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Natureza rica, povos pobres? - questões conceituais e analíticas sobre o papel dos recursos naturais na prosperidade contemporânea

Rich nature, poor people? Conceptual and analytical questions on the role of natural resources for contemporary prosperity

Resumos

Este artigo questionaa tendência atual de se igualar a riqueza de recursos naturais de uma região à prosperidade e ao bem-estar dos seus habitantes. Discute formulações clássicas da "sociologia do desenvolvimento" de Prebisch e Hirschman e os seus desdobramentos nas obras mais recentes de Bunker e Freudenburg. Todos esses autores ressaltam que regiões e atividades intensivas em recursos naturais têm sérias desvantagens desenvolvimentistas quando comparadas a regiões e atividades transformadoras de recursos naturais ou intensivas em tecnologia e informação.

recursos naturais; desenvolvimento; extrativismo; indústrias de transformação; agregação de valor; produtos primários


This article questions the current trend which supposes that the rich natural resource endowment of a region leads to the prosperity or weel-being of its inhabitants. It discusses classic statements by Prebisch and Hirschman as well as more contemporary ones by Bunker and Freudenburg. These authors stress the idea that regions and activities intensive in natural resources have serious developmental handicaps when compared to regions and activities intensive in industrial transformation of natural resources or in technology and information.

natural resources; development; extractive economies; transformative industries; added value; raw products


ARTIGOS / ARTICLES

Natureza rica, povos pobres? – questões conceituais e analíticas sobre o papel dos recursos naturais na prosperidade contemporânea* * Este texto reúne materiais dos capítulos 2 e 3 de minha dissertação de Ph. D. (DRUMMOND, 1999). O meu doutorado foi completado com apoio da CAPES e da Universidade Federal Fluminense. Agradeço Sandra de Carlo e Elimar Nascimento pelas leituras críticas de uma versão anterior deste texto. Tirei proveito ainda das apreciações feitas por dois pareceristas anônimos de Ambiente e Sociedade.

Rich nature, poor people? Conceptual and analytical questions on the role of natural resources for contemporary prosperity

José Augusto Drummond

Cientista Ambiental, Departamento de Ciência Política, UFF. E-mail: jaldrummond@uol.com.br

RESUMO

Este artigo questionaa tendência atual de se igualar a riqueza de recursos naturais de uma região à prosperidade e ao bem-estar dos seus habitantes. Discute formulações clássicas da "sociologia do desenvolvimento" de Prebisch e Hirschman e os seus desdobramentos nas obras mais recentes de Bunker e Freudenburg. Todos esses autores ressaltam que regiões e atividades intensivas em recursos naturais têm sérias desvantagens desenvolvimentistas quando comparadas a regiões e atividades transformadoras de recursos naturais ou intensivas em tecnologia e informação.

Palavras-chave: recursos naturais / desenvolvimento / extrativismo / indústrias de transformação / agregação de valor / produtos primários

ABSTRACT

This article questions the current trend which supposes that the rich natural resource endowment of a region leads to the prosperity or weel-being of its inhabitants. It discusses classic statements by Prebisch and Hirschman as well as more contemporary ones by Bunker and Freudenburg. These authors stress the idea that regions and activities intensive in natural resources have serious developmental handicaps when compared to regions and activities intensive in industrial transformation of natural resources or in technology and information.

Key words: natural resources / development / extractive economies / transformative industries / added value / raw products

INTRODUÇÃO

Leigos e estudiosos do desenvolvimento e do bem-estar social muitas vezes manifestam surpresa perante a pobreza material de povos que vivem em territórios ricos em recursos naturais. Existe, principalmente entre algumas correntes ambientalistas contemporâneas, uma percepção enraizada de que regiões ou países ricos em recursos naturais "deveriam ter" populações prósperas, saudáveis e felizes. Essa percepção é característica de pesquisadores, tomadores de decisão e ambientalistas que esposam as concepções de desenvolvimento sustentável, ou que de outras formas valorizam positivamente a preservação ou o uso racional de recursos naturais.

Entre muitos outros exemplos, Paulo Kitamura atribui o contraste entre riqueza natural e pobreza social na Amazônia brasileira às políticas públicas excludentes que comandam o acesso aos recursos:

"Talvez o lado mais dramático da intervenção do Estado no processo de ocupação da Amazônia seja o contraste entre o estoque de riquezas naturais prontamente disponível para serem exploradas e as condições de pobreza extrema de grande parte da população". (KITAMURA, 1994: 60)

Kitamura confia, assim, no pressuposto de que o acesso mais democrático aos recursos naturais "prontamente" disponíveis garantiria a prosperidade dos amazônidas, ou ao menos aliviaria o seu estado de pobreza.

Marianne Schmink e Charles Wood oferecem outro exemplo pertinente do uso desse pressuposto (SCHMINK & WOOD, 1992: 277-289). Apesar de mostrarem a decadência do extrativismo e a baixíssima produtividade da agricultura "tradicional" em São Félix do Xingu (PA) na década de 1970, os autores sustentam que extratores e agricultores pobres teriam um futuro melhor se continuassem a produzir a sua própria comida ao invés de produzirem para o mercado ou mesmo comprarem alimentos no mercado. Eles acreditam que a condição dessas pessoas melhorará se elas se dedicarem às lides "intensivas de recursos naturais" (agricultura, extração, caça e pesca), embora usem dados que mostram as duríssimas condições de vida dos povos "tradicionais" que seguem as suas prescrições.

Os exemplos de apreciações similares poderiam ser multiplicados. Essa percepção fundamenta-se na premissa que riqueza natural e riqueza social andam juntas (ou, numa postura normativa, que ambas "devem" andar juntas). Nem sempre, no entanto, essa premissa é testada como uma hipótese. Assim, ela sobrevive na literatura mais como um pressuposto não comprovado, ou como uma postura normativa que não precisa ser comprovada, e não como um achado de pesquisa. No entanto, há no mundo contemporâneo um número apreciável de motivos para supor precisamente o oposto: quanto mais uma população depende diretamente de recursos naturais, menos próspera ela será. Não faltam, igualmente, argumentações teóricas e estudos empíricos. Alguns ,formulados há décadas, colocaram em dúvida esse pressuposto e testaram-no como hipótese de investigações científicas, chegando a resultados que o refutam.

O objetivo deste artigo é examinar algumas formulações teóricas e alguns conceitos que direcionam pesquisas empíricas destinadas a testar a hipótese de coincidência entre riquezas naturais e riqueza social. Pretende-se chamar a atenção para a hipótese mais plausível – e um tanto incômoda para a consciência ambiental contemporânea - de que a prosperidade e o bem-estar social de um determinado país ou região em geral não dependem da riqueza local de recursos naturais. Espera-se que esta discussão permita calibrar melhor as expectativas, as práticas sociais e as políticas derivadas do ideal de alcançar sustentabilidade ambiental na produção econômica.

MÉTODO DE EXPOSIÇÃO E CONTEXTO CONCEITUAL E TEÓRICO

Para desenvolver a minha argumentação, focalizarei o papel desenvolvimentista das atividades e/ou das regiões extrativistas. Refiro-me àqueles empreendimentos e/ou àquelas regiões dedicados exclusivamente a retirar recursos naturais dos seus locais de ocorrência, a partir dos seus estoques naturais, sem manipulações reprodutivas ou processamento industrial. Neles, as relações entre recursos naturais, de um lado, e capital + tecnologia + mão-de-obra, de outro, são tipicamente elevadas. Dito de outra forma, essas atividades ou regiões são intensivas de recursos naturais. Exemplos típicos de atividades extrativistas são o corte de árvores em florestas nativas, as muitas formas de mineração (inclusive de petróleo e gás natural), a coleta de bens vegetais, a caça, a pesca, a captação de água para diversos fins (energéticos, abastecimento, irrigação, etc.), e, mais contemporaneamente, a prospecção da biodiversidade.1 1 Em DRUMMOND (1996) explorei o conceito de extrativismo e as perspectivas do extrativismo tradicional ou de baixa intensidade de tecnologia na Amazônia brasileira.

Elegi essas atividades como foco da narrativa pois representam casos extremos de dependência de recursos naturais, tanto de empreendimentos individuais, quanto de uma região ou um país. De acordo com a mencionada suposição que a riqueza natural se traduz (ou deve se traduzir) em prosperidade social, as atividades extrativistas seriam logicamente candidatas ao papel de esteio dessa prosperidade. Cabe alertar que nem todas as limitações apontadas na literatura discutida se aplicam igualmente a todas as atividades extrativistas. Ao longo do texto procurarei ilustrar as atividades extrativistas afetadas pelos fatores discutidos.

