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PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: ORIENTAÇÕES PARA A IDENTIFICAÇÃO DE ÁREAS PRIORITÁRIAS COM FOCO NA BIODIVERSIDADE*

Resumo

O instrumento econômico de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) tem sido considerado uma alternativa para a conservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos em terras privadas. Com a finalidade de orientar os tomadores de decisão no processo de implantação de esquemas de PSA, este artigo teve por objetivo identificar na literatura científica os elementos importantes para se priorizar áreas para a implantação de esquemas de PSA-biodiversidade. Parte-se do argumento de que os elementos extraídos dos esquemas de PSA-biodiversidade devem ser utilizados como referência para orientar a implantação de outros esquemas de PSA baseados na recuperação e manutenção de áreas naturais (e.g. água, carbono, beleza cênica). Dessa forma, a sustentabilidade dos esquemas de PSA poderá ser garantida ao longo do tempo.

Palavras-chave:
Biodiversidade; Instrumento econômico; Gestão ambiental

Abstract

The economic tool of Payment for Environmental Services (PES) has been considered as an alternative for the conservation of the biodiversity and ecosystem services in private lands. To guide decision makers in implementing PES schemes, this paper aimed to identify in the scientific literature the important elements to prioritize areas in the implementation of PES-biodiversity schemes. It is claimed that the elements extracted from PES-biodiversity schemes must be used as a reference to guide the implementation of other PES schemes based on the recovery and maintenance of natural areas (e.g. water, carbon, environmental aesthetics conditions). Thus, the sustainability of PES schemes can be guaranteed over time.

Keywords:
Biodiversity; Economic tool; Environmental management

Resumen

El instrumento económico de Pago por Servicios Ambientales (PSA) es una alternativa para la conservación de la biodiversidad y de los servicios ecosistémicos en terrenos privados. Con la finalidad de orientar a tomadores de decisión, en el proceso de implementación de esquemas de PSA, este trabajo tiene como objetivo identificar en la literatura científica elementos importantes para la priorización de áreas en la implementación de esquemas de PSA-biodiversidad. La condicionante de partida es, que los elementos extraídos de los esquemas de PSA-biodiversidad tienen que ser utilizados como referencia para orientar la implantación de otro esquema de PSA basados en la recuperación y manutención de las áreas naturales (p.e. agua, carbón, belleza escénica). De esta forma la sustentabilidad de los esquemas de PSA pueden garantizarse a lo largo del tiempo.

Palabras clave:
Biodiversidad; Instrumento económico; Gestión ambiental

Introdução

O bem-estar humano e o sistema econômico são fortemente dependentes do capital natural (i.e. água, ar, solo, fauna e flora) e dos serviços resultantes do funcionamento dos ecossistemas (COSTANZA et al., 1997COSTANZA, R. et al. The value of the world’s ecosystem services and natural capital. nature, v. 387, n. 6630, p. 253-260, 1997.). Por serviços ecossistêmicos entendem-se os benefícios que as populações humanas recebem dos ecossistemas, tais como fertilidade do solo, polinização, manutenção da qualidade da água e do ar, controle de erosão, entre outros (MEA, 2005). Cabe ressaltar que os serviços ecossistêmicos são comumente utilizados como sinônimos de serviços ambientais (MURADIAN et al., 2010MURADIAN, R. et al. Reconciling theory and practice: An alternative conceptual framework for understanding payments for environmental services. Ecological Economics, v. 69, n. 6, p. 1202-1208, 2010.), porém estes diferem-se de serviços ecossistêmicos por serem gerados por meio das ações antrópicas, ou seja, correspondem aos benefícios advindos da gestão e manejo sustentável dos sistemas naturais (MURADIAN et al., 2010; WUNDER, 2015WUNDER, S. Revisiting the concept of payments for environmental services. Ecological Economics, v. 117, p. 234-243, 2015.).

Para que um bem ou um serviço ecossistêmico seja eficientemente alocado pelo mercado privado, este deve ser exclusivo e rival. Um bem ou um serviço exclusivo é aquele cuja propriedade é possível, ou seja, um indivíduo deve ser capaz de usar o bem ou o serviço em questão e evitar que outros indivíduos o utilizem. A excludabilidade virtualmente é considerada como sinônimo de direito de propriedade. Neste sentido, o estabelecimento de um regime institucional, seja político, religioso ou cultural, é requerido para garantir o direito de propriedade dos recursos (FARLEY, 2010FARLEY, J. Conservation through the economics lens. Environmental Management, v.45, n. 1, p. 26-38, 2010.). Segundo Farley (2010FARLEY, J. Conservation through the economics lens. Environmental Management, v.45, n. 1, p. 26-38, 2010.), um bem ou um serviço rival, por sua vez, é aquele que o uso de uma unidade por um indivíduo impede o uso da mesma unidade, simultaneamente, por outro indivíduo. Diferentemente da excludabilidade, a rivalidade é uma propriedade inerente do bem ou do serviço em questão, não relacionada com os arranjos institucionais (FARLEY, 2010).

Os mercados privados falham na alocação eficiente de bens ou de serviços cujos direitos de propriedade não são nitidamente estabelecidos. É o caso dos bens públicos (e.g. regulação climática), que se caracterizam por ser não exclusivos e não rivais. O consumidor de um bem público não pode ser impedido de usufruir dos benefícios gerados pelo bem em questão mesmo se este consumidor não pagar pelo seu uso (i.e. problema de free-rider) (FARLEY, 2010FARLEY, J. Conservation through the economics lens. Environmental Management, v.45, n. 1, p. 26-38, 2010.). No caso dos bens comuns (i.e. não exclusivos, mas rivais), por sua vez, o consumidor do bem ou do serviço não pode ser impedido de utilizá-lo, mas seu uso impedirá que outros usuários usufruam do benefício com qualidade e quantidade equivalentes. A ideia dos indivíduos utilizando um recurso comum em excesso, poderá culminar na indisponibilidade deste para a sociedade (i.e. tragédia dos comuns) (HARDIN, 2009HARDIN, G. The tragedy of the commons. Journal of Natural Resources Policy Research, v. 13, p. 243-253, 2009.).

Na impossibilidade de se atribuir direitos de propriedade, as forças de mercado produzirão poucos resultados efetivos para a conservação dos recursos naturais. Dessa forma, e a fim de corrigir essa falha de mercado, os governos podem “intervir” e agir em nome dos bens públicos e dos bens comuns, de modo a preservar os serviços ecossistêmicos em terras privadas (FARLEY, 2010FARLEY, J. Conservation through the economics lens. Environmental Management, v.45, n. 1, p. 26-38, 2010.). O governo pode, por exemplo, determinar um conjunto de regras que visem controlar o uso dos recursos naturais e garantir a alocação eficiente dos mesmos a um custo menor do que ocorreria no mercado privado (COASE, 2009COASE, R. O problema do custo social. The Latin American and Caribbean journal of legal studies, v. 3, n. 1, 2009.).

