Acessibilidade / Reportar erro

Efeitos cognitivos e emocionais do estresse ocupacional em profissionais de enfermagem

Resumos

OBJETIVOS: Investigar, de forma integrada, possíveis indicadores de alterações cognitivas, depressão, ansiedade e agentes estressores ocupacionais em auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros de diversos setores da Santa Casa de Misericórdia de Assis-SP, por meio de instrumentos de rastreio psicológico e cognitivo. MÉTODOS: Participaram do estudo 66 profissionais de enfermagem, avaliados por instrumentos de rastreio psicológico e cognitivo. RESULTADOS: A experiência de estresse não foi homogênea na equipe de enfermagem; escores altos no rastreio de depressão foram associados a escores cognitivos baixos. CONCLUSÃO: Auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros foram afetados pelo estresse, portanto, atenção à saúde do trabalhador deve ser oferecida a toda a equipe de enfermagem.

Esgotamento profissional; Equipe de enfermagem; Ansiedade; Depressão; Manifestações neurocomportamentais


OBJECTIVE: Investigating the indicators of stress, anxiety, depression and the cognitive changes in members of the nursing team at Santa Casa de Misericórdia de Assis SP. METHODS: 66 nursing professionals participated in the study, evaluated by psychological and cognitive tracking instruments. RESULTS: The stress experience was not homogenous in the nursing team; high scores in the depression tracking were associated to low cognitive scores. CONCLUSION: Nursing auxiliaries and technicians were affected by stress. Therefore, worker's healthcare should be provided for the whole nursing team.

Burnout, professional; Nursing, team; Anxiety; Depression; Neurobehavioral manifestations


OBJETIVOS: Investigar, de forma integrada, posibles indicadores de alteraciones cognitivas, depresión, ansiedad y agentes estresores ocupacionales en auxiliares y técnicos de enfermería así como de enfermeros de diversos sectores de la Santa Casa de Misericordia de Asís-SP, por medio de instrumentos de rastreo psicológico y cognitivo. MÉTODOS: Participaron en el estudio 66 profesionales de enfermería, evaluados por instrumentos de rastreo psicológico y cognitivo. RESULTADOS: La experiencia de estrés no fue homogénea en el equipo de enfermería; los escores altos en el rastreo de depresión fueron asociados a escores cognitivos bajos. CONCLUSIÓN: Los auxiliares y técnicos de enfermería y enfermeros se vieron afectados por el estrés por lo que la atención a la salud del trabajador, debe ser ofrecida a todo el equipo de enfermería.

Agotamiento profesional; Grupo de enfermería; Ansiedad; Depresión; Manifestaciones neurocomportamentales


ARTIGO ORIGINAL

Efeitos cognitivos e emocionais do estresse ocupacional em profissionais de enfermagem*

Efectos cognitivos y emocionales del estrés ocupacional en profesionales de enfermería

Bruna PaschoaliniI; Mônica Martins OliveiraI; Michele Cândida FrigérioI; Ana Luiza Ribeiro Pereira DiasI; Flávia Heloísa dos SantosII

IAcadêmicas de Psicologia da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" - UNESP - Assis (SP), Brasil

IIDoutora, Professora do Departamento de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" - UNESP - Assis (SP), Brasil

Autor Correspondente

RESUMO

OBJETIVOS: Investigar, de forma integrada, possíveis indicadores de alterações cognitivas, depressão, ansiedade e agentes estressores ocupacionais em auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros de diversos setores da Santa Casa de Misericórdia de Assis-SP, por meio de instrumentos de rastreio psicológico e cognitivo.

MÉTODOS: Participaram do estudo 66 profissionais de enfermagem, avaliados por instrumentos de rastreio psicológico e cognitivo.

RESULTADOS: A experiência de estresse não foi homogênea na equipe de enfermagem; escores altos no rastreio de depressão foram associados a escores cognitivos baixos.

CONCLUSÃO: Auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros foram afetados pelo estresse, portanto, atenção à saúde do trabalhador deve ser oferecida a toda a equipe de enfermagem.

Descritores: Esgotamento profissional; Equipe de enfermagem; Ansiedade; Depressão; Manifestações neurocomportamentais

RESUMEN

OBJETIVOS: Investigar, de forma integrada, posibles indicadores de alteraciones cognitivas, depresión, ansiedad y agentes estresores ocupacionales en auxiliares y técnicos de enfermería así como de enfermeros de diversos sectores de la Santa Casa de Misericordia de Asís-SP, por medio de instrumentos de rastreo psicológico y cognitivo.