A agricultura e a pecuária foram praticamente excluídas da minha discussão, embora vários argumentos valham também para elas (principalmente no caso das idéias de Prebisch). Elas obviamente dependem de recursos naturais – solos, água, plantas, animais - mas, em contraste com o extrativismo, implicam em vários graus de manipulação reprodutiva ou tecnológica desses recursos. Essas atividades alteram os ciclos naturais de vida e da reprodução de plantas e animais, os seus estoques e os seus padrões de crescimento. Além disso, transferem os recursos de um lugar a outro, e eliminam obstáculos naturais diversos para intensificar a presença dos bens cultivados nas paisagens, tudo isso para canalizar o máximo da produtividade dos ecossistemas nativos para a finalidade de sustentar as sociedades humanas. Em outras palavras, agricultura e pecuária, mesmo diretamente dependentes de recursos naturais, incorporam capital, tecnologia e trabalho em proporção maior do que as atividades extrativistas. Já as atividades industriais e de serviços são abordadas como antípodas do extrativismo, precisamente por serem intensivas de capital, tecnologia e mão-de-obra. Veremos que diversas correntes de pensamento sustentaram que essas indústrias e esses serviços, tipicamente pouco intensivos de recursos naturais, são os esteios do desenvolvimento contemporâneo.

A discussão que se segue tem as suas raízes no debate sobre os potenciais de desenvolvimento dos países pobres ou periféricos, logo depois da Segunda Guerra Mundial. Antes de discutir autores e conceitos mais contemporâneos, vou tratar de duas manifestações clássicas desse debate, as de Raul Prebisch e Albert O. Hirschman.2 2 O decenal debate em torno das alternativas desenvolvimentistas dos países subdesenvolvidos é recuperado em numerosos livros, entre os quais EVANS (1995); SO (1990); BAER (1989); KAY (1989).

Prebisch fundou, há mais de 50 anos, a perspectiva "estruturalista" ou "cepalina" da sociologia do desenvolvimento (PREBISCH, 1950; PREBISCH, 1959). As suas dúvidas sobre o papel desenvolvimentista dos recursos naturais logo se tornaram influentes, o que mostra como o tema não é novo. Prebisch divulgou as suas idéias na esteira da Segunda Guerra Mundial, num contexto de otimismo quanto às possibilidades de melhoria das condições econômicas e sociais dos países pobres.3 3 Significativamente, foi nesta época e no contexto deste debate que os países pobres passaram a ser chamados de subdesenvolvidos. No entanto, Prebisch e os demais estruturalistas não compartilhavam desse otimismo. Identificavam uma grande barreira ao desenvolvimento dos países subdesenvolvidos, precisamente no fenômeno que batizaram de "deterioração dos termos de troca" dos recursos naturais (ou dos bens primários da agricultura e da pecuária) em face aos bens industrializados. Prebisch elegeu como fator decisivo a tendência histórica de que volumes cada vez maiores de recursos naturais eram necessários para comprar volumes fixos ou mesmo decrescentes de bens industrializados. Ele duvidava, assim, da capacidade de o setor primário da economia dos países pobres gerar renda suficiente para comprar os insumos (maquinário, tecnologia, bens intermediários, etc.) que permitissem o deslanche de processos autônomos de desenvolvimento nos países subdesenvolvidos.

Façamos um resumo das idéias relevantes de Prebisch. Ele focaliza basicamente o comércio internacional, especialmente entre "países periféricos engajados na produção de bens primários" e os "centros industriais" (PREBISCH, 1959: 251). Prebisch confronta a idéia básica do estudioso do desenvolvimento W. W. Rostow (ROSTOW, 1960), da chamada escola "modernizadora", de que os países periféricos deveriam se concentrar apenas no "aumento [da] produtividade das suas atividades primárias", tirando proveito imediato, assim, de suas "vantagens comparativas" nessas atividades. Prebisch contra-argumentou que isso deveria ser acompanhado por um "vigoroso processo de industrialização e de crescimento da produtividade industrial" (p. 251). Para Prebisch, a industrialização era estratégica por causa das diferenças entre as "inelasticidades de demanda" dos bens primários e dos bens industrializados. Isso significa que a demanda por bens industriais tende a crescer de forma mais vigorosa que a dos bens primários, gerando crescentes diferenciais de preços relativos, beneficiando os produtores de bens industriais - empresas, ramos, regiões ou países.

Esse diferencial se manifestava por uma constante degradação das relações de troca (ou preços relativos) entre bens primários e bens industrializados, o que significava uma transferência líquida de valor dos países periféricos para os países centrais. Embora Prebisch fosse favorável à modernização tecnológica dos setores agrícolas, pecuários e extrativistas dos países subdesenvolvidos, considerava que apenas a "substituição de importações" e as indústrias modernas protegidas, cambial e tarifariamente, poderiam "corrigir os efeitos das disparidades de elasticidade do comércio internacional sobre o crescimento da periferia" (p. 253).

Essa formulação original de Prebisch deu origem a toda uma escola de pensadores e planejadores, chamada "cepalina". Para eles, era inconcebível a idéia de que o desenvolvimento e a prosperidade pudessem brotar a partir de bens primários, especialmente os do extrativismo. Isso se traduziu em estudos que propunham - e em políticas governamentais de diversos países latino-americanos que instituíam – indústrias direcionadas à "substituição de importações", as quais seriam, supostamente, capazes de superar os obstáculos criados pela dependência da produção de bens primários e a alcançar as esperadas vantagens de uma industrialização autônoma. Assim, a escola cepalina, uma das principais vertentes dos modernos estudos desenvolvimentistas, nasceu apontando a incapacidade de bens primários sustentarem processos de desenvolvimento. Essa hipótese é frontalmente contrária à mencionada suposição de que riqueza natural se traduz em riqueza social.

É relevante acrescentar que, mais de 40 anos depois de sua formulação, a visão de Prebisch sobre a "deterioração dos termos de troca" das commodities do setor primário foi testada por um estudo específico, empiricamente bem fundamentado e metodologicamente sofisticado, de DIAKOSAWAS e SCANDISSO (1991). Esses autores usaram uma ampla base de dados contendo os preços internacionais praticados entre 1900 e 1982 para 19 commodities (alimentos, minérios, etc.). Concluíram que Prebisch acertou ao identificar a tendência de longo prazo de deterioração dos termos de troca. Fizeram apenas duas ressalvas. Primeiro, a deterioração, embora sensível, não foi tão forte quanto se poderia supor. Segundo, alguns fatores não mencionados por Prebisch (como aumento das escalas de produção, maior eficiência dos meios de transporte, etc.) contribuíram para diminuir os custos de produção de algumas commodities. Dependendo da tendência dos preços internacionais, isso assegurou a margem de ganhos dos seus produtores. Esse estudo confirmou as idéias de Prebisch e, por isso, elas continuam a ser merecidamente influentes nos estudos sobre desenvolvimento e nas políticas desenvolvimentistas.

Albert O. Hirschman, ligado à corrente modernizadora dos estudiosos do desenvolvimento, contemporânea e antípoda da escola cepalina, produziu uma formulação que, embora distinta, é aparentada da de Prebisch (HIRSCHMAN, 1958; entre obras pertinentes mais recentes de Hirschman, ver HIRSCHMAN, 1977). Hirschman também se tornou influente na literatura científica e nas políticas desenvolvimentistas de alguns países, inclusive como consultor de governos e organismos de planejamento de vários países subdesenvolvidos. No Brasil ele influenciou na adoção do conceito de "polos de desenvolvimento regional" na Amazônia e em outras regiões, na década de 1970. O importante, no entanto, é destacar que, por outras vias, ele também atribuiu às atividades extrativistas um papel muito limitado (se não nulo) no desenvolvimento nos países subdesenvolvidos.

Examinemos as idéias de Hirschman para ver como ele, por outras vias, chegou a conclusões parecidas com as de Prebisch sobre as fracas virtualidades desenvolvimentistas das commodities. No seu texto clássico de 1958, Hirschman propôs uma modalidade de análise do desenvolvimento que espelhava o otimismo dos modernizadores com as perspectivas dos países periféricos. Ele supunha que esses países poderiam desencadear processos de desenvolvimento industrial se fossem tomadas as decisões corretas. O seu argumento mais famoso foi a importância das conexões produtivas ("linkages") entre os diferentes ramos e setores da economia.

As conexões produtivas são definidas como os intercâmbios que ocorrem entre as diferentes atividades econômicas de um mesmo país ou uma mesma região. Elas são mensuráveis pelo consumo que umas fazem dos produtos não-acabados de outras. Hirschman argumentou que, para acelerar o desenvolvimento, as decisões empresariais e as políticas públicas deveriam favorecer as atividades capazes de gerar os maiores números de conexões. O motivo é que tais atividades geram mais demandas por e mais ofertas para empreendimentos associados, criando efeitos multiplicadores e diversificadores de produção, investimento e emprego. O conceito de desenvolvimento de Hirschman é coerente com a importância dada a essas conexões: uma economia desenvolvida seria aquela formada por uma rede complexa de empreendimentos especializados, distintos e interdependentes, dividida em setores tais como extrativista, agro-pecuário, comércio, indústria e serviços, com predomínio das duas últimas. Ocorrem conexões entre esses diversos empreendimentos e setores de uma economia, independentemente de quaisquer políticas públicas. Hirschman destacou a importância das decisões privadas e públicas de criar ou apoiar a criação de certos empreendimentos para ampliar a rede de conexões produtivas.

