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Iuri Lotman: a análise da cultura segundo a perspectiva da complexidade e da transdiciplinaridade

RESUMO

Neste artigo, temos vários objetivos. Em primeiro lugar, estamos interessados em retomar a categoria de semiosfera em seu caráter dialético e polissêmico, mas introduzindo reflexões para analisar produções culturais de grande complexidade. Nesse mesmo sentido, a categoria de fronteira semiótica interna e externa permite introduzir os problemas de tradução cultural, intercultural e transcultural que se articulam com as mudanças dinâmicas de cada cultura. Em segundo lugar, retomamos a categoria de cultura, para articulá-la com a não-cultura, com a anticultura, o que leva a propor três tipos de semiosferas: da cultura, da não-cultura, da anticultura, que introduzem aspectos controvertidos que devem ser considerados. Em terceiro lugar, tratamos das últimas abordagens de Iuri Lotman sobre a imprevisibilidade dos processos culturais, com os quais formula premissas sobre a complexidade e transdisciplinaridade presentes em todo o seu trabalho.

PALAVRAS-CHAVE:
Semiosfera; Tradução cultural-intercultural-transcultural; Anticultura, não-cultura; Imprevisibilidade

ABSTRACT

We have several objectives in this article. Firstly, we return to the category of semiosphere due to its dialectical and polysemic character, but we also introduce some reflections in order to analyze more complex cultural productions. In this same sense, the category of internal and external semiotic border allows us to present the cultural, intercultural, and transcultural translation problems that are articulated with the dynamic changes of every culture. Secondly, we examine the category of culture and articulate it with the no-culture, with the anti-culture, which would lead to propose three types of semiosphere: cultural semiosphere, noncultural semiosphere, and anti-cultural semiosphere, which introduce controversial aspects that must be considered. Thirdly, we study Iuri Lotman’s latest approaches on the unpredictable in cultural processes, assuming assumptions of complexity and transdisciplinarity that are present in all his work.

KEYWORDS:
Semiosphere; Cultural-intercultural-transcultural translation; No-culture, anti-culture; The unpredictable

RESUMEN

En este artículo, tenemos varios objetivos. En primer lugar, nos interesaretomar la categoría de semiosfera por su carácter dialéctico y polisémico, pero introduciendo reflexiones para analizar producciones culturales más complejas. En este mismo sentido, la categoría de frontera semiótica, de carácter interno y externo, nos permte introducir los problemas de la traducción cultural, intercultural, transcultural que se articulan con los cambios dinámicos de toda cultura. En segundo lugar, retomamos la categoría de cultura, para articularla con la nocultura, con la anticultura, lo que conllevaría a proponer tres tipos de semiosferas: de la cultura, de la nocultura, de la anticultura, que introduce aspectos polémicos que deben ser considerados. En tercer lugar, tratamos los últimos planteamientos de Iuri Lotman sobre lo impredecible en los procesos culturales, con lo cual asume premisas de la complejidad, de la transdisciplinariedad que están presentes en toda su obra.

PALABRAS CLAVE:
Semiosfera; Traducción cultural-intercultural-transcultural; Anticultura, no-cultura; Lo impredecible

Introdução

Neste artigo, propomos retomar as propostas de Iuri Lotman para a análise da cultura, desde a complexidade e a transdisciplinaridade, com o objetivo de atualizá-las para destacar a importância que adquirem estas propostas para os estudos dos processos culturais, cada vez mais complexos na atualidade, vinculados a múltiplos conflitos e tensões que não encontram soluções positivas e convincentes. Além disso, é necessário destacar o impacto nas produções culturais da era digital, na qual surge a cultura digital que abrange o ciberespaço, o cibertempo (espécie de cronotopo digital), o ciberantropo.

Neste quadro apresentado, as formulações de Lotman não perdem atualidade, pois estão organicamente relacionadas com os atuais problemas de globalização política, econômica, cultural, gerados por diversos fatores.

Nesse sentido, os três núcleos que vamos desenvolver serão tratados analiticamente, isto é, relacionados aos processos culturais complexos que vive a humanidade. No primeiro núcleo, ao retomar a categoria de semiosfera, destacam-se três linhas analíticas: a das fronteiras semióticas internas e externas; a dos movimentos dialéticos entre o centro e a periferia culturais; a da recursividade entre memória e esquecimento, a partir da categoria de memória cultural, e os processos dos distintos tipos de tradução. No segundo núcleo, de igual modo, consideramos as categorias de cultura, não-cultura e anticultura para problematizar e aprofundar na análise, o que permite situar três tipos de semiosfera, não só a da cultura. No terceiro núcleo, retomamos as principais premissas às quais Lotman recorre para analisar o imprevisível na cultura, sob influência de Ilya Prigogine, com o qual se articula com maior clareza a complexidade e a transdisciplinaridade.