Muitas das intervenções governamentais referentes ao controle das externalidades têm assumido a forma das regulamentações de comando-e-controle (e.g. prescrição e sanções financeiras). Alguns autores defendem que é através das políticas baseadas em incentivos (e.g. redução de impostos, subsídios e pagamentos) que as externalidades são internalizadas (JACK; KOUSKY; SIMS, 2008JACK, B. K.; KOUSKY, C.; SIMS, K. R. E. Designing payments for ecosystem services: Lessons from previous experience with incentive-based mechanisms. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 105, n. 28, p. 9465- 9470, 2008.). É neste contexto que se insere o instrumento de incentivo econômico de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). O PSA pode ser definido como uma transação voluntária entre os usuários e os fornecedores dos serviços ambientais, de modo que os fornecedores estejam condicionados às regras de gestão e manejo dos recursos naturais dentro e fora das áreas de provisão dos serviços (WUNDER, 2015WUNDER, S. Revisiting the concept of payments for environmental services. Ecological Economics, v. 117, p. 234-243, 2015.).

Dentre os mercados de PSA existentes (i.e. água, carbono, beleza cênica e biodiversidade), os relacionados à biodiversidade encontram mais dificuldades em se desenvolver (ENGEL; PAGIOLA; WUNDER, 2008ENGEL, S.; PAGIOLA, S.; WUNDER, S. Designing payments for environmental services in theory and practice: An overview of the issues. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 663-674, 2008.), particularmente pelo fato dos proprietários rurais não receberem compensações financeiras diretas para proteger serviços com características de não excludabilidade e de não rivalidade (HANLEY et al., 2012HANLEY, N. et al. How should we incentivize private landowners to “produce” more biodiversity? Oxford Review of Economic Policy, v. 28, n. 1, p. 93-113, 2012.). Ou seja, a biodiversidade, entendida como um bem público, depende da atribuição de valores e de direitos de uso para se tornar exclusiva (FARLEY, 2010FARLEY, J. Conservation through the economics lens. Environmental Management, v.45, n. 1, p. 26-38, 2010.).

Não obstante, os processos naturais dependem substancialmente da biodiversidade em termos das características funcionais dos organismos e da distribuição e abundância destes no espaço e no tempo. Dessa forma, a biodiversidade passa a desempenhar um papel importante nos diferentes níveis hierárquicos de provisão dos serviços, podendo ser abordada como um regulador dos processos ecossistêmicos (e.g. ciclos de nutrientes do solo), como um serviço ecossistêmico final (e.g. a riqueza de espécies como um proxy da diversidade genética contribui com a produção de medicamentos) ou mesmo como um bem (e.g. a biodiversidade possui valores culturais, estéticos, espirituais, educacionais). O fato é que os serviços ecossistêmicos são afetados pelas mudanças na diversidade biológica, as quais, na maioria das vezes, não são lineares e são difíceis de prever (MACE; NORRIS; FITTER, 2012MACE, G. M.; NORRIS, K.; FITTER, A. H. Biodiversity and ecosystem services: a multilayered relationship. Trends in Ecology & Evolution, v. 27, n. 1, p. 19-26, 2012.).

Ressalta-se ainda que o baixo embasamento científico (NAEEM et al., 2015NAEEM, S. et al. Get the science right when paying for nature’s services. Science, v.347, n.6227, p. 1206-1207, 2015.), a ausência de dados e de informações simétricas entre os agentes econômicos (FERRARO, 2008FERRARO, P. J. Asymmetric information and contract design for payments for environmental services. Ecological Economics, v. 65, p. 810-821, 2008.), assim como a baixa capacidade de monitorar e avaliar a efetividade dos esquemas de PSA, aliados aos orçamentos limitados, têm ocasionado um descompasso entre design ótimo e viabilidade dos esquemas de pagamento como mecanismos efetivos para a conservação (NAEEM et al., 2015). Dessa forma, existe a necessidade de orientar os tomadores de decisão no processo de identificação de áreas prioritárias para a implementação de esquemas de PSA, de modo a direcionar a distribuição adequada dos geralmente escassos recursos financeiros destinados para este fim e otimizar a provisão dos serviços ecossistêmicos em terras privadas (HEIN; MILLER; DE GROOT, 2013HEIN, L.; MILLER, D. C.; DE GROOT, R. Payments for ecosystem services and the financing of global biodiversity conservation. Current Opinion in Environmental Sustainability, v. 5, n. 1, p. 87-93, 2013.; WÜNSCHER; ENGEL, 2012WÜNSCHER, T.; ENGEL, S. International payments for biodiversity services: Review and evaluation of conservation targeting approaches. Biological Conservation, v. 152, p. 222-230, 2012.).

Portanto, considerando que a estrutura dos ecossistemas sustenta a diversidade biológica, que, por sua vez, sustenta a provisão dos serviços ecossistêmicos, o objetivo deste artigo é identificar na literatura científica os elementos importantes para priorizar áreas destinadas à implantação de esquemas de PSA-biodiversidade em terras privadas. Ainda que o foco da revisão deste artigo possa estar direcionado aos esquemas de PSA-biodiversidade, argumenta-se que os elementos identificados devem ser utilizados como referência para orientar a implantação de outros esquemas de PSA baseados na recuperação e na manutenção de áreas naturais (e.g. água, carbono, beleza cênica), de modo a garantir a sustentabilidade e a efetividade dos esquemas de PSA ao longo do tempo.

Método

Para identificar quais os elementos indicados pela literatura científica para priorizar áreas à implantação de esquemas de PSA-biodiversidade, utilizou-se a revisão bibliográfica sistemática (RBS) como método de coleta e síntese dos dados. A RBS tem por objetivo informar qual a melhor evidência disponível na literatura de interesse, de modo a otimizar o processo de tomada de decisão. As principais características de uma RBS são a transparência e a replicabilidade dos procedimentos adotados, o que a colocam à parte da maioria das revisões tradicionais publicadas na área de ciências ambientais (COOK; POSSINGHAM; FULLER, 2013COOK, C. N.; POSSINGHAM, H. P.; FULLER, R. A. Contribution of Systematic Reviews to Management Decisions. Conservation Biology, v. 27, n. 5, p. 902-915, 2013.). As etapas da RBS aplicadas nesta pesquisa foram adaptadas das recomendações dispostas no “Guia de orientações para revisões sistemáticas na gestão ambiental”, versão 4.2, da Collaboration for Environmental Evidence (CEE, 2013).

Assim, a primeira etapa do processo de execução da RBS foi delimitar a pergunta norteadora da pesquisa, a partir da qual foram estabelecidos os termos de busca e as questões de elegibilidade para a seleção dos trabalhos relevantes, qual seja: “Quais são os elementos indicados pela literatura científica para priorizar áreas à implantação de esquemas de pagamento por serviços ambientais direcionados à conservação da biodiversidade?”.

As buscas por trabalhos relevantes restringiram-se às duas principais plataformas científicas para as áreas das ciências ambientais e das engenharias, a saber: Scopus e Web of Science. As buscas foram realizadas para todos os tipos de documentos indexados nas respectivas plataformas científicas e para todos os anos até o mês de março de 2017. Os termos de busca adotados estão apresentados no Quadro 1.