MÉTODOS: Participaron en el estudio 66 profesionales de enfermería, evaluados por instrumentos de rastreo psicológico y cognitivo.

RESULTADOS: La experiencia de estrés no fue homogénea en el equipo de enfermería; los escores altos en el rastreo de depresión fueron asociados a escores cognitivos bajos.

CONCLUSIÓN: Los auxiliares y técnicos de enfermería y enfermeros se vieron afectados por el estrés por lo que la atención a la salud del trabajador, debe ser ofrecida a todo el equipo de enfermería.

Descriptores: Agotamiento profesional; Grupo de enfermería; Ansiedad; Depresión; Manifestaciones neurocomportamentales

INTRODUÇÃO

O estresse caracteriza-se por uma resposta adaptativa do organismo frente a novas situações, especialmente àquelas entendidas como ameaçadoras(1). É considerado um processo individual, com variações sobre a percepção de tensão(2) e manifestações psicopatológicas diversas(3). No âmbito laboral pode produzir uma diversidade de sintomas físicos, psíquicos e cognitivos(4), por requerer respostas adaptativas prolongadas, para tolerar, superar ou se adaptar a agentes estressores(5-6), as quais podem comprometer o indivíduo e as organizações(7-8).

A atividade laboral hospitalar é caracterizada por excessiva carga de trabalho, contato com situações limite, alto nível de tensão e de riscos para si e para outros(9). Inclui problemas de relacionamento interpessoal entre indivíduos que prestam assistência direta aos pacientes(10) e preocupações com demandas institucionais(11). Contudo, não se tem conhecimento de estudos que investiguem, de forma integrada, indicadores de alterações cognitivas e emocionais frente aos agentes estressores que afetam o exercício profissional na área da enfermagem.

Autores(12) realizaram estudo com enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem que atuam em unidades de tratamento intensivo (UTIs), e verificaram que os principais fatores estressantes relatados foram limitações das condições de trabalho e dificuldades no relacionamento interpessoal. Uma possível explicação é que a comunicação em equipes multidisciplinares (nutricionistas, psicólogos, enfermeiros, fisioterapeutas, farmacêuticos, dentistas e médicos) é marcada por uma dificuldade de atuação em grupo(13), gerada pelo desconhecimento do papel dos colegas. Outro estudo(14) indicou que mais da metade dos enfermeiros (66,7%; N=8) apresentaram sinais de sofrimento físico e/ou psicológico característicos da fase de resistência, que é uma resposta ao estresse intermediária entre alerta e exaustão.

Pesquisadores(15) encontraram índices médios de tensão em 73 enfermeiros em unidades de emergência de hospitais públicos e privados, com escores mais elevados referentes às condições de trabalho e administração de pessoal, mostrando a necessidade de investimento nas condições de trabalho, o que inclui a aquisição de materiais de qualidade e em quantidade ideal, além da contratação de número suficiente de funcionários.

Quanto a qualidade de vida e sintomas depressivos em residentes de enfermagem(16), rastreados respectivamente pelo Inventário de Depressão de Beck(17) e o questionário de qualidade de vida SF-36(18), concluiu-se que houve uma prevalência de disforia/depressão em 27,9% (N=68) dos residentes de enfermagem.

De acordo com o modelo trifásico de Selye(19), os efeitos do estresse podem manifestar-se, tanto na área somática como na cognitiva, e aparecem em seqüência e gradação de seriedade, à medida que as fases do estresse se agravam.

Em resumo, os agentes estressores em ambiente hospitalar são mais relacionados aos fatores intrínsecos ao trabalho, às relações profissionais e à estrutura organizacional(20), e podem produzir efeitos físicos(4,14), emocionais(4,16) e cognitivos(4,14). Embora a literatura específica seja escassa, a ênfase dos estudos é sob o exercício profissional, particularmente de enfermeiros, nas UTIs e pronto socorros, de forma que pouco se sabe sobre o enfrentamento de agentes estressores em outros setores hospitalares e pelos demais profissionais que compõem a equipe de enfermagem.

