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Depósitos de escarnitos mineralizados em ferro e cobre do arco magmático de Santa Quitéria, Ceará, Provincia Borborema do nordeste do Brasil

Fe-Cu skarns deposits in the Santa Quiteria magmatic arc, Borborema Province, Brazil

Resumo

Depósitos de escarnitos mineralizados em W-Mo da Província Borborema são conhecidos desde os anos 40. Entretanto, até a execução deste trabalho, não se tinha registros desses depósitos mineralizados em ­Fe-Cu. No Ceará, as primeiras ocorrências e/ou depósitos de escarnitos ricos em ferro e cobre foram identificadas recentemente no Arco Magmático Continental de Santa Quitéria, considerado produto de evolução de vários arcos magmáticos, variando de arco juvenil (870 - 800 Ma) a colisão continental (625 - 600 Ma). Os escarnitos estão associados às rochas calcissilicáticas e mármores dolomíticos e/ou calcíticos, recortadas por quartzo monzonitos neoproterozóicos cedo a tardi-colisionais. São encontrados todos os tipos do sistema escarnítico como endoescarnitos, hornfels, escarnóides e exoescarnitos. Os exoescarnitos apresentam duas associações minerais, que refletem protólitos carbonáticos distintos: uma composta por clinopiroxênio-granada (estágio progradante) e magnetita-pirrotita-calcopirita-pirita-biotita (estágio retrogradante), característica de protólito calcítico, e outra formada por olivina-espinélio-diopsidio na fase progradante e serpentina na fase retrogradante, representativa de protólito dolomítico. As granadas, em parte zonadas, exibem composição dominada por andradita (82 - 52 mol%), seguida por grossularita (16 - 45mol%) e, em proporção menor, piropo (2 - 3 mol%). O piroxênio do protólito calcítico é típico da série diopsídio-hedenbergita, com composição média Diopsídio46Hedenbergita52Johannsenita2. Três tipos de minério magnetítico são encontrados: i) magnetito bandado; ii) magnetito disseminado; iii) magnetito maciço filoneano. Ocorre ainda um minério sulfetado de cobre com e sem magnetita associado, e blocos de gossans. Os dados geológicos e metalogenéticos obtidos indicam que a gênese destes escarnitos está associada à influência dos granitos monzoníticos tardi-brasilianos e, embora haja dois tipos de escarnito, predomina o mineralizado em ferro e cobre.

PALAVRAS-CHAVE:
Endoescarnitos; Escarnóides; Exoescarnitos; Petrografia; Mineralizações de Fe.

Abstract

W-Mo skarns deposits in the Borborema Province have been known since the 40's, however, until this study there were no records of Fe-Cu skarns. In Ceará State, Brazil, the first occurrences of Fe-Cu skarns were identified recently in the Magmatic Arc of Santa Quiteria, product of superposition of several magmatic arcs, ranging from juvenile arc (870 - 800 Ma), up to continental collision (625 - 600 Ma). The skarns are associated with calc-silicate rocks and dolomitic and/or calcitic marbles, cut by Neoproterozoic, early to tardi-collisional quartz monzonite. In the area several skarn system types are found such as endoskarns, hornfels, skarnoids and exoskarns. The exoskarns show two mineral assemblages, reflecting different carbonate protolith: the first consists of clinopyroxene-garnet (prograde stage) and magnetite-pyrrhotite-chalcopyrite-pyrite-biotite (retrograde stage), characteristic of calcitic protolith, and the second, consists of olivine-spinel-diopside in prograde phase and serpentine in retrograde phase, representative of dolomitic protolith. Garnets partly zoned exhibit composition dominated by andradite (82 - 52 mol%) with subordinate grossularite (16 - 45 mol%) and minor pyrope (2 - 3 mol%). The pyroxene of the marble calcitic protolith is typical of the diopside-hedenbergite series, with average composition Diopside46Hedenbergite52Johannsenite2. Three types of iron-dominated skarn related ores are distinguished: i) banded magnetite; ii) disseminated magnetite; iii) vein massive magnetite. Takes place also a sulphide copper ore with and without associated magnetite and gossans blocks. The geological and metallogenic data obtained indicate that the genesis of these skarns are associated with the influence of monzonitic Brasilian granites and although there are two types of skarn, there is a predominance of Fe-Cu Skarn.

KEYWORDS:
Endoskarns; Skarnoids; Exoskarns; Petrography; Fe-mineralizations.

INTRODUÇÃO

Os depósitos de escarnitos da Provincia Borborema (PB) são conhecidos desde os anos 1940 do século passado, mas restringiam-se aos depósitos de W-Mo da Faixa Móvel Seridó, de idade brasiliana (Van Schmus et al. 2004Van Schmus W.R., Brito Neves B.B., Hackspacher P., Babinski M. 1995. U-Pb and Sm- Nd geochronological studies of eastern Borborema Province, northeastern Brazil: initial conclusions. Journal of South America Earth Science 8;267-288.), porção oriental da PB, à leste da região. A maioria desses depósitos era explotado, até o final dos anos 1980, para W-Mo, quando foi interrompida, devido ao baixo preço das commodities, à época. No início dos anos 1990, a descoberta de ouro em rejeito de uma das minas abandonadas (Mina Bonfim) desencadeou uma reavaliação do potencial metalogenético da região, o que culminou com a reabertura dessa mina, voltada para exploração de W-Au. Desde então, essa região passou a ser alvo de pesquisa e mineração de depósitos de W-Mo-Au. Para maior detalhe sobre esses depósitos consultar Sousa Neto et al. (2008Souza Neto J.A., Legrand J.M., Volfinger M., Pascal M.L, Sonnet P. 2008. W-Au skarns in the Neo-Proterozoic Seridó Mobile Belt, Borborema Province in northeastern Brazil: an overview with emphasis on the Bonfim deposit. Mineralium Deposita 43:185-205).

No Arco Magmático de Santa Quitéria (AMSQ), as primeiras ocorrências de escarnitos mineralizados em Fe-Cu foram identificadas por Parente et al. (2014Parente C.V., Veríssimo C.U.V., Melo O.O.C., Botelho N.F., Oliveira C.G., Lira Júnior J.A., Martins D.T. 2014. Caracterização geológica e petrográfica dos primeiros skarns de ferro e cobre encontrados no Arco Magmático de Santa Quitéria-Ceará, Brasil. 47º Congresso Brasileiro de Geologia,Salvador, Ba. Anais de Resumos em CD. PAPO16683 :p.785 ) associados às rochas calcissilicáticas e mármores dolomíticos e/ou calcíticos, em contato com granitos brasilianos, em que se distinguem todos os tipos do sistema escarnítico, entre eles hornfels, endoescarnitos e exoescarnitos. Os endoescarnitos quando o protólito é ígneo e os exoescarnitos quando o protólito é de origem sedimentar, estes últimos apresentam paragênese clinopiroxênio (Cpx)-granada (Grt) (estágio progradante) e pirrotita (Po), calcopirita (Cp), pirita (Py), epidoto (Ep) e biotita (Bt) (estágio retrogradante) comum em exoescarnitos mineralizados, como caracterizados por Burt (1977Burt D.M. 1977. Mineralogy and petrology of skarn deposits. Rend. Soc. Ital. Mineral. Petrol . 33:859-873., 1982Burt D.M. 1982. Skarn Deposits Historical Bibliography through 1970. Economic Geology .77;755-768.), Einaudi et al. (1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.), Einaudi e Burt (1982Einaudi M.T. & Burt D.M. 1982. Introduction Terminology, Classification, and Composition of Skarn Deposits. Economic Geology 77:745-754), Meinert (1992Meinert L.D. 1992. Skarns and skarn deposit. Department of Geology. Washington State University, Washington. Geoscience Canada 19(4):145-161.), Lentz (1998Lentz D.R. 1998. Mineralized intrusions-related skarns systems, Québec. Mineralogical Association of Canada Short Course Series. 664 p.), Aleksandrov (1998Aleksandrov S.M. 1998. Geochemistry of Skarn and Ore Formation in Dolomites . VSP. Utrecht, The Netherlands, Tokyo, Japan.300 p.), Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ), entre outros.

As descobertas desses escarnitos adquirem expressiva importância geológica e metalogenética, uma vez que não havia registro de mineralizações de minerais metálicos associadas ao Arco Magmático de Santa Quitéria (AMSQ). Aliás, a maioria dos trabalhos relacionados ao AMSQ tem sido dirigida à petrologia das rochas graníticas que compõem o arco e sua evolução geotectônica, sem dar ênfase ao seu potencial mineral. Isso se deve, em parte, a predominância de rochas ortognaissicas migmatíticas, incluindo metatexitos e diatexitos em seu interior, em que um possível sistema hidrotermal, comum à parte apical de rochas graníticas mineralizadas, raramente, seria preservado nesse contexto geológico. Não obstante, existem inúmeras lentes de rochas calcissilicáticas e mármores recortadas por granitos que sugerem que o contexto geológico apresenta potencial metalogenético para depósitos escarníticos de mineralizações variadas, além do Fe e Cu, devido à diversidade de granitos presentes na região.

O presente trabalho apresenta uma síntese das principais feições geológicas, petrográficas e tipológicas das principais ocorrências de Fe e Cu, obtidas a partir de trabalhos de campo e da descrição de testemunhos de sondagens disponibilizados pela empresa Biogold S.A., com objetivo de contribuir para o melhor entendimento sobre seu mecanismo de formação, sua gênese e sua potencialidade dentro da Província Borborema.