Quadro 1
Termos utilizados na busca por trabalhos relevantes inseridos nas plataformas científicas Scopus e Web of Science

Destaca-se a inserção do termo Design no processo de busca por trabalhos relevantes, visto que este não é sinônimo e também não corresponde a uma grafia alternativa dos termos Priorit* areas, Target* ou Prioriti*ation. Um dos principais assuntos a ser considerado no desenho de um programa de PSA eficiente é a seleção de áreas para o direcionamento de contratos (ENGEL; PAGIOLA; WUNDER, 2008ENGEL, S.; PAGIOLA, S.; WUNDER, S. Designing payments for environmental services in theory and practice: An overview of the issues. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 663-674, 2008.). Desse modo, parte-se do pressuposto de que trabalhos sobre o design de um programa de PSA poderiam contribuir com informações relevantes ao objetivo da pesquisa.

A realização da triagem dos trabalhos mais relevantes considerou dois tipos de filtros: no primeiro filtro (Filtro I), os trabalhos foram avaliados de acordo com o título, resumo e palavras-chave do autor, sendo selecionados aqueles que aparentemente apresentavam potencial para a pesquisa; já no segundo filtro (Filtro II), os trabalhos selecionados no Filtro I foram avaliados por completo. A seleção dos trabalhos no Filtro II foi realizada de modo a responder às questões de elegibilidade apresentadas no Quadro 2, ou seja, os trabalhos que responderam positivamente a uma dessas questões foram considerados relevantes para a pesquisa.

Quadro 2
Questões de elegibilidade para a seleção dos trabalhos relevantes

Além disso, alguns dos trabalhos selecionados no Filtro II remetiam a outros que apresentavam potencial ao objetivo da pesquisa, mas não foram retornados pelas bases de dados consultadas. Dessa forma, julgou-se pertinente prosseguir com a busca por trabalhos relevantes analisando-se as referências bibliográficas dos trabalhos anteriormente selecionados. Neste momento, a seleção no Filtro I foi realizada somente pelo título. Posteriormente, os trabalhos foram avaliados por completo conforme os procedimentos adotados no Filtro II.

Os elementos extraídos dos trabalhos relevantes correspondem a: (i) critérios para o direcionamento de contratos ou seleção dos proprietários rurais; (ii) indicadores e/ou variáveis utilizados nos modelos de priorização de áreas; (iii) recomendações sugeridas pelos pesquisadores para otimizar os modelos de priorização de áreas ou os processos de direcionamento de contratos. Com a finalidade de padronizar os resultados obtidos, todos os elementos extraídos foram reescritos de forma a indicar o que pode ser priorizado. Posteriormente, elementos com significados semelhantes foram agrupados em categorias temáticas representativas, resultando nos denominados “Elementos de priorização”. Além disso, os elementos de priorização foram divididos em dois grupos distintos. O primeiro grupo considerou apenas os elementos importantes à conservação da diversidade biológica, sendo denominado “Grupo I - Elementos ecológicos da paisagem”, enquanto que o segundo grupo englobou os elementos direcionados aos aspectos sociais, econômicos e políticos, denominado “Grupo II - Elementos socioeconômicos e de governança”. Por fim, os resultados foram discutidos conjuntamente.

Resultados e Discussão

Considerando os termos de busca adotados, 333 trabalhos foram retornados das plataformas científicas consultadas, excluindo-se os duplicados. Desse total, 151 trabalhos foram retornados somente pela plataforma Scopus e 182 pela plataforma Web of Science. No Filtro I, foram selecionados 81 trabalhos que apresentaram potencial para a pesquisa e, no Filtro II, apenas 24 trabalhos responderam positivamente às questões de elegibilidade apresentadas no Quadro 2. Com relação à triagem realizada a partir das referências bibliográficas, sete trabalhos adicionais foram incluídos na seleção final, totalizando 31 trabalhos considerados relevantes para a pesquisa (Quadro 3). Cabe ressaltar que, dentre os sete trabalhos adicionais, alguns não retornaram às buscas iniciais devido à ausência de um ou de mais termos de busca (Quadro 1) no título, resumo ou palavras-chaves (i.e. CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.; CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008CLAASSEN, R.; CATTANEO, A.; JOHANSSON, R. Cost-effective design of agri- environmental payment programs: U.S. experience in theory and practice. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 737-752, 2008.; WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2006WÜNSCHER, T.; ENGEL, S.; WUNDER, S. Payments for environmental services in Costa Rica: increasing efficiency through spatial differentiation. Quarterly Journal of International Agriculture, v.45, p.319-337, 2006., 2008; EGOH et al., 2011EGOH, B. N. et al. Identifying priority areas for ecosystem service management in South African grasslands. Journal of Environmental Management, v. 92, n. 6, p. 1642-1650, 2011.; PAGIOLA et al., 2007PAGIOLA, S. et al. Paying for the environmental services of silvopastoral practices in Nicaragua. Ecological Economics, v. 64, n. 2, p. 374-385, 2007.) ou por não estarem indexados nas respectivas plataformas científicas consultadas (i.e. BARTON et al., 2003BARTON, D. N. et al. Spatial prioritisation of environmental service payments for biodiversity protection. Olsom: NIVA. REPORT SNR 4746, 2003.).

Quadro 3
Trabalhos selecionados como relevantes para a pesquisa

Este resultado reflete a possibilidade de ampliação futura da RBS, particularmente no que tange à inserção de novos termos de buscas e também a consulta a outras plataformas de indexação de trabalhos científicos.

No conjunto, foram obtidos 15 elementos de priorização referentes ao Grupo I (i.e. elementos ecológicos da paisagem) e 10 elementos de priorização referentes ao Grupo II (i.e. elementos socioeconômicos e de governança). O Quadro 4 apresenta os elementos que podem ser considerados no processo de priorização de áreas para a implantação de esquemas de PSA-biodiversidade.

Quadro 4
Elementos de priorização para a implantação de esquemas de PSA-Biodiversidade

Elementos ecológicos da paisagem

A riqueza de espécies é um elemento comumente utilizado nos esquemas de PSA-biodiversidade, com foco predominante na conservação da diversidade de espécies de plantas (BRYAN et al., 2011BRYAN, B. A. et al. Comparing Spatially Explicit Ecological and Social Values for Natural Areas to Identify Effective Conservation Strategies. Conservation Biology, v. 25, n. 1, p. 172-181, 2011.; CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008CLAASSEN, R.; CATTANEO, A.; JOHANSSON, R. Cost-effective design of agri- environmental payment programs: U.S. experience in theory and practice. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 737-752, 2008.; KLIMEK et al., 2008KLIMEK, S. et al. Rewarding farmers for delivering vascular plant diversity in managed grasslands: A transdisciplinary case-study approach. Biological Conservation, v. 141, n. 11, p. 2888-2897, 2008.; LA NOTTE et al., 2014LA NOTTE, A. et al. An ecosystem service-based approach to design agri-environment- climate payments for the rural development programs 2014-2020. the case of the autonomous province of trento. Annali di Botanica, v. 4, p. 91-96, 2014.; NARLOCH; PASCUAL; DRUCKER, 2011NARLOCH, U.; PASCUAL, U.; DRUCKER, A. G. Cost-effectiveness targeting under multiple conservation goals and equity considerations in the Andes. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 417-425, 2011.; PAGIOLA et al., 2007PAGIOLA, S. et al. Paying for the environmental services of silvopastoral practices in Nicaragua. Ecological Economics, v. 64, n. 2, p. 374-385, 2007.; ULBER et al., 2011ULBER, L. et al. Implementing and evaluating the effectiveness of a payment scheme for environmental services from agricultural land. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 464-472, 2011.). Tal resultado pode ser atribuído, particularmente, à implementação de esquemas agroambientais na Europa e nos Estados Unidos, cujo objetivo é conciliar produção agrícola e conservação da biodiversidade. Nestes casos, o aumento da diversidade de espécies de plantas nos campos agrícolas (e.g. leguminosas) significa o aumento do fornecimento do serviço ambiental (KLIMEK et al., 2008; ULBER et al., 2011).