Hirschman dividiu essas conexões em "para trás" ("cada atividade econômica não-primária induzirá tentativas de suprimento através da produção doméstica de insumos necessários àquela atividade") e "para a frente" ("cada atividade que pela sua natureza não serve exclusivamente às suas demandas finais induzirá tentativas de usar os seus produtos como insumos necessários a algumas atividades novas"). A partir dessa classificação, Hirschman construiu o seu esquema analítico, que se baseia na expectativa razoável de que as atividades fortemente conectadas ("mestres"), se estimuladas e bem localizadas geograficamente, gerariam demandas e ofertas para um grande número de atividades "satélites" e "não-satélites". Isso, por sua vez, abriria caminho para uma estrutura produtiva complexa e diversificada, rica em conexões, característica dos países desenvolvidos. Mais tarde, Hirschman chegou a aplicar o mesmo esquema analítico para propor políticas descentralizadoras em países não desenvolvidos, como o Brasil, na forma da criação de pólos regionais de desenvolvimento sediados em regiões de fronteira.

Para identificar as atividades mestres, ou fortemente conectadas, Hirschman usou um survey (feito por Chenery e Watanabe), baseado numa análise de insumo-produto de regiões industriais do Japão, da Itália e dos EUA. Esses autores propuseram quatro tipos de setores econômicos, de acordo com as proporções observadas entre conexões para trás e para a frente. Os resultados do survey estão no Quadro I.


Hirschman considerou o setor de produtos industriais intermediários – o primeiro do Quadro I - como o setor estratégico para programas e políticas de diversificação industrial em países subdesenvolvidos, porque ele apresenta fortes potencialidades de conexão, tanto para trás quanto para a frente. Em termos bem simples, esses tipos de empreendimento (1) compram muitos insumos produzidos por outras empresas, e (2) transformam-nos e (3) vendem muitos produtos não-acabados que viram insumos para outras empresas. Essa categoria inclui têxteis, produtos químicos, papel e celulose, derivados de petróleo, metalurgia e assim por diante. Esses eram os setores estratégicos a serem incentivados pelas políticas desenvolvimentistas e pelas decisões empresariais. Nenhum dos três outros setores apresenta forte potencialidade para criar os dois tipos de conexão produtiva.

É interessante destacar dois pontos com tonalidades ambientais sobre esses setores "mestres". Primeiro, eles tipicamente transformam recursos naturais (minérios metálicos e não-metálicos, água, fibras vegetais, madeira, petróleo cru, gás natural, carvão vegetal etc.). Segundo, quase todos são grande consumidores de energia e/ou grandes geradores de diversas substâncias poluentes/tóxicas. Ou seja, tais setores, embora industriais, têm grande impacto sobre os estoques de recursos naturais úteis, quer consumindo-os, quer poluindo-os. Esses dois pontos são relevantes para as preocupações contemporâneas com os estoques dos recursos naturais e os padrões de qualidade ambiental, mas tais questões ainda não se colocavam quando Hirschman escreveu sobre as conexões produtivas.

Hirschman considerava as atividades extrativistas – tais como mineração, pesca, etc. – como "produtoras de bens primários intermediários", com potenciais fracos ou nulos de conexões para trás, ou seja, elas compram pouco ou quase nada de insumos de outros empreendimentos, constituem setores que extraem, mas não transformam, recursos naturais. Embora muitos desses produtos primários intermediários tenham fortes potenciais de conexões para a frente com indústrias transformadoras, as poucas conexões para trás os excluem do papel de atividades desenvolvimentistas estratégicas. Em termos práticos, para Hirschman, entre uma mina de minério de ferro e uma usina siderúrgica, a atividade estratégica a ser estimulada seria a usina. Ela tanto compra insumos numerosos - minério de ferro, outros minérios (carvão, manganês), maquinário, veículos, energia, etc. - quanto vende numerosos produtos intermediários (ferro-gusa, vergalhões, cabos, fios, placas, trilhos, chapas, estacas, etc.) adquiridos por outras empresas

Enfim, vemos que essa outra corrente clássica dos estudos sobre o desenvolvimento, ainda na década de 1950, tal qual Prebisch, excluiu as atividades (regiões) extrativistas do papel de condutores de processos de desenvolvimento. Apesar de o otimismo de então quanto ao desenvolvimento de países e regiões pobres ter se diluído bastante hoje em dia, sobreviveu na literatura o achado de que as atividades intensivas de recursos naturais não são cruciais para o desenvolvimento. Na esteira das abordagens do "desenvolvimento sustentável", esse achado está sendo esquecido por muitos analistas contemporâneos.

Por falta de espaço, não discutirei as abordagens da teoria "dependentista" (cujas principais formulações constam de FRANK, 1967; e CARDOSO & FALLETTO, 1970) e da teoria dos "sistemas mundiais" (WALLERSTEIN, 1974) sobre o assunto. Basta recordar que essas duas outras importantes escolas de estudos desenvolvimentistas também expressam profundas dúvidas quanto ao papel dos recursos naturais no desenvolvimento dos países pobres contemporâneos, ou simplesmente os excluem deste papel. Este é um dos poucos pontos de concordância entre as quatro escolas.

Depois desta breve revisão do contexto conceitual, apresentarei a seguir as reflexões mais contemporâneas de Stephen Bunker e William Freudenburg.

BUNKER: O EXTRATIVISMO COMO MODO DE PRODUÇÃO SUBORDINADO

Stephen Bunker, sociólogo americano, estuda as perspectivas desenvolvimentistas de regiões extrativistas do mundo contemporâneo, especialmente nos países subdesenvolvidos (ver BUNKER, 1986, 1984, 1989, 1992; BARHAM et alli, 1994). Vários motivos justificam examinar os seus conceitos, as suas estratégias de pesquisa e os seus achados. Primeiro, ele trabalha com uma perspectiva de que não tratei na seção anterior, a da teoria dos sistemas mundiais de Wallerstein. Ele se ocupa das relações entre as nações subdesenvolvidas, as empresas produtoras de recursos naturais e as nações e empresas industriais nos países desenvolvidos. Segundo, Bunker fez pesquisas originais sobre regiões extrativistas brasileiras, especialmente a Amazônia. Terceiro, aparentemente os seus textos nunca foram traduzidos para o português em forma de livros ou artigos científicos.

Além da influência de Wallerstein, a economia política marxista (revista por Ernst Mandel) e a própria sociologia do desenvolvimento "estruturalista" inspirada em Prebisch influenciaram Bunker. Ele construiu uma argumentação que ajuda a entender os obstáculos à transição de áreas extrativistas contemporâneas para a diversificação produtiva ou para o desenvolvimento, ou seja, ele examina as relações entre a abundância de recursos naturais e a pobreza ou, ao menos, a falta de desenvolvimento. É sobre esse aspecto de suas contribuições que me concentrarei aqui.4 4 Discuti mais extensamente as idéias de BUNKER no capítulo 2 de DRUMMOND, 1999. A sua hipótese geral sobre o subdesenvolvimento necessário de regiões extrativistas submetidas a investimentos modernizadores a partir de capitais externos foi empiricamente refutada, em relação à Amazônia brasileira, por HALLER et alli (1996) e HALLER et alli (2000).

Em primeiro lugar, Bunker trabalha com uma distinção entre "modos de produção" e "modos de extração". Este é um traço original e básico da sua abordagem. Para ele, a extração é a coleta de recursos naturais brutos na sua região de ocorrência natural. Por exemplo, o corte de árvores em florestas naturais é extração, mas o corte de árvores plantadas para esse fim é uma forma especial de agricultura, a silvicultura. A pesca de cardumes selvagens de peixes em águas abertas é extração, mas a coleta de peixes criados em cativeiro é um tipo especial de pecuária, a piscicultura. Qualquer grau de manipulação tecnológica dos recursos naturais brutos já implica em transitar do extrativismo para atividades que ele chama de "produtivas", "transformadoras", ou "industriais". Evidentemente, uma região ou um país pode combinar extração, agricultura e transformação. É o caso de quase todos os países ricos ou desenvolvidos da atualidade. No entanto, Bunker sustenta que a diversificação produtiva é característica de regiões ou países desenvolvidos, e que a predominância do extrativismo é um indicador de subordinação de uma região ou de um país a outros que têm diversificação industrial, comercial e de serviços.

Bunker insiste nesta separação conceitual entre extração e produção por motivos que se ligam à economia política. Os produtos extrativistas apresentam uma proporção muito baixa de capital, tecnologia e trabalho. Por isso, afirma ele, a maior parte do valor desses bens é atribuível às suas características naturais, e não ao capital, à tecnologia, ou ao trabalho neles embutidos. Ele destaca ainda que a agregação de valores do capital e do trabalho aos recursos naturais brutos – ou seja, a sua transformação em produtos acabados ou intermediários - tipicamente se dá em regiões industriais que não coincidem com as áreas extrativistas.