GEOLOGIA DO ARCO

O Arco Magmático de Santa Quitéria (AMSQ) é uma unidade litotectônica do domínio Setentrional da Província Borborema (Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.; Arthaud et al. 2008Arthaud M.H., Caby R., Fuck R.A., Dantas E.L., Parente C.V. 2008. Geology of the Northern Borborema Province, NE Brazil and its correlation with Nigeria, NW Africa. In: Pankhurst R.J., Trouw R.A.J., Brito Neves B.B., De Wit M.J. (Eds.), West Gondwana: Pre-Cenozoic Correlations Across the Atlanti Region , vol. 294. Geological Society of London Special Publications, p. 49-67. ). O AMSQ possui forma sinuosa, com eixo maior na direção NNE-SSW e comprimento de cerca de 220 km, bordejado, tanto a leste, quanto a oeste, por rochas metassedimentares do tipo quartzitos-pelitos-carbonatos (QPC), com intercalações subordinadas de rochas metabásicas, atribuídas ao Complexo Ceará (Arthaud 2007Arthaud M.H. 2007. Evolução Neoproterozóica do Grupo Ceará (Domínio Ceará Central, NE Brasil): da sedimentação à colisão continental brasiliana . PhD thesis, Universidade de Brasília, Brasília, 170 p. ). As rochas encaixantes são deformadas e metamorfisadas em condições do fácies anfibolito alto a eclogito (Garcia & Arthaud 2004Garcia M.G.M. & Arthaud M.H. 2004. Caracterização de trajetória P-T em nappes brasilianas: região de Boa Viagem/Madalena - Ceará Central (NE Brasil). Revista de Geologia , Universidade Federal do Ceará, 17:173-191.; Santos et al. 2009Santos T.J.S., Garcia M.G.M., Amaral W.S., Caby R., Wernick E., Arthaud M.H., Dantas, E.L., Santos H.M. 2009. Relics of eclogite facies assemblages in the Ceará Central Domain, NW Borborema Province, NE Brazil: implications for the assembly of West Gondwana. Gondwana Research , 15:454-470.). Quatro grupos de granitóides são reconhecidos em seu interior (Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.). O primeiro, com idade U-Pb de 637 Ma, é representado por gnaisses e migmatitos de composição diorítica a granodiorítica, de alto Ca e baixo K, considerados como pré-colisionais e interpretados como a fase mais primitiva do arco. O segundo, com idade U-Pb de 614 Ma, corresponde a migmatitos mais evoluídos, de composição granodiorítica a granítica, cor rósea acinzentado e representam produtos de fusão dos granodioritos e dioritos pré-colisionais do primeiro grupo. O terceiro reúne granodioritos e monzogranitos megaporfiríticos pouco deformados, com enclaves máficos de composição diorítica, de idade U-Pb de 591 Ma. O quarto é representado por monzogranitos e álcali feldspato granito, com textura porfirítica e equigranular, de alto-K, baixo-Ca. Para Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.), as rochas graníticas sensu lato estão associadas a uma história neoproterozóica de subducção, colisão continental, relaxamento pós-orogênico e colapso orogênico consistente com fases magmáticas descritas em arcos magmáticos continentais clássicos.

Zincone (2011Zincone S. 2011. Petrogênese do Batólito Santa Quitéria: implicações ao magmatismo Brasiliano na porção norte da Província Borborema, NE Brasil . MS Dissertation, Instituto de Geociências-Unicamp. 192 p.) considera que o AMSQ é composto por várias fases magmáticas. A primeira, denominada de Santa Quitéria (FMSQ) (658 - 606 Ma), é pré- a sin- empurrão. A segunda, fase magmática Tamboril (FMT), é tardi-empurrão a sin- transcorrência e compreende: a) uma unidade epizonal de granitos equigranulares rosa, ferroso, cálcio- alcalina de alto-K e shoshonítico e, b) outra de migmatitos de injeção. As demais seriam as fases magmáticas Quixeramobim (FMQ), Seridó (FMS) e Bimodal Final (FMBF) que transgridem os limites do arco.

Santos et al. (2009Santos T.J.S., Garcia M.G.M., Amaral W.S., Caby R., Wernick E., Arthaud M.H., Dantas, E.L., Santos H.M. 2009. Relics of eclogite facies assemblages in the Ceará Central Domain, NW Borborema Province, NE Brazil: implications for the assembly of West Gondwana. Gondwana Research , 15:454-470.) admitem que o AMSQ é composto por uma série de corpos graníticos, com composição de sienogranitos a quartzo monzodioritos, com diferentes intensidades de migmatização (diatexitos e metatexitos) e deformação, cujos contatos com as rochas supracrustais paleo e neoproterozóicas são tectônicos. Sugerem que a evolução do arco se deu de um ambiente intraoceânico para continental, com geração de granitos sin e pós-colisionais contaminados por uma crosta mais antiga. Costa et al. (2013Costa F.G., Ganade de Araújo C.E., Amaral W.D.S., Vasconcelos A.M., Rodrigues J.B. 2013. Idade U-Pb (LA-ICPMS) em zircão e isótopos de Nd para granitoides do Complexo Tamboril-Santa Quitéria, Domínio Ceará Central: implicações para magmatismo neoproterozoico sin-colisional no domínio norte da Província Borborema. Geologia. USP Série Científica 13:159-174.) reconhecem na porção sul do AMSQ, três associações, cujos protólitos são de origem magmática: i) diatexitos, ii) granitoides híbridos, e iii) quartzo-dioritos. Os diatexitos exibem composição granodiorítica a granítica, com frequentes estruturas schilieren e schollen . Os granitoides híbridos são compostos por associação de quartzo-monzonitos, monzonitos, sienitos e quartzo-sienitos com abundante ocorrência de enclaves e diques sin-plutônicos máficos. Os quartzo-monzonitos têm idade U-Pb de 634 ± 10 Ma e TDM de 2,69 Ga e os quartzo-dioritos apresentam idade U-Pb em zircão de 618 ± 23 Ma e TDM de 2,19 Ga. Para esses autores, a presença simultânea de magmatismo com afinidade mantélica e diatexitos (fusão crustal), sugere que esta manifestação magmática evoluiu em ambiente colisional, associado ao processo de slab breakoff durante a amalgamação da porção oeste do supercontinente Gondwana.

Ganade de Araújo et al. (2014Ganade de Araujo C.E., Cordani Umberto G., Weinberg R.F., Basei M.A.S., Armstrong R., Sato K. 2014. Tracing Neoproterozoic subduction in the Borborema Province (NE-Brazil): Clues from U-Pb geochronology and Sr-Nd-Hf-O isotopes on granitoids and migmatites . Lithos 202-203 :167-189), trabalhando em sua porção centro-norte, dividem o Complexo Santa Quitéria em quatro unidades: i) Unidade Lagoa Caiçara constituída de metatexito estromático com paleossoma de composição granodiorítica a tonalítica, de idade U-Pb (870 - 800 Ma) e caráter juvenil (εNd(t) + 4,98), e ortognaisses de natureza crustal, com idade ~ 650 Ma; ii) Unidade Boi composta por quartzo-diorito a tonalito-granodiorito, com idade 648 ± 4,1 Ma; iii) Unidade Santa Quitéria representada por monzogranitos porfiríticos com megacristais de K-feldspato, com idade 640 - 635 Ma; e, iv) Unidade Tamboril constituída por diatexitos, contendo enclaves do monzonito porfiritico Santa Quitéria e dos ortognaisses Lagoa Caiçara, tendo idade 620 - 610 Ma. Ganade de Araújo et al. (2014Ganade de Araujo C.E., Cordani Umberto G., Weinberg R.F., Basei M.A.S., Armstrong R., Sato K. 2014. Tracing Neoproterozoic subduction in the Borborema Province (NE-Brazil): Clues from U-Pb geochronology and Sr-Nd-Hf-O isotopes on granitoids and migmatites . Lithos 202-203 :167-189) consideram que o AMSQ evoluiu em diferentes períodos. O primeiro, entre 880 e 800 Ma, teria formado um arco juvenil. Entre 660 e 630 Ma, formou-se um arco magmático maturo, com magmatismo híbrido, envolvendo componentes crustais e mantélicos. Entre 625 e 618 Ma, em regime colisional himalaiano, teria se formado a anatexia crustal que continuou até 600 Ma. Padilha et al. (2014Padilha A.L., Vitorello Í., Pádua M.B., Bologna M.S. 2014. Electromagnetic constraints for subduction zones beneath the northwest Borborema Province: Evidence for Neoproterozoic island arc-continent collision in northeast Brazil. Geology 42;91-94.), com base em dados magnetotelúricos, apresentam indicativos de subducção de dupla convergência, em concordância com os dados petrológicos de retroeclogitos e granulitos de alta pressão em ambos os lados do arco (e.g.Castro 2004Castro, N.A. 2004. Evolução geológica proterozóica da região entre Madalena e Taperuaba, Domínio Tectônico Ceará Central (Província Borborema) . PhD thesis, Universidade de São Paulo-USP, São Paulo-BR, 221 p.; Garcia & Arthaud 2006Garcia M.G.M. & Arthaud M.H. 2004. Caracterização de trajetória P-T em nappes brasilianas: região de Boa Viagem/Madalena - Ceará Central (NE Brasil). Revista de Geologia , Universidade Federal do Ceará, 17:173-191.; Santos et al. 2009Santos T.J.S., Garcia M.G.M., Amaral W.S., Caby R., Wernick E., Arthaud M.H., Dantas, E.L., Santos H.M. 2009. Relics of eclogite facies assemblages in the Ceará Central Domain, NW Borborema Province, NE Brazil: implications for the assembly of West Gondwana. Gondwana Research , 15:454-470.; Amaral 2010Amaral W.S. 2010. Análise geoquímica, geocronológica e termobarométrica das rochas de alto grau metamórfico, adjacentes ao Arco Magmático de Santa Quitéria, NW da Província Borborema . PhD Thesis, Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas, Brasil. ).

