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Família, trabalho e religião das mulheres assistidas em São Paulo

Family, work and religion of women in social programs at São Paulo

Familia, trabajo y religión de las mujeres asistidas en São Paulo

Resumos

Este artigo propõe abrir a "caixa preta" de famílias assistidas pelos novos programas sociais brasileiros criados com base no princípio da matricialidade sociofamiliar. Estes encontram sucesso graças à colaboração das mães, que obedecem às regras para poder usufruir dos serviços e dos benefícios. Contudo, pouco se conhece sobre as famílias atendidas e, particularmente, sobre as mulheres titulares desses programas - suas trajetórias, valores e subjetividades. Por meio de entrevistas com titulares foi possível revelar as dificuldades que elas enfrentam de acesso ao trabalho, por serem insubstituíveis cuidadoras do lar. E ainda, o papel da religião e das ações assistenciais na organização de seu cotidiano e na manutenção da respeitabilidade familiar.

famílias; relações de gênero; religião; assistência social


The purpose of this article is to open the "black box" of families in new Brazilian social programs based on the principle of "socio-familial matrix". Thanks to the collaboration of mothers fulfilling their obligations to get services and benefits, the programs have been quite successful. Nevertheless, very few aspects about these women are known: their biographies, values and subjectivity. Interview with beneficiaries of these program, reveal their difficulty to access the labor market due to their irreplaceable function in managing their households. The role of religion and social assistance in the organization of everyday life and in the maintainance of family respectability is assessed.

family; gender relations; religion; social assistance


Este trabajo se propone abrir la "caja negra" de las familias asistidas de los nuevos programas sociales de Brasil con base en el principio de la matriz social y familiar. Estos logran éxito gracias a la colaboración de las madres que obedecen las reglas para recibir los servicios y beneficios. Sin embargo, poco se sabe acerca de las familias atendidas, y en particular a las mujeres titulares de dichos programas - sus trayectorias, valores y subjetividades. A través de entrevistas con ellas fue posible revelar las dificultades que enfrentan en el acceso al trabajo, ya que son las cuidadoras insustituibles de casa. Y, sin embargo, el papel de la religión y de la asistencia en la organización de su vida cotidiana y en el mantenimiento de la respetabilidad de la familia.

familias; relaciones de género; religión; asistencia social


TEMA EM DESTAQUE

Familia, trabajo y religión de las mujeres asistidas en São Paulo

Yumi Garcia dos Santos

Professora adjunta do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (MG) yumigds@uol.com.br

RESUMO

Este artigo propõe abrir a "caixa preta" de famílias assistidas pelos novos programas sociais brasileiros criados com base no princípio da matricialidade sociofamiliar. Estes encontram sucesso graças à colaboração das mães, que obedecem às regras para poder usufruir dos serviços e dos benefícios. Contudo, pouco se conhece sobre as famílias atendidas e, particularmente, sobre as mulheres titulares desses programas - suas trajetórias, valores e subjetividades. Por meio de entrevistas com titulares foi possível revelar as dificuldades que elas enfrentam de acesso ao trabalho, por serem insubstituíveis cuidadoras do lar. E ainda, o papel da religião e das ações assistenciais na organização de seu cotidiano e na manutenção da respeitabilidade familiar.

Palavras-chave: famílias; relações de gênero; religião; assistência social

ABSTRACT

The purpose of this article is to open the "black box" of families in new Brazilian social programs based on the principle of "socio-familial matrix". Thanks to the collaboration of mothers fulfilling their obligations to get services and benefits, the programs have been quite successful. Nevertheless, very few aspects about these women are known: their biographies, values and subjectivity. Interview with beneficiaries of these program, reveal their difficulty to access the labor market due to their irreplaceable function in managing their households. The role of religion and social assistance in the organization of everyday life and in the maintainance of family respectability is assessed.

