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Efeitos da titulação de doses no perfil de tolerabilidade de Tramadol de liberação prolongada<a href="#back1">*</a> em pacientes com dor crônica não-oncológica

Effects of dose titration on the tolerability profile of sutained-release Tramadol in patients with non-oncologic chronic pain

Resumos

Este estudo multicêntrico teve por objetivo comparar os efeitos de dois esquemas posológicos no perfil de tolerabilidade do tramadol de liberação prolongada em pacientes com dor crônica não-oncológica. A casuística envolveu 189 pacientes com idade entre 14 e 75 anos, divididos em 2 grupos aleatoriamente: grupo A com 96 e o grupo B com 93 pacientes que receberam a medicação do estudo por 15 dias. O grupo A utilizou uma dose inicial de tramadol de liberação prolongada de 50mg a cada 12 horas por 3 a 7 dias, passando para uma dose de manutenção de 100mg a cada 12 horas até o 15º dia. O grupo B fez uso de uma dose padronizada de 100mg a cada 12 horas de tramadol de liberação prolongada durante os 15 dias do estudo. Os aspectos analisados foram o tipo de dor crônica não-oncológica, a intensidade da dor através da escala visual analógica, a aderência ao tratamento prescrito, a necessidade do uso da medicação de resgate, os efeitos adversos, a avaliação global da eficácia pelo médico e pelo paciente, bem como a tolerabilidade global na opinião do médico e do paciente. A dor de origem músculo-esquelética, definida como dor muscular com suas inserções no osso, foi a mais freqüente com 45,8% dos casos no grupo A, enquanto a dor osteoarticular foi a mais observada no grupo B (47,3%). Verificou-se uma melhora altamente significante tanto intra grupos como entre grupos, quanto à intensidade da dor, com redução de 67% em ambos os grupos. No grupo A, 77,1% dos pacientes cumpriram adequadamente o tratamento prescrito e no grupo B, a proporção foi de 75,3%, não havendo diferença estatisticamente significativa entre os grupos. Os grupos foram semelhantes entre si quanto à utilização da medicação de resgate, onde apenas 9,7% dos pacientes do grupo A e 15,1% do grupo B necessitaram-na durante o período do estudo. Não houve diferença significante na freqüência de eventos adversos nos dois grupos ( 30,2% e 36,6% respectivamente). Nos pacientes cuja dose final foi de 200mg/dia, a avaliação global da eficácia foi considerada boa e excelente pelos investigadores no grupo A em 86,7% dos pacientes e no grupo B o resultado foi de 78,8%. Os pacientes do grupo A consideraram a avaliação global da eficácia como boa e excelente em 88,9% e no grupo B 78,8%. A tolerabilidade da droga foi considerada entre boa e excelente pelos investigadores no grupo A em 86% e no grupo B o resultado foi de 77,2%. Os pacientes consideraram a tolerabilidade da droga como boa e excelente no grupo A em 77,4% e no grupo B o resultado foi de 71,5%. Em conclusão, os dois grupos de tratamento foram estatisticamente semelhantes em relação a todos os parâmetros estudados, com exceção da intensidade da dor, a qual foi inicialmente maior no grupo B, sendo equivalente em ambos os grupos ao final do estudo. Houve uma tendência favorável, porém não significante, ao esquema terapêutico de titulação de doses.

Dor crônica; Opiáceos; Tramadol


The main objective of this multicentric study was to compare the effects of two posologic schemes on the safety profile of slow-release tramadol in patients with non-oncological chronic pain. One hundred, eighty nine patients aged between 14 and 75 years were enrolled and divided in two groups at random : group A, with 96 and group B with 93 patients which received the study medication for 15 days. Group A received an initial dose of slow release tramadol of 50mg twice a day for 3 to 7 days, and then using 100mg twice a day until day 15. Group B received a standard dose of slow release tramadol 100mg bid during the study period. The parameters analised were: type of non-oncological chronic pain, intensity of pain assessed by means of a Visual Analogue Scale, the compliance to the prescribed treatment, requirement of rescue medication, adverse events, global assessment of efficacy by the investigators and patients as well as global assessment of tolerability by the investigators and patients. Musculoeskeletal pain, defined as muscular pain and its bone insertions, was the most frequent type in group A ( 45.8%) while osteoarticular pain was the most observed in group B ( 47.3%). A significant relief of the intensity of pain was shown within both groups and when compared with each other ( 67% decrease). The treatment prescribed was followed by 77.1% of the patients in Group A and by 75.3% of the patients in group B, showing that there was no significant statistical difference between groups. Both groups were similar regarding rescue medication required, whereas only 9.7% of the group A patients and 15.1% in group B needed it. Both groups had similar frequency of adverse events: 30.2% in group A and 36.6% in group B. Patients which received a daily dose of 200mg at the end of the study had their global efficacy assessed as good and excellent by the investigators in 86.7% in group A and 78.8% in group B. In group A, 88.9% of the patients considered the global assessment of efficacy as good and excellent and in group B, 78.8% of them did. Tolerability of the drug was considered good and excellent by the patients in group A in 86% and in group B the result was of 77,2%. In conclusion, both treatment groups were statistically similar regarding all assessed parameters, except for pain intensity, which was formerly higher in group B, and becoming equivalent in both groups at the end of the study. There was a favorable tendency, however non-significant, towards the titration dose group.

