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Artroplastia glenoumeral: resistência do fio de poliéster após contato com o metilmetacrilato

Resumos

OBJETIVO: Os autores estudam as características do fio de poliéster (ethibond) após o contato com o metilmetacrilato (cimento ortopédico) no laboratório de resistência de materiais. MÉTODOS: Avaliam a força necessária para a ruptura bem como a elasticidade e a deformidade provocadas durante a tração no aparelho Instron 4482. Realizam análise estatística através do teste "t-student". RESULTADOS: Não encontram diferença estatisticamente significativa entre os grupos estudados. CONCLUSÃO: Concluem que o contato do metilmetacrilato com o poliéster não acarreta mudanças na suas propriedades elásticas e de resistência à tração.

Metilmetacrilato; Ombro; Artroplastia; Próteses e implantes


OBJECTIVE: The authors studied the physical properties of polyester thread (ethibond) following methyl methacrylate contact in a biomechanics laboratory. METHODS: Strain at rupture, elasticity and traction deformity were evaluated using an Instron 4482 machine. The student-t test was used for the statistical analysis. RESULTS: There were no statistical differences between the two groups. CONCLUSION: It is concluded that methy metacrylate contact with polyester does not affect its elastic properties and traction resistance.

Methylmethacrylate; Shoulder; Arthroplasty; Prostheses and implants


ARTIGO ORIGINAL

Artroplastia glenoumeral: resistência do fio de poliéster após contato com o metilmetacrilato

Ildeu Afonso Almeida Filho; Antonio Enéas Rangel Carvalho Junior; Elton Luis Ribeiro Bueno; Ricardo Garcia Ribeiro; Roger Simões

Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Groelândia 195 apto 202 CEP 30320.060 Bairro Sion, Belo Horizonte - MG. Brasil. E-mail: ildeu_almeida@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Os autores estudam as características do fio de poliéster (ethibond) após o contato com o metilmetacrilato (cimento ortopédico) no laboratório de resistência de materiais.

MÉTODOS: Avaliam a força necessária para a ruptura bem como a elasticidade e a deformidade provocadas durante a tração no aparelho Instron 4482. Realizam análise estatística através do teste "t-student".

RESULTADOS: Não encontram diferença estatisticamente significativa entre os grupos estudados.

CONCLUSÃO: Concluem que o contato do metilmetacrilato com o poliéster não acarreta mudanças na suas propriedades elásticas e de resistência à tração.

Descritores: Metilmetacrilato. Ombro. Artroplastia. Próteses e implantes.

INTRODUÇÃO

As primeiras evidências do uso das suturas pelo homem datam de 4000 A.C., no Egito Antigo. Ao longo do tempo vários materiais como o linho, cabelo humano, pelo de porco, algodão, tripa de animais, nylons, poliéster e metal, dentre outros, têm sido usados para reparar os tecidos lesados. Ainda hoje as suturas têm lugar de destaque na área médica. Neste último século, após a invenção do nylon e do poliéster, a popularidade do algodão propagou-se bem como a das fibras naturais tratadas, como: polipropileno, ácido poliglicólico e poliglactin 910.

Sutura é forma utilizada para se aproximar e manter os tecidos em contato até que o processo natural de cicatrização tenha adquirido resistência suficiente para fechar a ferida ou comprimir vasos sanguíneos.

O compêndio oficial das indústrias produtoras de materiais para suturas é chamado "The United States Farmacopeia". Ele serve como guia para a fabricação de fios.

As suturas são classificadas de várias formas:

O tamanho é dado pelo seu diâmetro que varia de 10 a 12-0, sendo o primeiro o mais espesso e o último mais estreito que um fio de cabelo.

Podem ser absorvíveis, ou seja, aquela que por um determinado período cumpre a sua função sendo decomposta pelo organismo através de uma reação natural do tipo corpo estranho.

Podem ser inabsorvíveis, ou seja, não são decompostas pela ação natural do organismo. Entretanto a regra não deve ser seguida à risca, já que apesar dos nylons e sedas serem materiais que se decompõe após longos períodos, eles são classificados como inabsorvíveis.

As suturas ainda podem ser classificadas em monofilamentares ou multifilamentares, entrelaçados torcidos ou trançados. Podem ser tingidos ou incolores, revestidos ou não.

OBJETIVO

Este trabalho tem como objetivo estudar as características do fio poliéster antes e após o contato com o metilmetacrilato, usado frequentemente nas artroplastias do ombro.