O objetivo geral do presente estudo foi investigar, de forma integrada, possíveis indicadores de alterações cognitivas, depressão, ansiedade e agentes estressores ocupacionais em auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros de diversos setores da Santa Casa de Misericórdia de Assis-SP, por meio de instrumentos de rastreio psicológico e cognitivo. Teve como objetivos específicos verificar se: os efeitos dos agentes estressores apresentam as mesmas características em diferentes setores hospitalares; auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros possuem a mesma percepção quanto aos agentes estressores ocupacionais; os agentes estressores produzem efeitos cognitivos e emocionais associados ou independentes. Esse hospital não possui um serviço de apoio psicológico aos profissionais de saúde, um dos fatores que determinou a seleção do mesmo para a realização do estudo.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O projeto de estágio curricular "Aspectos psicobiológicos no ambiente de trabalho" respeita a Resolução n.º 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. O estágio foi aprovado pelo Conselho de Graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista, UNESP, campus de Assis em 07/10/2005, órgão que regulamenta estágios curriculares, e autorizado pelo Conselho Administrativo da Santa Casa de Misericórdia de Assis.

Casuística

A instituição possuía 110 funcionários na equipe de enfermagem, dos quais dez encontravam-se licenciados por motivos de saúde. Foram realizadas 80 entrevistas, entretanto, tendo em vista a existência de questionários incompletos, foram incluídos no presente estudo relatos de 66 profissionais de enfermagem, sendo 18 homens e 48 mulheres, que trabalhavam em turnos de 12 por 36 horas, plantões de oito horas ou de seis horas em nove setores do hospital: MAT=Maternidade; CMF=Clínica Médica Feminina; PART=Particular; PA=Pronto Atendimento; CMM=Clínica Médica Masculina; ORT=Ortopedia; PED=Pediatria; CM=Central de Medicamentos; CCIR=Centro Cirúrgico.

Procedimentos

Foram efetuadas visitas de observação organizacional para obtenção e registro de informações sobre a dinâmica e infra-estrutura do hospital. Em seguida, cada profissional foi avaliado individualmente por uma estagiária dentro do turno, em sessão única, por aproximadamente 30 minutos. Após a entrevista estruturada breve, os instrumentos de rastreio foram aplicados, em ordem aleatória. Os dados das observações e das avaliações foram obtidos entre março e setembro de 2006.

Instrumentos de rastreio

Mini-Exame do Estado Mental - MEEM(21). Instrumento de rastreio breve, que avalia funções cognitivas específicas (orientação espacial e temporal, atenção, leitura, escrita, memória e capacidade construtiva visual) e permite rastrear disfunções cognitivas com indícios de organicidade cerebral, sendo útil na identificação de casos clínicos quanto à gravidade (de comprometimento cognitivo leve à demência). Cada item correto é pontuado com 1 ponto. O escore pode variar de 0 a 30 pontos. O ponto de corte 23/24 tem boa sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de demência.

Escala Beck de Depressão - BDI(17, 22-23). Trata-se de uma escala de auto-relato para levantamento de sintomas depressivos. Composta por 21 itens com intensidade variável de 0 a 3, sobre temas como tristeza, pessimismo, culpa, idéias suicidas, irritabilidade, retração social, indecisão, inibição para o trabalho, sono, fadiga, apetite, libido, etc. Pontuação de 0 a 11 indica ausência de depressão; de 12 a 19, depressão leve; de 20 a 35 grave e, de 36 a 63, gravíssima.

Inventário Ansiedade Traço Estado - IDATE(24). Instrumento de auto-relato que contém duas escalas: IDATE-E (estado); sentimentos subjetivos e transitórios de tensão, e IDATE-T (traço); reações mais estáveis (de personalidade) frente a situações ameaçadoras. É composto de 20 itens para cada escala, com intensidade variável de 0 (nunca) a 4 (sempre) e pontuação de 20 a 80 pontos. A Resolução n.º 002/2003 do Conselho Federal de Psicologia autoriza o seu uso em pesquisas científicas e recomenda a revisão e atualização de dados normativos.

Teste de Fluência Verbal Semântica para a categoria Animais. Pede-se ao participante para dizer todos os nomes de animais que se lembrar no período de um minuto. A pontuação é obtida por meio da soma de todas as respostas corretas. O desempenho médio para indivíduos com mais de oito anos de estudo seria de 15,8 animais(25).