Podem ser priorizadas também áreas com o maior número de espécies ameaçadas, vulneráveis e raras (CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008CLAASSEN, R.; CATTANEO, A.; JOHANSSON, R. Cost-effective design of agri- environmental payment programs: U.S. experience in theory and practice. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 737-752, 2008.; NELSON et al., 2008NELSON, E. et al. Efficiency of incentives to jointly increase carbon sequestration and species conservation on a landscape. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 105, n. 28, p. 9471-9476, 2008.; HAJKOWICZ et al., 2008HAJKOWICZ, S. et al. Targeting conservation payments to achieve multiple outcomes. Biological Conservation, v. 141, n. 9, p. 2368-2375, 2008.; WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.; BRYAN et al., 2011BRYAN, B. A. et al. Comparing Spatially Explicit Ecological and Social Values for Natural Areas to Identify Effective Conservation Strategies. Conservation Biology, v. 25, n. 1, p. 172-181, 2011.; EGOH et al., 2011EGOH, B. N. et al. Identifying priority areas for ecosystem service management in South African grasslands. Journal of Environmental Management, v. 92, n. 6, p. 1642-1650, 2011.; LARSON; LONDOÑO-MURCIA; TURNER, 2011; BATEMAN et al., 2015BATEMAN, I. J. et al. Conserving tropical biodiversity via market forces and spatial targeting. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 112, n. 24, p. 7408- 7413, 2015.; HILY et al., 2015HILY, E. et al. Assessing the cost-effectiveness of a biodiversity conservation policy: A bio- econometric analysis of Natura 2000 contracts in forest. Ecological Economics, v. 119, p. 197-208, 2015.), assim como a presença de espécies endêmicas (BARTON et al., 2009BARTON, D. N. et al. Environmental service payments: Evaluating biodiversity conservation trade-offs and cost-efficiency in the Osa Conservation Area, Costa Rica. Journal of Environmental Management, v. 90, n. 2, p. 901-911, 2009.; EGOH et al., 2011) e de espécies bandeiras (WENDLAND et al., 2010). Além disso, os esquemas de PSA podem ser direcionados à conservação de espécies com valor local (e.g. uso medicinal, religioso), ou com valor global (e.g. bioprospecção, turismo de observação) (WENDLAND et al., 2010; NARLOCH; PASCUAL; DRUCKER, 2011NARLOCH, U.; PASCUAL, U.; DRUCKER, A. G. Cost-effectiveness targeting under multiple conservation goals and equity considerations in the Andes. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 417-425, 2011.; DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011DICKMAN, A. J.; MACDONALD, E. A.; MACDONALD, D. W. A review of financial instruments to pay for predator conservation and encourage human-carnivore coexistence. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 108, n. 34, p. 13937-13944, 2011.).

Especificamente para carnívoros de médio e grande porte, a conservação tem sido considerada nos desenhos dos esquemas de PSA-biodiversidade (ZABEL; ENGEL, 2010ZABEL, A.; ENGEL, S. Performance payments: A new strategy to conserve large carnivores in the tropics? Ecological Economics, v. 70, n. 2, p. 405-412, 2010.; DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011DICKMAN, A. J.; MACDONALD, E. A.; MACDONALD, D. W. A review of financial instruments to pay for predator conservation and encourage human-carnivore coexistence. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 108, n. 34, p. 13937-13944, 2011.), uma vez que estes desempenham a função de “espécies guarda-chuva” (DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011), contribuindo indiretamente com a conservação de outras espécies menos visadas. Além disso, a fragmentação e perda de hábitats têm provocado o declínio das populações de carnívoros, visto que estes animais necessitam de grandes extensões territoriais para sobreviver, o que gera conflitos com os produtores rurais, principalmente devido ao ataque aos rebanhos. Dessa forma, os esquemas de pagamento têm surgido de modo a promover a coexistência entre vida selvagem e produtores rurais (ZABEL; ENGEL, 2010; DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011). A priorização de áreas para o direcionamento de contratos poderia considerar, por exemplo, as áreas com maior densidade de carnívoros (ZABEL; ENGEL, 2010) ou a área de vida necessária para manter o tamanho da população minimamente viável em seu hábitat natural.

A persistência das espécies está associada à quantidade de área de hábitat natural requerida para a reprodução, alimentação ou migração/dispersão das espécies (NELSON et al., 2008NELSON, E. et al. Efficiency of incentives to jointly increase carbon sequestration and species conservation on a landscape. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 105, n. 28, p. 9471-9476, 2008.), de modo que sua sobrevivência não seja ameaçada ao longo do tempo (BARTON et al., 2003BARTON, D. N. et al. Spatial prioritisation of environmental service payments for biodiversity protection. Olsom: NIVA. REPORT SNR 4746, 2003.; BARTON et al., 2009; CLEMENTS et al., 2013CLEMENTS, T. et al. An evaluation of the effectiveness of a direct payment for biodiversity conservation: The Bird Nest Protection Program in the Northern Plains of Cambodia. Biological Conservation, v. 157, p. 50-59, 2013.; EGOH et al., 2010EGOH, B. N. et al. Safeguarding Biodiversity and Ecosystem Services in the Little Karoo, South Africa. Conservation Biology, v. 24, n. 4, p. 1021-1030, 2010.; NARLOCH; PASCUAL; DRUCKER, 2011NARLOCH, U.; PASCUAL, U.; DRUCKER, A. G. Cost-effectiveness targeting under multiple conservation goals and equity considerations in the Andes. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 417-425, 2011.). A probabilidade de persistência de uma espécie em seu hábitat natural pode ser adotada como o inverso da “probabilidade de extinção”, em que áreas isoladas e menores possuem alta probabilidade de extinção (BARTON et al., 2003). Assim, um número maior de espécies poderá ser conservado se uma maior área de hábitat for conservada (EGOH et al., 2010).