MATERIAL E MÉTODOS

No laboratório de resistência de materiais testamos as características do fio de sutura poliéster número cinco, trançado, com espessura de 0,85mm, conhecido como Ethibond. Os lotes utilizados e o prazo de validade dos mesmos foram registrados: L.06Z021 E.06/99 Val. 06/04; L.02Z015 E.02/99 Val.02/04; L.06Z021 E.06/99 Val. 06/04; L.05Z003 E. 05/99 Val.05/04; L.60X003 E.ausente Val.06/03.

O cimento ortopédico da Howmedica Surgical Simplex foi utilizado. Segue a discriminação dos seus constituintes e o número dos lotes utilizados:

Parte líquida: Metilmetacrilato (monômero) 19,5 ml

N, N-dimethyl para toluidine 0,5 ml

Hydroquinone, USP 1,5 mg

Parte sólida: Metilmetacrilato - stirene copolimero 30,0 gr

Polymetilmetacrilato 6,0 gr

Sulfato de Bário E.P. 4,0 gr

Ref - 6191 0 001 Lote-CIF 141, Lote-CEF 068, Lote-CFI 145.

Testes iniciais foram realizados utilizando-se o aparelho Versat 500 da indústria Panambra - Pantec. (Figura 1) O objetivo foi o de observarmos a força necessária para causar a ruptura completa do fio de poliéster. Cinco fios foram utilizados neste teste inicial e detectamos que todos se romperam ao nível da presilha (Figura 2) a uma força de distração média de 92 N. A literatura nos mostra que o fio poliéster apresenta uma resistência muito maior do que a encontrada.1 Portanto, após verificarmos a influência negativa da presilha do aparelho Versat 500 sobre a resistência dos fios testados passamos a utilizar uma segunda máquina: o Instron 4482 acoplado ao programa de computador Instron Series IX Automated Materials Tester - Versão 7.43.00. (Figura 3) Presilhas especiais2 foram utilizadas de forma a não danificarem os fios durante os testes. (Figura 4) Para tal utilizamos presilhas cilíndricas ao redor das quais os fios foram enrolados e não sobrepostos. Quatro voltas foram dadas ao redor do cilindro e quatro nós cirúrgicos realizados em cada extremidade do fio testado. Todos os fios testados bem como o cimento ortopédico utilizado foram abertos no dia do teste.





A distância entre as presilhas antes do início dos testes foi de 22 cm.

A temperatura ambiente, era de 25 º C. A velocidade de tração foi de 2 cm/min.2

Dois grupos de fios foram testados:

O grupo I ( grupo controle ) e o grupo II ( grupo dos fios que entraram em contato com o cimento ortopédico ). Em cada grupo doze fios foram testados mecanicamente até a sua ruptura completa, tendo-se registrado o local da mesma, a saber: ao nível do cimento ortopédico; entre o cimento e a presilha; ao nível da presilha ou ao nível do nó cirúrgico. O registro da força aplicada durante todo o teste, bem como o da deformidade provocada no fio, foi realizado pelo computador. A análise da percentagem da deformidade no ponto de máxima força também foi realizada.

Análise estatística

Três variáveis foram utilizadas para a comparação entre os dois grupos estudados: força à ruptura (N), alongamento do fio (cm) e deformidade na carga máxima (%). Estas variáveis foram comparadas através de teste "t-student"3 para amostras independentes, a um nível de significância de 5% (teste bilateral). Além dos testes de significância,4 intervalos de 95% confiança para a diferença média entre os dois grupos foram construídos.

RESULTADOS

Os dados individuais das medidas experimentais de força, alongamento e deformidade estão nas Tabelas 1 a 3. Na Tabela 4 é feita a análise estatística (teste de hipóteses) comparando os dois grupos. Em nenhuma das variáveis foi detectada uma diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos: a força média de ruptura é a mesma (p = 0,698), o alongamento médio obtido é o mesmo (p = 0,829) e a deformidade média na carga máxima é a mesma (p =0,982). Além dos testes de significância, as diferenças médias entre os dois grupos, com os respectivos intervalos de confiança (Figura 5), foram também calculados.