Chronicpain; Opiates; Tramadol


ARTIGO ORIGINAL

Efeitos da titulação de doses no perfil de tolerabilidade de Tramadol de liberação prolongada* * Timasen ® SR - ASTAMEDICA em pacientes com dor crônica não-oncológica

Antônio Carlos Camargo Amaral FilhoI; Luiz Roberto Stigler MarczykII

IChefe do Centro de Terapia da Dor e Medicina Paliativa do Hospital Amaral Carvalho de Jaú-SP

IIProfessor Titular de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Endereço para correspondência Endereço para correspondência accafjau@uol.com.br / clinicaf@terra.com.br

RESUMO

Este estudo multicêntrico teve por objetivo comparar os efeitos de dois esquemas posológicos no perfil de tolerabilidade do tramadol de liberação prolongada em pacientes com dor crônica não-oncológica. A casuística envolveu 189 pacientes com idade entre 14 e 75 anos, divididos em 2 grupos aleatoriamente: grupo A com 96 e o grupo B com 93 pacientes que receberam a medicação do estudo por 15 dias. O grupo A utilizou uma dose inicial de tramadol de liberação prolongada de 50mg a cada 12 horas por 3 a 7 dias, passando para uma dose de manutenção de 100mg a cada 12 horas até o 15º dia. O grupo B fez uso de uma dose padronizada de 100mg a cada 12 horas de tramadol de liberação prolongada durante os 15 dias do estudo.

Os aspectos analisados foram o tipo de dor crônica não-oncológica, a intensidade da dor através da escala visual analógica, a aderência ao tratamento prescrito, a necessidade do uso da medicação de resgate, os efeitos adversos, a avaliação global da eficácia pelo médico e pelo paciente, bem como a tolerabilidade global na opinião do médico e do paciente.

A dor de origem músculo-esquelética, definida como dor muscular com suas inserções no osso, foi a mais freqüente com 45,8% dos casos no grupo A, enquanto a dor osteoarticular foi a mais observada no grupo B (47,3%). Verificou-se uma melhora altamente significante tanto intra grupos como entre grupos, quanto à intensidade da dor, com redução de 67% em ambos os grupos. No grupo A, 77,1% dos pacientes cumpriram adequadamente o tratamento prescrito e no grupo B, a proporção foi de 75,3%, não havendo diferença estatisticamente significativa entre os grupos. Os grupos foram semelhantes entre si quanto à utilização da medicação de resgate, onde apenas 9,7% dos pacientes do grupo A e 15,1% do grupo B necessitaram-na durante o período do estudo. Não houve diferença significante na freqüência de eventos adversos nos dois grupos ( 30,2% e 36,6% respectivamente).

Nos pacientes cuja dose final foi de 200mg/dia, a avaliação global da eficácia foi considerada boa e excelente pelos investigadores no grupo A em 86,7% dos pacientes e no grupo B o resultado foi de 78,8%. Os pacientes do grupo A consideraram a avaliação global da eficácia como boa e excelente em 88,9% e no grupo B 78,8%.

A tolerabilidade da droga foi considerada entre boa e excelente pelos investigadores no grupo A em 86% e no grupo B o resultado foi de 77,2%. Os pacientes consideraram a tolerabilidade da droga como boa e excelente no grupo A em 77,4% e no grupo B o resultado foi de 71,5%.