Considerando a perspectiva da conservação, áreas maiores de vegetação nativa devem ser priorizadas, visto que possuem um valor intrínseco em termos de evolução e persistência da diversidade biológica (SIERRA; RUSSMAN, 2006SIERRA, R.; RUSSMAN, E. On the efficiency of environmental service payments: A forest conservation assessment in the Osa Peninsula, Costa Rica. Ecological Economics, v. 59, n. 1, p. 131-141, 2006.). Maior prioridade deve ser atribuída aos remanescentes de florestas primárias intactas ou com baixa intervenção antrópica (i.e. mais próximos ao natural), seguidas pelas florestas secundárias (BATEMAN et al., 2015BATEMAN, I. J. et al. Conserving tropical biodiversity via market forces and spatial targeting. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 112, n. 24, p. 7408- 7413, 2015.; BRYAN et al., 2011BRYAN, B. A. et al. Comparing Spatially Explicit Ecological and Social Values for Natural Areas to Identify Effective Conservation Strategies. Conservation Biology, v. 25, n. 1, p. 172-181, 2011.; EGOH et al., 2010EGOH, B. N. et al. Safeguarding Biodiversity and Ecosystem Services in the Little Karoo, South Africa. Conservation Biology, v. 24, n. 4, p. 1021-1030, 2010.; PAGIOLA et al., 2007PAGIOLA, S. et al. Paying for the environmental services of silvopastoral practices in Nicaragua. Ecological Economics, v. 64, n. 2, p. 374-385, 2007.; VON HAAREN et al., 2012VON HAAREN, C. et al. Assessing biodiversity on the farm scale as basis for ecosystem service payments. Journal of Environmental Management, v. 113, p. 40-50, 2012.; SIERRA; RUSSMAN, 2006). Além disso, manchas de vegetação com formato menos complexo possuem maior valor ecológico do que as manchas com formato mais complexos (BRYAN et al., 2011), podendo, portanto, receber maior prioridade de conservação.

Não obstante, as funções do hábitat para as espécies não dependem somente da qualidade individual das manchas, mas também dos padrões de conectividade da paisagem (VON HAAREN et al., 2012VON HAAREN, C. et al. Assessing biodiversity on the farm scale as basis for ecosystem service payments. Journal of Environmental Management, v. 113, p. 40-50, 2012.). Para definir padrões de conectividade deve-se considerar a capacidade de dispersão de espécies bem investigadas na literatura científica, uma vez que mudanças no deslocamento das espécies têm importantes impactos no efeito da conectividade, podendo alterar substancialmente as prioridades de conservação (VON HAAREN, et al., 2012; WÄTZOLD; DRECHSLER, 2014WÄTZOLD, F.; DRECHSLER, M. Agglomeration payment, agglomeration bonus or homogeneous payment? Resource and Energy Economics, v. 37, p. 85-101, 2014.; DUARTE; RIBEIRO; PAGLIA, 2016DUARTE, G. T.; RIBEIRO, M. C.; PAGLIA, A. P. Ecosystem Services Modeling as a Tool for Defining Priority Areas for Conservation. PLOS ONE, v. 11, n. 5, 2016.). Considerando a capacidade de membros individuais de uma população poderem se locomover entre as manchas de hábitat, pode-se afirmar que hábitats conectados são mais valiosos para a conservação do que hábitats isolados. Além disso, o aumento nos orçamentos da conservação implica que mais manchas poderão existir na paisagem, aumentando a rede de manchas conectadas. Dessa forma, selecionar áreas com o maior grau de conectividade da paisagem é uma consideração chave no design dos esquemas de PSA (WÄTZOLD; DRECHSLER, 2014).

Além disso, os benefícios ecológicos na paisagem aumentam com a quantidade e com a proximidade de manchas bem conservadas (CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.; WÄTZOLD; DRECHSLER, 2014WÄTZOLD, F.; DRECHSLER, M. Agglomeration payment, agglomeration bonus or homogeneous payment? Resource and Energy Economics, v. 37, p. 85-101, 2014.), o que favorece o direcionamento dos contratos para propriedades próximas às unidades de conservação (HAJKOWICZ et al., 2008HAJKOWICZ, S. et al. Targeting conservation payments to achieve multiple outcomes. Biological Conservation, v. 141, n. 9, p. 2368-2375, 2008.; PAGIOLA et al., 2007PAGIOLA, S. et al. Paying for the environmental services of silvopastoral practices in Nicaragua. Ecological Economics, v. 64, n. 2, p. 374-385, 2007.; WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2006WÜNSCHER, T.; ENGEL, S.; WUNDER, S. Payments for environmental services in Costa Rica: increasing efficiency through spatial differentiation. Quarterly Journal of International Agriculture, v.45, p.319-337, 2006., 2008; ZABEL; ENGEL, 2010ZABEL, A.; ENGEL, S. Performance payments: A new strategy to conserve large carnivores in the tropics? Ecological Economics, v. 70, n. 2, p. 405-412, 2010.; ZHANG; ENGEL, 2011ZHANG, W.; PAGIOLA, S. Assessing the potential for synergies in the implementation of payments for environmental services programmes: an empirical analysis of Costa Rica. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 406-416, 2011.). Uma área não protegida legalmente pode refletir no ganho marginal da biodiversidade quando um atributo ambiental (e.g. hábitat, espécie ou mesmo uma característica do meio físico) não suficientemente representado dentro das áreas legalmente protegidas for complementar ao sistema de reservas já existente (WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2006, 2008). Ou seja, os pagamentos podem ser direcionados para as áreas que apresentam maior complementariedade e representatividade da biodiversidade em relação às unidades de conservação.

Ressalta-se que, da mesma forma que os benefícios ecológicos aumentam com a proximidade de manchas bem conservadas, eles diminuem com a proximidade dos usos antrópicos do solo, principalmente rodovias e centros urbanos (DUARTE; RIBEIRO; PAGLIA, 2016DUARTE, G. T.; RIBEIRO, M. C.; PAGLIA, A. P. Ecosystem Services Modeling as a Tool for Defining Priority Areas for Conservation. PLOS ONE, v. 11, n. 5, 2016.; ZABEL; ENGEL, 2010ZABEL, A.; ENGEL, S. Performance payments: A new strategy to conserve large carnivores in the tropics? Ecological Economics, v. 70, n. 2, p. 405-412, 2010.). Além disso, propriedades próximas às principais rodovias e centros urbanos detêm menores custos de transporte para o escoamento da produção, o que implica no maior custo de oportunidade da terra e, consequentemente, na menor disposição dos produtores rurais em receber os recursos do PSA (SIERRA; RUSSMAN, 2006SIERRA, R.; RUSSMAN, E. On the efficiency of environmental service payments: A forest conservation assessment in the Osa Peninsula, Costa Rica. Ecological Economics, v. 59, n. 1, p. 131-141, 2006.; DE LEEUW et al., 2014DE LEEUW, J. M. et al. Spatial variation in the willingness to accept payments for conservation of a migratory wildlife corridor in the Athi-Kaputiei Plains, Kenya. Ecosystem Services, v. 8, p. 16-24, 2014.; BATEMAN et al., 2015BATEMAN, I. J. et al. Conserving tropical biodiversity via market forces and spatial targeting. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 112, n. 24, p. 7408- 7413, 2015.). Assim, os contratos de pagamento devem ser direcionados para as propriedades mais afastadas de áreas densamente urbanizadas.