Por mais que o AMSQ apresente volumosos magmas de origem crustal, há importantes participações de magmas de origem mantélica. Isso é observado tanto nos granitoides híbridos de Costa et al. (2013Costa F.G., Ganade de Araújo C.E., Amaral W.D.S., Vasconcelos A.M., Rodrigues J.B. 2013. Idade U-Pb (LA-ICPMS) em zircão e isótopos de Nd para granitoides do Complexo Tamboril-Santa Quitéria, Domínio Ceará Central: implicações para magmatismo neoproterozoico sin-colisional no domínio norte da Província Borborema. Geologia. USP Série Científica 13:159-174.) quanto nos granitoides da unidade Caiçaras e Boi de Ganade de Araújo et al. (2014Ganade de Araujo C.E., Cordani Umberto G., Weinberg R.F., Basei M.A.S., Armstrong R., Sato K. 2014. Tracing Neoproterozoic subduction in the Borborema Province (NE-Brazil): Clues from U-Pb geochronology and Sr-Nd-Hf-O isotopes on granitoids and migmatites . Lithos 202-203 :167-189), característicos de granitos de arco magmáticos.

Adicionalmente, Castro et al. (2012Castro N.A., Ganade de Araujo C.E., Basei M.A.S., Osako L.S., Nutman A., Liu D. 2012. Ordovician A-type granitoid magmatism on the Ceará Central Domain, Borborema Province, NE-Brazil. Journal of South American Earth Sciences 36;18-31.) consideram que alguns granitóides pós-colisionais, como Complexo Anelar Quintas, Granito Pajé e Serrote São Paulo, que se encontram em meio às rochas do arco magmático e adjacências, exibem enclaves de rochas máficas, idade, composição mineralógica e química compatível com granitos anorogênicos, tipo A2 de Eby (1992Eby G.N. 1992. Chemical subdivision of the A-type granitoids: petrogenetic and tectonic implications. Geology , 20:641-644.) (Fig. 1).

Figura 1:
Esboço geológico do Domínio Setentrional da Província Borborema. Principais zonas de cisalhamento: Modifiado de Fetter et al. (2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.).

MATERIAIS E MÉTODOS

A identificação dos primeiros escarnitos foi realizada a partir do estudo petrográfico de 120 seções delgadas, 20 polidas e de 6 análises de microssonda, com ênfase aos silicatos, em testemunhos de sondagens, cedidos pela empresa Biogold, que prospectava ferro no Arco Magmático de Santa Quitéria, no município homônimo. Nos trabalhos de campo, utilizaram-se dados de imagens de Sensores Remotos e Aerogeofísicos (magnetométricos e gamaespectométricos) de uma área de 250 km2 , em que havia registro de ocorrência de ferro, entre as sedes dos municípios Santa Quitéria e Catunda, região central do AMSQ. Isso resultou na confirmação de uma mega ocorrência de escarnito, que se encontra atualmente em explotação com reserva da ordem de 11 Mt, com teor médio de Fe em torno de 65%, e na descoberta de várias outras de menor escala, mas que requerem maiores estudos a fim de viabilizar ou não sua explotação. Análises químicas e estudos geocronológicos encontram-se em andamentos e serão objetos de detalhes em trabalhos futuros.

As análises de microssonda e microscopia eletrônica foram realizadas no Laboratório de Microssonda Eletrônica (LME) do IG/UnB, em um equipamento Jeol, modelo Superprobe JXA-8230. As condições analíticas para os silicatos foram 15 Kv de energia e 10 nA de corrente.

GEOLOGIA E PETROGRAFIA DOS ESCARNITOS

As principais ocorrências dos escarnitos mineralizados em ferro e cobre estão na porção central do AMSQ, próximo à Fazenda Mantença e adjacências, 25 km ao sul da sede de Santa Quitéria, associadas às rochas supracrustais que incluem anfibolitos, calcissilicáticas, mármores dolomíticos e calcíticos, xistos, paragnaisses e metatexitos, provavelmente, remanescentes do Complexo Ceará do Meso-Neoproterozóico de Cavalcante et al. (2003Cavalcante J.C., Vasconcelos A.M., Medeiros M.F., Paiva I.P., Gomes F.E.M., Cavalcante S.N., Cavalcante J.E., Melo A.C.R., Duarte Neto V.C., Bevenides H.C. 2003. Mapa Geológico do Estado do Ceará - Escala 1:500.000 . CPRM-SGB Serviço Geológico do Brasil, Fortaleza.) e Arthaud (2007Arthaud M.H. 2007. Evolução Neoproterozóica do Grupo Ceará (Domínio Ceará Central, NE Brasil): da sedimentação à colisão continental brasiliana . PhD thesis, Universidade de Brasília, Brasília, 170 p. ). Os termos calcissilicáticos e escarnitos estão no sentido de Einauldi et al. (1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.), Meinerth et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ) e Bucher e Grapes (2011Bucher K. & Grapes R. 2011. Petrogenesis of Metamorphic Rocks . Ed. Springer. 428 p.), entre outros. As calcissilicáticas, embora tenham uma mineralogia de silicatos em comum com os escarnitos, como clinopiroxenio, anfibólio e epidoto, diferenciam-se destes pela inexistência de minerais acessórios metálicos, aspectos texturais e nos processos formacionais. As calcissilicáticas são rochas metamórficas formadas a partir de sedimentos carbonáticos impuros durante o metamorfismo regional, pobres em mineralizações metálicas, enquanto os escarnitos correspondem à rocha metassomática resultado da interação entre corpos intrusivos e rochas carbonáticas encaixantes e, normalmente, ricos em mineralizações metálicas, no caso, ferro e cobre.

Texturalmente, as calcissilicáticas apresentam granulacão fina a média, enquanto as escarniticas apresentam granulação grossa a muito grossa, cujos cristais de granadas podem atingir até 20 cm. As rochas calcissilicáticas e os mármores associados se dispõem em faixas descontínuas dentro do arco, por mais de 50 km de comprimento e 5 a 10 km de largura, exibindo trend grosseiramente N-S (Fig. 2). Os escarnitos são mais localizados e se desenvolvem na zona de contato entre corpos graníticos intrusivos com mármores dolomíticos e/ou calcíticos e mesmo calcissilicáticas . Entre os granitos estão monzogranitos de granulação grossa, quartzo monzonitos e monzonitos, cedo, tardi a pós-colisonais, estes últimos pouco deformados e com variadas concentrações de enclaves máficos de composição diorítica, representativos de diques sin- plutônicos desmembrados. As ocorrências de escarnito mineralizado em ferro são representadas por uma dezena de corpos, de escala decamétrica, cujo número tende a aumentar à medida que se avança nos conhecimentos da geologia da região. A ocorrência localizada próximo à Fazenda Mantença, maior delas, exibe reserva em torno de 11 Milhões de toneladas com teor médio de 65% Fe Total.

Figura 2:
Mapa Geológico da região sul de Santa Quitéria com as principais ocorrências de escarnito de Fe.

Rochas Supracrustais

Rochas Calcissilicáticas e Mármores

As rochas calssilicáticas e mármores correspondem às principais rochas hospedeiras ou protólitos dos escarnitos, quando em contato com granitos. Ocorrem como faixas decamétricas descontínuas de espessura entre alguns centímetros a dezenas de metros, exibindo aspecto xistoso ou bandado, marcado pela alternância de bandas de calcissilicáticas e mármores. São comuns feições de dissolução cárstica que ressaltam, por vezes, planos de foliações, boudinagem e dobramentos (Fig. 3A). Ao microscópio, as rochas calcissilicáticas exibem textura granonematoblástica, estrutura orientada e/ou bandada, evidenciada pelo alinhamento do eixo "c" dos cristais de hornblenda. O bandamento é marcado por faixas dominadas por hornblenda, o que confere uma coloração verde escura, alternadas por bandas dominadas por plagioclásio, refletindo numa coloração verde clara a esbranquiçada. A assembleia mineral é composta por plagioclásio (50%), anfibólio (43%), clinopiroxênio (3%), titanita (2%), apatita (1%) e zircão (1%). Partes dessas rochas calcissilicáticas, nas imediações dos corpos escarnitos mineralizados, encontram-se parcialmente fundidas, em que se verifica mobilizados hololeucocráticos em meio a restitos de anfibólio e clinopiroxênio (Fig. 3B). Enquanto outras rochas calcissilicáticas, em zonas mais afastadas, mesmo recortadas por diques irregulares de granitos hololeucocráticos, de espessura centimétrica a métrica, comportam-se como corpos mais resistentes à fusão, adquirindo um aspecto fragmentário, sob forma de enclaves em diferentes arranjos, angulares, retangulares, poligonais ou irregulares, similares a brecha intrusiva. Localmente, esses granitos hololeucocráticos produzem escarnitos de espessura milimétrica a centimétrica, com uma mineralogia a base de granada e clinopiroxênio, tendo ainda mineralizações de ferro e sulfetos de Cu associadas.

Figura 3:
Feições texturais e estruturais das rochas supracrustais. (A) Rocha calcissilicática exibindo foliação tectono-metamórfia penetrativa e feições de dissoluções cársticas associadas. (B) Rocha calcissilicática, parcialmente fundida, exibindo mobilizados félsicos difusos em meio a restitos de anfiólio, recortada por dique granítico hololeucocrático. (C) Aflramento de mármore dolomítico exibindo foliação milonítica. (D) Seção delgada do mármore dolomítico exibindo foliação milonítica sublinhada pelo desenvolvimento de clinocloro (em azul) fortemente estirado em meio a porfioclastos de carbonato (calcita) com geminação encurvada e recristalização marginal. (E) Meta-andesito com textura porfiítica com fenocristais de hornblenda e plagioclásio em matriz afanítica. (F) Testemunho de meta-andesito com fenocristais de hornblenda fortemente estirados e porções irregulares de metadacitos. (G) Seção delgada exibindo fenocristal de hornblenda com caldas de recristalização e lamelas de biotita sublinhando a foliação (Nicóis //). (H) Metadacito exibindo fenocristal reliquiar de plagioclásio zonado, parcialmente alterado, em matriz quartzo-feldspática.