Keywords: family; gender relations; religion; social assistance

RESUMEN

Este trabajo se propone abrir la "caja negra" de las familias asistidas de los nuevos programas sociales de Brasil con base en el principio de la matriz social y familiar. Estos logran éxito gracias a la colaboración de las madres que obedecen las reglas para recibir los servicios y beneficios. Sin embargo, poco se sabe acerca de las familias atendidas, y en particular a las mujeres titulares de dichos programas - sus trayectorias, valores y subjetividades. A través de entrevistas con ellas fue posible revelar las dificultades que enfrentan en el acceso al trabajo, ya que son las cuidadoras insustituibles de casa. Y, sin embargo, el papel de la religión y de la asistencia en la organización de su vida cotidiana y en el mantenimiento de la respetabilidad de la familia.

Palabras clave: familias; relaciones de género; religión; asistencia social

Este artigo tem como objetivo mostrar as trajetórias de mulheres assistidas pelos chamados novos programas sociais implementados com base nos princípios da Constituição de 1988: Estratégia Saúde Família - ESF1 1 Criado em 1994 como Programa Saúde Família - PSF - , o ESF é um serviço que promove a prevenção e a identificação de doenças, assim como a educação sanitária (OLIVEIRA, 2004, p. 47). O serviço é oferecido nas Unidades Básicas de Saúde por meio de equipes médicas constituídas por um(a) médico(a), um enfermeiro(a), dois(duas) auxiliares de enfermagem e cinco agentes comunitários(as) de saúde (BRASIL, s.d.). - , Programa Bolsa Família - PBF2 2 O Bolsa Família é um programa de transferência de renda, instituído em 2004, destinado a famílias com renda igual ou menor a 70 reais per capita. Em contrapartida, os responsáveis pelo recebimento da renda devem cumprir as condicionalidades nas áreas da saúde, educação e assistência social (BRASIL, 2004). - e Serviço de Proteção e Atenção Integral à Família - PAIF3 3 Criado em 2004, o PAIF visa a auxiliar as famílias em situação de vulnerabilidade social na rede socioassistencial em espaços denominados Centros de Referência de Assistência Social - CRAS - , cujas atribuições foram definidas na Resolução n. 109 do Conselho Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2009). De modo semelhante à ESF, opera com uma equipe de profissionais especializados na área de assistência social como assistentes sociais e psicólogos(as). . Desde meados dos anos 1990, a família tem sido foco de atenção das políticas assistenciais brasileiras para o desenvolvimento de programas de prevenção e combate à pobreza.

Tal desenho foi adotado em primeiro lugar na área da saúde como parte integrante do Sistema Único de Saúde - SUS - , por meio da ESF. Desde então, foram implementados outros programas sociais com "matricialidade sociofamiliar", como passaram a ser chamados, por exemplo, o Serviço de Proteção e Atenção Integral à Família - PAIF, o Bolsa Família e, mais recentemente, as ações e os programas que integram o Plano Brasil Sem Miséria, como a Ação Brasil Carinhoso.4 4 O Plano Brasil Sem Miséria foi instituído em 2011 para combater a extrema pobreza. Por meio de uma concepção multidimensional da pobreza e realizando uma busca ativa, adota três eixos de intervenção: garantia de renda, acesso aos serviços públicos e inserção produtiva. O Programa Brasil Carinhoso integra o eixo garantia de renda e realiza transferências monetárias às famílias com crianças e adolescentes (BRASIL, 2011).

Associada à ideia do lugar moral que ocupa a família em nossa sociedade, a atenção à família tem sido vista como uma solução humanizada para a resolução dos problemas de acesso à saúde, renda e proteção social da população classificada como socialmente vulnerável, usuária privilegiada desses programas assistenciais. Nesses programas, o objeto principal do bem-estar é a nova geração, crianças e adolescentes (JENSON, 2011; MOLYNEUX, 2006; SANTOS, 2012).

Segundo Jenson (2011), essa é uma característica dos novos programas sociais latino-americanos em geral, que visam ao combate à reprodução da pobreza, apoiando-se fundamentalmente na divisão sexual do trabalho e na disposição feminina para o ato de cuidar. Considerando inerente a todas as mulheres (pobres) o exercício do papel de mãe, tais programas e serviços assistenciais são concebidos com base na suposição de que estas serão suas interlocutoras privilegiadas (SARTI, 2010; SCOTT, 2005).