Já em uma perspectiva da restauração, o PSA poderia ser direcionado para recuperar ou reabilitar áreas degradadas em terras privadas (SIERRA; RUSSMAN, 2006SIERRA, R.; RUSSMAN, E. On the efficiency of environmental service payments: A forest conservation assessment in the Osa Peninsula, Costa Rica. Ecological Economics, v. 59, n. 1, p. 131-141, 2006.; WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.), principalmente hábitats naturais relativamente raros na paisagem (NELSON et al., 2008NELSON, E. et al. Efficiency of incentives to jointly increase carbon sequestration and species conservation on a landscape. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 105, n. 28, p. 9471-9476, 2008.; HILY et al., 2015HILY, E. et al. Assessing the cost-effectiveness of a biodiversity conservation policy: A bio- econometric analysis of Natura 2000 contracts in forest. Ecological Economics, v. 119, p. 197-208, 2015.). Alguns tipos de hábitats são mais vulneráveis do que outros, implicando no direcionamento dos recursos disponíveis para a recuperação daqueles mais críticos (SIERRA; RUSSMAN, 2006).

Por fim, Wendland et al. (2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.) e Cimon-Morin, Darveau e Poulin (2013) recomendam a incorporação das avaliações da funcionalidade dos ecossistemas e das trocas entre os serviços ecossistêmicos nos modelos de priorização de áreas para a conservação. De acordo com os autores, a diversidade funcional (i.e. características dos organismos que constituem um ecossistema) é o elemento da biodiversidade mais significativo que explica a presença e a produção de um serviço ecossistêmico em um local e tempo específicos, podendo estar associado às características funcionais de uma única espécie ou de uma variedade de atributos funcionais (WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.; CIMON-MORIN; DARVEAU; POULIN, 2013CIMON-MORIN, J.; DARVEAU, M.; POULIN, M. Fostering synergies between ecosystem services and biodiversity in conservation planning: A review. Biological Conservation, v. 166, p. 144-154, 2013.).

Elementos socioeconômicos e de governança

Para que o proprietário rural se interesse em aderir aos esquemas de PSA, os pagamentos devem ser maiores que o rendimento obtido da melhor alternativa de uso da terra (EGOH et al., 2010EGOH, B. N. et al. Safeguarding Biodiversity and Ecosystem Services in the Little Karoo, South Africa. Conservation Biology, v. 24, n. 4, p. 1021-1030, 2010.; PAGIOLA et al., 2007PAGIOLA, S. et al. Paying for the environmental services of silvopastoral practices in Nicaragua. Ecological Economics, v. 64, n. 2, p. 374-385, 2007.; SIERRA; RUSSMAN, 2006SIERRA, R.; RUSSMAN, E. On the efficiency of environmental service payments: A forest conservation assessment in the Osa Peninsula, Costa Rica. Ecological Economics, v. 59, n. 1, p. 131-141, 2006.; WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2006WÜNSCHER, T.; ENGEL, S.; WUNDER, S. Payments for environmental services in Costa Rica: increasing efficiency through spatial differentiation. Quarterly Journal of International Agriculture, v.45, p.319-337, 2006., 2008; BATEMAN et al., 2015BATEMAN, I. J. et al. Conserving tropical biodiversity via market forces and spatial targeting. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 112, n. 24, p. 7408- 7413, 2015.; ULBER et al., 2011ULBER, L. et al. Implementing and evaluating the effectiveness of a payment scheme for environmental services from agricultural land. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 464-472, 2011.) e menores que o valor do benefício fornecido (PAGIOLA et al., 2007; WÜNSCHER; ENGEL, 2012). Entretanto, na prática, o valor do benefício é mais difícil de ser estimado do que o valor dos custos de oportunidade (PAGIOLA et al., 2007). Dessa forma, a fim de se obter o maior custo-efetividade na implementação de esquemas de PSA, deve-se priorizar as áreas com o menor custo de oportunidade da terra (BARTON et al., 2003BARTON, D. N. et al. Spatial prioritisation of environmental service payments for biodiversity protection. Olsom: NIVA. REPORT SNR 4746, 2003.; BARTON et al., 2009; NELSON et al., 2008NELSON, E. et al. Efficiency of incentives to jointly increase carbon sequestration and species conservation on a landscape. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 105, n. 28, p. 9471-9476, 2008.; WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.; CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.; HILY et al., 2015HILY, E. et al. Assessing the cost-effectiveness of a biodiversity conservation policy: A bio- econometric analysis of Natura 2000 contracts in forest. Ecological Economics, v. 119, p. 197-208, 2015.).

Os custos de oportunidade da terra podem ser estimados, por exemplo, por meio do cálculo do rendimento médio anual de uma determinada atividade agropecuária, ponderado pela área relativa ocupada por tal atividade (BARTON et al., 2003BARTON, D. N. et al. Spatial prioritisation of environmental service payments for biodiversity protection. Olsom: NIVA. REPORT SNR 4746, 2003.; BARTON et al., 2009; WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.). Contudo, para se obter os custos reais da terra, observados em nível de propriedade, o ideal seria calcular os custos de oportunidade individuais, os quais consideram não somente as características físicas da propriedade em si, mas também as condições socioeconômicas do produtor rural e o sistema de produção adotado (CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.; ULBER et al., 2011ULBER, L. et al. Implementing and evaluating the effectiveness of a payment scheme for environmental services from agricultural land. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 464-472, 2011.; WÜNSCHER; ENGEL, 2012WÜNSCHER, T.; ENGEL, S. International payments for biodiversity services: Review and evaluation of conservation targeting approaches. Biological Conservation, v. 152, p. 222-230, 2012.).

Enquanto os custos de oportunidade indicam as áreas que podem ser mais custo-efetivas para implementar um esquema de PSA, a adicionalidade indica as áreas potenciais para a intervenção mostrando onde a conservação pode obter melhores resultados (WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.), uma vez que o direcionamento dos pagamentos para áreas onde não há riscos de perda da biodiversidade ou dos serviços ecossistêmicos é pouco efetivo (WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2008______. Spatial targeting of payments for environmental services: A tool for boosting conservation benefits. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 822-833, 2008.). Geralmente, a probabilidade de desmatamento é calculada como um proxy da adicionalidade (WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2008; WÜNSCHER; ENGEL, 2012; WENDLAND et al., 2010). Neste sentido, áreas com maior probabilidade de desmatamento (i.e. maior adicionalidade) são consideradas prioritárias para a conservação (WÜNSCHER; ENGEL, 2012).