Os mármores afloram como corpos lenticulares descontínuos, por mais de 20 km, intercalados às rochas calcissilicáticas, com comprimentos entre 5 e 500 m e largura entre 1 e 50 m (Figs. 3C e 3D). Apresentam cor branca a cinza claro, granulação média a grossa, e podem ser puros ou impuros. Alguns dos mármores cinza claro apresentam-se mosqueados, com partículas ou fragmentos angulosos escuros de rocha metapelítica, composta de biotita e quartzo, dimensões milimétrica a centimétrica, dobrados, em meio a matriz carbonática recristalizada. Outros exibem mineralogia bem diversificada a base de escapolita, humita e clinopiroxenio. Entretanto, em função da descontinuidade entre esses corpos de mármores, não foi possível saber se eles representam uma única camada cuja geometria original foi totalmente modificada pela deformação brasiliana ou se representam camadas distintas.

Os xistos são particularmente identificados em furos de sonda, onde se encontram intercalados com rochas calcissilicáticas, metavulcânicas e exoescarnitos. Exibem espessura da ordem de 1 m em meio às rochas metavulcânicas intermediárias. Ao microscópio apresentam aspecto bandado, marcado pela alternância de níveis centimétricos de metapelitos, dominados por granada e biotita, e níveis milimétricos de metapsamitos, ricos em feldspato e biotita.

Anfibolitos ocorrem subordinados sob forma de blocos soltos, em faixas lenticulares da ordem de 200 m de comprimento e 50 m de largura, intercalados e/ou recortando as rochas metassedimentares. Apresentam-se foliados ou não, e exibem granulação média a grossa, sugestivo de rocha básica originalmente subvulcânica ou mesmo plutônica. Algumas rochas exibem mobilizados e/ou filmes leucocráticos, ricos em plagioclásio com segregações de anfibólio, indicativos de deformação e metamorfismo em condições do fácies anfibolito alto.

Rochas Intrusivas do Arco Magmático - Complexo Tamboril Santa Quitéria

Na região estudada, os granitos foram caracterizados em função dos seus aspectos petrográficos e estruturais. Entretanto, resultados geocronológicos em andamento já permitem posicionar, cronoestratigraficamente, alguns corpos graníticos. Assim, merecem destaque duas associações: i) uma associação metavulcano-plutônica de composição intermediária composta por meta-andesitos, monzodioritos e quartzo monzodioritos, e; ii) uma plutônica representada por sienogranitos, monzogranitos, quartzo monzonitos e monzonitos.

Associação Metavulcano-Plutônica

Rochas Metavulcânicas

As ocorrências de rochas metavulcânicas merecem registro especial, pois é a primeira vez que são identificadas no domínio do Arco Magmático de Santa Quitéria (Figs. 3E e 3F). São representadas por meta-andesitos de cor cinza escura, porfiríticas, contendo porções leucocráticas, descontínuas de metadacitos, de pequena espessura, que se dispõem de maneira irregular. Afloram em lajedos, ocupando uma faixa com comprimento da ordem de 1km e largura em torno de 100 m. Os meta-andesitos, provavelmente sills e/ou derrames, exibem textura porfirítica com fenocristais de plagioclásio e hornblenda, estirados e/ou lenticulares, de 4 a 10 mm de comprimento, respectivamente, dispersos em matriz de granulação fina, equigranular, composta por plagioclásio, anfibólio e biotita. Os metadacitos exibem espessura que varia de 2 a 4 cm, granulação fina, equigranular, compostos por quartzo e feldspatos. Apresentam contato bruscos e irregulares com os meta-andesitos, sugestivo de duas porções vulcânicas em processo de imiscibilidade ou em processo de mingling . As rochas do conjunto exibem foliação de baixo ângulo, que quando afetado por zonas de cisalhamento transcorrentes, adquirem foliação vertical.

Ao microscópio, os meta-andesitos porfiríticos exibem matriz dominada por plagioclásio (35%), biotita (30%) e hornblenda (30%), com quartzo subordinado (2%). Entre os minerais acessórios e secundários tem-se titanita (3%), apatita (1%), zircão (< 1%) e carbonato (< 1%). Os megacristais de hornblenda, de cor verde oliva, ocorrem isolados com caldas de recristalização (Fig. 3G) ou em agregados poligonais lenticulares, resultado de recristalização e migração ao longo dos limites do grão, sublinhando, juntamente com a biotita, a foliação da rocha.

Os metadacitos exibem textura granoblástica, granulação fina e uma mineralogia dominada por plagioclásio (70%) e ocorrências menores de biotita (15%) e quartzo (10%). Alguns cristais de plagioclásio são subédricos e parcialmente zonados, típicos de cristais magmáticos, em que se destaca um núcleo alterado para mica branca e carbonato (Fig. 3H). Como minerais acessórios tem-se apatita (< 1%), zircão (< 1%) e opacos (~ 2%), em grande parte envolvidos por titanita (1%), ambos inclusos e/ou associados a biotita, indicando tratar-se de titano-magnetita, cujo titânio reagiu com Ca e Si móvel para produzir bordas de titanita.

Rochas Metaplutônicas

As rochas metaplutônicas são representadas por anfibólio-biotita monzodioritos e anfibólio-biotita quartzo monzodioritos, sienogranitos e quartzo-monzonitos. Monzodiorito e quartzo monzodiorito ocorrem na forma de matacões, lajedos, enclaves e/ou diques sin-plutônicos nos monzogranitos e quartzo-monzonitos e, localmente, exibem foliação de baixo ângulo. Dada sua composição e deformação, os primeiros tipos litológicos parecem corresponder aos granitos pré-empurrão de Fetter et al. (2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.), provavelmente, equivalentes plutônicos das meta-vulcânicas intermediárias. Os granodioritos e monzogranitos ocorrem na forma de batólitos, stocks com apófises associadas e sheets. Na maioria encontram-se deformados e migmatizados, com diferenciados estágios de fusão (meta e diatexitos)

Os granitóides do AMSQ, aos quais os escarnitos estão relacionadoscorrespondem aos granitóides de composição entre monzonitos e monzogranitos, rosados, isotrópicos a levemente foliados, que ocorrem sob forma de stocks , diques e/ou apófises. Exibem granulação média a grossa, por vezes, porfirítica com fenocristais de feldspato potássico de 5 a 10 mm (Figs. 4A e 4B). Localmente, apresentam enclaves de rochas dioríticas, diques aplíticos e pegmatóides, alguns com granada (Fig. 4C). Próximo ao contato com as rochas calcissilicáticas e mármores, os quartzo monzonitos exibem cristais de clinopiroxênio disseminados e em agregados, característico de endoescarnitos, afetados por uma pronunciada epidotização. Datação U-Pb no quartzo monzonito propilitizado realizada neste trabalho, dá idade de 635,9 ± 5,0 Ma, o que posiciona estes corpos intrusivos dentro do grupo dos granitos híbridos cedo a sinorogênicos de Costa et al. (2013Costa F.G., Ganade de Araújo C.E., Amaral W.D.S., Vasconcelos A.M., Rodrigues J.B. 2013. Idade U-Pb (LA-ICPMS) em zircão e isótopos de Nd para granitoides do Complexo Tamboril-Santa Quitéria, Domínio Ceará Central: implicações para magmatismo neoproterozoico sin-colisional no domínio norte da Província Borborema. Geologia. USP Série Científica 13:159-174.).

Figura 4:
Feições texturais e petrográfias dos corpos intrusivos: (A) Monzogranito exibindo fácies predominante grossa recortada por diques aplíticos; (B) Testemunho de sonda do fácies porfiítico recortado por dique aplítico; (C) Testemunho de um dique pegmatóide com granada recortando exoescarnito com granada. (D) Seção delgada de quartzo monzonito exibindo hornblenda, opacos e titanita em orientação preferencial e aspecto nublado dos cristais de plagioclásio.

Ao microscópio, o quartzo monzonito porfirítico exibe textura inequigranular, levemente deformado, contendo K-feldspato (45%), plagioclásio (25%), quartzo (15%) e hornblenda (10%) e, como minerais acessórios e secundários (~ 5%): magnetita e/ou titano-magnetita, clorita, titanita, carbonato, apatita e zircão.

O feldspato potássico encontra-se pertitizado e ocorre como megacristais com até 2 cm e na matriz com 0,3 a 0,8 mm. O plagioclásio é, em geral, anédrico e exibe dimensões similares àquelas do k-feldspato da matriz. Apresenta-se turvo, impregnado de minúsculas partículas de hidróxido e/ou óxido de ferro, resultado da substituição parcial do alumínio pelo ferro. O anfibólio é a hornblenda, que se encontra mais ou menos orientada numa direção preferencial ou na forma de agregados de cristais prismáticos de comprimento variado (Fig. 4D). Os opacos são magnetita e/ou titano-magnetita, subédricos a anédricos e, frequentemente, encontram-se alterados nas bordas para titanita. Os cristais de quartzo são anédricos, exibem extinção ondulante e encontram-se recristalizados em subgrãos. A clorita é neoformada e encontra-se ao longo de fraturas junto a carbonato em meio a hornblenda e feldspatos.