Assim, os gestores desses novos programas sociais que têm a família como objeto de intervenção necessitam da cumplicidade das mulheres, para que repassem as instruções da equipe profissional aos demais membros da família, garantindo seu sucesso. Elas são parceiras ótimas quando aderem voluntariamente aos programas e consideradas "boas usuárias" ou, ao contrário, objeto de controle e correção quando consideradas "inadequadas" e "más usuárias" (GEORGES; SANTOS, 2013).

As mulheres cumprem, portanto, um papel chave, às vezes tenso, na concretização dos novos programas sociais brasileiros, cujo sucesso tem repercutido para além das fronteiras nacionais. Mas pouco se conhece sobre elas - suas trajetórias, valores e subjetividades. No desenho dos novos programas sociais, seus interesses são considerados análogos aos dos demais membros da família, tornando invisíveis a desigualdade e o conflito de gênero existentes.

Trata-se da ausência da percepção do que Sen (1990) chamou de "conflitos cooperativos" (co-operative conflicts). O autor adverte que a família não é uma unidade homogênea que opera unicamente na lógica da solidariedade. O interesse do homem e da mulher é frequentemente divergente, o dos adultos é diferente do das crianças, o dos idosos, do dos demais. É dentro dessas tensões que a família vive o cotidiano, ora cooperando, ora em conflito, preservando - ou não - o equilíbrio das relações entre seus membros com base na hierarquia de gênero e geração vigente.

Contudo, as políticas que priorizam a família operam como se tais tensões não existissem, tratando-a como um grupo homogêneo, com interesses e status iguais. A mulher, que implicitamente é a pessoa de referência para o atendimento pelos programas, é vista apenas como uma representante da família, sem a compreensão de que possa viver os dilemas causados pelas relações desiguais de gênero, classe, raça e geração.

Tendo como porta de entrada os novos programas sociais, visamos a desvendar os dilemas e as tensões vividos pelas mulheres pobres, assim como algumas conciliações por elas encontradas, notadamente na religião. Adentramos nos relatos das mulheres a partir da questão do afastamento do mundo do trabalho, o que é de modo paradoxal desejado na concepção de família da classe popular que privilegia o cuidado do lar, mas é entendido por elas como necessário para a sua realização pessoal e autonomia.

A pesquisa de campo, baseada em entrevistas semidiretivas em profundidade e observação participante, foi realizada na periferia de São Paulo, a 30 km do centro da cidade.5 5 A pesquisa de campo foi realizada entre abril de 2010 e junho de 2011, em parceria com Isabel Georges, do Institut de Rercherches pour le Dévelopement - IRD - e Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. É lá onde se concentra a população qualificada pelo poder público como sendo de "alta vulnerabilidade social".6 6 O conceito de vulnerabilidade social tem sido empregado na recente construção do regime de proteção social pelo Estado brasileiro em geral e pelo Município de São Paulo, especificamente. Baseia-se no entendimento de que a pobreza compreende dimensões de carência que não se limitam ao nível de renda, mas incluem também o acesso à educação, saúde, moradia e outros direitos sociais. Hoje em dia, diversos programas assistenciais (públicos, privados e semipúblicos) se localizam nesses territórios a fim de atender a uma população majoritariamente composta por migrantes internos e seus descendentes, assim como por uma maior proporção de pretos e pardos em relação a outras regiões da cidade.

Tivemos acesso a mulheres atendidas pelos novos programas sociais por meio do acompanhamento às visitas domiciliares realizadas pelos trabalhadores sociais (agentes comunitárias de saúde da ESF e agentes de proteção social do PAF). Nas entrevistas, as perguntas não foram orientadas no sentido de se procurar saber a opinião delas sobre os programas, mas, sim, de apreender o modo como explicam suas realidades baseadas na vida cotidiana, incluindo aspectos como casamento, família, trabalho e religião. Requereu-se, a cada entrevista realizada, uma assinatura das entrevistadas no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido à pesquisa.

AS TRAJETÓRIAS DE MULHERES ASSISTIDAS: FAMÍLIA, TRABALHO E RELIGIÃO

De acordo com Sarti (1996), a família da classe popular brasileira supõe que os papéis do marido e da esposa sejam cumpridos de forma hierarquizada e complementar, atribuindo a cada um "realizar diferentes funções da autoridade na família": ao homem, a de pai e chefe de família, e à mulher, a de mãe e dona de casa. O chefe de família seria a "autoridade moral, responsável pela respeitabilidade familiar" hierarquicamente superior, e a dona de casa, a responsável pela manutenção da "unidade do grupo", submetida ao primeiro.