Assim, para Bunker as regiões ou economias extrativistas fazem a simples "mineração" ou coleta dos recursos naturais brutos a serem processados alhures. Isso para ele gera um "fluxo líquido de matéria e energia para as áreas centrais industrializadas do planeta", ou, o que dá no mesmo, "uma perda de valor na região de origem [e] um acréscimo de valor da região de consumo ou transformação". As regiões extrativistas sofrem ainda perdas sérias em termos de degradação ambiental - alterações físicas e biológicas nos seus estoques de recursos naturais, os quais são reduzidos (os não-renováveis) ou se tornam mais difíceis de obter (os renováveis).

Para Bunker, quem estiver na extremidade extrativa deste tipo de intercâmbio é o perdedor. Na terminologia de Hirschman, discutida acima, o extrativismo se localiza no início das redes de conexões produtivas "para a frente". Ele alimenta o setor industrial com matérias primas, mas consome poucos insumos alheios. Bunker argumenta que no mundo contemporâneo o desenvolvimento ocorreu invariavelmente nos locais que sediam os estágios transformadores ou industriais da rede de conexões produtivas, e que nem sempre esses locais coincidem com os das atividades extrativas. Ou seja, o desenvolvimento decorre de atividades produtivas executadas "mais à frente" em relação à extração. Apesar de isso remontar às idéias de Hirschman, a diferença principal é que Bunker afirma não existirem manipulações privadas ou públicas capazes de reverter isso. Ele sustenta que as indústrias têm maior possibilidade de manipular os demais fatores de produção - trabalho, tecnologia e capital – e assim têm mais agilidade e adaptabilidade do que os empreendimentos extrativistas.

Um dos motivos pelos quais Bunker estudou a Amazônia é o fato de ela, em sua opinião, ilustrar, à perfeição, o papel de "região extrativa periférica" que tem um deficit nas suas transações com as "regiões industrializadas centrais". Apesar de fornecer recursos naturais para os países centrais há mais de 300 anos, a Amazônia continua a ser, nas suas palavras, "uma das áreas mais pobres do mundo". Ele sustenta que cada ciclo extrativo afetou os habitantes da Amazônia e os seus recursos naturais, através da escravização e dispersão dos nativos e da exaustão de recursos, tornando mais difícil dar início ao ciclo extrativo seguinte. Ele reconhece que, por vezes, "as economias extrativistas produzem aumentos dramáticos na renda regional, mas eles tendem a ser efêmeros". Assim, é preciso tomar cuidado com os horizontes temporais das análises, para não confundir a prosperidade financeira temporária de alguns ciclos extrativistas amazônicos com desenvolvimento.

Crítico das iniciativas "espontâneas" do mercado, Bunker também não espera qualquer racionalidade das intervenções dos estados nacionais dos países subdesenvolvidos em regiões extrativistas. Para ele, em oposição diametral a Hirschman e a Prebisch, políticas desenvolvimentistas não são capazes de reverter as perspectivas cinzentas de regiões extrativistas. Bunker considera que o governo central brasileiro, por exemplo, abordou a Amazônia como uma "fronteira vazia" da qual se poderiam auferir lucros fáceis e rápidos. Assim, ele agiu de forma tão imediatista ou tão irracional quanto a miríade de empresários privados. Grandes investimentos foram feitos ou estimulados em colonização, fazendas de gado, estradas, minas, hidrelétricas, Zona Franca de Manaus, gerando movimento financeiro, demográfico e econômico, mas não um "desenvolvimento auto-sustentado, autônomo". Assim, Bunker não vê a ação estatal como remédio para assegurar a transição de áreas extrativistas para áreas transformativas. Tanto no Brasil quanto em outros países por ele estudados (Venezuela, Jamaica, Suriname, Indonésia, etc.), as políticas governamentais não têm sido capazes, segundo ele, de reverter as duras regras da economia política que comandam a distinção entre a extração e a transformação industrial.

Bunker afirma que o extrativismo gera produtos nos quais o trabalho humano não é "o determinante principal do valor ( ) (O valor fundamental da madeira,) dos minerais, petróleo, peixes e assim por diante faz(em) parte dos próprios bens, e não resid(em) no trabalho humano nele(s) incorporado. Valor adicional pode ser criado quando esses materiais são transformados pelo trabalho humano. O ponto importante, entretanto, é que esse valor adicional é geralmente realizado no centro industrial, e não na periferia". (BUNKER, 1986: 44).

Este princípio converge com o de Wallerstein, que diz que o sistema mundial remunera magramente o trabalho de baixa qualificação e os recursos naturais brutos, premiando o trabalho qualificado e os bens naturais processados. Assim, Bunker considera que as economias extrativistas perdem duplamente: (1) ficam necessariamente na extremidade prejudicada dos intercâmbios comerciais, e (2) têm que lidar com as disrupções locais (sociais e biofísicas) que ocorrem na esteira dos ciclos produtivos, disrupções essas que impediriam a emergência de uma economia industrial estável.

Um segundo ângulo analítico importante na abordagem de Bunker é a maneira pela qual ele identifica as conexões entre economias extrativistas regionais e processos econômicos e políticos globais. Ele sustenta que a contínua necessidade de consumir recursos naturais provoca mudanças constantes na "divisão internacional do trabalho", à medida que antigos depósitos se esgotam e novos depósitos começam a ser explorados. Numa escala espacial planetária e numa escala temporal de décadas, isso significa que as novas frentes extrativistas se tornam cada vez "menos convenientemente localizadas" em relação às regiões industriais centrais, que têm muito mais estabilidade geográfica e durabilidade. Os centros permanecem e as periferias migram. Além disso, os novos depósitos assumem escalas financeiras e tecnológicas cada vez maiores, restringindo a entrada de novos concorrentes. Esses processos se combinam para fazer com que os novos depósitos de recursos naturais tornem-se mais remotos, maiores, e menos numerosos, e, portanto, mais desconectados entre si e menos capazes de desencadear novos processos de desenvolvimento local.

Para Bunker as economias extrativistas são vulneráveis a três fortes constrangimentos "externos": (1) maiores economias de escala e conseqüente crescimento dos investimentos iniciais exigidos; (2) um mercado globalizado, no qual diferentes áreas extrativistas competem entre si; e (3) as múltiplas estratégias pelas quais os países centrais tentam estabilizar ou baratear a oferta dos recursos naturais. Bunker mostra assim que os empreendimentos extrativistas em países subdesenvolvidos enfrentam cada vez mais dificuldades para surgir e continuar em operação, tornando-se agentes improváveis de desenvolvimento local.

Um terceiro aspecto pertinente da análise de Bunker é o status explicativo que ele atribui a "fenômenos naturais – climáticos, topográficos, geológicos, além de químicos e biológicos". Isso coloca Bunker fora das correntes dominantes nos estudos sobre o desenvolvimento, as quais seguem uma longa tradição sociológica de dar primazia aos fatores sociais e negar qualquer estatuto explicativo aos processos naturais. Vejamos uma ilustração de como isso ajuda a enxergar as relações entre recursos naturais e pobreza. O espaço físico – que Bunker chama de "topografia" - é para ele um fator analítico crítico, por causa da citada dispersão dos depósitos de recursos naturais em relação aos países industrializados consumidores de recursos. O espaço e o seu fator associado, o tempo, operam ,de acordo com ele, de maneiras distintas em economias transformativas e economias extrativistas. O "momento certo" para produzir ou usar recursos naturais – solos, minérios, carvão, petróleo, florestas, peixes, água – escapa aos desígnios humanos. No caso de recursos não-renováveis, a sua reprodução deliberada é impossível. No caso de recursos renováveis, a sua reprodução natural pode estar fora dos prazos viáveis à cultura humana ou ela não consegue ser manipulada pela cultura de forma eficaz.

Dessa maneira, Bunker mostra que as formas mais comuns de "desígnio humano" – as quais são instrumentos de poder social – não funcionam ou funcionam de forma muito limitada nas atividades extrativistas (e mesmo em boa parte das atividades agrícolas) no sentido de manipular os processos produtivos industriais. Primeiro, a extração tem que ser feita onde ocorrem os recursos. Segundo, ela é obrigada a aceitar restrições naturais rígidas – climáticas, físicas, químicas, fisiológicas, etc. Um empreendedor que montar uma infra-estrutura para retirar caulim de um depósito remoto só poderá usá-la para esse fim. Mas um fabricante de porcelana baseado em outra região, que consome e transforma o caulim, pode modificar os seus produtos de tempos em tempos (mudando a sua forma, cor, ou finalidade) e explorar novos mercados. Ou pode, também, empregar um substituto natural ou sintético do caulim. Isto faz com que empreendimentos extrativistas sejam, por definição, periféricos às indústrias transformadoras, que podem (e às vezes são obrigadas a) alterar os seus produtos, insumos, processos produtivos, mercados, sazonalidade, localização e tecnologia.

O quarto fator no esquema de Bunker é o fato evidente - mas nada desprezível - de que uma empresa extrativista não pode mudar de produto, a não ser que: (1) outros produtos naturais ocorram no mesmo local; (2) e que eles sejam exploráveis com a mesma tecnologia; (3) e tenham mercado, condições sucessivas difíceis de serem cumpridas. Assim, grandes investimentos de capital em empreendimentos extrativistas ficam "presos" a um único produto, que não pode ser mudado e, por vezes, perde mercado, competitividade ou utilidade. Uma exceção a isso é a exploração de florestas nativas que pode transitar da madeira para produtos não-madeireiros, mas isso exige mercados distintos dos da madeira.