Escarnitos

Os escarnitos, como visto anteriormente, diferem das rochas calcissilicáticas principalmente em termos texturais e processos formacionais. Bucher e Grapes (2011Bucher K. & Grapes R. 2011. Petrogenesis of Metamorphic Rocks . Ed. Springer. 428 p.) também consideram os escarnitos como rochas silicáticas ricas em Ca-Fe-Mg-(Mn) de origem metassomática, formadas pela interação de um sistema silicático com um carbonático, em contato mútuo. Para estes autores os minerais escarniticos típicos incluem wollastonita, diopsidio, grossulária, zoisita, anortita, escapolita, margarita em escarnitos calcíferos (Ca skarns ); hedenbergite, andradita, ilvaita em escarnito ferro-calcífero (Ca-Fe skarns) ; forsterita, humita, espinélio,flogopita, clintonita, fassaita em escarnitos ricos em magnésio (Mg skarns ); rodonita, tefroita, piemontita em escarnito manganesífero (Mn skarns ).

Na região os escarnitos são as principais rochas hospedeiras da mineralização ferro-cuprífera, sendo reconhecidas tanto em afloramento quanto em testemunhos de sondagens (Fig. 5), como produtos de substituição de rochas calcissilicáticas e/ou mármores, os quais refletem transferência de massa por movimentos de fluidos em diferentes escalas, como descrito por Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ). Em escala milimétrica a centimétrica, em que se reconhece ainda o protólito calcissilicático e/ou mármore, são denominados de escarnóides, para diferenciá-los dos escarnitos metassomáticos propriamente dito, que são marcados por fortes reações metassomáticas em que as texturas e composições do protólito foram totalmente modificadas. São reconhecidos, portanto, todos os tipos litológicos que são comuns em contexto de escarnitos, como hornfels calciosilicáticos, escarnóides, exoescarnitos e endoescarnitos (e.g. Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.; Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ), bem como feições de zonações mineralógicas e texturais que são comuns a esses tipos litológicos.

Figura 5:
Seções esquemáticas de furos de sonda das principais ocorrências de escarnito mineralizado em Fe.

Hornfels calciosilicáticos ocorrem em forma blocos e/ou matacões de escala métrica nas proximidades de quartzo monzonito de granulação grossa em associação com blocos e matacões de exoescarnitos e de óxidos de ferro. Entretanto, não foi observado in situ, devido à tectônica rúptil que afetou a área, o que deve ter proporcionado a erosão desses tipos litológicos. São rochas de granulação fina, cor cinza a verde claro, isotrópica com estrutura homogênea (Fig. 6A). Ao microscópio, exibem textura granoblástica poligonal, granulação fina e composição dominada por clinopiroxênio e plagioclásio (Fig. 6B).

Figura 6:
Textura e composição dos hornfels e escarnóides. (A) Amostra de hornfels cálcio-silicático exibindo granulação fia e estrutura isotrópica. (B) Seção delgada do hornfels mostrando sua textura granoblástica poligonal característica. Nicóis //. (C) Testemunho de escarnóide, fracamente bandado, com porções irregulares, centimétricas (0,5 mm a 1 cm) de exoescarnitos de infitração de cor verde em seu interior, com granulação mais grossa. (D) Seção delgada do escarnóide com agregados de feldspatos subédricos a anédricos e cristais de anfiólio, clinopiroxênio e microclina associados. (E) Seção delgada do exoescarnito exibindo porfioblastos de clinopiroxênio (hedenbergita) e agregados de granada com plagioclásio em meio ao escarnóide, Nicóis //. (F) Seção delgada do exoescarnito com porfioblasto de clinopiroxênio com inclusões subarrendondadas de microclina, semelhante ao que é encontrado nas porções de granulação fia, indicando um processo de substituição em estágio subsolidus.

Escarnóides representam um termo descritivo, no sentido de Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ), para rochas calcissilicáticas de granulação fina, pobre em ferro, contendo faixas milimétricas a centimétricas de escarnitos intercaladas, resultado da transferência de massa por movimentos de fluidos em pequena escala em seu interior (Figs. 6C e 6D). Correspondem um termo intermediário entre o Hornfels calciosilicático, que não apresenta reações metassomáticas, e o Escarnito metassomático propriamente dito, marcado por fortes reações metassomáticas em que as texturas e composições do protólito foram totalmente modificadas.

Exoescarnitos sob esta denominação estão os escarnitos, cujo protólito de origem sedimentar, calcissilicático e/ou mármore, foi totalmente transformado para uma rocha de granulação grossa rica em granada e clinopiroxênio. Ocorrem como lentes ou corpos estratóides, próximos às intrusões quartzo-monzoníticas, resultado da sua interação com rochas calcissilicáticas e/ou mármores. Junto à megaocorrência, que se encontra em explotação, formam faixas ou bandas de coloração e texturas variadas, que são melhor distinguidas em furos de sondagens (Fig. 5): verde claro com granulação média a grossa, compostos por piroxênio, granada e plagioclásio; porções verde escuro, maciças, de granulação média a grossa, relativamente homogêneas, dominada por clinopiroxênio. Adicionalmente, são encontrados também olivina, espinélio, condrodita, serpentina em testemunho de mármore. Essa diferença na mineralogia e na textura reflete tanto variação na composição dos protólitos carbonáticos quanto à distância do corpo intrusivo. As associações minerais dominadas por granada e clinopiroxênio são características de escarnitos de Fe-Ca desenvolvidos a partir de protólitos carbonáticos cálcicos, enquanto aquelas a base de olivina, espinélio, dolomita, calcita, serpentina e condrodita são representativas de escarnitos de protólitos carbonáticos magnesianos ou dolomíticos, e o tipo mais homogêneo, dominado por clinopiroxênio, estaria condicionado à distância corpo granítico intrusivo (e.g . Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391. ; Meinert et al. 2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ). Isso permite que os escarnitos da região sejam classificados como escarnitos de Fe-Mg e Fe-Ca. A presença de minerais de alta temperatura como granada, clinopiroxênio, olivina, espinélio em zonas proximais ao corpo intrusivo e de baixa temperatura como serpentina, calcita, dolomita, epidoto, em zonas distais, indica que esses exoescarnitos tem estágios de formação distintos: os exoescarnitos do estágio progradante e do estágio retrogradante, segundo classificação de Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.) e Meinert et al. 2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ).

Exoescarnitos do Estágio Progradante são caracterizados pela associação mineral paragenética anidra, produto de reações metamórfica-metassomáticas em alta temperatura, que tende a localizar-se mais próximo à zona de contato entre o corpo intrusivo e as rochas encaixantes. Entre os escarnitos deste estágio tem-se: i) exoescarnito dominado por piroxênio sobre granada em meio a escarnóides (Fig. 6E); ii) exoescarnito com porfiroblasto de hedenbergita envolvendo cristal subarredondado de microclina (Fig. 6F); iii) exoescarnito com porfiroblastos de piroxênio invadidos por granada (Figs. 7A e 7B); iv) exoscarnito dominado por clinopiroxênio verde escuro (Figs. 7C e 7D); v) exoescarnito dominados por granada zonada com relíquias de carbonato sublinhando zonas de crescimento (Figuras 7E e 7F); vi) exoescarnitos compostos por olivina, espinélio, condrodita, dolomita e calcita (Figs. 7G e 7H).

Figura 7:
Textura e composição dos exoescarnitos. (A) Exoescarnito exibindo porfioblastos de granada e clinopiroxênio. (B) Seção delgada mostrando o clinopiroxênio sendo invadido por granada. Nicóis //. (C) Testemunho de exoescarnito dominado por clinopiroxenio. (D) Seção delgada com duas gerações de clinopiroxênio. O incolor, mais pobre em ferro, é o diopsídio formado provavelmente na fase inicial do metamorfimo e o verde escuro, o hedenbergita, formado durante o estágio metassomático. (E) Testemunho de sondagem exibindo porfioblastos de granada zonada com porções de anfiólio verde e carbonato. (F) Seção delgada da granada zonada. (G) e (H).Seção delgada a base de olivina, espinélio, calcita, dolomita e opacos. Nicóis // e Nicói X.

Exoescarnitos do estágio retrogradante são marcados pelo desenvolvimento de uma assembléia mineral de mais baixa temperatura, que se superpõe e/ou modifica a assembléia preexistente. Nos exoescarnitos magnesianos as fases minerais hídricas de baixa temperatura são representadas por serpentina (Fig. 8A) e clorita (clinocloro) e nos exoescarnitos cálcicos são compostas por actinolita-tremolita, biotita, epídoto, em que se associam óxidos de ferro e sulfetos (Figs. 8B, 8C, 8D e 8E).

Figura 8:
Fases dos minerais retrógrados. (A) Serpentina pseudomorfiando olivina e ao longo de microfraturas. Nicóis X. (B) Clinopiroxenio envolvido parcialmente por anfiólio e este por opacos (sulfetos). Nicóis //. (C) Testemunho de sondagem exibindo granada parcialmente substituída por epídoto e carbonato associado. (D) Clinopiroxenio parcialmente substituído por anfiólio. Nicóis //. (E) Agregados microlamelares de biotita, parcialmente cloritizada, ocupando interstícios e microfraturas em granada e opacos (magnetita e sulfetos) do exoescarnito. Nicóis //. (F) Brecha de carbofraturamento marcada por clastos angulosos de exoescarnitos cimentados por carbonatos (siderita e calcita).

Brecha

Além dos termos litológicos supracitados, característicos dos exoescarnitos retrógados, observa-se em profundidade, uma brecha marcada por clastos angulosos de exoescarnitos cimentados por carbonatos (Figura 8F). Sua ocorrência parece estar relacionada à presença de fluidos ricos em CO2, desenvolvida durante o estágio retrogradante, conhecida na literatura como carbofraturamento (Bowman 1998Bowman J.R. 1998. Basic aspects and applications of phase equilibria in the analysis of metasomatic Ca-Mg-AI-Fe-Si Skarns. In: Lentz D.R. (Ed.). Mineralized intrusions-related skarns systems, Ottawa Mineralogical Association of Canada Short Course Series, 26;1-49.) em que o hidrofraturamento ou brechação é causado por separação da fase vapor rica em CO2.

