, essa permuta de benefícios é revestida pela ironia. O crítico Steve Murphy chama a atenção para o papel do "presente" ou "dádiva" em O Spleen de Paris, raramente envolto em boas intenções e, em sua maior parte, representando armadilhas (MURPHY, 2003: 73) MURPHY, S. Logiques du dernier Baudelaire -- Lectures du Spleen de Paris. Paris: Honoré Champion Éditeur, 2003. . Em "O Cão e o Frasco", o presente não é um oferecimento gratuito, mas algo entregue para que o doador se sinta reconhecido - uma gentileza ardilosa, ofertada com o objetivo de recebê-la em troca. Como em "O Heautontimoroumenos", o sarcasmo parece entrar em cena para gerar um curto-circuito na ligação entre autor e destinatário, entremeando o gesto ambivalente e violento do poeta em relação a si mesmo e à obra. O autor reconhece seu papel de adulador, resiste a entrar nessa função e opera de maneira irônica e contraditória, entregando um simulacro de "presente", inadequado; o leitor, por sua vez, percebe o embuste e reage ativamente com a agressão e reprovação.

Visto sob esse prisma, a relação agressiva entre poeta e público parece permitir a eclosão, neste pequeno poema em prosa, de uma aguda reflexão sobre o papel e os sentidos da lírica. Os três pequenos poemas em prosa que encerram a primeira série publicada em La Presse, "O Bobo e a Vênus", "O Cão e o Frasco" e "O Mau Vidraceiro", parecem tratar do que Edward K. Kaplan chamou de "busca artística" (KAPLAN, 2015: 63) KAPLAN, E. K. Baudelaire et Le Spleen de Paris: L'esthétique, l'éthique et le religieux. Paris: Classiques Garnier, 2015.. O crítico caracteriza os três textos como reflexões estéticas, nas quais o artista em geral busca um ideal permanentemente inalcançável. Em "O Cão e o Frasco", contudo, mais que a procura de um belo inatingível, o autor parece estar questionando a essência desse ideal, sua composição e seus fins. Das fendas do texto sobressai a meditação estética sobre a natureza da obra literária, representada pela dupla contraditória perfume-imundícies, composta para funcionar como simples objeto de troca entre autor e público, em um jogo de sedução ambíguo e mal-sucedido. O texto problematizaria a criação artística como um "presente" comercializado ou uma "lisonja", em que autor e público estariam em um acordo tácito de aceitação de embustes.

Vale mencionar que, nos poemas em prosa, a questão da violência costuma estar ligada a situações de ordem econômica (valor de produtos, posição social ou trocas monetárias), deixando claro quão ambígua e discutível seria a inserção da poesia, bem como de seus participantes, nesse sistema de trocas. O entendimento da arte como uma relação de adulação incluída nesse sistema demonstraria ainda o que há de paradoxal e contraditório na ligação entre autor, obra e leitor: o poeta oferece ao público uma trapaça com o objetivo de agradá-lo e seduzi-lo, mas, ao fazê-lo, violenta sua obra e, ao mesmo tempo, violenta-se. Como o sujeito de "O Heautontimoroumenos", a agressividade dirigida ao outro retorna: o poeta assume a posição de inocente e de culpado, assim como o público, que busca e rejeita a carícia do poeta.

É preciso ressaltar, entretanto, que a postura do poeta é, em si mesma, profundamente ambivalente - a reflexão dirigida às relações entre autor, obra e público não exibe conclusões ou soluções únicas. Em meio ao invólucro aparentemente banal da linguagem do pequeno poema em prosa "O Cão e o Frasco", a meditação em relação à poesia provoca o colapso dos critérios estéticos tradicionais, que se fundem em poderosos oxímoros: o autor compõe para ser aceito e para ser rejeitado, exige e despreza a boa-vontade do leitor, questiona e assume a lógica das trocas em que a criação artística se inscreve, traz perfumes que são imundícies, desfere golpes em seu público e em si mesmo. Esse ato poético, fundado na contradição, impede o estabelecimento de sentidos inequívocos para o texto, colocando a indeterminação como condutora da poesia. Atuando dessa forma, implodindo as bases estéticas pelas quais se institui a poesia, é possível dizer que Baudelaire promoveria algo como o martírio que alguns de seus poemas retratam19 19 Como nos poemas de As Flores do Mal "Uma mártir" (OC I: 111) ou "Uma viagem a Citera" (OC I: 117). . O autor parece dar indícios de que, para que a poesia se constitua como tal, ela tenha a tarefa de minar-se, apresentando-se como vítima voluntária e testemunhando conscientemente sua aniquilação. Transposto em palavras e imagens, o processo torna-se o poema, gerador de surpreendentes ruídos críticos que seriam os suportes constituintes de uma certa poética moderna. Por meio desse dispositivo, desafiando as bases tradicionais pelas quais a arte se constitui, a lírica seria, assim, o espaço privilegiado para discuti-la, colocando em xeque a forma como artista e público se relacionam com a poesia e a instituem. Em última instância, esse gesto poético de concepção da poesia seria um modo singular de refletir e considerar a própria existência como tal.