Inventário de Estresse em Enfermeiros - IEE(26). Investiga agentes estressores da profissão do enfermeiro. Contém 44 itens, com respostas de intensidade 1 (nunca) a 5 (sempre). É composto de três fatores específicos: Relações Interpessoais (RI), Papéis Estressores na Carreira (PEC) e Fatores Intrínsecos ao Trabalho (FIT) e um fator de segunda ordem, Estrutura e Cultura Organizacional (ECO). Cada fator pode atingir a pontuação máxima de 55 pontos e a soma total dos fatores pode variar entre 44 e 220 pontos. Quanto mais altos os escores obtidos, maiores os índices de tensão no ambiente de trabalho.

Análise estatística

Os dados obtidos foram analisados pelo software do Statistica for Windows release 5.0 - Statsoft Incorporation 1984-1999. Para análises descritivas foram calculados médias, desvios-padrão e porcentagens de resposta. Para a análise inferenciais utilizou-se a ANOVA, tendo como variáveis dependentes as respostas (número de acertos ou pontos) em itens da entrevista, escores de testes e escalas, e como variável independente os grupos (auxiliares, técnicos e enfermeiros). Para as quatro categorias do IEE utilizou-se a MANOVA com os mesmos fatores entre grupos. Os contrastes foram obtidos pelo teste de Duncan e o nível de significância adotado foi de 5%. Foram realizadas análises de correlação pelo Coeficiente de Pearson (r) entre os instrumentos de rastreio. Adotou-se, como escore mínimo para discussão, as correlações moderadas (r>0,40; p<0,05).

RESULTADOS

Perfil institucional

Por meio da observação organizacional verificou-se que a Santa Casa de Misericórdia de Assis - SP, instituída em 1919, é uma instituição filantrópica conveniada com o Sistema Único de Saúde, que conta com 118 leitos distribuídos em 11 clínicas. Possui um corpo de enfermagem de 110 pessoas, entre funcionários ativos e inativos. Realiza em média 600 internações por mês e recebe cerca de 3.000 pessoas/mês no atendimento ambulatorial.

Perfil amostral

A entrevista estruturada evidenciou que a idade média dos participantes foi 33,74 (± 9,30) anos. Quanto à função, foram 40 auxiliares de enfermagem, 21 técnicos de enfermagem e 5 enfermeiros, dos quais 74,24% não possuíam outro emprego. Quanto ao estado civil, 56,06% dos entrevistados se declararam casados; 54,55% declararam ter entre um e quatro filhos. A média do tempo de exercício da função foi de 71,28 (± 63,88) meses, e a média de tempo de trabalho na Instituição foi de aproximadamente 4 anos e 10 meses, com variação de 1 a 20 anos. Não houve efeito de grupo quanto ao tempo de exercício da função [F(2,63)=2,16; p=0,12] e ao tempo de trabalho no hospital [F(2,63)=1,45; p=0,24]. Quanto à escolaridade, 45 profissionais possuíam entre 10 e 11 anos de estudo, 11 pessoas tinham entre 11 e 12 anos de estudo e outros 10 possuíam até 15 anos de escolaridade. Houve diferença quanto à escolaridade [F(2,63)=23,73; p<0,001], enfermeiros apresentaram em média 15 anos de estudo em contraste aos 11 anos médios de auxiliares e técnicos de enfermagem (Duncan; ps<0,0001). Embora a diferença fosse previsível, houve exceções, nas quais o cargo exercido era incompatível com a qualificação (quatro auxiliares de enfermagem, e um técnico de enfermagem possuíam formação superior).

Entrevista

Na entrevista, 81,81% relataram considerar sua profissão estressante. Por esse motivo, realizou-se uma ANOVA para medidas repetidas para a questão "Sente mais estresse antes, durante ou após o trabalho?". Não houve efeito de grupo [F(2,63)=2,03; p=0,13], entretanto, houve efeito de período [F(2,126)=6,41; p=0,002], sendo que os estressores foram percebidos mais freqüentemente durante e após o trabalho (Duncan, ps<0,05). Quanto ao período do dia em que sentiam mais tensão, três participantes disseram senti-la apenas antes do trabalho, 22, apenas durante o trabalho e 21, apenas após o trabalho. A percepção de tensão durante o trabalho variou conforme o setor hospitalar: MAT=50%; CMF=16%; PART=50%; PA=75%; CMM=33%; ORT=50%; PED=60%; CM=60%; CCIR=75%. Houve casos em que os participantes escolheram mais de uma alternativa. Para cinco deles, o estresse é sentido nos três momentos pesquisados, enquanto seis relataram não sentir estresse em nenhum momento. Os demais oscilaram entre os três períodos. A Figura 1 mostra a percepção do estresse por período e categoria profissional.