A autoridade feminina vincula-se à valorização da mãe, num universo simbólico em que a maternidade faz da mulher, mulher, tornando-a reconhecida como tal, senão ela será uma potencialidade, algo que não se completou. (SARTI, 1996, p. 43)

Assim, o casamento das mulheres da camada pobre envolve, em ampla medida, a obtenção de um status respeitável por meio da combinação dos seus papéis de esposa, dona de casa e, principalmente, mãe.

As sete mulheres entrevistadas no âmbito desta pesquisa são todas mães com pelo menos um filho sob sua responsabilidade. Sua origem social é a da classe trabalhadora, rural ou urbana, algumas são migrantes ou filhas de migrantes do nordeste do país. À época em que foram ouvidas, seis eram cônjuges dependentes do marido e uma chefe de família monoparental (Clara), três eram beneficiárias do programa Estratégia Saúde Família (Iara, Rosalina e Sandra) e quatro do Ação Família (Clara, Jessica, Valéria e Vanessa). Destas últimas, três recebiam Bolsa Família (Clara, Valéria e Vanessa). As mulheres pertencem a três distintas faixas etárias: Jessica, Iara, Valéria e Vanessa estão na casa dos 20 anos; Clara, dos 30 anos; e as restantes, dos 40 anos. Duas concluíram o ensino médio (Jessica, Sandra), duas interromperam seus estudos no ensino fundamental e os retomaram em cursos supletivos (Iara e Rosalina) e três não concluíram o ensino fundamental (Clara, Valéria e Vanessa).

Além de as sete mulheres terem em comum o fato de serem mães, usuárias de programas sociais, moradoras de bairros da periferia classificados como sendo de "alta vulnerabilidade social", nenhuma delas trabalha. De trabalhadoras no mercado de trabalho formal ou não, elas passaram, com o casamento e a maternidade, por um processo de ordenamento de suas vidas, segundo a lógica da moral dos pobres, seja assumindo o papel natural de cuidado familiar e doméstico, seja compelidas pelos atores externos (de modo mais direto, o marido) que lembra a elas constantemente onde deve ser o seu lugar. Afastadas do mercado de trabalho por motivos que sobrepõem a falta de qualificação e de equipamentos e estruturas de conciliação entre trabalho e família, assim como a existência do paradigma da rígida divisão sexual do trabalho, que orienta a moral conjugal dos pobres, o cuidado que elas oferecem à família se torna sua razão de ser, e suas vidas se organizam em torno dessa função, numa construção paulatina da maternidade.

Organizamos as trajetórias das mulheres por ordem etária para que seja possível acompanhar tal construção, entrelaçando com as tensões e as conciliações pelas quais passam suas experiências com o casamento, a maternidade, o trabalho e a religião. As narrativas são construídas a partir da relação das mulheres com o trabalho, atividade que é iniciada cedo na vida mas interrompida - definitivamente ou não - com o casamento e a maternidade.

JESSICA

A transição entre a vida de trabalhadora e a vida exclusivamente voltada às atividades reprodutivas não é bem aceita por Jessica, mãe de gêmeas. Ela tem 22 anos, é parda, filha única de pai motorista de caminhão e mãe agente comunitária de saúde. Nasceu na zona norte da cidade de São Paulo, onde seus pais viviam na época. Seus pais viveram juntos durante mais ou menos 25 anos, repetindo separações e voltas, até que se separaram definitivamente, quando Jessica estava com 17 anos. Seu pai constituiu uma nova família, o que entristece Jessica por ter reduzido as chances de seus pais estarem novamente juntos. As repetidas separações e voltas entre o casal fizeram com que ela sempre tivesse esperança de que seus pais fossem reatar a relação. Isso teria sido o motivo, além de um caso de amor frustrado, do seu mergulho nas drogas entre os 18 e 19 anos de idade, começando com lança perfume e evoluindo para a cocaína. Foi também a droga que a uniu ao seu companheiro e pai de suas filhas, Cleiton, um ano mais novo do que ela, branco. O temperamento dele é tranquilo, sua fala é bastante contida, o que contrasta com Jessica, expansiva. Também havia rompido com uma namorada quando conheceu sua companheira, além de ter perdido o pai pouco tempo antes. Como afirmou Jessica, no início foram mais companheiros para usar drogas do que namorados. Ela afundou-se mais no vício do que ele; que usava mais para acompanhá-la. Um ano depois, quase em overdose, e com muito medo de que sua mãe terminasse por descobrir seu vício, decidiu parar. Nesse período, Jessica trabalhava como operadora de telemarketing. Pouco tempo depois de ter sido bem sucedida em sair do vício, ela engravidou de suas filhas gêmeas.