Tomemos, no entanto, uma mina de ferro de grandes dimensões, dotada de capitais, equipamentos e tecnologias que servem apenas para extrair aquele minério, e em cujo perímetro não ocorrem outros minérios de valor econômico. Comparemos essa mina com uma fábrica de artefatos de couro. Enquanto a mina só pode retirar minério de ferro, a fábrica, de acordo com oportunidades de mercado e modificações tecnológicas relativamente simples, pode começar fabricando cintos, bolsas e carteiras, transitar para a fabricação de sapatos e botas, e depois para a de bancos de automóvel e estofados, ou alguma combinação conveniente de todos esses produtos. O resultado líquido disso é o que Bunker chama de "subordinação de economias dependentes da produtividade natural àquelas economias capazes de manipular a produtividade social". As economias extrativistas ficam assim "particularmente sujeitas às características [naturais] do bem extraído" e a sua dinâmica mais pesada e inelástica cria-lhes desvantagens em relação às manipulações factíveis em empreendimentos industriais.

O quinto obstáculo notado por Bunker para empreendimentos extrativistas, ligado ao item "topografia" mencionado acima, é o transporte. Para ele , o tansporte é outra variável analítica crucial. O transporte é analisado como uma forma particular de manipulação humana, que tem o objetivo de "encolher" os intervalos de tempo e os espaços existentes entre os locais de extração e os locais de transformação. Ele destaca que os custos de transporte (via rios, canais, estradas, ferrovias, teleféricos ou portos) tipicamente representam a parcela individualmente mais cara dos modernos empreendimentos extrativistas. Isso persiste mesmo depois de duas grandes revoluções barateadoras dos custos dos transportes – as ferrovias e os navios a vapor e de calado metálico. Assim, os custos de mover os recursos naturais das periferias para os centros transformadores geralmente são maiores do que os custos individuais de sua descoberta, sua prospecção, estudos de viabilidade, construção de instalações, mão-de-obra, da tecnologia adotada, sua operação, e o seu processamento primário. Como quase todo empreendimento extrativo moderno gasta mais em transporte do que em qualquer outro fator produtivo, e como os investimentos em transporte são tipicamente caros e de longa maturação, isso torna os empreendimentos extrativistas ainda mais vulneráveis.

Uma sexta dimensão problemática dos empreendimentos extrativistas é retirada por Bunker dos estudos do historiador econômico canadense Harold Innis (INNIS, 1956). Bunker desenvolveu um método, inspirado em Innis, de "análise baseada na commodity" ("commodity-based analysis"):

"[Innis] adotava o próprio bem natural como o princípio organizador de sua pesquisa, trabalhando, a partir dela para fora, a partir de suas características naturais – inclusive a sua localização geográfica, as exigências espaciais e físicas de sua reprodução, e a relação entre peso e volume do bem e o peso e volume dos fatores exigidos para a sua extração e o seu processamento local." (BUNKER, 1984:1030).

Além disso, Innis "trabalhava também para dentro a partir das condições financeiras, tecnológicas, políticas, demográficas e de mercado prevalecentes em qualquer parte do mundo". A análise conjunta dessas condições internas e externas mostra concretamente muitas diferenças existentes entre as economias industriais e a extrativistas. Por exemplo, a necessidade de ferrovias (implicando em túneis, trilhos, dormentes, estações, armazéns, pontes, etc.) para movimentar grandes volumes de minérios produzidos longe de vias aquáticas, torna-se parte crítica da análise daqueles empreendimentos minerais que produzem bens (ferro, alumínio, estanho, etc.) que combinam grandes volumes com baixos preços por unidade de volume.

Ainda seguindo Innis, Bunker insiste que atenção especial deve ser dada às características físicas e químicas de cada bem natural. Ele faz uma divisão básica entre eles – "orgânicos / renováveis" e "minerais / não-renováveis". Em geral, os segundos são mais suscetíveis à manipulação humana, o que implica , por exemplo, em graus maiores de tecnificação e confiabilidade na produção mineral. Já a pesca, a caça e o corte de árvores nativas incluem fatores naturais mais complexos e mais difíceis de manipular. Os seres vivos são sujeitos a fatores reprodutivos, a dinâmicas populacionais, a ciclos vitais, a doenças, a influências ecológicas imediatas e remotas, à perecibilidade, e a fatores sazonais e climáticos, complicando muito a sua tecnificação e previsibilidade. Mesmo assim, a própria morfologia e o teor de depósitos minerais, embora naturais, devem ser levados em conta na análise dos respectivos empreendimentos produtivos, pois criam-lhes limites, vantagens ou obstáculos relevantes ao seu papel desenvolvimentista.

Quando se levam em conta estes fatores destacados por Bunker, percebemos que regiões, e mesmo países, podem ter perspectivas desenvolvimentistas muito diferentes, ligadas ao peso específico que os recursos naturais têm neles. Vemos, assim, que esse importante analista contemporâneo, tal como Prebisch e Hirschman, embora crítico de ambos, distancia-se da suposição de que exista ou deva existir mais riqueza entre os povos que habitam territórios ricos de recursos naturais.

FREUDENBURG: ARQUIPÉLAGOS DE POBREZA EXTRATIVISTA NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS

Bunker se interessa pelo desenvolvimento - ou falta de desenvolvimento - de regiões e países subdesenvolvidas. No entanto, a questão das relações entre desenvolvimento sócio-econômico e recursos naturais se aplica também aos próprios países desenvolvidos. Ou seja, é comum detectar pobreza ou, ao menos, prosperidade relativamente menor, entre os segmentos das populações dos países desenvolvidos dedicados à extração de recursos naturais, especialmente em regiões decadentes. Um exame da literatura mostra que existem várias semelhanças substantivas entre essas regiões "subdesenvolvidas" dos países desenvolvidos e os países subdesenvolvidos propriamente ditos. Para resumir e organizar a exposição dessas semelhanças, examinarei dois textos: um de William Freudenburg, e outro do mesmo Freudenburg e de Robert Gramling, dois dos principais estudiosos das perspectivas de desenvolvimento de áreas extrativistas de recursos naturais dentro dos EUA (ver FREUDENBURG 1992; FREUDENBURG & GRAMLING, 1994, 1998; FREUDENBURG & FRICKEL, 1994, 1996).

Ao examinarmos os conceitos adotados, as perguntas feitas, os dados expostos e os achados de pesquisa desses autores que estudam regiões dos EUA, vemos que as suas perspectivas desenvolvimentistas assemelham-se bastante às dos países ou blocos de países periféricos subdesenvolvidos especializados na produção de recursos naturais ou matérias primas. Apesar das diferenças do contexto sócio-geográfico imediato, o estudo das crises e incertezas vividas por essas regiões dos países desenvolvidos constata as mesmas expectativas e barreiras, adota contextualizações análogas, usa evidências semelhantes, e chega a conclusões parecidas. O trabalho de Freudenburg, sociólogo rural, descende de uma longa linhagem de estudos da sociologia rural norte-americana sobre pobreza, prosperidade e emprego rurais. Essa literatura deixou patente que as regiões extrativistas têm apresentado um quadro sistematicamente medíocre ou ruim, mesmo quando comparadas às regiões estritamente agrícolas e pecuárias. Entre as regiões ou empreendimentos extrativistas mais estudados, estão as áreas mineradoras de carvão da Virginia, Ohio e Pennsylvania, muitas frentes madeireiras em todo o país (hoje o Noroeste e o Alaska são os pontos focais dessas atividades), os campos petrolíferos de Louisiana, Texas, Oklahoma e Arkansas, e cidades pesqueiras dos litorais do nordeste (Maine) e do noroeste (Washington e Alaska).

Freudenburg discute oito fatores, ou conjuntos de fatores, que determinam a instabilidade socioeconômica do que ele chama de "comunidades dependentes de recursos naturais" (resource-dependent communities, que chamarei de CDRNs) dos EUA. Primeiro, existe o fenômeno da "compressão de custos e preços" ("cost-price squeeze"). Ele pode ocorrer em qualquer empreendimento produtivo, mas é bem característico de empreendimentos extrativistas. Os seus custos de produção têm uma característica notável: tendem a subir constantemente (ponto para o qual Bunker também chama a atenção), devido ao esgotamento relativamente rápido dos recursos de qualidade mais alta e/ou mais acessíveis, e à impossibilidade ou dificuldade de introduzir novas tecnologias. Por exemplo, árvores à beira de estradas existentes serão cortadas primeiro pelas empresas madeireiras. As demais árvores exigirão a abertura de estradas, aumentando os custos, sem garantia de elevação das receitas. Outro exemplo: minérios de mais alto teor serão extraídos antes dos de mais baixo teor, e a receita por volume minerado tenderá a cair com o passar do tempo, aumentando os custos. Ou, ainda: cardumes de peixes grandes serão pescados primeiro e, com o passar do tempo, um maior esforço de pesca (acarretando maiores custos) terá que ser aplicado a cardumes de peixes menores, o que tenderá a produzir rendimentos menores.