Endoescarnitos representam os monzonitos modificados, apresentando tanto agregados de clinopiroxênio do tipo hedenbergita, envolvendo os cristais de feldspatos em condições de alta temperatura (Figs. 9A, 9B 9C), quanto epidoto e actinolita em baixa temperatura. Alguns endoescarnitos encontram-se em passagem lateral para exoescarnitos, por meio de zonação marcada por faixas mominerálicas ricas em granada e clinopiroxênio, sendo ambos afetados por cristalizações tardias de epidoto, quartzo e calcita ao longo de microfraturas irregulares, representando a fase retrogradante.

Figura 9:
Textura e composição dos endoescarnitos e zonação no contato. (A) Endoescarnito com segregação de clinopiroxênio, formado a partir do monzonito. (B) Porção do endoescarnito dominada por agregados de clinopiroxenio. Nicóis X. (C) Seção delgada do monzonito exibindo feldspato potássico, deformado e microclinizado, com inclusão de plagioclásio com borda albitizada. Nicóis X. (D) Zonação marcada por faixas monominerálicas de granada e clinopiroxênio com epídoto retrógado em contato com quartzo monzonito.

ZONAÇÃO

As zonações ocorrem desde escala microscópica, em que se tem megacristais de granada zonada (Figura 7E), à escala macroscópica, onde se tem afloramento de quartzo monzonito em contato com escarnóides, marcado por zonas mono ou biminerálicas dominadas por granada e/ou clinopiroxênio, de espessura centimétrica à métrica (Figura 9D). A razão granada/clinopiroxênio é maior na zona próximo ao corpo granítico intrusivo e diminui em direção às rochas escarnóides e mármores. Para Meinert et al., (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ), a maioria dos grandes depósitos de escarnito é zonada, resultado do fluxo do fluido emanado dos corpos intrusivos, reação do fluido com as rochas encaixante, mudança de temperatura e evolução dos fluidos, o que permite supor que os escarnitos da região têm importante potencial metalogenético.

Em furos de sonda (Fig. 5), onde ocorrem diques graníticos em meios aos escarnitos, têm-se importantes variações mineralógicas, em escala centimétrica a métrica, assim distribuídas, do corpo granítico para as rochas encaixantes i) endoescarnito com clinopiroxênio; ii) exoescarnitos dominado por clinopiroxênio com sulfetos (pirrotita, ~ 25%; calcopirita, ~ 2%; pirita, ~ 1%; e marcassita, ~ 1%), iii) exoescarnito com predomínio de clinopiroxênio sobre granada sem sulfetos; iv) exoescarnito com predomínio de granada na zona mais distal com óxido de ferro (magnetita, ~30%) e sulfetos (pirita, ~ 5%; calcopirita, ~ 3%; e pirrotita, ~ 1%). Essa zonação, um tanto irregular, pode retratar, além da maior ou menor influência do granito sobre as encaixantes, protólitos de composição distintas, em que os escarnitos mais ricos em magnésio teriam uma razão clinopiroxênio/granada maior, enquanto os escarnitos mais cálcios e mais ferríferos teriam uma razão clinopiroxênio/granada menor.

QUÍMICA MINERAL

Foram realizadas análises químicas dos principais minerais presentes nos escarnitos, entre eles: granada (13), piroxênio (6), espinélios (5), flogopita (05) anfibólio (02), condrodita (07) e stilpnomelano (02), que foram coletadas em dois furos, o MTC-3 e o MTC-4. As Tabs. 1 e 2 apresentam esses resultados.

Tabela 1:
Análises das granadas dos exoescarnitos.
Tabela 2:
Análises dos clinopiroxênios.

Granada

As granadas analisadas, à exceção de uma única amostra que exibe Adr<Grs (Adr37Grs54Pyp9) e Pyralspita (Almandina+Espessartita+Piropo) ~9, todas apresentam composição dominada pela molécula da andradita (Adr>Grs) e pobres em pyralspita ((Alm+Sps+Prp) ≤3), indo de Adr82Grs16Pyp2 a Adr52Grs45Pyp3 (Tab.1 e Fig. 10A). Essa variação na composição da granada indica que algum ferro foi originado de fluidos emanados dos corpos intrusivos, cujo alto teor é compatível com granadas de depósitos de escarnito rico Fe e Cu, como assinalado por Einaudi et al. (1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.) e Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ). Adicionalmente, Harris e Einaudi (1982Harris N.B. & Einaudi M.T. 1982. Skarn Deposits in the Yerington District, Nevada: Metasomatic Skarn Evolution near Ludwig. Economic Geology . 77:877-898) consideram que os escarnitos ricos em Mg são caracterizados por baixa razão Grt/Cpx e granadas do tipo grandita, enquanto os escarnitos ricos em Fe são caracterizados por alta razão Grt/Cpx e por granada tipo andradita quase pura. Na região estudada, pode-se encontrar tanto exoescarnitos em que Cpx predomina sobre granada, quanto ao contrário, o que reflete a existência dos dois tipos de protólito carbonático.

Figura 10:
Diagramas ternários de Granada e Clinopiroxênio dos escarnitos do AMSQ. (A) Diagrama ternário de composição das granadas e (B) Diagrama ternário de composição do clinopiroxenio.

Os clinopiroxênios possuem composições químicas, enquadradas pelo diagrama definido por quatro componentes CaMgSi2O6 (diopsídio = Di) - CaFeSi2O6 (Hedenbergite = Hd) - MgSiO3 (Clinoenstatite) - FeSiO3 (Ferrosilite), como da série Di-Hd, mas precisamente a hedenbergita, exibindo baixos teores em MnO. Isso é observado também no diagrama diopsídio (Di), hedenbergita (Hd), johannsenite (Jhn) (Fig. 10B), cujo piroxênio exibe composição média Di46Hd52Jhn2 tão comum em exoescarnitos mineralizados em Fe e Cu.

Condrodita exibe composição (Mg4,74 Fe0,34 Mn0,1)5,09 Si1.91O8 (F, OH)2 , espinélio (Spl44-45Hc16-14Gah32-35Mag4-6Gal2-3) que apresenta composição química constante. O anfibólio é dominantemente a hastingsita (Na+K no sítio A >0,5, Fe3+ >vIAl). Algumas análises revelaram também flogopita e stilpnomelano.

TIPOLOGIA DA OCORRÊNCIA DE FERRO E COBRE

As principais ocorrências de Fe-Cu do AMSQ estão geneticamente associadas aos processos de escarnitização, desencadeados pelas intrusões quartzo monzoníticas junto às rochas calcissilicáticas e carbonatadas, concentrando-se nas imediações do contato entre esses tipos litológicos e ao longo de estruturas tectônicas como zonas de cisalhamento. São reconhecidos quatro tipos de minérios: i) minério magnetítico ou stratabound (MB); ii) minério magnetítico disseminado (MD); iii) magnetitito maciço filoneano (MMF); e iv) minério sulfetado (MS). Além desses, existem também ocorrências de gossans ou chapéus de ferro testemunhados por pequenos blocos soltos.

O minério do tipo magnetítico bandado ou stratabound é a principal forma de ocorrência. Apresenta granulação média a grossa, alta densidade e magnetismo moderado a forte. É composto por cristais euédricos de magnetita que se encontram parcialmente martitizados em uma ganga de minerais silicáticos, principalmente, clinopiroxênio. Em alguns afloramentos exibe foliação de alto ângulo, ressaltada pelo intemperismo das rochas escarnóides ou escarníticas hospedeiras, cuja orientação do minério é concordante com essa estruturação, o que indica uma provável substituição dos silicatos por magnetita (Figs. 11A e 11B). Isso assinala a existência também de controles estruturais na formação da mineralização, marcados por foliações regionais de baixo e de alto ângulo, relacionados à deformação regional e à falhas e fraturas que favoreceram a migração de fluídos aos sítios de deposição. Essa propagação de fluidos ocorre de maneira descontínua em profundidade, sendo marcada pela presença de vários níveis mineralizados com espessura entre 3 e 15 m, localizando-se próximos a corpos graníticos e em estruturas associadas, provavelmente, à charneiras de dobras e/ou falhas.

Figura 11:
Mineralizações de ferro. (A) Minério magnetítico bandado com foliação vertical; (B) Minério magnetítico bandado, parcialmente oxidado, com foliação de baixo ângulo acompanhando a estruturação regional da rocha hospedeira. (C) Minério magnetítico disseminado em protólito ígneo, com alteração propílica avançada e centrípeta. Notar a parte central menos alterada. (D) Detalhe da amostra do minério magnetítico disseminado. (E) Filão magnetÍtico, provavelmente produto de remobilização do minério bandado. (F) Morrote com blocos e matacões de minério magnetítico maciço e bandado. (G) e (H) Seções polidas de magnetita parcialmente martitizada, com microfraturas (cinza marrom a rosa) preenchidas por limonita e argilossilicatos.

O minério de magnetita disseminado exibe teor de Fe2O3 em torno de 70% e ocorre associado ao quartzo monzonito grosso (1 - 3 mm), rosa, levemente orientado e/ou foliado e fortemente alterado, marcado por importante fase de alteração retrometamórfica, penetrativa e de disposição centrípeta, dominada por epídoto e tremolita/actinolita, que lhe confere cor esverdeada (endoescarnito) (Fig. 11C). A magnetita ocorre disseminada ou em filmes ou microveios paralelos à foliação (Fig. 11D).