Instrumentos de rastreio

A Tabela 1 apresenta os escores obtidos por grupos nos instrumentos utilizados. Não houve diferenças entre os grupos para MEEM, IDATE-T, IDADE-E e Fluência Verbal, exceto para o escore total do IEE. Em seguida, os itens do IEE foram agrupados em quatro categorias de resposta(17), contudo a MANOVA não detectou efeito de grupo [Rao R (8,118)=1,51; p=0,161].

Análise de Correlação de Pearson (r)

O MEEM apresentou correlação moderada com a tarefa de Fluência Verbal Semântica (r=0,46) e alta com o subteste de cálculo (r=0,78), bem como correlação interna entre os subtestes que avaliam memória verbal: evocação imediata e tardia (r=0,45). O BDI exibiu correlação positiva com o IDATE-T (r=0,61) e uma correlação negativa (r=-0,43) com o subteste Orientação Temporal do MEEM. O IDATE-E apresentou correlação interna com o IDATE-T (r=0,49). O IEE apresentou correlações internas altas: IEE-FIT (r=0,86), IEE-RT (r=0,84), IEE-PEC (r=0,89) e IEE-ECO (r=0,94).

DISCUSSÃO

O relato subjetivo da entrevista breve foi compatível com as medidas quantitativas, revelando a presença de comprometimentos sutis das funções cognitivas, do humor e de estresse ocupacional. Houve associação entre diferentes indicadores.

A maioria dos profissionais declarou considerar sua profissão estressante e seus efeitos foram mais referidos durante o exercício profissional, contudo houve exceções, corroborando estudos que afirmam que a resposta ao estresse é um processo individual e que para algumas pessoas a percepção de tensão é maior(2). Além disso, em sete dos nove setores hospitalares, os relatos de tensão durante o exercício profissional ultrapassaram 50%, alcançando 75% no pronto atendimento e centro cirúrgico(15). Na presente amostra, similar a outros estudos(9,15) os agentes estressores mais relatados foram as condições e a organização do trabalho, no entanto, distinguiu-se de outro estudos, pois o relacionamento interpessoal foi relatado como satisfatório (IEE - RT entre 25,12 e 33,6)(10) e a sobrecarga laboral por dupla jornada foi vista em apenas um terço dos entrevistados(4). Observou-se também pessoas exercendo funções com demandas inferiores às suas qualificações. Estas constatações sugerem que os agentes estressores possuem características intrínsecas às demandas sócio-econômicas e culturais de cada cidade.

Quanto aos aspectos cognitivos, os escores do MEEM e do teste Fluência Verbal foram similares aos dados normativos(21,25), embora os escores de cálculos e orientação temporal fossem levemente rebaixados. Além disso, na tarefa de evocação tardia apenas 50% da amostra recordou todos os itens. A cronicidade do estado de estresse pode diminuir sensivelmente as funções cognitivas e produzir prejuízos cognitivos(19).

Em relação ao rastreio do humor, o escore médio do BDI esteve abaixo da nota de corte para indicadores de depressão, entretanto, quase um terço da amostra obteve escores compatíveis com a classificação de disforia(16). Houve correlação negativa entre BDI e um subteste do MEEM, indicando que altos escores de depressão foram associados a limitações na orientação temporal. Em outras palavras, um comprometimento leve do humor relacionou-se significativamente com efeitos sutis sob as habilidades cognitivas, demonstrando uma associação entre efeitos cognitivos e emocionais.

No que tange à ansiedade, as médias encontradas no IDATE correspondem às normas brasileiras(24) e estudo prévio(12) evidenciando que o exercício da profissão não causaria, nestes profissionais, escores elevados de ansiedade nas modalidades traço e estado. A correlação entre IDATE-T e BDI indica uma similaridade entre sintomas de ansiedade e de depressão, portanto, recomenda-se o rastreio de ambos os transtornos afetivos em profissionais de enfermagem, e diagnóstico diferencial quando necessário.