Em conclusão, os dois grupos de tratamento foram estatisticamente semelhantes em relação a todos os parâmetros estudados, com exceção da intensidade da dor, a qual foi inicialmente maior no grupo B, sendo equivalente em ambos os grupos ao final do estudo. Houve uma tendência favorável, porém não significante, ao esquema terapêutico de titulação de doses.

Descritores: Dor crônica; Opiáceos; Tramadol.

INTRODUÇÃO

Pacientes que buscam serviços médicos devido à sintomas dolorosos representam 10 a 50% de todas consultas médicas(19). De 30 a 60% das manifestações dolorosas, em adultos, ocorrem na forma crônica comprometendo o desempenho funcional e laborativo em maior ou menor grau destas, sem mencionar a queda da qualidade de vida e o impacto econômico-social que estas manifestações acarretam(2). Nos Estados Unidos, são gastos ao redor de 14 bilhões de dólares por ano só com a lombalgia(19).

Desta forma, a dor tem sido entendida como um grave problema de saúde pública e, como tal, tem merecido os esforços de médicos especialistas e autoridades de muitos países. No Brasil, o Ministério da Saúde, no ano de 2002, preocupado e entendendo a magnitude da questão, criou o Programa Nacional de Educação e Assistência à Dor e Cuidados Paliativos para enfrentar o problema em nível nacional.

Por outro lado, os grandes avanços no conhecimento médico-científico da dor, desde a década de setenta até os dias de hoje não foram suficientes para que os portadores de dores crônicas merecessem avaliações corretas e tratamentos adequados. O mesmo acontecendo com o mito, extremamente arraigado, entre médicos e demais profissionais da saúde de que pacientes com dores intensas e particularmente aqueles com dores não relacionadas a canceres, não devem receber prescrições de morfínicos, sob risco de os transformarem em dependentes destas drogas(2, 13).

A droga cloridrato de tramadol, do grupo dos opiáceos, possui características especiais pois sua molécula inibe a recaptação da serotonina e da dopamina, além de exercer atividade opiácea sobre os receptores mi, kappa e delta, tendo pouca tendência de desenvolver tolerância e dependência física, mesmo em pacientes que façam uso dela por tempo prolongado(2, 4,7,16).

Ultimamente, drogas como a metadona, levorfanol e tramadol são considerados como morfínicos de largo espectro, pois tem ações outras que são desejáveis em pacientes portadores de síndromes dolorosas mistas, tais como nos cancerosos e mesmo dores crônicas não-oncológicas do tipo neuropáticas de grande intensidade(12). Assim, o tramadol tem sido prescrito com freqüência para portadores de dores crônicas de origem não-oncológica e muitos trabalhos têm sido publicados na literatura internacional demonstrando a eficácia e segurança desta droga(1,3,5,6,8,10,11,17,18).

Sintomas desagradáveis, como náuseas, tonturas e vômitos, que acontecem apenas nos primeiros dias de uso da droga, eventualmente fazem com que os pacientes abandonem o tratamento, podendo ser evitados caso a prescrição seja de dosagens tituladas, como tem mostrado várias publicações(9,14). Com base neste fato, a presente investigação foi proposta para comparar os dois esquemas posológicos, testando a tolerabilidade de ambos na dor crônica não-oncológica em um período de 15 dias.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Este estudo multicêntrico, de coorte e observacional teve como objetivo principal comparar os efeitos da titulação de doses no perfil de tolerabilidade do tramadol de liberação prolongada em pacientes com dor crônica não-oncológica. Os objetivos secundários foram: observar a incidência de eventos adversos à droga, a aderência ao tratamento, a utilização de medicação de resgate, o seguimento do tratamento prescrito, comparar a eficácia entre os dois grupos, avaliada pela escala visual analógica (EVA) e obter a avaliação global da eficácia e tolerabilidade segundo os investigadores e pacientes.

Foram recrutados para o estudo 189 pacientes de ambos os sexos e idades entre 14 e 75 anos, portadores de dor crônica não-oncológica há pelo menos três meses, de intensidade maior ou igual a 5 na escala visual analógica e com indicação de receber tramadol de liberação prolongada. Caso os pacientes estivessem recebendo nas duas últimas semanas algum analgésico, sua continuação deveria ser permitida sob critério médico. Os pacientes que puderam ser incluídos assinaram o termo de consentimento informado após concordarem em participar do estudo, sendo acompanhados por 20 médicos ortopedistas.