Em suma, neste trabalho vamos transitar por diferentes eixos teóricos e percursos analíticos, com o objetivo de expor os caminhos que se abrem com as propostas lotmanianas que, por seu caráter polissêmico, permite que continuem vigentes, propositivas para qualquer análise das produções culturais tão aceleradas, efêmeras, mutantes que nos envolvem e nos ligam neste século XXI.

Semiosfera, categoria dialética, polissêmica e recursiva

Esta categoria aparece no segundo estágio da produção lotmaniana e, embora as abordagens anteriores continuem, mudanças importantes são introduzidas, como as sintetizadas a seguir (Lotman, 1996LOTMAN, I. La semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1996. [Colección Frónesis]):

  1. A cultura é uma semiosfera em oposição à biosfera. Os mecanismos estruturais da semiosfera são organizar, hierarquizar, memorizar, traduzir, interpretar e examinar os grandes processos históricos, acumulativos ou explosivos, basicamente imprevisíveis. Se nos detivermos um pouco nesta definição, podemos destacar a complexidade das funções que possui, o que lhe confere um grande alcance heurístico.

  2. A cultura é um texto organizado de forma complexa em que é possível observar hierarquias de “textos dentro de textos”, o que configura uma complexa trama textual.

  3. A categoria fundamental e dialética para trabalhar a semiosfera é a de fronteira semiótica, definida como filtros bilíngues para tradução cultural. Retomando esta abordagem, preferimos propor que existem filtros multilíngues, já que com os processos de globalização a tradução é muito mais complexa, por isso é mais pertinente usar a metáfora do plurilinguismo, isto é, inumeráveis linguagens e textos hiperconectados.

Desde este ponto de vista, a multiculturalidade, a pluriculturalidade, a interculturalidade e a transculturalidade implicam a existência de complexas fronteiras semióticas nas quais se estabelecem relações espaço-temporais, cronotópicas de alta densidade semiótica. O que se menciona anteriormente pode ser ilustrado com a relação entre o Ocidente e o Oriente, na perspectiva macro e micro, com as culturas indígenas da América que constituem semiosferas, com textos e linguagens que estabelecem fronteiras semióticas entre culturas. Desta perspectiva, o cultural passa pela tradução de linguagens ou textos, para que a alteridade, o outro, o estrangeiro, possam ser integrados a partir de uma lógica textual originária, evitando a violência física ou simbólica. No entanto, no desenvolvimento contemporâneo, não há traduções interculturais e transculturais com os graus necessários para evitar a violência, mas pelo contrário. Nesse sentido, nas fronteiras semióticas funcionam, fundamental e principalmente, os conflitos nos processos de tradução, formulação que às vezes é invisível nas abordagens lotmanianas.

Relacionamos a categoria de tradução com as de multiculturalidade, a pluriculturalidade, a interculturalidade, a transculturalidade. Nos estudos culturais, as duas categorias iniciais, que tentam relacionar as culturas, são as da multiculturalidade/pluriculturalidade, que não conseguem problematizar e aprofundar a heterogeneidade cultural, interna e externa. A multiculturalidade (pluriculturalidade) se define como a coexistência de múltiplas culturas num dado espaço, como acontece praticamente em todos os Estados Nacionais. A posteriori, emerge a categoria de interculturalidade, com o objetivo de aprofundar as relações entre diferentes culturas, para evidenciar os conflitos e as tensões geradas nestes intercâmbios, com a intensificação dos processos migratórios, baseados na globalização cultural, econômica e política, que são inevitáveis desde o final do século XX, continuando no século XXI. Esta categoria permite visualizar de forma mais profunda os problemas derivados das relações entre as culturas. No entanto, é importante salientar que existem duas posições fundamentais para tratar destes processos interculturais: 1) a primeira surge relacionada com as posições hegemônicas, que estudam a dimensão intercultural, como o encontro entre culturas, com o qual se excluem muitas problemáticas e 2) a segunda, constitui uma posição crítica desde o alternativo, com o qual a interculturalidade apela para resgatar uma matriz decolonial1 1 N. T.: Decolonial é o conceito formulado a partir do ano 2000 que promove um novo entendimento do processo do pós-colonialismo na América Latina, com um objetivo de promover uma crítica radical ao culturalismo eurocêntrico. Não se confunde com descolonial pois, ao invés de acreditar na superação da condição colonial, preconiza sua permanência escamoteada pelo jogo do poder que, em nossos dias, se sustenta de planos estratégicos baseados numa geopolítica mundial profundamente desigual. , para afastar-se dos esquemas dominantes (MIGNOLO, 2015MIGNOLO, W. Habitar la frontera. Sentir y pensar la descolonialidad (Antología, 1999-2014).Barcelona Center for International Affairs, Universidad Autónoma de Ciudad Juárez, 2015.; CARLOS GOMEZ E GROSFOGUEL, 2007CARLOS-GOMEZ, S y GROSFOGUEL, R (compiladores). El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007. Disponible en: www.unsa.edu.ar/histocat/hamoderna/grosfoguelcastrogomez.pdf
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); esta segunda posição requer uma redefinição das problemáticas e das categorias que são usadas com base no discurso dominante.