Quanto ao estresse ocupacional, os escores do IEE foram similares aos dados normativos(26) e a outro estudo(15), sendo classificados como médios. Entretanto, o escore total de enfermeiros foi maior que o de técnicos e auxiliares, indicando que os agentes estressores laborais são percebidos com maior intensidade por estes profissionais. A análise por categorias específicas do IEE não detectou diferenças entre os grupos. Deve-se considerar que o IEE foi originalmente elaborado para enfermeiros e, neste estudo, foi utilizado também para auxiliares e técnicos de enfermagem, cujas atribuições e responsabilidades são diferentes. Os sintomas físicos e psíquicos foram similares aos relatados na literatura(12,15,20) e equivalentes aos IEE.

Em resumo, quantitativamente, os níveis de ansiedade e de estressores ocupacionais verificados estavam dentro da normalidade, estes últimos com escores mais altos para enfermeiros. Qualitativamente, o ambiente de trabalho foi considerado estressante pela maioria dos entrevistados, que relatou sentir maiores efeitos durante o trabalho. Na BDI, a média da amostra indica que se trata de uma população normal, com leve tendência à disforia. Os escores no MEEM indicam que as funções mentais estão preservadas, porém há uma pequena defasagem na pontuação do cálculo, orientação temporal e memória, em associação com indicadores de depressão. No entanto, esses resultados sugerem prejuízos leves, possivelmente porque a amostra é jovem, com poucos anos de exercício profissional e de vínculo institucional. Entretanto, estes resultados alertam para o risco de que prejuízos mais graves possam ser evidenciados futuramente se estes profissionais permanecerem expostos ao estresse ocupacional crônico(19).

Considerando os objetivos da presente pesquisa, o estudo demonstrou que: os efeitos dos agentes estressores apresentam intensidades variáveis em diferentes setores de um mesmo hospital; enfermeiros referem maior intensidade dos estressores ocupacionais, em relação a auxiliares e técnicos de enfermagem e; ainda, os agentes estressores produziram efeitos cognitivos e emocionais associados.

Após a apresentação dos resultados à Santa Casa de Misericórdia de Assis foram propostas as seguintes estratégias para promoção de saúde e qualidade de vida para a equipe de enfermagem: Palestras educativas sobre agentes estressores e o seu enfrentamento; Mudanças nas condições de trabalho e remanejamento dos funcionários dentro das clínicas; Desenvolvimento de pesquisa de clima organizacional quanto à hierarquia e papéis profissionais; Pesquisas de opinião dos funcionários para facilitar o diálogo e melhorar as condições de trabalho; Nomeação de um responsável por percorrer todas as clínicas para melhorar a logística de materiais; Reavaliação dos indicadores de alterações cognitivas, depressão, ansiedade e agentes estressores ocupacionais em auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros, após um período de seis meses da implementação de mudanças.

CONCLUSÃO

Auxiliares e técnicos de enfermagem e enfermeiros são afetados por agentes estressores, portanto, atenção à saúde do trabalhador deve ser dada a toda a equipe de enfermagem.

AGRADECIMENTOS

Aos profissionais de enfermagem que participaram da pesquisa. À Santa Casa de Misericórdia de Assis SP, que permitiu a realização deste estudo. À docente Dra. Sandra Maria Fortaleza e as estagiárias Angélica Nakazone, Ane Fernandes, Bruna Oliveira, Daniela Macedo, Letícia Negrizole, Natália Almeida e Vivian Bernardes, pelo auxílio na coleta de dados. Ao Dr. Jose Javier Berenguer Pina (Universidad de Murcia, España), pela revisão do resumo em espanhol.