Outro elemento importante a ser considerado no processo de priorização de áreas para a implantação de esquemas de PSA é a garantia do direito de posse da terra. A garantia do direito de posse da terra não significa a privatização do serviço ecossistêmico, mas o reconhecimento dos indivíduos ou da comunidade para a proteção dos serviços contra a ação de terceiros (WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.). Além disso, direitos de propriedade pobremente esclarecidos dificultam a legalização dos contratos de pagamento, contribuindo para que uma elite minoritária se aproprie dos benefícios da conservação em prejuízo das populações menos favorecidas (CLEMENTS et al., 2013CLEMENTS, T. et al. An evaluation of the effectiveness of a direct payment for biodiversity conservation: The Bird Nest Protection Program in the Northern Plains of Cambodia. Biological Conservation, v. 157, p. 50-59, 2013.). Dessa forma, a atuação das organizações coletivas locais, assim como das instituições governamentais, pode contribuir substancialmente com a distribuição equitativa dos benefícios dos esquemas (DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011DICKMAN, A. J.; MACDONALD, E. A.; MACDONALD, D. W. A review of financial instruments to pay for predator conservation and encourage human-carnivore coexistence. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 108, n. 34, p. 13937-13944, 2011.; NARLOCK; PASCUAL; DRUCKER, 2011; CLEMENTS et al., 2013).

Verifica-se, pois, um conjunto de elementos importantes a ser considerado no processo de direcionamento dos contratos, tais como (i) priorizar as áreas com garantia do direito de posse da terra, (ii) priorizar as áreas com maior atuação dos coletivos locais, (iii) priorizar as áreas com maior interação entre as partes envolvidas e (iv) priorizar as áreas que possuem melhor governança e estabilidade política. Cabe ressaltar que, geralmente, regiões com instituições fracas e com conflitos políticos correspondem àquelas com níveis favoráveis de provisão dos serviços e maior adicionalidade (WÜNSCHER; ENGEL, 2012WÜNSCHER, T.; ENGEL, S. International payments for biodiversity services: Review and evaluation of conservation targeting approaches. Biological Conservation, v. 152, p. 222-230, 2012.). Dessa forma, devem-se priorizar as áreas com maior estabilidade política, mas deve-se também considerar o fortalecimento de tais instituições nas regiões de grande importância para a conservação da diversidade biológica.

Como salientado anteriormente, na maioria das vezes, os benefícios da conservação não alcançam as populações menos favorecidas (CLEMENTS et al., 2013CLEMENTS, T. et al. An evaluation of the effectiveness of a direct payment for biodiversity conservation: The Bird Nest Protection Program in the Northern Plains of Cambodia. Biological Conservation, v. 157, p. 50-59, 2013.). Dessa forma, os pagamentos deveriam ser pensados no sentido de facilitar as inscrições dos proprietários rurais mais pobres, de modo a alcançar maior sinergia entre redução da pobreza e conservação ambiental, além de fornecer auxílio técnico e financeiro (ZHANG; PAGIOLA, 2011ZHANG, W.; PAGIOLA, S. Assessing the potential for synergies in the implementation of payments for environmental services programmes: an empirical analysis of Costa Rica. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 406-416, 2011.). Alguns autores utilizam índices de desenvolvimento social, baseados em indicadores como saúde, educação e renda para indicar áreas prioritárias à conservação (WÜNSCHER; ENGEL; WUNDER, 2006WÜNSCHER, T.; ENGEL, S.; WUNDER, S. Payments for environmental services in Costa Rica: increasing efficiency through spatial differentiation. Quarterly Journal of International Agriculture, v.45, p.319-337, 2006.; ZHANG; PAGIOLA, 2011). Todavia, fatores políticos e de mercado também deveriam ser adicionados ao cálculo, assim como deveriam ser feitas distinções entre pobreza transitória, que afeta várias pessoas temporariamente, e pobreza crônica, em que uma população permanece estacionada no mesmo nível de pobreza por um longo período (DICKMAN; MACDONALD; MACDONALD, 2011DICKMAN, A. J.; MACDONALD, E. A.; MACDONALD, D. W. A review of financial instruments to pay for predator conservation and encourage human-carnivore coexistence. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 108, n. 34, p. 13937-13944, 2011.).

Para obter o maior benefício ambiental por dólar gasto, programas agroambientais como o “Conservation Reserve Program”, nos Estados Unidos (CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008CLAASSEN, R.; CATTANEO, A.; JOHANSSON, R. Cost-effective design of agri- environmental payment programs: U.S. experience in theory and practice. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 737-752, 2008.), direcionam os pagamentos para os produtores rurais que combinam práticas de manejo e tratamentos específicos do solo em prol do aumento nos níveis ecológicos (CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008; KLIMEK et al., 2008KLIMEK, S. et al. Rewarding farmers for delivering vascular plant diversity in managed grasslands: A transdisciplinary case-study approach. Biological Conservation, v. 141, n. 11, p. 2888-2897, 2008.), tais como a adoção de quantidades adequadas de fertilizantes (ULBER et al., 2011ULBER, L. et al. Implementing and evaluating the effectiveness of a payment scheme for environmental services from agricultural land. Environmental Conservation, v. 38, n. 04, p. 464-472, 2011.; LA NOTTE et al., 2014LA NOTTE, A. et al. An ecosystem service-based approach to design agri-environment- climate payments for the rural development programs 2014-2020. the case of the autonomous province of trento. Annali di Botanica, v. 4, p. 91-96, 2014.; VON HAAREN et al., 2012VON HAAREN, C. et al. Assessing biodiversity on the farm scale as basis for ecosystem service payments. Journal of Environmental Management, v. 113, p. 40-50, 2012.) e o regime de colheita apropriado (SIERRA; RUSSMAN, 2006SIERRA, R.; RUSSMAN, E. On the efficiency of environmental service payments: A forest conservation assessment in the Osa Peninsula, Costa Rica. Ecological Economics, v. 59, n. 1, p. 131-141, 2006.; LA NOTTE et al., 2014).

Além disso, um esquema de pagamento desenhado em escala regional poderia sustentar os sistemas agrícolas que devem ser manejados tanto para atender os objetivos da conservação quanto para atender os objetivos da produção agrícola (CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008CLAASSEN, R.; CATTANEO, A.; JOHANSSON, R. Cost-effective design of agri- environmental payment programs: U.S. experience in theory and practice. Ecological Economics, v. 65, n. 4, p. 737-752, 2008.; WÄTZOLD; DRECHSLER, 2014WÄTZOLD, F.; DRECHSLER, M. Agglomeration payment, agglomeration bonus or homogeneous payment? Resource and Energy Economics, v. 37, p. 85-101, 2014.). Desse modo, os proprietários rurais obteriam menores riscos de perda da produção devido à diversificação de culturas, ao mesmo tempo em que promovem o aumento da qualidade ambiental (KLIMEK et al., 2008KLIMEK, S. et al. Rewarding farmers for delivering vascular plant diversity in managed grasslands: A transdisciplinary case-study approach. Biological Conservation, v. 141, n. 11, p. 2888-2897, 2008.) e do fluxo dos serviços ecossistêmicos (CIMON-MORIN; DARVEAU; POULIN, 2013CIMON-MORIN, J.; DARVEAU, M.; POULIN, M. Fostering synergies between ecosystem services and biodiversity in conservation planning: A review. Biological Conservation, v. 166, p. 144-154, 2013.; DUARTE; RIBEIRO; PAGLIA, 2016DUARTE, G. T.; RIBEIRO, M. C.; PAGLIA, A. P. Ecosystem Services Modeling as a Tool for Defining Priority Areas for Conservation. PLOS ONE, v. 11, n. 5, 2016.) em nível de paisagem (CLAASSEN; CATTANEO; JOHANSSON, 2008; CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.).