A categoria que adquire o escopo mais amplo para a análise destes complexos processos culturais é a da transculturalidade, que foi retomada nos anos de 1990 e continua com seu vigor, embora a de interculturalidade seja a mais difundida. Fernando Ortiz utiliza o conceito de transculturação em 1935, mas com outros matizes. Atualmente, a categoria de transculturalidade já possui uma produção considerável; contudo, em quase nenhuma se estabelece uma relação com as abordagens da Epistemologia da Complexidade de Edgar Morin e da Transdisciplinaridade, que são as que permitem aprofundar sua análise. A categoria aparece neste sentido na Carta da Transdisciplinaridade2 2 N. T.: Carta produzida por ocasião do Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, ocorrido no Convento da Arrábida, Portugal, de 2 a 7 de novembro de 1994, e assinada pelo comitê de redação constituído por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu. Trata-se de um documento que reúne os princípios fundamentais da comunidade transdisciplinar. (1994)VARIOS AUTORES. Carta de la Transdisciplinariedad. Portugal, Convento de La Arrábida, 1994. Disponible en: www.filosofia.org/cod/c1994tra.htm
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, em diversos artigos e com mais sistematização no Manifesto da Transdisciplinaridade, de Basarab Nicolescu, elaborado em 1996NICOLESCU, B. La transdisciplinariedad. manifiesto. Xalapa: Universidad Veracruzana. Trad. Norma Núñez-Dentin y Gérard Dentin. [Original Paris: Editions Du Rocher 1996]..

O exposto anteriormente tem o objetivo de ampliar a tradução cultural lotmaniana, a tradução intercultural e transcultural, concentrando-se nesta última devido ao seu alcance heurístico (HAIDAR, 2013HAIDAR, J. From Interculturality to the Transculturality: Impact on the Discursive Practices. Hangzhou, China, 2013 (Working paper).).

  1. A modernidade e a pós-modernidade aceleram as mudanças e os processos complexos transculturais, que são inevitáveis no presente e no futuro.

  2. O transcultural apresenta duas orientações básicas: uma que leva ao dialogismo cultural, desde o ato ético, como entendemos, e outro que conduz à reprodução da dominação, da diferença. Para o desenvolvimento da transculturalidade positiva, devemos superar a diferença entre línguas e culturas distintas e procurar sua tradução, promovendo o dialogismo, que sempre será possível apesar de diversas dificuldades.

  3. No transcultural reside o paradoxo entre o aberto e o fechado. Os processos transculturais devem superar o mito: Ocidente como repositório da ciência e o Oriente como repositório da sabedoria. No entanto, em termos recursivos, em cada sujeito estão reunidos potencialmente o Oriente da sabedoria e o Ocidente da ciência.

  4. O transcultural propõe que não haja cultura que possa julgar as outras, em termos discriminatórios. O transcultural sempre existiu, mas no mundo atual adquire outros domínios com a globalização, com a hiperconexão entre culturas.

  5. O transcultural é a condição de ser da cultura, porém implica uma complexa relação recursiva entre o homogêneo e o heterogêneo. Nesse sentido, o transcultural tem como objetivo nuclear buscar o diálogo entre todas as culturas, que sempre resistem à homogeneização.

As abordagens expostas sobre a transculturalidade se relacionam com a categoria da tradução total proposta por Lotman (1996LOTMAN, I. La semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1996. [Colección Frónesis], 1998LOTMAN, I. La semiosfera II. Semiótica de la cultura, del texto, de la conducta y del espacio. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1998. [Colección Frónesis], 2000)LOTMAN, I. La semiosfera III. Semiótica de las artes y de la cultura. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 2000. [Colección Frónesis] e por Torop (2000)TOROP, P. La traduzione totale. Modena: Guaraldi Logos. 2000., uma vez que entre as culturas existem processos contínuos de tradução para que possam ser inteligíveis. Nesses termos, os processos transculturais devem obedecer a princípios éticos, partindo da necessidade de respeito ao outro, à alteridade, o que não acontece porque não conseguem eliminar conflitos, tensões, guerras que estão levando a uma crise total, uma crise da civilização mundial.

No entanto, a transculturalidade é sedutora, porque o contato com o “outro”, com a alteridade, pode ser possível em um mundo em que a heterogeneidade de linguagens, ritos e ordens simbólicas podem ser superadas com a mídia digital. O melhor da globalização (a utopia transcultural) terá que enfrentar o grave e ainda intransponível problema da negação do outro, das complexas e diferentes alteridades.