REFERÊNCIAS

  • 1. Sardá Jr JJ, Legal EJ, Jablonski Jr SJ. Estresse: conceitos, métodos, medidas e possibilidades de intervenção. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2004.
  • 2. Da Silva Brito E, Pimenta Carvalho AM. Stress, coping (enfrentamento) e saúde geral dos enfermeiros que atuam em unidades de terapia intensiva e problemas renais. Enfermería Global [ Internet]. 2004 [citado 2007 Dez 11] (4): [aproximadamente 10 p.]. Disponível em: http://www.um.es/ojs/index.php/eglobal/issue/view/59/showToc
  • 3. Margis R, Picon P, Cosner AF, Silveira RO. Relação entre estressores, estresse e ansiedade. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul. 2003; 25(Supl 1): 65-74.
  • 4. Murofuse NT, Abranches SS, Napoleão AA. Reflexões sobre estresse e Burnout e a relação com a enfermagem. Rev Latinoam Enferm. 2005; 13(2):255-61.
  • 5. Couto HA. Stress e qualidade de vida dos executivos. Rio de Janeiro: COP; 1987.
  • 6. Holt RR. Occupational stress. In: Goldberger L, Breznitz S, editors. Handbook of stress: theoretical and clinical aspects. 2nd ed. New York: Free Press; 1993.
  • 7. Cooper CL. Identifying workplace stress: costs, benefits and the way forward. Procedings of the European Conference on Stress at Work; 2003; Brussels: European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions.
  • 8. Moraes LFR, Swan JA, Cooper CL. A study of occupational stress among government white collar workers in Brazil using the occupational stress indicator. Stress Med. 1993; 9:91-104.
  • 9. Elias MA, Navarro VL. A relação entre o trabalho, a saúde e as condições de vida: negatividade e positividade no trabalho das profissionais de enfermagem de um hospital escola. Rev Latinoam Enferm. 2006; 14(4):517-25.
  • 10. Pereira MER. O lazer como aspecto alternativo de alívio de tensão para a equipe de enfermagem em CTI [dissertação ]. Ribeirão Preto: Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 1997.
  • 11. Bonato VL. Procura de atendimento psicoterápico pelo trabalhador da saúde. [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; 1994.
  • 12. Coronetti A, Nascimento ERP, Barra DCC, Martins JJ. O estresse da equipe de enfermagem na unidade de terapia intensiva: o enfermeiro como mediador. ACM Arq Catarin Med. 2006; 35(4):56-63.
  • 13. Saar SRC, Trevizan MA. Professional roles of a health team: a view of its components. Rev Latinoam Enferm. 2007; 15(1):106-12.
  • 14. Ferrareze MVG, Ferreira V, Carvalho AMP. Percepção do estresse entre enfermeiros que atuam em terapia intensiva. Acta Paul Enferm. 2006; 19(3):310-5.
  • 15. Batista KM, Bianchi ERF. Estresse do enfermeiro em unidade de emergência. Rev Latinoam Enferm. 2006; 14(4):534-9.
  • 16. Franco GP, Barros ALBL, Nogueira-Martins LA. Qualidade de vida e sintomas depressivos em residentes de enfermagem. Rev Latinoam Enferm. 2005; 13(2):139-44.
  • 17. Cunha JA. Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2001.
  • 18. Ciconelli RM. Tradução para o português e validação do questionário genérico de avaliação de qualidade de vida "Medical Outcomes Study 36 - item short-form health survey (SF-36)" [tese]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina; 1997.
  • 19. Selye H. The stress of life. New York: McGraw-Hill; 1984.
  • 20. Stacciarini JMR, Tróccoli BT. O estresse na atividade ocupacional do enfermeiro. Rev Latinoam Enferm. 2001; 9(2):17-25.
  • 21. Brucki SMD, Nitrini R, Carmelli P, Bertolucci PHF, Okamoto IH. Sugestões para o uso do mini-exame do estado mental no Brasil. Arq Neuropsiquiatr. 2003; 61(3B):777-81.
  • 22. Beck AT, Ward CH, Mendelson M, Mock J, Erbaugh J. An inventory for measuring depression. Arch Gen Psychiatry. 1961; 4:561-71.
  • 23. Beck AT, Steer RA. BDI: Beck Depression Inventory Manual. New York: Psychological Corporation; 1993.
  • 24. Spielberger CD, Gorsuch RL, Lushene RE. Inventário de ansiedade traço-stado- idate. Rio de Janeiro: Cepa; 1979.
  • 25. Brucki SM, Malheiros SMF, Okamoto IH, Bertolucci PHF. Dados normativos para o teste de fluência verbal categoria animais em nosso meio. Arq Neuropsiquiatr. 1997; 55(1): 56-61.
  • 26. Stacciarini JMR, Tróccoli BT. Instrumento para mensurar o estresse ocupacional: Inventário de Estresse em Enfermeiros (IEE). Rev Latinoam Enferm. 2000; 8(6):40-9.
  • Corresponding author:
    Flávia Heloísa dos Santos
    Av. Dom Antônio, 2100
    Assis - SP - CEP. 19806-900
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Out 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      04 Jun 2008
    • Recebido
      11 Jan 2008
    Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actapaulista@unifesp.br