Os corpos de magnetitos maciços filoneanos exibem espessura da ordem de 50 cm a 1 m e são compostos essencialmente por magnetita, aparecendo na cava à céu aberto, truncando o minério bandado e/ou escarnóides (Figs. 11E e 11F). Em superfície, antes do início da explotação mineira, eram comuns blocos e matacões de minério maciço, alguns sustentavam pequenos morrotes que acompanhavam, grosseiramente, a orientação NW-SE, tratando-se provavelmente de produtos de erosão de corpos filonianos. Os cristais de magnetita, que se encontram martitizados, exibem tamanho entre 0,2 e 1,0 mm, e são em geral subédricos a anédricos, microfraturados, com contatos irregulares, às vezes reto, característico de textura granoblástica poligonal, cujos cristais exibem limites diedros de 120º, mas aparentemente separados entre si, por filmes de hidróxidos de ferro e argilominerais (Figs. 11G e 11H).

O minério sulfetado tem duas associações: uma com pirrotita-calcopirita-pirita-marcassita e a outra composta pela associação magnetita, pirrotita, calcopirita e pirita.

A primeira está associada aos exoscarnitos com dominância de clinopiroxênio (~ 55%) e sulfetos (~ 30%), e quantidades menores de biotita-flogopita (~ 8%), hornblenda (~ 5%), titanita (~1%) e apatita (~ 1%), compatível com escarnitos de Fe-Mg. Entre os sulfetos predomina pirrotita (~ 80%), com menores proporções de calcopirita (~ 10%) e pirita/marcassita. Os sulfetos são anédricos e ocorrem de maneira intersticial entre os silicatos (clinopiroxênio, hornblenda e biotita-flogopita) em contatos lobados ou irregulares, onde parecem ­substituí-los (Figs. 12A, 12B e 12C), indicando tratar-se das últimas fases de cristalização.

A segunda está associada aos exoescarnitos com predomínio da granada (~ 52%) sobre clinopiroxênio (~ 15%), na fase prograda, que contém ainda, opacos (~ 15%), actinolita (~ 10), biotita (~ 5%), hornblenda (~ 1%), apatita (~ 1%), clorita (1%). Esses últimos minerais, à exceção da apatita, desenvolveram na fase retrograda, característico de escarnitos Fe-Ca. Os opacos em geral ocupam os interstícios da granada e clinopiroxênio, sendo esses minerais envolvidos por aglomerados de biotita finamente lamelar associada à clorita, indicando tratar-se das fases minerais retrometamórficas mais tardias. Os opacos são constituídos de magnetita (~ 8%), seguidos de calcopirita (~ 5%), pirita (~ 1%), e pirrotita (~ 1%). Os cristais de magnetita, tamanho entre 0,2 e 1 mm, são subédricos, e tem microfraturas preenchidas por silicatos e calcopirita (Figs. 12D e 12E). Os cristais de calcopirita, anédricos, ocorrem disseminados (Fig. 12F), encontrando-se deformados e às vezes ao longo das bordas da magnetita, onde parece substituí-la (Fig. 12G). A pirita é a última fase de sulfeto, ocorrendo na forma de veio ou em forma anédrica substituindo calcopirita e magnetita (Fig. 12H).

Figura 12:
Seções polidas do minério sulfetado e óxido de ferro. (A) Pirrotita parcialmente substituída por calcopirita nas bordas; (B) Pirrotita parcialmente alterada para pirita/marcassita, com inclusão de calcopirita. (C) Pirrotita anédrica, parcialmente alterada para pirita, ocupando os interstícios dos silicatos. (D) Agregados de magnetita subédrica recortados por microfraturas preenchidas por silicatos. (E) Cristais subédricos de magnetita associados a cristais anédricos de calcopirita e pirita. (F) Cristais subédricos de magnetita bordejados por calcopirita, que se encontra também disseminada, deformada e orientada. (G) Cristais de calcopirita anédricos, alguns alongados devido à deformação, associados à magnetita e pirita que aparece em microveios de espessura irregular. (H) Agregados de cristais subédricos a anédricos de pirita substituindo calcopirita e magnetita.

SUCESSÃO MINERAL

As associações minerais e as relações texturais dos diversos tipos de escarnitos encontrados na área sugerem que essas rochas se formaram em condições metamórficas e/ou metassomáticas distintas.

Os hornfels calciosilicáticos, que são compostos por uma associação de minerais anidros, de granulação fina, a base de clinopiroxênio, plagioclásio, com quantidades menores de microclina e titanita, textura granoblástica poligonal, teriam se formados por metamorfismo térmico de contato, isoquímico, entre corpo intrusivo e rochas carbonáticas impuras.

Os escarnóides, que são dominados por bandas ricas em minerais de granulação fina a média, a base de plagioclásio, anfibólio, clinopiroxênio e microclina, comuns às rochas calcissilicáticas, e faixas irregulares de granulação grossa, com poiquiloblastos de granada e clinopiroxênio, com inclusões de silicatos preexistentes, característicos de rochas escarníticas, tem sua formação ligada a metamorfismo regional, provavelmente na fase cedo orogênica. Este seria responsável pela mineralogia da faixa calcissilicática, com reações bimetassomáticas localizadas, envolvendo transferência de massa entre camadas em pequena escala, o que gera a mineralogia das porções escarníticas.

Os exoescarnitos, que representam os produtos de transformação das rochas pré-existentes pela ação conjunta de metamorfismo térmico e de metassomatismo em larga escala, apresentam uma assembleia mineral mais diversificada, que varia em função da composição do protólito carbonático.

Nos exoescarnitos de Ca-Fe dominam os porfiroblastos de granada/clinopiroxênio (diopsídio-hedenbergita) de granulação grossa, em proporções variadas, sendo parcialmente envolvidos por actinolita-tremolita, seguidos de óxido de ferro, epídoto, sulfetos e biotita. Isso revela duas paragêneses distintas: uma anidra, de alta temperatura, representada pelo par granada-clinopiroxênio, cuja razão Grt/Cpx diminui com a distância do corpo intrusivo e, a outra, de mais baixa temperatura, é retratada pela associação actinolita-tremolita, biotita, epídoto, óxidos de ferro e sulfetos.

Os escarnitos de Fe-Mg, que têm uma associação mineral composta por porfiroblastos de olivina, espinelio, calcita, diopsidio, magnetita, além de serpentina, clorita, pirrotita, calcopirita, pirita/marcassita e clorita, tem também duas paragêneses: a anidra, composta de olivina-espinelio-calcita-diopsidio-magnetita e a outra a base de serpentina, clorita, pirrotita, calcopirita, pirita/marcassita e clorita.

Essas paragêneses de alta e baixa temperatura, respectivamente, indicam que o processo metassomático transcorreu em diferentes estágios. A fase inicial do processo metassomático ou infiltração conduz o desenvolvimento da paragênese anidra, de alta temperatura, em ambos exoescarnitos. Quanto às paragêneses de baixa temperatura, estão ligadas ao arrefecimento gradual do sistema hidrotermal, provavelmente, influenciado por mistura de fluidos meteóricos com fluidos oriundos do plutão em resfriamento.

Isso mostra que os escarnitos estudados evoluíram em três estágios metamórficos distintos: metamorfismo isoquímico, metassomatismo e retrometamorfismo, em conformidade com os estágios de formação dos escarnitos caracterizados por Einaudi et al. (1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.), Meinert et al. (2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ), dentre outros.

É importante ressaltar a existência de pequenos blocos de gossans, contendo hidróxidos de ferro, cuprita e prata nas proximidades desses escarnitos, o que retrata a influência de processos intempéricos sobre uma fase hidrotermal sulfetada. A Tab. 3 sintetiza estas sequências paragenéticas, relacionando minerais, eventos e processos aos tipos de escarnitos estudados.

Tabela 3:
Minerais, eventos e processos relacionados aos tipos de escarnitos estudados.

DISCUSSÕES E CONCLUSÕES

Os depósitos em estudos apresentam inúmeras feições comuns a depósitos de Escarnitos de Fe-Mg e Escarnito Fe-Ca, entre as quais: i) as rochas hospedeiras das mineralizações são modificadas por alterações metassomáticas, responsáveis por duas distintas assembléias anidras de alta temperatura: uma a base de olivina, espinélio, diopsídio em protólitos carbonáticos magnesianos ou dolomíticos e a outra composta por piroxênio diopsidio-hedenbergita, granada andradita em protólito carbonático mais cálcico. Sobrepondo-se a essas associações tem-se uma assembleia de minerais hidratados produzida por alteração hidrotermal, de caráter penetrativo, dominada por serpentina e clorita junto aos protólitos magnesianos, epidoto, biotita, clorita, actinolita nos protólitos carbonáticos cálcicos e, sobretudo, epidoto e actinolita na cúpula do quartzo monzonito intrusivo ou endoescarnito; ii) a mineralização principal é do tipo estratóide, intercalada e/ou associada principalmente aos exoescarnitos Fe-Ca. Ela é composta, sobretudo, de óxidos de ferro (magnetita) com ocorrência subordinada de sulfetos, estes identificados em testemunhos de sondagens a profundidades superiores a 50 m. Adicionalmente, ocorre minério magnetítico disseminado em protólito ígneo (endoescarnito) fortemente epidotizado, bem como em filões; iii) a fase sulfetada é subordinada e se desenvolve em duas associações: uma associada a exoescarnitos Fe-Mg sem granada, dominada por clinopiroxênio (~ 55%) e sulfetos (~ 30%), com quantidades menores de biotita-flogopita (~ 8%), hornblenda (~ 5%), e a outra associada a exoescarnito Fe-Ca com predomínio da granada (~ 50%) sobre clinopiroxênio (~ 15%), óxidos de ferro (~ 6%) e sulfetos (9%), estes após a fase oxidada; iv-a gênese dessas mineralizações, em função da sua associação estreita com intrusões graníticas (stocks e diques) permite considerá-la como escarnitosígneos. Entretanto, algumas questões necessitam ser esclarecidas, como a coexistência espacial desses dois tipos de Escarnitos e sua preservação em terrenos dominados por ortognaisses migmatiticos, metatexitos e diatexitos.