Nos processos transculturais, que implicam vários tipos de tradução, é importante retomar a recursividade entre a memória e o esquecimento, relacionada à categoria de memória cultural. Lotman (1996)LOTMAN, I. La semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1996. [Colección Frónesis] coloca muita ênfase nesta categoria, que se relaciona com os processos mnemônicos de conservação das culturas. A imensa e prolífica produção cultural não pode ser conservada em sua totalidade, motivo pelo qual as culturas selecionam o que deve permanecer e excluem o que deve ser esquecido. Nessa dialética entre memória e esquecimento, no entanto, exclusões ou desaparecimentos ocorrem por várias razões, entre as quais se destaca o importante papel do poder. Com efeito, o poder interfere de maneira fundamental na memória da cultura de vários tipos que estão relacionados aos processos cognitivos das classes dominantes, principalmente.

Para finalizar esta seção, regressamos à categoria de semiosfera de modo a esmiuçar seus sentidos, orientados a como segmentá-la analiticamente. Em primeiro lugar, se propõe uma semiosfera geral, macro que abarca todo o cultural, e onde funciona uma infinidade de linguagens, de textos (incluindo a possibilidade de que os textos podem preceder algumas linguagens, o caso do texto-código) (LOTMAN, 1996LOTMAN, I. La semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1996. [Colección Frónesis], 1998LOTMAN, I. La semiosfera II. Semiótica de la cultura, del texto, de la conducta y del espacio. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1998. [Colección Frónesis]). Num segundo sentido, a semiosfera da cultura está conformada por semiosferas específicas, particulares, e cada uma delas, por sua vez, é constituída por linguagens e textos heterogêneos. No terceiro sentido, as semiosferas são constituídas por formações semióticas, que é a proposta analítica de Lotman para a segmentação (1996LOTMAN, I. La semiosfera I. Semiótica de la cultura y del texto. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1996. [Colección Frónesis], 1998)LOTMAN, I. La semiosfera II. Semiótica de la cultura, del texto, de la conducta y del espacio. Selección y traducción del ruso de Desiderio Navarro. Madrid: Cátedra, 1998. [Colección Frónesis]. Do nosso ponto de vista, nos parece mais pertinente o segundo sentido, no qual se articulam recursivamente o macro e o micro, o que permite cobrir as semiosferas da música, do espaço, da pintura, da moda etc.

Em síntese, a relação entre semiosferas e fronteiras internas e externas passa por uma dialética de conflito, que se materializa nos problemas de tradução cultural, intercultural e transcultural, o que implica diferentes tipos e graus nos processos de tradução, que se superpõem à dialética da memória e do esquecimento nas culturas.

Semiótica da cultura, da não cultura e da anticultura

Na base das abordagens de Lepik (2002)LEPIK, PEET. The Anticulture Phenomenon in Soviet Culture. Semiotica 138 (1/4), pp.179-203, 2002., se encontra uma exposição muito interessante da relação entre os conceitos de cultura, de não cultura e de anticultura, que não ficaram totalmente explicitados nas exposições de Lotman e Uspensky (1979)LOTMAN, I. Escuela de Tartu. Semiótica de la cultura. Madrid: Cátedra, 1979.. A partir das relações que Lepik estabelece entre a cultura, a não cultura e a anticultura, em nossa opinião, é possível ampliar a proposta inicial lotmaniana, para propor que estão em relações orgânicas três tipos de semiosfera: a semiosfera da cultura, a semiosfera da não cultura e a semiosfera da anticultura, nas quais se materializam os movimentos do previsível/imprevisível. Esta expansão nos parece pertinente porque, se a semiótica da cultura e a semiosfera se desenvolvem como duas categorias básicas, é necessário se deter nas outras duas que se derivam logicamente: semiosfera da não cultura; semiosfera da anticultura. Além disso, ao invés de propor diferenças entre as três semiosferas, preferimos propor um continuum recursivo entre cultura / não cultura / anticultura (HAIDAR; CHÁVEZ HERRERA, 2016).

Esta proposta demanda, em princípio, uma definição mais objetiva do que pode ser a não cultura e a anticultura, segundo as propostas de Lotman e Uspenski em vários artigos. A não cultura se localiza espacialmente como fora da semiosfera, como a desconhecida, e possui uma relação recursiva com a cultura, uma vez que entre as duas se tornam possíveis os mecanismos dos diversos tipos de traduções que se tratam neste trabalho. Como um exemplo para ilustrar o que seja a não cultura, podemos citar as culturas ancestrais para as quais a cultura europeia da conquista é uma não cultura, entre muitos outros exemplos. Do lado oposto, a anticultura está em oposição à cultura, situando-se ambas no negativo e no positivo, o que nos lembra o mecanismo cultural do enantiomorfismo (LEPIK, 2002LEPIK, PEET. The Anticulture Phenomenon in Soviet Culture. Semiotica 138 (1/4), pp.179-203, 2002.; HAIDAR; CHÁVEZ HERRERA, 2016)

Da perspectiva de onde sintetizamos a brilhante análise de Lepik, argumentamos que o narcotráfico não é uma narcocultura, como chegam a se referir muitos autores em muitas investigações e estudos, senão que se situa na semiosfera da anticultura, sendo portador, como tantos outros, de uma grande heterogeneidade de linguagens e textos. Esta singular e grotesca semiosfera não produz cultura, desde que do nosso ponto de vista a cultura deve estar ligada à ética e à construção. A produção do narcotráfico é anticultural porque é gerada pela barbárie, pelo terror, pela morte criminosa, que nega relevância para a narcocultura, o que sem dúvida gera múltiplas controvérsias.