Por fim, integrar conservação da biodiversidade com um ou mais serviços ecossistêmicos pode ser vantajoso no sentido de que a biodiversidade é frequentemente mais difícil de ser monetizada, se comparada a outros serviços como água e carbono, e, consequentemente, de obter beneficiários locais e globais dispostos a pagar por sua manutenção (WENDLAND et al., 2010WENDLAND, K. J. et al. Targeting and implementing payments for ecosystem services: Opportunities for bundling biodiversity conservation with carbon and water services in Madagascar. Ecological Economics, v. 69, n. 11, p. 2093-2107, 2010.). Além disso, metodologias de congruência espacial entre serviços ecossistêmicos e biodiversidade podem contribuir significativamente com o aumento das áreas alvos para a conservação (DUARTE, RIBEIRO, PAGLIA, 2016DUARTE, G. T.; RIBEIRO, M. C.; PAGLIA, A. P. Ecosystem Services Modeling as a Tool for Defining Priority Areas for Conservation. PLOS ONE, v. 11, n. 5, 2016.) e também com a diversificação de fundos financeiros (WENDLAND et al., 2010).

Considerações Gerais

Os modelos de priorização de contratos de PSA deveriam examinar a “produção da biodiversidade” em nível de propriedade, ao mesmo tempo em que se apropriam de informações sobre a produção agropecuária local (i.e. custos de oportunidade individuais). Essa abordagem permitiria obter os custos marginais do produtor rural e otimizar a conservação da diversidade biológica (ARMSWORTH et al., 2012ARMSWORTH, P. R. et al. The cost of policy simplification in conservation incentive programs. Ecology Letters, v. 15, n. 5, p. 406- 414, 2012.). Entretanto, as relações contratuais do PSA estão sujeitas às insuficiências de informações simétricas entre os atores econômicos; isto é, os proprietários rurais obtêm melhores informações sobre a procedência e o preço dos serviços ambientais providos em suas terras do que os agentes reguladores. Este fenômeno pode limitar a efetividade dos esquemas de PSA e encarecer sua implementação, uma vez que, desconhecendo os reais custos de oportunidade dos produtores rurais, os agentes reguladores podem alocar os contratos de pagamento para áreas onde os custos de oportunidade são elevados (FERRARO, 2008FERRARO, P. J. Asymmetric information and contract design for payments for environmental services. Ecological Economics, v. 65, p. 810-821, 2008.).

No processo de seleção de áreas prioritárias aos esquemas de PSA, deve-se considerar também os custos de transação, os quais correspondem aos custos de negociação, administrativo, monitoramento e execução dos contratos de pagamento. Geralmente, tais operações são dispendiosas para os proprietários rurais. Assim, para obter uma maior efetividade dos esquemas (benefício-custo), o valor da produção de uma unidade do bem deverá ser maior do que os custos incorridos para implementá-lo (COASE, 2009COASE, R. O problema do custo social. The Latin American and Caribbean journal of legal studies, v. 3, n. 1, 2009.). Contratos de conservação com objetivos ecológicos complexos (e.g. monitoramento de espécies raras) podem aumentar os custos de transação e, consequentemente, desencorajar a participação dos proprietários rurais nos esquemas (HANLEY et al., 2012HANLEY, N. et al. How should we incentivize private landowners to “produce” more biodiversity? Oxford Review of Economic Policy, v. 28, n. 1, p. 93-113, 2012.).

A inserção do aspecto biológico no processo de identificação de áreas prioritárias ao PSA torna-se um desafio na medida em que dados sobre espécies, populações ou mesmo hábitats são escassos (CULLEN, 2013CULLEN, R. Biodiversity protection prioritisation: a 25-year review. Wildlife Research, v. 40, n. 2, p. 108, 2013.). Além disso, a coleta e a mensuração dos recursos biológicos de uma região ou mesmo de uma parcela de terra é muitas vezes dispendiosa e demorada (CHEN et al., 2010CHEN, X. et al. Using Cost-Effective Targeting to Enhance the Efficiency of Conservation Investments in Payments for Ecosystem Services. Conservation Biology, v. 24, n. 6, p. 1469-1478, 2010.). Nestes casos, recorre-se ao uso de proxies de biodiversidade, os quais funcionam como um tipo de “substituto” de um dado biológico, podendo incluir tanto uma única característica biológica quanto uma combinação de várias (CHEN et al., 2010).

Destaca-se ainda a inserção dos aspectos sociais (e.g. pobreza) e econômicos (e.g. adicionalidade, custo de oportunidade da terra) nos processos de priorização de áreas. O direcionamento dos pagamentos sem considerar a cultura local, a situação de pobreza da população e a existência das relações políticas, institucionais e participativas poderá culminar na ineficiência do programa ao longo do tempo (KOLINJIVADI et al., 2015KOLINJIVADI, V. et al. Juggling multiple dimensions in a complex socio-ecosystem: The issue of targeting in payments for ecosystem services. Geoforum, v. 58, p. 1-13, 2015.).

Recomendações

Eventualmente, nem todos os elementos indicados neste artigo possuem dados disponíveis. Desse modo, recomenda-se o desenvolvimento de um banco de dados bem organizado e articulado entre as partes envolvidas, o qual seja suficientemente flexível para permitir a inserção de um maior número de dados na medida em que estes forem sendo produzidos e aperfeiçoados.

Recomenda-se também que os elementos utilizados para a identificação de áreas prioritárias para a implantação de esquemas de PSA-biodiversidade sejam considerados no processo de implantação de outros esquemas de PSA baseados na recuperação e na manutenção de áreas naturais, uma vez que os serviços ecossistêmicos são afetados pelas mudanças na diversidade biológica. Dessa forma, incluir os elementos de biodiversidade nos esquemas de PSA garantirá a manutenção de outros serviços ecossistêmicos, tais como a regulação climática, a provisão de água e o sequestro de carbono e, consequentemente, a sustentabilidade dos esquemas ao longo do tempo.

Cabe ressaltar ainda que a identificação dos elementos relevantes para a priorização de áreas é apenas o primeiro passo de um planejamento da conservação mais custo-efetivo. A partir dos resultados obtidos neste trabalho, é possível definir quais elementos devem ser mais ou menos prioritários em relação aos outros, de acordo com os objetivos das ações de conservação. Neste momento, os métodos de hierarquização podem ser aplicados, bem como a realização de oficinas ou consultas com especialistas, a fim de se estabelecer pesos de prioridade entre os elementos selecionados. Somente posteriormente à etapa de hierarquização, os valores a serem pagos pelo fornecimento do serviço ambiental poderão ser definidos.

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  • *
    Agradecimentos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro (Processo: 130438/2016-2), e aos revisores anônimos pelas valiosas sugestões ao manuscrito.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    09 Jan 2018
  • Aceito
    05 Set 2019
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