Referências bibliográficas

  • BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Martin Claret, 2011.
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  • BAUDELAIRE, Charles.Meu coração desnudado Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.
  • BAUDELAIRE, Charles Œuvres Complètes, Org. Claude Pichois. Paris : Gallimard, 1975 (reimpressão em 2010), 2 volumes.
  • BAUDELAIRE, Charles.Petits poèmes en prose Édition critique par Robert Kopp. Paris: Librairie José Corti, 1969.
  • BAUDELAIRE, Charles. O Spleen de Paris: pequenos poemas em prosa Apresentação e tradução de Leda Tenório da Motta. Rio de Janeiro: Imago, 1995.
  • BENJAMIN, Walter. Charles Baudelaire um lírico no auge do capitalismo (Obras escolhidas v.3) Tradução de José Martins Barbosa, Hemerson Alves Baptista. São Paulo: Brasiliense, 1989.
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  • PICHOIS, Claude. Études et Teimognages Neuchâtel, La Baconnière, 1967.
  • SISCAR, Marcos. Poesia e crise: ensaios sobre a "crise da poesia" como topos da modernidade Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2010.
  • STAROBINSKY, Jean. As máscaras da civilização: ensaios Tradução de Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
  • STAROBINSKY, Jean. A melancolia diante do espelho: três leituras de Baudelaire Tradução Samuel Titan Jr. São Paulo: Editora 34, 2014.
  • STEPHENS, S. Baudelaire's prose poems - The Practise and Politics of Irony Oxford: Oxford University Press, 1999.
  • THÉLOT, Jérôme. Baudelaire, Violence et poésie Paris: Éditions Gallimard, 1993.
  • 1
    O presente texto é desenvolvimento de alguns tópicos abordados em comunicação apresentada no Congresso Internacional da Associação Brasileira de Literatura Comparada (ABRALIC), em agosto de 2018.
  • 2
    Os textos em língua estrangeira terão a tradução da autora, salvo exceções, como os textos e poemas em prosa e em verso de Baudelaire, em que o tradutor será mencionado com a indicação entre parênteses do sobrenome seguido pelo ano e página da edição.
  • 3
    O crítico Antoine Compagnon tratou da maneira como diversos autores abordaram o topos da "batalha" literária ao longo da história em um curso chamado Da literatura como esporte de combate, no Collège de France, em Paris, entre 2016 e 2018. O resumo do curso traz alguns exemplos de como a "luta" em literatura rende frutos: "De uma pena de ferro sobre um papel de aço", é dessa maneira que Ronsard, combatente da causa católica e real, se dirige à Catarina de Médicis em 1562. 'A caneta é mais forte que a espada', resume Edward Bulwer-Lytton em seu drama Richelieu, em 1839. Gautier dizia de Scudéry, o capitão Fracasse, que ele "deixaria a espada pela pena e não usaria pior uma que a outra". Desde Homero e Hesíodo, a poesia é também uma agonística [termo que designa, na Antiguidade greco-romana, a ciência e prática dos combates ou lutas corporais; na retórica, diz respeito a antigos jogos dialéticos, técnica de argumentação usada para fazer valer uma opinião]. No século XIX, a questão do duelo, das duras críticas literárias está por toda a parte. No século XX, ela foi substituída pelo boxe em Hemingway ou Montherlant. A longa história da metáfora da "pena de ferro", depois da "esgrima", do "boxe literário" será explorada." Disponível em <https://www.college-de-france.fr/site/antoine-compagnon/course-2016-2017.htm>, consultado em 10 de janeiro de 2018.
  • 4
    De acordo com o comentário ao poema da edição francesa das Obras Completas, com notas e comentários de Claude Pichois da coleção “Bibliothèque de la Pléiade” : BAUDELAIRE, C. Œuvres Complètes, Org. Claude Pichois. Paris : Gallimard, 1975 (reimpressão em 2010), 2 volumes. A obra será utilizada como referência para os textos em francês de Baudelaire e citada com a abreviação “OC”, o algarismo romano designa o volume, e o número arábico a página. Pichois reproduz a citação de J. de Maistre em As Noites de São Petesburgo: "tout méchant est un Heautontimoromenos", indicando que o termo é também o título bastante conhecido de uma comédia de Terêncio, dramaturgo e poeta romano que viveu entre 185 a.C. - 159 a.C. (OC I: 985).