Desde a complexidade e a transdisciplinaridade, a categoria de narco cultura não tem legitimidade, pois é gerada graças ao vínculo com o funcionamento de um poder sem ética, um poder dominante para o qual os critérios éticos não se aplicam. Os produtos do narcotráfico pertencem à semiosfera da anticultura, embora pareçam ocultar todo o terror e a morte que geram, como são os narcoeventos, a moda, o cinema, o narcocemitério, a publicidade etc.

Deste modo, a anticultura do narcotráfico simula a realidade através do uso massivo de signos degenerados, produções semióticas desviadas ou distorcidas que buscam representar modos de vida adulterados e ocultar, mediante mecanismos superficiais, a estrutura profunda desta semiosfera, que tem como centro as múltiplas técnicas de horror através da intimidação, desumanização e exclusão (HAIDAR; CHAVEZ HERRERA, 2016).

Além disso se apresenta como desvinculado do desenvolvimento do capitalismo transnacional e de seus poderes de dominação. Em outras palavras, esta semiosfera da anticultura se insere no coração do capitalismo global, em seu lado mais perverso e sombrio, o que nos obriga a investigar as dimensões sociopolítico-culturais-histórico-econômicas que se inserem nessas semiosferas do crime. Nesse sentido, reivindicamos a necessidade de nomear esses produtos a partir da anticultura e da barbárie. A transculturalidade não permite a narcobarbárie, uma vez que esta não se sustenta a partir dos valores mínimos da ética e menos ainda de uma ética planetária (MORIN, 2004MORIN, E. El Método VI. Ética. Madrid: Cátedra, 2004.). Além disso, a disseminação e circulação dessa barbárie é sustentada pelo vínculo do tráfico de drogas com os poderes fácticos3 3 Poderes fácticos são aqueles que, situados à margem das instituições políticas e sem constituir aparelho formal do Estado, são dotados de capacidade de pressão sobre a sociedade, por exemplo, a Igreja, os meios de comunicação, os bancos. transnacionais: políticos, midiáticos e militares, como já mencionamos.

Desde os movimentos da periferia ao centro, tratados por Iuri Lotman em vários trabalhos, não deixa de ser preocupante o fascínio pelas práticas do crime organizado e pelo que eles representam: heróis para muitos grupos sociais marginalizados, situação que não deixa de ser um simulacro da realidade tremendamente trágica que lhes permite viver como uma elite ilegal articulada ao poder. Observamos como uma semiosfera de anticultura, como é o narcotráfico, se move para o centro criando hiper-realidades. Para sustentar uma análise crítica profunda, recorremos à Semiótica da Cultura, à Epistemologia da Complexidade e da Transdisciplinaridade para poder argumentar e refutar as posições acríticas que analisam com acenos positivos a “narcocultura”, excluindo todo o seu terror e ficando em suas produções superficiais, como são a música, a moda, as casas e até mesmo os narcocemitérios.

A dialética entre o previsível / imprevisível em diferentes processos culturais

Na terceira etapa, Lotman continua com os temas tratados anteriormente, mas introduz novos ângulos analíticos ao problema dos intercâmbios culturais. Em seu livro Cultura e explosão (1999), as mudanças não implicam necessariamente a revolução, mas sim o imprevisível como objeto científico, o casual. Com essas abordagens, introduz as teorias do acaso, do caos, da catástrofe, da complexidade, pela influência de Ilya Prigogine, expoente emblemático da química desde a complexidade. Desse autor retoma os processos simétricos e assimétricos (LOTMAN, 2013LOTMAN, I. The Unpredictable Workings of Culture. Tallin: Tallinn University Press, 2013.), definindo os primeiros como processos de equilíbrio e circulares, enquanto que os segundos são processos instáveis que têm a capacidade de inovar e produzir, de forma dinâmica, novas informações e novas ideias.

Em seus últimos anos de vida, as formulações de Iuri Lotman se orientam por outros ângulos, quando examinou com especial interesse a dialética do previsível/imprevisível nos processos culturais. Em seguida, sintetizamos as propostas de Iuri Lotman em alguns tópicos (1999LOTMAN, I. Cultura y explosión. Barcelona: Gedisa, 1999., 2013)LOTMAN, I. The Unpredictable Workings of Culture. Tallin: Tallinn University Press, 2013.:

  1. A relação entre o previsível e o imprevisível é produzida em distintas dimensões: na intra-semiosfera (no interior de cada uma) e na extra-semiosfera (na relação intersemiosférica).