Além disso, nos empreendimentos extrativistas há altos custos fixos ligados aos elevados salários pagos em regiões de fronteira ou isoladas e à depreciação de equipamentos caros (ferrovias, processadores de minérios, escavadeiras, veículos pesados, navios, geradores, vilas operárias, etc.). Ou seja, os empreendimentos extrativistas têm custos elevados, rígidos e tendencialmente crescentes, já que existe muito menos margem para alcançar reduções através da inovação tecnológica ou da ação gerencial.

Ao mesmo tempo, e na contra-mão disso, os preços das commodities têm demonstrado uma longa tendência de queda (relativa e absoluta) pelo menos desde o início do século XX, em escala mundial (este é o argumento original de Prebisch). Os bem conhecidos motivos mencionados por Freudenburg para este fenômeno são: competição entre áreas produtoras, avanços tecnológicos na extração ou no aproveitamento industrial dos recursos, substitutos domesticados ou sintéticos, transporte eficiente, e programas de reciclagem de recursos. Assim, os preços estagnados ou declinantes das commodities pressionam ou prejudicam a receita dos empreendimentos extrativistas, mesmo que não sofressem aumentos de custos.

Outra desvantagem correlata dos empreendimentos extrativistas é a escassez relativa de novos capitais nos países desenvolvidos. É evidente que o crescimento muito mais acelerado dos setores produtivos intensivos de informação (mais leves, de maturação rápida, e de retorno mais elevado), contidos na mesma economia nacional, afastam ou tornam mais raros novos capitais investidos em atividades de extração de recursos naturais (tipicamente pesadas, de longa maturação, e de retorno baixo). Aliás, não é coincidênciaque os produtos desses setores intensivos de informação (como micro-eletrônica, telefonia, informática, softwares, etc.) tenham, tipicamente, uma participação reduzida à mínima de recursos naturais na sua composição, tanto em termos de volume, quanto de valor. Em última instância, trata-se de mais uma manifestação da tendência de ocorrerem lacunas cada vez maiores entre os valores relativos de produtos extrativistas e produtos industriais.

Os custos com tendências ascendentes, combinados com as receitas com propensões decrescentes dos empreendimentos extrativistas, já seriam suficientes para abalar qualquer expectativa de que possam ser esteios de desenvolvimento, ainda mais em clave "sustentável". Mas há vários outros motivos para duvidar dessa expectativa. O segundo fator examinado por Freudenburg no declínio da importância das regiões extrativistas dos EUA – este menos aplicável que o primeiro a países subdesenvolvidos – é que a maioria dos empregos (e dos capitais) se desconectou da exploração direta dos recursos naturais há muitas décadas. A divisão social do trabalho nos países ricos avançou tanto, que ao longo dos últimos 100 a 150 anos, mais ou menos, as parcelas de trabalhadores e empresas empenhadas na extração de recursos naturais caíram muito. É claro que isso vai de mãos dadas com o processo já secular de participação decrescente da produção extrativa e agrícola nos PIBs dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Esse fenômeno reduz o peso demográfico e econômico dos trabalhadores e empresas extrativistas, enfraquecendo as CDRNs.

Isso não é contraditadopelo fato de que as populações prósperas das cidades dos países desenvolvidos sejam as maiores consumidoras de recursos naturais, tanto dos seus próprios países quanto de outras partes do mundo. Esse uso voraz de recursos passa quase exclusivamente pelos mercados consumidores, mas não faz parte dos processos produtivos a que a maioria dos trabalhadores está exposta no seu dia-a-dia. Além disso, a simples drenagem de habitantes do campo para os centros urbano-industriais retira peso propriamente eleitoral e político das regiões extrativistas, e assim as CDRNs tendem a ter cada vez menos capacidade de influenciar as políticas regionais e nacionais.

Vale notar que em alguns países subdesenvolvidos pode acontecer o contrário disso: novas fronteiras extrativistas podem atrair grandes contingentes populacionais e novos empreendimentos produtivos para regiões antes esparsamente habitadas, dando-lhes maior peso demográfico, econômico e eleitoral. É claro que isso não significa que tais regiões se tornem mais poderosas do que outras onde existam setores agrícolas, industriais e de serviços estabelecidos.

Este fator de "esvaziamento demográfico-econômico" dos setores e regiões extrativistas dos países desenvolvidos serve para chamar a atenção para o peso econômico e político das mesmas nos embates de desenvolvimento regional. Por exemplo, sabe-se que, no caso brasileiro, novos empreendimentos extrativistas de grande porte em áreas de fronteira tendem a atrair mais pessoas do que as que serão diretamente empregadas ou beneficiadas, o que amplia os seus efeitos, mas não necessariamente o seu desenvolvimento ou o seu peso político. Além do mais, tais investimentos tipicamente implicam na presença de atores como o governo federal, agências regionais de desenvolvimento, investidores de outras regiões e outros países e bancosmultilaterais, e de populações locais inchadas e nem sempre bem organizadas, tornando mais complexa a análise das perspectivas desenvolvimentistas locais.

O terceiro fator citado por Freudenburg é a impossibilidade de "diferenciação" dos produtos extrativistas. Isso é válido também para a extração em países subdesenvolvidos. Essa formulação de Freudenburg é uma outra maneira de expressar as limitações que Bunker identifica para os "desígnios humanos" aplicados a empreendimentos extrativistas. Cada empreendimento extrativista tem pouca ou nenhuma margem para diferenciar deliberadamente o seu produto dos de seus competidores, de forma a ocupar novos nichos ou oportunidades especiais de mercado. O extrativismo não é apropriado a essas ações elementares de gerenciamento dos produtos e de estratégia de mercado. Quando um produto extrativo tem qualidade significativamente superior a de seus competidores, deve-se apenas às suas características naturais – um minério com teor muito alto, uma madeira ou uma fibra vegetal com aplicações industriais mais amplas, um rio com maior potencial hidrelétrico. Ocorre ainda a vantagem "locacional", também natural (ou topográfica, na terminolgia de Bunker) - distâncias menores entre locais de extração e locais de processamento industrial.

Uma conhecida conseqüência disso é o fenômeno contemporâneo do "nivelamento por baixo", ou estabilização dos preços das principais commodities, em escala mundial. Há décadas existem preços internacionais praticados para produtos extrativistas como o petróleo, os minérios de ferro, alumínio, estanho e manganês, a madeira em toras, etc., e para certos produtos agrícolas ou agro-industriais como trigo, milho, arroz, soja, café, açúcar, algodão, frutas cítricas, etc. É difícil ver uma região, um país ou uma empresa extrativa que consiga obter preços excepcionalmente mais elevados para os seus produtos extrativos, já que as características naturais dos mesmos variam em faixas já bem conhecidas pelos mercados e que nenhuma região extrativa pode recorrer a práticas de diferenciação dos seus produtos sem virar uma região industrial (o que exige longos prazos, grandes investimentos e tecnologias de natureza transformativa). Por conseqüência, qualquer produto extrativo sofre a competição direta dos similares produzidos em qualquer outro lugar do mundo, enquanto a busca de diferenciação de produtos para alcançar preços mais elevados requer investimentos adicionais em transformação.

O quarto fator mencionado por Freudenburg vale também para países subdesenvolvidos. Trata-se da racionalidade dos "reinvestimentos" locais nos empreendimentos extrativistas ou em atividades distintas na mesma região ou na mesma CDRN. Ao contrário do que muitas vezes se afirma com veemência, nem sempre é "racional" que um empreendimento extrativista reinvista os seus lucros no próprio empreendimento, ou sequer em outros negócios na mesma região. Do ponto de vista dos habitantes de uma CDRN, isto é evidentemente desejável. Para os donos ou gerentes de um empreendimento extrativista (privado ou público), no entanto, o nível inicial de produção, a produtividade, a receita e a lucratividade podem ser considerados satisfatórios por muitos anos ou mesmo por décadas.

O primeiro ponto a levar em conta quanto à expectativa de reinvestimentos locais de lucros é que, seguindo uma lógica geral, tais reinvestimentos serão poupadores de mão-de-obra. Os críticos do papel desenvolvimentista das modernas empresas extrativistas raramente desejam que elas eliminem empregos. No entanto, a participação menor da mão-de-obra é um resultado comum da modernização tecnológica em qualquer tipo de empreendimento produtivo, extrativista ou não. Uma segunda consideração é que qualquer tecnologia extrativa nova que surja pode, na verdade, ser mais apropriada a novos empreendimentos que explorem outros depósitos de recursos. Nesse caso, haverá reinvestimentos sim, mas em outro local.

Acima de tudo, porém, é preciso lembrar uma terceira consideração: uma empresa é, em princípio, livre para decidir em que e onde reinvestir os seus lucros. Pode ser perfeitamente racional para uma empresa madeireira ou petrolífera, por exemplo, reinvestir parte dos seus lucros (1) em regiões inteiramente distintas das áreas de extração, e (2) num setor distinto mas correlato da economia (por exemplo, na indústria de móveis, no caso da madeireira, ou no refino de petróleo, no caso da companhia extratora de petróleo). Na verdade, pode ser racional e rentável para a empresa investir em setores produtivos inteiramente distintos do extrativismo e dos bens extraídos – imóveis, agro-pecuária, mercado de ações, construção civil, etc.

