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Enfermagem e a pesquisa em hipertensão arterial

EDITORIAL

Professora Titular da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - USP, São Paulo (SP), Brasil

A hipertensão arterial é uma doença crônica multifatorial caracterizada por níveis tensionais elevados (>140/90 mmHg nos adultos) e sustentados. Acarreta alterações principalmente em órgãos-alvo como coração, encéfalo, rins e vasos sanguíneos, além de alterações metabólicas(1). Dessa forma, há aumento do risco de eventos cardio-vasculares fatais e não-fatais que representam a primeira causa de morbidade e mortalidade em nosso meio. Em 2006, ocorreram no Brasil 302.682 óbitos por doenças do aparelho circulatório, o que correspondeu a 29,4% do total de óbitos(2). É assintomática, na maioria das vezes e a única maneira de se identificar a hipertensão arterial é realizando o procedimento de medida da pressão. Apesar da comprovada eficácia do tratamento com medidas medicamentosas e não medicamentosas, o controle da hipertensão arterial ainda é um desafio a ser vencido. Apenas cerca de um terço dos hipertensos estão com seus níveis pressóricos controlados, provavelmente em função da baixa adesão ao tratamento. Face a essas colocações, questiona-se como a enfermagem visualiza o contexto da assistência à pessoa hipertensa? O que se tem produzido em pesquisa atende às necessidades, contextualiza a problemática e apresenta propostas?

Analisando-se a produção em quatro periódicos nacionais, com classificação Qualis A da CAPES, sobre hipertensão arterial, foram encontrados 58 artigos publicados. A maioria dos artigos (47) era de estudos descritivos, exploratórios, apenas dois testaram alguma intervenção relacionada à assistência aos hipertensos, e os demais eram de revisão de literatura e relato de experiência. Verificou-se que o principal aspecto abordado recaiu na identificação das características dos hipertensos, identificando sua necessidades para traçar um perfil incluindo variáveis estruturais, socioeconômicas, psicoemocionais, conhecimentos sobre doenças e tratamento, qualidade de vida, dentre outros. Destaca-se que a temática adesão ao tratamento, na maioria das vezes, não foi o foco principal abordado, mas considero que a busca em identificar e conhecer esteja intimamente relacionada aos fatores muito mais dificultadores, do que facilitadores do processo de adesão.

A expressão "adesão ao tratamento" refere-se ao grau de cumprimento das medidas terapêuticas indicadas, sejam elas medicamentosas ou não, com o objetivo de manter a pressão arterial em níveis controlados. Adesão é um processo comportamental complexo, fortemente influenciado pelo meio ambiente, pelos profissionais de saúde e pelos cuidados de assistência prestada. A não adesão é um impedimento ao alcance dos objetivos terapêuticos e pode constituir-se em uma fonte de frustração para os profissionais de saúde. As variáveis biossociais como idade, sexo, raça, escolaridade, nível sócio-econômico, ocupação, estado civil, religião, hábitos de vida, aspectos culturais e crenças de saúde devem ser consideradas na adesão ao tratamento. O conhecimento sobre a doença e tratamento também é uma variável a ser ressaltada, pois tem se verificado que de um modo geral os hipertensos possuem a informação sobre sua problemática de saúde, porém não estão devidamente controlados. A discrepância entre ter informação a respeito da doença e tratamento, e conseguir controlar a pressão arterial aponta para a diferença essencial entre conhecimento e adesão. Enquanto o conhecimento é racional, adesão é um processo complexo, envolvendo fatores emocionais e barreiras concretas, de ordem prática e logística. A cronicidade da doença e ausência de sintomatologia específica; bem como complicações a longo prazo, também merecem atenção. Acrescenta-se ainda a relação com os membros da equipe de saúde, o relacionamento que se estabelece pode ser a base de sustentação para a efetividade do sucesso do tratamento. Características do tratamento medicamentoso podem influenciar na adesão, destacando-se o custo, efeitos indesejáveis, esquemas terapêuticos complexos e tratamento por toda vida, além do acesso aos serviços de saúde.

Considero que já temos bom conhecimento sobre a problemática que envolve o contexto da pessoa hipertensa, em nosso meio. A próxima etapa deve contemplar a proposição de estudos com implementeção e avaliação de estratégias que possam ser úteis para a modificação do panorama atual. A literatura aponta inúmeros recursos que podem ser úteis, porém, o enfermeiro deve testá-los e adequá-los às reais necessidades dos hipertensos.

  • 1. Sociedade Brasileira de Hipertensão. Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial VI. Revista Hipertensão. 2010; 13(1):1-68.
  • 2
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2008: 20 anos de Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil/ Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde.- Brasília: Ministério da Saúde, 2009. 416 p.
  • Enfermagem e a pesquisa em hipertensão arterial

    Angela Maria Geralo Pierin
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010
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