  2. Nesta dialética, são analisados os processos graduais opostos aos processos imprevisíveis, explosivos. A continuidade é uma previsibilidade implícita, enquanto que a imprevisibilidade é a mudança que acontece nos modos de explosão. A partir destas propostas, Lotman propõe que a imprevisibilidade dos processos explosivos não é a única forma do novo, uma vez que regiões completas da cultura podem transformar-se também pelos processos graduais. Com estas abordagens, o semioticista enriquece suas reflexões sobre as mudanças culturais que sempre constituíram uma preocupação central de seu pensamento e da escola de Tartu.

  3. Os processos graduais e os explosivos são antitéticos, mas coexistem numa relação de reciprocidade, de tal maneira que a anulação de um dos polos levaria ao desaparecimento do outro. Em suma, há duas tendências necessárias: processos dinâmicos explosivos e processos dinâmicos graduais, os primeiros garantem a inovação e os segundos, continuidade na dinâmica da cultura.

  4. Os processos explosivos e graduais estão inseridos na dinâmica dialética do previsível/imprevisível, e ambos são significativos. Por exemplo, as grandes ideias científicas se relacionam com a arte porque sua origem é semelhante a uma explosão. Esta afirmação nos leva à relação recursiva entre as ciências e a arte, que é proposta a partir da complexidade e da transdisciplinaridade. Além disso, é importante notar que a categoria de explosão não se refere apenas à destruição, mas a novas descobertas.

  5. A partir destas últimas reflexões, Iuri Lotman recorre à teoria da incerteza que orienta, igualmente, as ideias sobre complexidade e transdisciplinaridade e que abrange as situações pré-explosivas do caos, dinamismo e mudança. Nessas situações, destaca-se a complexa heterogeneidade da linguagem e dos processos de tradução entre os textos que oscilam entre os traduzíveis e os intraduzíveis. As relações entre a explosão e o imprevisível de Lotman situam o pensamento lotmaniano na perspectiva da complexidade/transdisciplinaridade de Edgar Morin (1997MORIN, E. Introducción al pensamiento complejo. Barcelona: Gedisa, 1997., 2003)MORIN, E. El Método V. La humanidad de la humanidad. La identidad humana. Madrid: Cátedra, 2003. e Basarab Nicolescu (1996)NICOLESCU, B. La transdisciplinariedad. manifiesto. Xalapa: Universidad Veracruzana. Trad. Norma Núñez-Dentin y Gérard Dentin. [Original Paris: Editions Du Rocher 1996]..

  6. Outra abordagem que o aproxima desta epistemologia do século XXI refere-se ao isomorfismo entre o individual e o social, relação que também se encontra na complexidade com a categoria do holograma: o todo está nas partes e ao mesmo tempo as partes estão no todo.

  7. O imprevisível tem uma característica importante, porque está situado em um ponto de inflexão do qual se origina uma variedade de possíveis mudanças com múltiplas consequências, que se vincula à teoria da incerteza. O momento da explosão é também o espaço do brusco aumento de informação de todo o sistema, gerando um caminho completamente novo, imprevisível e mais complexo.

  8. Em Cultura e explosão(1999)LOTMAN, I. Cultura y explosión. Barcelona: Gedisa, 1999., Lotman explicita uma combinação simultânea nas esferas da cultura dos dois processos: o explosivo e o gradual. Há uma dinâmica entre os dois processos nas seguintes esferas culturais: a língua, a política, a moral, a moda, que manifestam diferentes velocidades nas mudanças e nos movimentos. Além disso, os dois processos ocorrem diacronicamente e de forma sincrônica.

  9. Os mecanismos dos processos graduais foram estudados muito menos, fazendo crer que eles estão ausentes e que não são importantes. Os processos graduais constituem um aspecto importante do movimento histórico e, além disso, não são estáveis. O significado de processos lentos, graduais, na história, não reserva lugar ao papel dos explosivos. Na realidade da história, todos esses tipos de processos são traçados e atuam uns sobre os outros, ora acelerando, ora retardando o movimento geral.

  10. Previsível/imprevisível em relação ao tempo: em relação ao futuro, à história, os momentos de explosão são de impossível previsão, visto que o desenvolvimento permite múltiplas possibilidades. A imprevisibilidade implica um complexo de probabilidades, das quais apenas uma é possível acontecer. O momento de exaustão da explosão produz um ponto de inflexão, pelo qual acontece um movimento de retrocesso para o ponto inicial. Desse modo, o mesmo evento pode ser inserido tanto na série previsível, quanto na imprevisível. Cada grande evento não só abre novos caminhos como também deixa em suspense o curso de potencialidade futura.