Os pacientes foram alocados no grupo A ou no Grupo B aleatoriamente, sendo que o grupo A recebeu uma cápsula de 50 mg de tramadol de liberação prolongada duas vezes ao dia por 3 a 7 dias, passando a receber duas cápsulas de 50 mg de tramadol de liberação prolongada duas vezes ao dia até o 15º dia do estudo. O grupo B recebeu um cápsula de 100mg de tramadol de liberação prolongada durante os quinze dias dos estudo. Os pacientes poderiam usar tramadol em gotas, como medicação de resgate, caso houvesse escape da dor nos intervalos entre as administrações.

Os critérios de exclusão foram: apresentar quadro de intoxicação por opiáceos, hipnóticos, álcool, ou analgésico de ação central, estar tomando inibidores da monoaminoxidase, hiperssensibilidade aos opiáceos, disfunção renal ou hepática grave, pressão intracraniana elevada, diminuição do nível de consciência, choque, risco de convulsões, depressão respiratória instalada, secreção brônquica excessiva, tratamento concomitante com fármacos de atuação no sistema nervoso central e, sendo mulheres, não poderiam estar amamentando.

Uma vez admitidos no estudo, foi avaliada na Visita 1 (V1) a pontuação do escore da dor em uma escala visual analógica de 100mm: 0 (ausência de dor) a 10 (a dor mais intensa possível), registrado o tipo de dor crônica e as medicações concomitantes.

No décimo quinto dia de tratamento (V2), foram registrados a intensidade da dor através da pontuação do escore da dor na escala visual analógica de 100mm e medicações concomitantes. O teste estatístico foi realizado na população PP (per protocol), isto é, nos pacientes que completaram o tratamento de acordo com o protocolo.

A aderência dos pacientes ao tratamento foi avaliada e, quando insuficiente, o número de cápsulas utilizado foi registrado, bem como a razão da baixa aderência. Foi realizado o registro do uso da medicação de resgate, quando necessário, e também os eventos adversos.

Ao final do estudo, tanto os pesquisadores como os pacientes avaliaram globalmente a eficácia e a tolerabilidade do tratamento com o tramadol de acordo com a seguinte classificação: muito boa, boa, moderada e ruim.

Na análise estatística, foram utilizados os testes paramétricos: Teste t de Student para a comparação entre os grupos da idade; análise de variância ("two-way") para a comparação simultânea das médias intra-grupos e entre grupos do parâmetro intensidade de dor na escala visual analógica. Os testes nãoparamétricos empregados foram Teste Qui-quadrado para a comparação entre grupos de dados demográficos, avaliação do tipo de dor, uso de medicações concomitantes e de resgate, eventos adversos, avaliação global da eficácia e tolerabilidade.

Todos os testes foram bicaudais e o nível de significância adotado foi de 5%.

RESULTADOS

Dos 189 pacientes incluídos neste estudo, foram alocados no grupo A 96 pacientes e grupo B 93 pacientes. Ao final do estudo, 116 pacientes concluíram-no de acordo com a posologia estabelecida pelo protocolo, sendo então analisados estatisticamente como população "per protocol" (PP). Os pacientes que não completaram o estudo por eventos adversos relacionados à medicação foram considerados na casuística total da avaliação estatística (PP).

Os pacientes que não completaram o estudo por terem abandonado o tratamento, não retornando à visita 2 (Dia 15+2), ou por não terem tomado corretamente a medicação do estudo, foram considerados para a avaliação da tolerabilidade do tramadol de liberação prolongada, formando a população "intent to treat" (ITT).

A Tabela 1 descreve as características demográficas de cada grupo de tratamento.

A Tabela 2 relaciona os tipos de dores não-oncológicas dos dois grupos registradas na V1 (médias e desvios-padrão). Observou-se que o tipo de dor mais freqüente no grupo A foi músculo-esquelética e no grupo B o tipo osteoarticular.

A utilização de analgésicos concomitantes foi semelhante nos dois grupos de tratamento, tanto na proporção de pacientes que utilizaram-nos como no número de medicamentos em uso.