  • 5
    Sem cólera em ti baterei/ Como o açougueiro, sem sanha,/ Como Moisés na montanha,/ E de tua pupila farei,// Para molhar meu Saara,/ Brotar as águas do sofrer./ Meu desejo com esperança/ No amargo pranto nadará// Como um navio no mar vaga,/ E no peito que embriagarão/ Teus caros ais reboarão/ Como um tambor que bate a carga.// Não sou acaso um falso acorde/ Nessa divina sinfonia,/ Graças à vivaz ironia/ Que me sacode e que me morde?// Está na minha voz gritante!/ É o sangue que negro gira!/ Sou o espelho deformante/ Em que a megera se mira.// Eu sou a chaga e a espada!/ Sou o rosto e o bofete atroz!/ Sou o membro e a roda dentada,/ E sou a vítima e o algoz!// Do meu coração um vampiro,/ - Um desses grandes largados/ Ao riso eterno condenados/ E que não tem mais sorriso! (LARANJEIRA, 2011BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Martin Claret, 2011.: 97-98).
  • 6
    Pela velha avenida, onde pende aos tugúrios/ Muita persiana, abrigo de atos espúrios,/ Quando esse sol cruel bate em raios fatais/ Sobre a cidade e o campo, os tetos e os trigais,/ Exerço-me sozinho a fantástica esgrima,/ Cheirando em todo canto os acasos da rima,/ Tropeçando em palavras como em chão calçado,/ Chocando muita vez em verso já sonhado. (LARANJEIRA, 2011BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Martin Claret, 2011.: 104)
  • 7
    [...] esgrimindo com seu lápis, sua pena, seu pincel, respingando no teto a água do copo, limpando a pena na camisa, apressado, violento, ativo, como se temesse que as imagens lhe escapassem, brigando sozinho, debatendo-se consigo mesmo.
  • 8
    "On voit un chiffonnier qui vient, hochant la tête,/ Butant, et se cognant aux murs comme un poète,/ Et, sans prendre souci des mouchards, ses sujets,/ Épanche tout son cœur en glorieux projets." (OC I: 106) "Vê-se um trapeiro vir, a cabeça meneando,/ A bater nas paredes qual poeta, tropeçando,/ E sem se preocupar com espiões, seus sujeitos,/ Expande o coração em gloriosos projetos." (LARANJEIRA, 2011BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. Trad. Mário Laranjeira. São Paulo: Martin Claret, 2011.: 130).
  • 9
    "Il arrive hochant la tête et butant sur les pavés, comme les jeunes poètes qui passent toutes leurs journées à errer et à chercher des rimes" (OC I: 381) "Chega meneando a cabeça e tropeçando nas pedras. Como os jovens poetas que passam os dias a errar e a procurar rimas."
  • 10
    "La peine de Mort est le résultat d'une idée mystique, totalement incomprise aujourd'hui. La peine de Mort n'a pas pour but de sauver la société, matériellement du moins. Elle a pour but de sauver (spirituellement) la société et le coupable. Pour que le sacrifice soit parfait, il faut qu'il y ait assentiment et joie de la part de la victime. Donner du chloroforme à un condamné à mort serait une impiété, car ce serait lui enlever la conscience de sa grandeur comme victime et lui supprimer les chances de gagner le Paradis." (OC I: 683). "A pena de morte é o resultado de uma ideia mística, totalmente incompreendida hoje em dia. A pena de morte não visa a salvar a sociedade, ao menos materialmente. Ela visa a salvar (espiritualmente) a sociedade e o culpado. Para que seja perfeito o sacrifício, cumpre haver assentimento e alegria, por parte da vítima. Dar clorofórmio a um condenado à morte seria uma impiedade, pois implicaria tirar-lhe a consciência da própria grandeza como vítima e suprimir-lhe as oportunidades de ganhar o Paraíso." (BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA, A., 1981BAUDELAIRE, Charles.Meu coração desnudado. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.: 72)
  • 11
    "Meu belo cão, meu bom cão, meu querido totó, aproxime-se e venha respirar um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade."/ E o cão, mexendo o rabo, o que é, acho, nesses pobres seres, o sinal correspondente ao riso e ao sorriso, aproxima-se e curiosamente pousa o úmido nariz no frasco aberto; depois, subitamente recuando de pavor, late para mim, à guisa de reprovação./ "Ah, miserável cão, se lhe tivesse oferecido um embrulho de excrementos o teria farejado com delícia e talvez devorado. Assim, até você, indigno companheiro de minha triste vida, se parece com o público, a quem nunca se devem apresentar perfumes delicados que o exasperem, mas somente imundícies cuidadosamente escolhidas. (MOTTA, 1995BAUDELAIRE, Charles. O Spleen de Paris: pequenos poemas em prosa. Apresentação e tradução de Leda Tenório da Motta. Rio de Janeiro: Imago, 1995.: 31)
  • 12
    BAUDELAIRE, C. Petits Poèmes en Prose. Introduction, notes, bibliographie et choix des variantes par Henri Lemaître. Paris: Garnier, 1962.