  11. A lógica da explosão, do imprevisível, pode ser percebida como uma cadeia de explosões coerentes, que se sucedem uma à outra. O momento da explosão é o momento do imprevisível, que não deve ser entendido como possibilidades ilimitadas, porque cada momento de explosão tem seu conjunto de possibilidades, mas com certos limites.

  12. Uma abordagem muito interessante se refere a que um mesmo evento pode ser inserido tanto na série previsível quanto na imprevisível com o qual a dinâmica da cultura prevalece sobre o estático. Consequentemente, cada grande evento não apenas abre novos caminhos como também deixa em suspense potencialidade futura: outra vez a presença da dialética da contradição: abrir e fechar caminhos ao mesmo tempo.

Partindo da exposição sintética das premissas anteriores, vamos abordar alguns acontecimentos contemporâneos desde o previsível/o imprevisível, sendo este último o que prevalece neste mundo turbulento, sem muitos horizontes de esperança.

Os processos de previsibilidade/imprevisibilidade podem surgir em vários campos culturais com movimentos temporais distintos: na arte, na moda, na política, em guerras e revoluções, em movimentos sócio-histórico-cultural-políticos etc.

Lotman (2013)LOTMAN, I. The Unpredictable Workings of Culture. Tallin: Tallinn University Press, 2013. assegura que o maior grau de imprevisibilidade está no campo artístico. O autor entende que a arte é a essência fundamental do conhecimento e por isso tem impacto no desenvolvimento histórico-cultural. É necessário explicar por que o imprevisível encontra seu melhor exemplo no campo da arte, no qual existe o maior grau de imprevisibilidade que, segundo Lotman, se deve a duas condições deste campo: a) a liberdade na criação (ainda que existam cânones) e b) mudanças rápidas e imprevisíveis do campo, que se baseiam na busca de originalidade para o novo. Nesse sentido, dialeticamente, a arte amplia o espaço do imprevisível, da informação e, ao mesmo tempo, cria um mundo convencional, o do cânone. Além disso, o autor coloca o maior grau de imprevisibilidade na metáfora.

Em movimentos sociocultural-histórico-político-econômicos destacamos os movimentos da diferença, nos quais existem diversas produções culturais materializadas em práticas semiótico-discursivas, como as marchas, a semiose dos corpos, os discursos. Esses movimentos são imprevisíveis, mais do que previsíveis, e suas formas de manifestação também. O diferente, o alternativo se situa na periferia lotmaniana, porém em muitas ocasiões se movem ao centro e o ocupam.

Reflexões finais

Com o que foi exposto anteriormente, nos detivemos nos alcances e limites da categoria de semiosfera e nos avanços necessários, que abordamos sinteticamente.

Os sistemas e as práticas semióticas que conformam a cultura humana estão sujeitos a uma lei obrigatória de desenvolvimento graças ao dinamismo das relações sociais. Essa premissa abrange os outros fatores de mudanças como são as relações interculturais, transculturais, a dominação cultural, que podem produzir transformações profundas, como são exemplos os fenômenos atuais da globalização política, econômica e cultural.

Para explicar os fenômenos da globalização cultural, retomamos a proposta lotmaniana de que a explosão cultural não é mudança brusca, mas sim o imprevisível no desenvolvimento cultural. Essa abordagem do imprevisível se situa nas mais avançadas propostas atuais no campo das ciências sociais ligadas ao princípio da incerteza.

A globalização implica, portanto, trabalhar desde a transculturalidade, da heterogeneidade dos movimentos dialéticos das fronteiras semiótico-culturais, que implicam a tradução cultural, intercultural, transcultural e, portanto, as mudanças culturais. Atualmente, quando a globalização, em termos positivos, realmente só existe para uma pequena parcela da humanidade, a heterogeneidade impõe a todos o desafio de preservar a diferença contra a homogeneização. Desafio complexo, porque nos encontramos com duas possibilidades: a possível irrupção de culturas da periferia em nível global e local, que passam a espaços nucleares do centro, ou com o oposto, a destruição das culturas que estão fora do centro, na periferia.

Esta é a marca do terceiro milênio, do século XXI, que Lotman considera em seus últimos escritos: como conservar diferenças diante dos processos de homogeneização dominantes. Acreditamos que é necessário retomar e desenvolver um pensamento crítico, analítico, que possa propor alternativas para o desenvolvimento da humanidade e dos próprios sujeitos.

É necessário abrir rotas analíticas para a semiosfera, como o próprio Lotman fez de alguma forma em Cultura e explosão (1999)LOTMAN, I. Cultura y explosión. Barcelona: Gedisa, 1999.. Por exemplo, é importante articular as formulações de Lotman aos problemas da globalização para os quais as propostas devem ser adequadas e modificadas para dar conta de novos processos culturais de profunda complexidade. Do mesmo modo, é necessário repensar muitas reflexões relativas a Iuri Lotman e à Escola de Tartu, com a Epistemologia da complexidade, da transdisciplinaridade de Edgar Morin e Basarab Nicolescu.