DISCUSSÃO

Temos utilizado na prática diária o fio poliéster para a reinserção tendinosa e dos tubérculos maior e menor durante os procedimentos de artroplastia de ombro, quando também o metilmetacrilato é amplamente usado para a estabilização do componente umeral. É descrito na literatura, como complicação deste tipo de procedimento, a migração dos tubérculos,5,6 e atribui-se a mesma à ação da musculatura, principalmente do músculos supraespinhal e subescapular e à má qualidade do tecido ósseo.7,8 Entretanto não observamos, até o presente, qualquer trabalho científico que demonstre a eficácia ou a resistência da sutura realizada com o fio poliéster após o mesmo ter entrado em contato com o metilmetacrilato. Antes deste estudo acreditávamos que o aumento da temperatura, provocada durante o processo de secagem do cimento ortopédico, pudesse alterar as características do fio poliéster.

É impressionante como os cirurgiões persistem em utilizar materiais estranhos ao organismo sem conhecê-los na sua totalidade. Encontramos uma dificuldade muito grande na obtenção de informação técnica a respeito dos fios de sutura que usamos na prática diária. A própria indústria produtora destes materiais não disponibiliza informações sobre os mesmos para a classe médica que tem aceitado passivamente esta situação.9

Ao estudarmos as características do fio de poliéster e a sua correlação com o metilmetacrilato passamos a olhar as solturas dos tubérculos maior e/ou menor no pós-operatório das artroplastias do ombro com outros olhos. Deste modo conseguimos questionar, com dados mais precisos, os resultados não satisfatórios devido a soltura dos tubérculos nas artroplastias. Não seria o atrito entre o fio poliéster e o implante o ponto de fraqueza que levaria à ruptura? Observamos ainda na nossa prática diária que o fio de poliéster apresenta uma importante redução na sua resistência após ter sido comprimido pela extremidade de um porta agulha ou após ter sido inadvertidamente transfixado por uma agulha cirúrgica. Estas são impressões iniciais que poderão determinar na realização de outros testes de resistência deste material tão utilizado nas cirurgias ortopédicas.10 A busca de novos métodos para fixação dos tubérculos e de novos materiais constituintes dos fios de sutura é algo que, no futuro próximo, poderá reduzir o índice de soltura dos tubérculos após as artroplastias do ombro

CONCLUSÃO

O contato do metilmetacrilato com o fio poliéster não acarreta alterações nas suas propriedades elásticas e de resistência à tração.

Trabalho recebido em 25/04/09, aprovado em 31/08/09

Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito de interesses referente a este artigo.

Trabalho realizado no Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG

  • 1. Spercer EE, Chisell HR, Spang J, Feagin JA Jr, Manoff EM, Rohatgi SD. Behavior of sutures used in anterior cruciate ligament reconstructive surgery. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 1996;4:84-8.
  • 2. Greenwald D, Shumway S, Albear P, Gottlieb L. Mechanical comparison of 10 suture materials before and after in vivo incubation. J Surg Res. 1994; 56:372-7.
  • 3. Colton T. Statistics in medicine. Boston: Little Brown; 1974.
  • 4. Becker R, Schröder M, Röpke M, Starke C, Nebelung W. Structural properties of sutures used in anchoring multistranded hamstrings in anterior cruciate ligament reconstruction: a biomechanical study. Arthroscopy. 1999 15:297-300.
  • 5. Copeland S. Operative shoulder surgery. Philadelphia: Churchill Livingstone; 1995. p.249-66.
  • 6. Boileau P, Krishanam SG, Tinsi L, Walch G, Coste JS, Molé D. Tuberosity malposition and migration: reasons for poor outcomes after hemiarthroplasty for displaced fractures of the humerus. J Shoulder Elbow Surg. 2002;11:401-12.
  • 7. Frankle MA, Ondrovic LE, Markee BA, Harris ML, Lee WE 3rd. Stability of tuberosity reattachament in proximal humeral hemiarthroplasty. J Shoulder Elbow Surg. 2002;11:413-20.
  • 8. Frankle MA, Mighell MA. Techniques and principles of tuberosity fixation for proximal humeral fractures treated with hemiarthroplasty. J Shoulder Elbow Surg. 2004:239-47.
  • 9. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 13904. Fios para sutura cirúrgica. Maio, 2003. Disponível em: http://www.abnt.org.br
  • 10. Tayor B, Bayat A. Basic plastic surgery techniques and principles: Choosing the right suture material. Student Br Med J. 2003;11:140-1.
  • Endereço para correspondência:
    Rua Groelândia 195 apto 202
    CEP 30320.060 Bairro Sion, Belo Horizonte - MG. Brasil.
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Aceito
      31 Ago 2009
    • Recebido
      25 Abr 2009
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