  • 13
    O francês é um animal de galinheiro tão bem domesticado que não ousa transpor nenhuma paliçada. Ver os seus gostos em arte e em literatura./ É um animal de raça latina; a imundície não lhe desagrada, no seu domicílio, e, em literatura, é escatófago. É doido por excrementos. A isso as literaturas de botequim chamam o sal gaulês. Belo exemplo de baixeza da França, da nação que se pretende independente acima de todas as demais. (BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA, A., 1981BAUDELAIRE, Charles.Meu coração desnudado. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.: 114).
  • 14
    "Eu tinha colocado algumas imundícies para agradar aos jornalistas. Eles se mostraram ingratos." "Pois eu mesmo, apesar dos esforços mais louváveis, não soube resistir ao desejo de agradar aos meus contemporâneos, como atestam, em alguns lugares, aplicadas como uma maquiagem, certas baixas adulações dirigidas à democracia, e até algumas imundícies destinadas a fazer com que me perdoem a tristeza de meu assunto. Mas, como os jornalistas se mostraram ingratos com as carícias desse tipo, retirei todos os seus vestígios, tanto que me foi possível, nesta nova edição."
  • 15
    A intenção aqui não é trazer uma análise profunda da doutrina da civilidade e do significado da adulação, mas mencionar apenas alguns aspectos que possam trazer pistas da relação estabelecida entre autor, obra e leitor em Baudelaire. Jean Starobinski dedicou-se ao assunto no ensaio "De la Flatterie", disponível em português no capítulo "Sobre a adulação" em STAROBINSKI, J. As máscaras da civilização: ensaios. Tradução de Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001STAROBINSKY, Jean. As máscaras da civilização: ensaios. Tradução de Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. : 57-85.
  • 16
    A. Ernout e A. Meillet, Dictionnaire étymologique de la langue latine, Paris, 1939: 15, apud STAROBINSKI, 2001STAROBINSKY, Jean. As máscaras da civilização: ensaios. Tradução de Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. : 71.
  • 17
    Dirigindo-se a um público coletivo e anônimo, seja o leitor de periódicos, jornalistas ou críticos, Baudelaire faz seu endereçamento de maneira diversa dos poetas que direcionavam suas obras aos soberanos ou a outras figuras individuais, aos quais as lisonjas eram orientadas. Boileau é um dos exemplos em língua francesa, dedicando um longo poema ao rei em Discours au roi. BOILEAU, N. Oeuvres complètes de N. Boileau et suivie du Bolaeana (Nouvelle édition). Précédées de la vie de l'auteur d'après des documents nouveaux et inédits par M. Edouard Fournier ; nouvelle édition illustrée par M. Émile Bayard...de M. de Losme de Monchesnay (1873), disponível em <www.gallica.bnf.fr>, consultado em 10 de janeiro de 2018.
  • 18
    Por Canalha entendo as pessoas que são incompetentes em poesia. Retrato da Canalha literária. Doctor Estaminetus Crapulosus Pedantissimus. Seu retrato feito à maneira de Praxíteles. (BUARQUE FERREIRA DE HOLANDA, 1981BAUDELAIRE, Charles.Meu coração desnudado. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.: 82) Os diretores de jornais, François Buloz, Houssaye, Rouy, Girardin, Texier, de Calonne, Solar, Turgan, Dalloz. Lista de canalhas, encabeçada por Solar (BUARQUE FERREIRA DE HOLANDA, 1981BAUDELAIRE, Charles.Meu coração desnudado. Tradução de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.: 102)
  • 19
    Como nos poemas de As Flores do Mal "Uma mártir" (OC I: 111) ou "Uma viagem a Citera" (OC I: 117).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2019
  • Aceito
    01 Abr 2019
Programa de Pos-Graduação em Letras Neolatinas, Faculdade de Letras -UFRJ Av. Horácio Macedo, 2151, Cidade Universitária, CEP 21941-97 - Rio de Janeiro RJ Brasil , - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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