Na obra de Lotman, que conhecemos, principalmente, devido às excelentes traduções de Desiderio Navarro (†1917)e de alguns outros, notamos algumas ausências significativas que podem estar em outros textos não traduzidos. Por isso, os limites são colocados com esta condição. Existe uma relativa ausência de uma teoria do poder no funcionamento da cultura, embora existam abordagens que aludam a esse problema, com a categoria de dominação. A isso se acrescenta a ausência de uma teoria do conflito, isto é, o funcionamento cultural ligado ao poder, à ideologia, e que é, por natureza, conflitivo. Finalmente, a ausência significativa de uma teoria objetiva do sujeito, com a qual, sem dúvida, as propostas de Lotman adquirem outros escopos. Não podemos deixar de mencionar, entretanto, a proposta peculiar de considerar o texto como sujeito, uma persona semiótica que dialoga com os destinatários.

Pensamos que é necessário, como importante a tarefa de reconstrução do pensamento lotmaniano, realizar uma reconstrução de múltiplas categorias como cultura, texto, fronteira, dialogismo, semiosfera para conseguir um melhor fechamento de suas propostas, para que as categorias possam recuperar seu caráter dialético, complexo, que às vezes se perde nas leituras fragmentadas de seu trabalho. E a isso se soma a necessidade de poder conhecer em traduções rigorosas, como as feitas por Desiderio Navarro, na Revista Criterios, publicada há quatro décadas e nas três semiosferas, e a divulgação feita por Manuel Cáceres, em Entretextos. Revista Eletrônica Semestral de Estudos Semióticos da Cultura - as contribuições mais completas de Lotman e da Escola de Tartu, aos quais ainda não conseguimos acessar.

Em termos dialéticos, no entanto, esses limites nos ajudam a continuar analisando a riqueza teórico-metodológica dessa tendência que ainda tem muitos caminhos inexplorados, como a abordagem lotmaniana da continuidade entre as ciências sociais, as ciências naturais, as quantitativas e as ciências artísticas, com a qual se articula muito claramente as propostas epistemológicas de Edgar Morin.

As propostas de Lotman mostram sua relevância ao se vincular às múltiplas questões que dizem respeito aos estudos de cultura e história. Além disso, buscam cruzar as fronteiras da interdisciplinaridade por meio de considerações teóricas inovadoras, abordando com clareza a epistemologia da complexidade e da transdisciplinaridade. Daí a importância da leitura e reflexão no século XXI, onde continuamos a viver tempos caóticos e imprevisíveis, com incertezas em relação ao futuro da humanidade e mesmo do planeta. Lotman está presente, continuará presente com suas reflexões e contribuições de seu pensamento crítico e ético, que ele sempre tentou observar em sua vida acadêmica e pessoal.

Finalmente, não podemos deixar de reconhecer que as reflexões, os trabalhos, as contribuições da escola de Tartu, de Iuri Lotman, são inestimáveis na análise da produção semiótica em toda a sua densidade e complexidade. Os caminhos estão abertos, alguns já são mais conhecidos que outros, mas ainda existem longos trajetos para esclarecer a riqueza teórico-metodológica que ele propõe, e não é justo que a maior parte dos meios acadêmicos não considere toda essa ampla e fértil contribuição, produzindo exclusões injustas. Para isso, para salvar tantas ausências é que convocamos todos os intelectuais a conhecer a obra lotmaniana, com o rigor e a seriedade que sempre teve e que merece por sua trajetória existencial e por sua ética impecável.

  • 1
    N. T.: Decolonial é o conceito formulado a partir do ano 2000 que promove um novo entendimento do processo do pós-colonialismo na América Latina, com um objetivo de promover uma crítica radical ao culturalismo eurocêntrico. Não se confunde com descolonial pois, ao invés de acreditar na superação da condição colonial, preconiza sua permanência escamoteada pelo jogo do poder que, em nossos dias, se sustenta de planos estratégicos baseados numa geopolítica mundial profundamente desigual.
  • 2
    N. T.: Carta produzida por ocasião do Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, ocorrido no Convento da Arrábida, Portugal, de 2 a 7 de novembro de 1994, e assinada pelo comitê de redação constituído por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu. Trata-se de um documento que reúne os princípios fundamentais da comunidade transdisciplinar.
  • 3
    Poderes fácticos são aqueles que, situados à margem das instituições políticas e sem constituir aparelho formal do Estado, são dotados de capacidade de pressão sobre a sociedade, por exemplo, a Igreja, os meios de comunicação, os bancos.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    07 Ago 2018
  • Aceito
    24 Ago 2019
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