A intensidade da dor foi avaliada a cada visita, através da escala visual analógica de 100mm de comprimento. Verificou-se uma melhora altamente significante em ambos os grupos, com redução de 67% da intensidade da dor, em ambos os grupos. Por outro lado, deve ser assinalado o fato que o grupo A apresentou média inicial significantemente inferior ao B, por ter o primeiro grupo maior número de pacientes admitidos no estudo com dor leve. A média das escalas visuais analógicas na primeira avaliação dos pacientes do grupo A foi 65,4 +/- 17,5 e no grupo B foi de 75,8 +/- 12,6. Na avaliação final da dor a média das escalas visuais analógicas dos pacientes do grupo A foi 21,8 +/- 23,8 e no grupo B foi de 24,7 +/- 22,2 (Tabela 3, Gráfico 1).


Com relação à aderência, 74 pacientes do grupo A seguiram o tratamento prescrito (77,1%) e, no grupo B, 70 pacientes (75,3%) cumpriram-no. Não houve diferença significativa entre os grupos (Tabela 4).

O número de pacientes que apresentaram dor, em algum momento, controlada insuficientemente ou tiveram escape de dor e que necessitaram utilizar a medicação de resgate foi muito pequeno, no grupo A 9 (9,7%) pacientes e 14 ( 15,1%) no grupo B. (Tabela 5).

Muitos pacientes fizeram uso de medicação concomitante durante o estudo: 27<1% no grupo A e 33,3% no grupo B. A comparação entre grupos foi não significante.

A incidência de eventos adversos foi estatisticamente semelhante nos dois grupos: 30,2% no grupo A e 36,6% no grupo B (Gráfico 2). Mais da metade dos pacientes apresentou reações adversas no primeiro dia após o início do tratamento, observando-se que o intervalo de tempo entre o início do tratamento e o evento adverso foi de 1 a 3 dias em 82,7% dos casos para o grupo A e em 97,0% para o grupo B (Tabela 6).


As manifestações gastrointestinais foram os eventos adversos mais comumente relatados, como náuseas e vômitos. Tonturas e vertigens foram também relatadas com freqüência (Tabela 7).

Naqueles pacientes que terminaram o estudo com a dose diária de 200mg (n=116), a avaliação global da eficácia foi classificada pelos investigadores como sendo excelente em 51,1% e boa em 35,6% no grupo A. No grupo B, a classificação como excelente foi de 39,4% e boa em 39,4%. A comparação estatística entre grupos não atingiu significância (Tabela 8, Gráfico 3).


Estes pacientes classificaram a avaliação global da eficácia como excelente em 53,3% e boa em 35,6% no grupo A. Esta classificação foi excelente em 39,4% e boa em 39,4% dos pacientes do grupo B ( Tabela 9, Gráfico 4).


As opiniões dos investigadores e dos pacientes foram bastante semelhantes, havendo coincidência entre as proporções de excelente e boa.

Para os 65 pacientes que terminaram o estudo com dose diária £ 100mg, os investigadores julgaram excelente a eficácia do tratamento do grupo A em 47,7% e boa em 31,8% dos casos. No grupo B esta classificação foi de 47,4% como excelente e boa em 31,6% dos casos (Tabela 10, Gráfico 5).


Segundo a opinião dos pacientes, o tratamento com tramadol sob o esquema A foi excelente em 54,5% e bom em 25% dos casos e, sob o esquema B, foi excelente em 42,1% e bom em 26,3% dos casos (Tabela 11, Gráfico 6). Não houve diferença significante entre os grupos. Na opinião dos pacientes, a proporção de excelente foi maior no grupo A em relação ao B, entretanto, não houve discordância em relação à opinião do investigador.


Na avaliação global da tolerabilidade foi considerada a população ITT, com 189 pacientes. Na opinião dos investigadores, o tratamento no grupo A foi considerado como excelente em 44,1% e boa em 41,9% dos casos. No grupo B, os investigadores consideraram-na excelente em 43,5% e boa em 33,7% dos casos. (Tabela 12, Gráfico 7)


Já na opinião dos pacientes, a tolerabilidade foi considerada excelente em 41,9% e como boa em 35,5% dos casos no grupo A. A tolerabilidade da droga foi considerada excelente em 39,6% e boa em 31,9% dos casos no grupo B. (Tabela 13, Gráfico 8)


DISCUSSÃO

Em nosso estudo, observamos que a redução da intensidade da dor foi altamente significativa nos dois grupos de tratamento quando comparou-se a média da EVA inicial com a final, confirmando dados da literatura quanto à eficácia da tramadol(1,3,5, 6,10,17,18).