Se a empresa privada não tem tal liberdade para decidir sobre os seus reinvestimentos, então alguma autoridade política tomará essa decisão em seu nome. Nesse caso, é mais provável que prevaleça a intenção de estimular o desenvolvimento da região extrativista através de reinvestimentos locais. Pode-se, por exemplo, obrigar a companhia a reinvestir localmente alguma parcela de seus lucros. Isso não é, porém, garantia de desenvolvimento. Uma regulamentação dessas pode ter o efeito inverso de minar a saúde financeira do empreendimento extrativista, ou mesmo de afastar outros empreendimentos planejados, pouco dispostos a reinvestimentos locais. Em ambos os casos, a "galinha dos ovos de ouro" se enfraquece ou some.

Outro ponto a se levar em conta é que autoridades políticas e funcionários públicos, eventualmente incumbidos de direcionar o reinvestimento de lucros de empresas extrativistas, trabalham, como outros atores, com uma visão incompleta do mercado de oportunidades. Podem, assim, tomar decisões equivocadas que, mesmo bem intencionadas, não gerem retornos locais. Governantes, planejadores e servidores públicos não são necessariamente peritos em mercados de commodities, ou em investimentos de qualquer natureza.5 5 No caso da mineração de manganês da Serra do Navio, no Amapá, por exemplo, o contrato de mineração de manganês em Serra do Navio assumiu uma posição intermediária. Obrigou a empresa a reinvestir localmente 20% dos seus lucros líquidos em empreendimentos correlatos, mas liberou a empresa para decidir sobre esses investimentos locais e para fazer o que quisesse com os demais 80%. Além disso, a empresa pagou royalties sobre as vendas de minério. Isso fez com que a empresa investisse (1) em algumas melhorias no processamento do minério, (2) em outros empreendimentos locais (mineração de cromita, metalurgia de pequena escala, plantio comercial de árvores, fazendas, fabricação de utensílios de madeira, plantio comercial de árvores) e (3) em mineração em outros estados e países. Os resultados disto para o desenvolvimento do Amapá, apesar de controvertidos, não foram desprezíveis. Ver DRUMMOND (1999), capítulos 6 e 8. Por exemplo, a expansão extensiva do próprio aparelho de estado e do funcionalismo público locais é um erro clássico (ver Hirschman, 1977, a esse respeito) na aplicação de recursos oriundos de royalties ou outras contribuições de empresas extrativistas, já que ela não conduz à diversificação produtiva típica do desenvolvimento contemporâneo.

Isso coloca a questão do efeito desenvolvimentista específico desses reinvestimentos locais, uma matéria complexa da qual não tratarei aqui, a não ser para apontar que reinvestimentos locais não garantem desenvolvimento local. Pode ocorrer ainda que haja uma política nacional de transferir deliberadamente os ganhos de empreendimentos extrativistas das regiões de origem para os centros urbano-industriais do país, conforme proposto pela escola modernizadora de desenvolvimento (ROSTOW, 1960: 23-24). Assim, reinvestimentos locais, espontâneos ou obrigatórios, embora sejam fatores importantes, não geram necessariamente desenvolvimento local.

O quinto fator mencionado por Freudenburg também se liga à reflexão de Bunker sobre países subdesenvolvidos. Trata-se da localização "aleatória" dos depósitos de recursos naturais – minérios, petróleo e gás natural, água, florestas naturais, fauna (inclusive cardumes de peixes), etc. A sua localização decorre de processos naturais que escapam do controle humano. Como os empreendimentos extrativistas só podem se localizar nas imediações dos recursos a serem extraídos, isso tende a situá-los fora dos eixos dominantes das economias urbano-industriais. Esta falta de sobreposição ocorre porque as modernas atividades industriais e de serviços se localizam a partir de critérios cada vez mais desligados do fator "recursos naturais", quer os consumam ou não. Os critérios "modernos" de localização de novos empreendimentos são: proximidade de clientes, fornecedores e empreendimentos correlatos; disponibilidade de energia, comunicações e transporte; concentração de trabalhadores qualificados; proximidade de sedes de órgãos governamentais; acesso a subsídios e incentivos fiscais; disponibilidade de bons serviços governamentais de educação, saúde e segurança; qualidade de vida. As empresas extrativistas não têm liberdade de escolher a sua localização a partir desses critérios e por isso sofrem sérias desvantagens locacionais. Assim, a tendência é que regiões extrativistas continuem a hospedar apenas empreendimentos extrativistas, o que enfraquece as perspectivas de diversificação produtiva.

O sexto fator é político, pois se refere a diferenciais de poder. Ele ocorre tanto em países desenvolvidos quanto subdesenvolvidos. O citado caráter aleatório e/ou remoto dos depósitos de recursos naturais e as escalas crescentes dos empreendimentos extrativistas individuais tendem a favorecer as grandes empresas extrativistas nas suas relações com as CDRNs, necessariamente pequenas, isoladas e politicamente fracas. Assim, são cada vez mais irreais as esperanças de que ocorra "controle comunitário" sobre empresas poderosas. Mesmo que tais CDRNs apresentem um bom grau de organização, as empresas são grandes e também são bem organizadas. Muitas vezes uma grande empresa chega a uma CDRN com experiência nacional ou mesmo global de como obter vantagens à custa das pequenas comunidades, enquanto a CDRN em questão só negociará com aquela empresa. É uma situação típica de interação entre um ator do tipo repeat player (que atua sistematicamente) e outro ator one-shotter (jogador que joga apenas uma vez), em que o primeiro quase sempre leva vantagem sobre o segundo.6 6 Ver GALANTER (1974), para um tratamento esclarecedor sobre a questão dos embates políticos e legais entre grandes atores e pequenos atores. É preciso, portanto, lidar com a realidade de que as grandes empresas extrativistas tendem a ser cada vez mais fortes que as CDRNs nas quais operam.

O sétimo fator, também político, ilustra com mais precisão o que Freudenburg qualifica como a situação "viciada" (termo que usa no título do seu artigo – "addictive") das CDRNs. Elas e os seus respectivos governos, na ânsia de atrair as empresas, mobilizam-se para criar incentivos (isenções fiscais, construção de infra-estrutura, regulamentos ambientais frouxos, uma força de trabalho dócil, tarifas diferenciadas de serviços públicos, etc.) que, no fim das contas, tornam-se excessivos. O problema disso é que a situação tende a se perpetuar e a prejudicar a CDRN. Freudenburg discorda de uma parte da literatura que vê nesses incentivos uma exibição de força das comunidades organizadas dispostas a se desenvolverem. Ele sustenta convincentemente que essa atitude tende, pelo contrário, a tornar as CDRNs cada vez mais dependentes do empreendimento extrativo. Quanto mais concessões, mais dependência. Conforme passa o tempo, o perfil da própria força de trabalho local e das expectativas comunitárias tende a se conformar às necessidades de um único grande empreendimento extrativo, reforçando as demais barreiras à diversificação das atividades produtivas. É o drama das chamadas "company towns" – cidades ligadas a uma empresa. Nesse caso, o próprio sucesso do empreendimento extrativo pode implicar na - e depender da - maior subordinação da CDRN à sua hegemonia, e acaba dando um perfil sobre-especializado à sua economia.

Um oitavo fator é discutido no texto citado de Freudenburg e Gramling. Ele é bem distinto dos demais e, mesmo considerando o peso dos fatores discutidos anteriormente, éparticularmente desconcertante para quem vê boas perspectivas desenvolvimentistas para as economias extrativistas. Os autores retomam a importância das conexões (linkages, na terminologia de Hirschman) que as atividades extrativistas estabelecem com atividades transformadoras baseadas na mesma região. Ao repensarem a atenção dada por Hirschman a essas conexões, no contexto da extração petrolífera no Golfo do México, Freudenburg e Gramling adicionam uma pergunta aparentemente simples. Ela pode ser formulada assim: se uma região extrativa estabelecer linkages produtivas que transformem localmente os seus produtos extrativistas, será isso suficiente para garantir o desenvolvimento regional? O próprio esquema de Hirschman sugeriria uma resposta positiva.

Antes de darem a sua resposta à pergunta, os autores lembram que os casos mais notórios de desenvolvimento de áreas originalmente dependentes de recursos naturais (entre outras, regiões mineradoras de carvão da Inglaterra, o nordeste madeireiro dos EUA, e o núcleo transformador de matérias-primas do meio-oeste norte-americano que deu origem a Chicago) ocorreram todos há mais de 100 anos. Num tom que remete a Wallerstein, eles sugerem que transições comparáveis se tornam cada vez menos prováveis. Isso significa que haverá, por muito tempo, em escala global, um conjunto relativamente pequeno e estável de centros industriais.