No que concerne a coexistência espacial dos dois escarnitoss (Fe-Ca e Fe-Mg), pode ser interpretada: i) como sobreposição do escarnito Fe-Ca sobre o escarnito Fe-Mg, como argumentado por Aleksandro (1998) em depósitos similares; ii) por variações na composição do protólito carbonático, camadas de calcário intercaladas a de dolomito, comum em contexto de margem continental passiva, ambiente que precederia ao desenvolvimento do arco; iii) pela existência de fontes múltiplas de fluidos magmáticos, dado à existência de vários granitos de tamanho, forma e composição distintos.

Em relação à preservação desses escarnitosem meio aos terrenos gnáissicos migmatíticos do AMSQ, em que a migmatização tem sido atribuída a Orogenia Brasiliana (640 - 600 Ma), duas questões se impõem: i) as rochas calcissilicáticas, juntamente com mármores e anfibolitos, embora metamorfisadas em fácies anfibolito, teriam sido preservadas da fusão brasiliana, dado ao seu caráter mais refratário, como assinalado por Motta Garcia & Arthaud (2004Garcia M.G.M. & Arthaud M.H. 2004. Caracterização de trajetória P-T em nappes brasilianas: região de Boa Viagem/Madalena - Ceará Central (NE Brasil). Revista de Geologia , Universidade Federal do Ceará, 17:173-191.), Arthaud (2007Arthaud M.H. 2007. Evolução Neoproterozóica do Grupo Ceará (Domínio Ceará Central, NE Brasil): da sedimentação à colisão continental brasiliana . PhD thesis, Universidade de Brasília, Brasília, 170 p. )?; e ii) o processo de escarnitização estaria diretamente associado aos magmas graníticos cedo- a sincolisionais, tardi a pós-colisionais intrusivos nessas associações no Neoproterozóico (Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.J.S., Van Schumus W.R., Hackspacher P.C., Brito Neves B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E., 2003. Evidence for Neoproterozoic continental arc magmatism in the Santa Quitéria Batholith of Ceará State, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the assembly of west Gondwana. Gondwana Research 6:265-273.; Brito Neves et al. 2003Brito Neves B.B., Passarelli C.R., Basei M.A.S., Santos E.J. 2003. Idades U-Pb em Zircão de Alguns Granitos Clássicos da Província Borborema. Geologia USP : Série Cientifica , São Paulo, 3;25-138., Arthaud et al. 2008Arthaud M.H., Caby R., Fuck R.A., Dantas E.L., Parente C.V. 2008. Geology of the Northern Borborema Province, NE Brazil and its correlation with Nigeria, NW Africa. In: Pankhurst R.J., Trouw R.A.J., Brito Neves B.B., De Wit M.J. (Eds.), West Gondwana: Pre-Cenozoic Correlations Across the Atlanti Region , vol. 294. Geological Society of London Special Publications, p. 49-67. , Castro et al. 2012Castro N.A., Ganade de Araujo C.E., Basei M.A.S., Osako L.S., Nutman A., Liu D. 2012. Ordovician A-type granitoid magmatism on the Ceará Central Domain, Borborema Province, NE-Brazil. Journal of South American Earth Sciences 36;18-31.)? Em relação à primeira questão, algumas calcissilicáticas exibem bandamento metamórfico bem desenvolvido, outras mostram feições de escarnitização incipiente, como os escarnóides, e algumas exibem feições de migmatização associadas. O bandamento metamórfico é marcado por faixas milimétricas dominadas por anfibólio, com clinopiroxênio subordinado, e bandas compostas por feldspatos (plagioclásio e feldspato potássico). As feições de escarnitização são registradas pela neoformação de granada e clinopiroxênio e as de migmatização por segregações de minerais máficos (anfibólio e clinopiroxênio) na forma de finas camadas, "bolsões" e lentes, interpretados como restitos de fusão parcial, envolvidos de maneira irregular por mobilizados leucocráticos de composição granítica. Essas características texturais e mineralógicas sugerem que, pelo menos parte desses litotipos, embora metamorfizados em fácies anfibolito alto a temperaturas superiores a 650ºC (e.g. Bucher & Graper 2011Bucher K. & Grapes R. 2011. Petrogenesis of Metamorphic Rocks . Ed. Springer. 428 p.) preservam a composição do protólito, como sugerido por Motta Garcia e Arthaud (2004Garcia M.G.M. & Arthaud M.H. 2004. Caracterização de trajetória P-T em nappes brasilianas: região de Boa Viagem/Madalena - Ceará Central (NE Brasil). Revista de Geologia , Universidade Federal do Ceará, 17:173-191.), Arthaud (2007Arthaud M.H. 2007. Evolução Neoproterozóica do Grupo Ceará (Domínio Ceará Central, NE Brasil): da sedimentação à colisão continental brasiliana . PhD thesis, Universidade de Brasília, Brasília, 170 p. ). Entretanto, já mostram evidências de escarnitização cedo orogênica.

No que concerne aos escarnitos, observa-se que eles estão preferencialmente associados às intrusões quartzo monzoníticas de granulação grossa, junto as rochas calcissilicáticas e mármores, em particular um quartzo monzonito propilitizado, com minério magnetítico disseminado, com idade de 635,9 ± 5,0 Ma. Isso indica tratar-se de granitos cedo- a sincolisionais e que o minério magnetítico disseminado, tem sua formação associada à evolução hidrotermal do próprio quartzo monzonito, que interagiu com fluidos das rochas encaixantes, em sua porção apical e, que provavelmente, propagou-se pelas rochas encaixantes. A fase de alteração retromórfica (epidoto-actinolita), estaria associada à introdução de cálcio fornecido pela rocha carbonática encaixante (e.g . Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.). Isso gera o desenvolvimento de epídoto-actinolita em fase retrogradante e sua disposição centrípeta.

Os hornfels calciosilicáticos apresentam uma associação dominada por clinopiroxênio e plagioclásio, que sugere temperatura de formação acima de 475ºC, considerando pressões constantes de 2 Kb (e.g . Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.). Os escarnitos Fe-(Mg), a base de olivina-espinélio-diopsidio, teriam ocorrido em temperatura acima de 600ºC (e.g . Aleksandrov 1998Aleksandrov S.M. 1998. Geochemistry of Skarn and Ore Formation in Dolomites . VSP. Utrecht, The Netherlands, Tokyo, Japan.300 p.). A deposição de magnetita em escarnito Fe-(Mg) acompanha a paragênese mineral anidra (~ 600ºC) e a precipitação de sulfetos ocorre desde o início do estádio retrógrado (≤ 550ºC) e prossegue durante a formação das fases hidratadas e carbonatadas (< 420ºC) (e.g. Einaudi et al. 1981Einaudi M.T., Meinert L.D., Newberry R.J. 1981. Skarn deposits. Economic Geology . 75th Ann. Volume;317-391.). No escarnitoFe-(Ca), a magnetita é gerada no estádio retrógrado (< 550ºC) em conjunto com a associação mineral hidratada, seguida pela deposição dos sulfetos (~ 400ºC).

Adicionalmente, as associações minerais de alta temperatura concentram-se mais próxima da zona de contato com o corpo intrusivo de granulação grossa, enquanto as de mais baixas localizam-se em porções mais distais e em estruturas tectônicas como dobras e zonas de cisalhamento, que serviram de canais preferenciais para circulação e alojamento dessas soluções mineralizadas, por ocasião da ascenção de corpos graníticos.

Datações U-Pb realizadas também em alguns diques, que recortam o quartzo monzonito e os escarnitos, revelam a presença de duas populações de zircões com valores de 640 e 450 Ma. A idade mais nova é interpretada como de cristalização dos diques, enquanto a mais antiga diz respeito a zircões herdados da fase cristalizada previamente. Este novo evento magmático poderia ter se desenvolvido concomitante à formação dos diques magnetíticos.

Esses dados mostram que a associação entre rochas químicas (mármores e calcissilicáticas), armadilhas estruturais e plutonismo constituem sítio promissor para processos de dissolução, migração/transporte e deposição de metais. Mostram também que a caracterização dessas ocorrências como do tipo Escarnito no AMSQ reveste-se de expressiva importância, sobretudo, porque é a primeira vez que se descreve depósito de escarnito mineralizado em Fe-Cu em região de arco magmático no Brasil, mas que é comum em outras regiões contendo arcos magmáticos continentais (e.g. Meinert et al. 2005Meinert L.D., Dipple G.M., Nicolescu S. 2005. World Skarn Deposits. Economic Geology . 100th Anniversary Volume:299-336. ; Pons et al. 2009Pons J.M., Franchini M., Meinert L., Recio C., Etcheverry R. 2009. Iron Skarns of the Vegas Peladas District, Mendoza, Argentina. Economic Geology 104:157-184). A presença de importantes faixas calcissilicáticas e mármores e a diversidade de corpos graníticos de composição distinta em seu interior aumenta também o potencial de ocorrência de outros depósitos de escarnito, além do Fe e Cu, o que pode modificar o panorama do setor mineral do estado do Ceará.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPq (Proc. 481713/2013-1), ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Estudos Tectônicos (CNPq/INCT-ET/Proc.573713/2008-1), ao PROCAD/NF (UFC-UNB), sob os auspícios da CAPES, às Universidades UFC, UNB e UNICAMP pelo apoio técnico e laboratorial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2015

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2015
  • Aceito
    25 Ago 2015
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