Entretanto, não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos com relação à freqüência de eventos adversos, necessidade de medicação de resgate, aderência ao tratamento prescrito, avaliação global da eficácia e da tolerabilidade, embora uma discreta tendência favorável, sem significado estatístico, possa ser observada com a titulação de doses no grupo A. Além disso, é provável que houvesse sido encontrada significância estatística nos parâmetros estudados caso o tamanho da amostra fosse ampliado.

A freqüência de eventos adversos foi maior nos primeiros dias da administração de tramadol de liberação prolongada, confirmando dados da literatura com relação à classe dos opióides(1,3,5,7,10,16,18). Segundo alguns autores, este fato pode ser minimizado utilizando-se doses menores nos primeiros dias e posteriormente titulando-se até a dose analgésica ser atingida(9,14). É importante observarmos que houve 13 casos onde a relação causal dos eventos adversos foi considerada pelos investigadores como improvável. Deste modo, a percentagem de pacientes que apresentaram eventos adversos seria 16% menor que aquele considerado sem a exclusão da variável de causalidade. É importante ressaltar a significância clínica do perfil favorável de eventos adversos do grupo em que a titulação de doses foi realizada.

Neste estudo, os investigadores não observaram a ocorrência de obstipação, o que é muito freqüente com qualquer analgésico do grupo dos opiáceos(2). Os casos de tontura relatados por 9 pacientes do grupo A e 12 pacientes do grupo B no início do tratamento podem ser explicados pelos efeitos serotoninérgicos do tramadol(7,16). A sonolência, outra ocorrência comum em pacientes fazendo o uso de morfínicos(2), manifestou-se apenas em 2 pacientes do grupo A e 2 do grupo B e isto poderia se explicado pela inexistência de picos plasmáticos elevados quando são prescritas drogas de liberação prolongada.

Com relação à aderência ao tratamento prescrito, é importante observar que a melhora da dor foi relatada como a principal razão para o não cumprimento do esquema terapêutico previamente estabelecido. É possível que esta proporção de pacientes seja ainda maior se considerarmos que, em alguns casos, não foi possível aferir adequadamente os verdadeiros motivos da não-aderência.

O tempo de utilização do tramadol de liberação lenta pelos pacientes, neste estudo, foi curto. Portanto, não poderemos tirar conclusões a respeito do desenvolvimento de tolerância e comportamento de adição.

A observância da titulação progressiva das doses e a utilização de drogas na formulação de liberação prolongada, como o cloridrato de tramadol podem minimizar as dificuldades do início da terapêutica, oferecendo maior tolerabilidade e aderência aos pacientes que necessitem de opiáceos para controlar suas síndromes dolorosas.

CONCLUSÃO

Os dois esquemas posológicos do cloridrato de tramadol de liberação prolongada demonstraram ser semelhantes nos dois grupos de tratamento em relação à eficácia e tolerabilidade, necessidade de medicação de resgate e aderência dos pacientes. A intensidade da dor, a qual foi inicialmente maior no grupo B, demonstrou atingir valores equivalentes em ambos os grupos ao final do estudo. Houve uma tendência favorável, porém não significante, ao esquema terapêutico de titulação de doses.

AGRADECIMENTOS:

Dr. Milton Possedente, Dr. José Maurício Dias, Dr. Lourival M. O. Gomes, Dr. Carlos Augusto Cauchiolli, Dr. Jesus Gutierres, Dr. Wallace Marion, Dra. Rosilene Castiglia, Dr. Gerson de Sá Tavares Filho, Dr. Egídio Paulo Oliveira Fré, Dr. Paulo José Scherner, Dr. Rui Alberto Ribeiro de Oliveira, Dr. Erno Thober, Dr. Geraldo Costa, Dr. Luiz Eduardo Hirata, Dr. Bernardino Leal de Quadros Júnior, Dr. Celestino de Oliveira Souza, Dr. José Cândido G. da Costa, Dr. João de Souza Gaspar e Dr. Domingos Ferreira Cardoso.

Trabalho recebido em 25/04/2003

Aprovado em 05/08/2003

Trabalho realizado no Centro de Terapia da Dor e Medicina Paliativa do Hospital Amaral Carvalho (Jau-SP) e Clínica de Ortopedia e Fraturas C.O.F. (Porto Alegre - RS)

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  • Endereço para correspondência
  • *
    Timasen
    ® SR - ASTAMEDICA
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Mar 2004
    • Data do Fascículo
      Dez 2003

    Histórico

    • Aceito
      05 Ago 2003
    • Recebido
      25 Abr 2003
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