A hipótese que os autores formulam e testam é esta: "Se uma região extrativa estabelece conexões produtivas ligadas a uma única commodity, o resultado líquido pode ser que as indústrias conectadas venham de fato a reforçar, ao invés de contrabalançar, a falta de diversificação econômica da região". Ou seja, a hipótese testada propõe que o fato de haver indústrias transformadoras conectadas aos recursos naturais não é suficiente para garantir o desenvolvimento de regiões extrativistas.

Eles testam a hipótese a partir de um estudo de caso, o da indústria extrativa de petróleo na plataforma continental do estado norte-americano da Louisiana. Os próprios autores a consideram a região extrativa mais bem sucedida do mundo contemporâneo. Concluem que as muitas conexões industriais ali geradas em torno do petróleo trouxeram grande e prolongada "prosperidade" para a região, mas não o desenvolvimento. A sua explicação para isso é que a vasta maioria dessas conexões, estabelecidas ao longo de cinco décadas (1930–1980, aproximadamente) dependeu excessivamente da "saúde" de uma única commodity – o petróleo. Houve, sim, inúmeras e complexas conexões produtivas, "para trás" e "para a frente" (na terminologia de Hirschman), mas no fim das contas quase todas – construção e reparo naval, navegação, construção civil, serralharia, metalurgia, portos, oleodutos, refino, petroquímica etc. – eram ligadas à própria extração de petróleo.

O crescimento quase ininterrupto da extração petrolífera desde a década de 1930 foi finalmente abalado no início da década de 1980 pelas quedas acentuadas dos preços internacionais e do consumo do petróleo. Nesta circunstância, as atividades industriais e de serviços baseadas na Louisiana, conectadas direta ou indiretamente ao petróleo, revelaram a sua fragilidade e acabaram encolhendo ou entrando em colapso, juntamente com o declínio da extração de petróleo. Os autores concluem que, para haver desenvolvimento, vale menos a ocorrência de conexões produtivas do que a natureza dessas conexões. Mesmo uma prosperidade durável baseada em conexões dependentes de uma única commodity pode representar nada mais que um longo prólogo à depressão ou à decadência depois que esse bem sofrer abalos no mercado.

Uma das conclusões gerais dos autores liga essa análise das perspectivas de desenvolvimento regional de áreas extrativistas dos EUA com o entendimento dessas mesmas perspectivas no contexto de países subdesenvolvidos dependentes da extração de recursos naturais:

"... a probabilidade de captar localmente conexões transformadoras bem sucedidas tenderá a cair ainda mais no futuro. A combinação da especialização, da infra-estrutura pré-existente de conexões, e da volatilidade dos mercados mundiais de commodities, entre outros fatores, faz com que pareça cada vez menos provável que, nas décadas vindouras, as regiões menos desenvolvidas do mundo consigam estabelecer os tipos necessários de conexões econômicas com as suas atividades extrativistas, conexões essas que possam levar ao desenvolvimento bem sucedido". (FREUDENBURG & GRAMLING, 1998: 584).

Eles concluem, num tom acautelador, recomendando " um ceticismo prudente em relação a qualquer tendência de equacionar extração de recursos naturais com prosperidade e desenvolvimento".

Vemos, assim, que duas linhas contemporâneas de análise das perspectivas desenvolvimentistas, tanto de países subdesenvolvidos quando de áreas extrativistas de países desenvolvidos, revelam uma considerável sobreposição em termos de lógica, argumentação, evidências e conclusões. As regiões extrativistas são definidas da mesma maneira, os seus potenciais e as suas fraquezas são argumentados de formas bem parecidas, e os mesmos tipos de evidências são citados para revelar a sua vulnerabilidade. As conclusões sobre as perspectivas desenvolvimentistas de países desenvolvidos e de regiões extrativistas de países desenvolvidos são praticamente as mesmas, e são desalentadoras.

CONCLUSÃO

Esta breve revisão de idéias clássicas e contemporâneas da "velha" sociologia do desenvolvimento mostra que ela tem lições relevantes para os debates mais modernos e interdisciplinares em torno do desenvolvimento sustentável. Existe fundamento de sobra para argumentar que a abundância de recursos naturais numa região ou num país (ou a sua grande participação nos outputs produtivos) se associa fortemente ao subdesenvolvimento ou, ao menos, a um nível de prosperidade e dinamismo relativamente menor do que ocorre em regiões industriais e de serviços. Essa constatação deve servir de advertência para os que esposam a contra-tendência de igualar conceitualmente os recursos naturais explorados "sustentavelmente" ao bem-estar e à prosperidade. Enquanto essa igualdade não for comprovada empiricamente, essa contra-tendência se assemelhará a um "neofisiocratismo", ou seja, a uma crença não comprovada de que as terras ricas em recursos naturais "devem" ser habitadas por povos ricos.

Evidentemente, uma boa base de recursos naturais é desejável e valiosa para qualquer país, desenvolvido ou não. Vários países desenvolvidos e em desenvolvimento extraem minérios, pescam, plantam cultivos alimentares e criam gado. Nada de prejudicial existe nisso, mas em quase todos os casos os setores extrativos e agro-pecuários têm um output bem limitado em relação aos dos setores comercial, industrial e de serviços. Em virtude dos argumentos discutidos acima, o que vem valendo mais no mundo contemporâneo, no entanto, em termos de diferenciais de desenvolvimento e prosperidade, é a extração eficiente ou racional desses recursos, combinada com a sua transformação industrial local na base de tecnologia eficiente. Nada indica que essa tendência vá se reverter nas próximas décadas.

Na verdade, ainda mais relevante para a declinante importância dos recursos naturais na prosperidade e no desenvolvimento é uma outra tendência que se instalou nas décadas mais recentes nas economias desenvolvidas, e mesmo em várias economias em desenvolvimento. Trata-se da enorme expansão dos setores produtivos intensivos em informação e tecnologia – computadores e periféricos, softwares, telefonia, micro-eletrônicos, robótica, comunicação, etc. Eles atraem grandes volumes de investimentos e, em relação aos setores primário e secundário, as suas taxas de retorno são mais altas e a velocidade desse retorno é muito maior. Da mesma forma, eles geram grandes quantidades de conexões produtivas, modernizam continuamente os seus produtos e expandem os seus mercados globalmente, tudo isso com níveis baixos ou irrisórios de consumo de recursos naturais. Essa tendência hoje é suficientemente estabelecida para, em alguns países, relativizar o papel dos próprios setores industriais como esteios do desenvolvimento, colocando as atividades extrativistas numa penumbra ainda mais escura.

Brasília, março-outubro de 2001

BIBLIOGRAFIA

NOTAS

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  • *
    Este texto reúne materiais dos capítulos 2 e 3 de minha dissertação de Ph. D. (DRUMMOND, 1999). O meu doutorado foi completado com apoio da CAPES e da Universidade Federal Fluminense. Agradeço Sandra de Carlo e Elimar Nascimento pelas leituras críticas de uma versão anterior deste texto. Tirei proveito ainda das apreciações feitas por dois pareceristas anônimos de
    Ambiente e Sociedade.
  • 1
    Em DRUMMOND (1996) explorei o conceito de extrativismo e as perspectivas do extrativismo tradicional ou de baixa intensidade de tecnologia na Amazônia brasileira.
  • 2
    O decenal debate em torno das alternativas desenvolvimentistas dos países subdesenvolvidos é recuperado em numerosos livros, entre os quais EVANS (1995); SO (1990); BAER (1989); KAY (1989).
  • 3
    Significativamente, foi nesta época e no contexto deste debate que os países pobres passaram a ser chamados de subdesenvolvidos.
  • 4
    Discuti mais extensamente as idéias de BUNKER no capítulo 2 de DRUMMOND, 1999. A sua hipótese geral sobre o subdesenvolvimento necessário de regiões extrativistas submetidas a investimentos modernizadores a partir de capitais externos foi empiricamente refutada, em relação à Amazônia brasileira, por HALLER et alli (1996) e HALLER et alli (2000).
  • 5
    No caso da mineração de manganês da Serra do Navio, no Amapá, por exemplo, o contrato de mineração de manganês em Serra do Navio assumiu uma posição intermediária. Obrigou a empresa a reinvestir localmente 20% dos seus lucros líquidos em empreendimentos correlatos, mas liberou a empresa para decidir sobre esses investimentos locais e para fazer o que quisesse com os demais 80%. Além disso, a empresa pagou
    royalties sobre as vendas de minério. Isso fez com que a empresa investisse (1) em algumas melhorias no processamento do minério, (2) em outros empreendimentos locais (mineração de cromita, metalurgia de pequena escala, plantio comercial de árvores, fazendas, fabricação de utensílios de madeira, plantio comercial de árvores) e (3) em mineração em outros estados e países. Os resultados disto para o desenvolvimento do Amapá, apesar de controvertidos, não foram desprezíveis. Ver DRUMMOND (1999), capítulos 6 e 8.
  • 6
    Ver GALANTER (1974), para um tratamento esclarecedor sobre a questão dos embates políticos e legais entre grandes atores e pequenos atores.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Dez 2003
    • Data do Fascículo
      Jun 2002
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