Com o nascimento das filhas, a mãe de Jessica recebeu Cleiton e a filha para morar em sua casa. A casa, onde Jessica tem lembranças de seu pai, se situa na parte considerada "mais perigosa" das microáreas estabelecidas pela ESF da região estudada. É uma das que possuem melhor aparência na rua. No andar de baixo moram a mãe, Jessica, Cleiton e as gêmeas, e no andar de cima, o tio materno de Jessica, que sofre de deficiência mental. Cleiton não se sente muito à vontade na casa de sua sogra, pois é constantemente alvo de críticas dessa última e de sua companheira, por não ser suficientemente participativo nos afazeres domésticos.

Geralmente é a minha mãe [que cozinha], a maioria das vezes é a minha mãe. Aí minha mãe fala assim: "eu vou fazer a comida". Então eu vou olhar as meninas, ele não vai fazer nada. Qual é o papel dele? Depois que todo mundo comeu, ele podia lavar a louça, ele lava o prato dele, a louça fica lá toda, ele lava [só] o prato dele, é uma coisa sem noção. [...] Olha, tem dois baldes de roupa pra passar, se você abrir ali, você se assusta com tanta roupa que tem pra passar. (Jessica)

Enquanto seu companheiro mantém sua vida anterior sem muitas mudanças fora de casa, a vida de Jessica sofreu mudanças significativas por causa da dedicação à maternidade. Ela percebe que o seu trabalho reprodutivo não é reconhecido, a começar por seu próprio marido. Assim, apela:

O que eu falo pra ele é assim, eu reconheço o trabalho dele, eu reconheço que é cansativo, eu reconheço que pegar condução não é fácil, é difícil ir e voltar, acordar 5h da manhã, é ruim, mas ele também tem que reconhecer o que eu faço, não é brincadeira. Eu vou dar banho em uma, fico de olho na outra porque quando eu vou dar banho na outra, a outra está quebrando não sei o que. Eu, qualquer hora, eu vou chegar no hospital e vou presa de tanto que essas meninas caem porque eu não consigo cuidar das duas ao mesmo tempo, uma vai pra um lado, a outra vai pro outro. (Jessica)

Jessica se ressente do fato de a maternidade ter sido uma ruptura com o que ela era antes, inclusive do ponto de vista físico, diferente de seu companheiro, apesar dele ter se tornado pai. Jessica teve depressão pós-parto quando suas filhas tinham seis meses:

Acho que tinham uns seis meses porque é que nem eu te falei, eu tenho essa loucura de ser magra, eu não aceito, eu me sinto enorme de gorda, eu não me aceito assim do jeito que eu estou, e eu estava mais gorda quando eu ganhei nenê, nenhuma roupa me servia, eu não conseguia sair pra lugar nenhum, eu me sentia horrorosa, essas duas crianças chorando no meu ouvido o dia inteiro, o tempo todo, eu não tinha mais paciência pra nada. Eu olhava as minhas fotos do meu tempo de solteira, eu lembrava da minha vida do meu tempo de solteira, eu chorava, chorava, chorava. "Onde eu amarrei meu jegue", eu falava assim. (Jessica)

Ela considera a possibilidade de voltar a trabalhar como operadora de telemarketing, pois tal ocupação permitiria conciliar o trabalho com o cuidado das filhas e os horários da creche. Isso vai ao encontro da vontade de sua mãe, que pagou cursos de informática e de inglês para que ela pudesse ter um emprego melhor. Assim, Jessica se posiciona:

Hoje eu preciso de um emprego que eu trabalhe em horário comercial. Eu tenho duas filhas que ninguém olha, nem se eu pagar 500 reais a pessoa não olha. Então o que eu preciso? Eu preciso de um emprego de segunda a sexta que eu entre depois das 7h que é a hora que eu levo elas pra creche, e volte antes das 5h0 que é a hora que as meninas voltam. Como o meu grau de escolaridade é só do ensino médio, eu vou arrumar aonde? Aí o povo fala assim pra mim, "você não quer trabalhar". (Jessica)

Jessica se encontra travada entre a necessidade de cuidar das filhas - não há outra pessoa para substituí-la - e a autorrealização. Diferente das mães da classe média, não tem como delegar a maternidade e, por ter baixa escolaridade e ser moradora de bairro distante do centro da cidade e estigmatizado, suas opções de emprego são limitadas. Enquanto aguarda um momento propício para reingressar no mercado de trabalho, frequenta as atividades do Programa Ação Família que são oferecidas durante o dia, como a oficina de manicure.

IARA

Já Iara se mostra mais conformada com os desdobramentos do casamento e da maternidade que a afastaram da vida economicamente ativa. Moradora do mesmo distrito que Jessica, Iara tem 28 anos, é parda, caçula de um casal que migrou de Recife com quatro filhos. Seu pai foi marceneiro da empresa de abastecimento de água do Estado de São Paulo, mas abandonou a família e voltou para Recife. Iara cresceu ressentindo a partida do pai. Sua mãe nunca voltou a se casar; analfabeta, trabalhou como faxineira e passadeira, sempre de modo informal.

Sentindo diferença entre ela e seus amigos em termos materiais, Iara parou de estudar na sétima série (atualmente oitavo ano fundamental) e passou a trabalhar. Começou em uma loja de roupas onde permaneceu durante dois anos. Depois, quando completou 18 anos, fez um curso de babás "do governo" e trabalhou no ramo para famílias de classe alta durante quatro anos, quase sempre de modo informal. Depois desse período, voltou a trabalhar alguns meses em comércio, para em seguida trabalhar em bufê e bingo, "cada coisa um pouquinho". Iara voltou a estudar, e conheceu uma pessoa com quem se casou depois de três anos de namoro. Depois do casamento, seu marido mostrou-se muito rude, e Iara descobriu que ele era usuário de drogas; foi rápida a deterioração da relação. Iara conheceu o atual marido, Mateus, no apartamento de uma amiga. Ambos se sentiram atraídos, pois, segundo ela, carregavam a tristeza do fracasso da relação com os respectivos cônjuges. O casal trabalhou junto em eventos, principalmente nos finais de semana. Enquanto isso Iara tentava engravidar sem sucesso. Isso foi gerando uma certa depressão, pois sentia-se cobrada pela sociedade, de se tornar mãe. Depois de cinco anos de casamento, a relação conjugal começou a frustrar Iara, ironicamente quando enfim ficou grávida de sua filha. Seu marido passou a beber muito, e Iara começou a se sentir só. Evangélica, acreditou que a mudança dele foi causada por "algum encosto que entrou nele".

A filha de Iara e Mateus tem atualmente um ano e meio de idade. Iara não cogita voltar a trabalhar até que sua filha entre no ciclo infantil. Mesmo assim, acredita que procuraria um emprego de meio período, para poder acompanhar os estudos da filha.

Vou ver se eu faço algum curso pra me especializar pra eu arrumar um trabalho meio período pra dar tempo de eu levar e o meu marido buscar ela. Eu quero acompanhar. Eu já falei pro meu marido - se tiver um serviço que não dê pra eu acompanhar, ver o caderno dela, ir na reunião da escola, eu não vou. (Iara)

Iara concebe uma condição econômica diferente da sua para sua filha, mas é grata ao marido por propiciar sua dedicação exclusiva à maternidade:

Eu quero que quando ela cresça, ela seja independente, não dependa de ninguém, eu vou sempre ensinar isso pra ela. Eu dependo do pai dela agora, mas eu quero ser independente também de todas as formas, sinto muita falta disso, trabalhar, pegar o meu dinheiro, de comprar o que eu quero. Ele compra tudo o que eu quero só que tem hora que cansa de pedir. Tem hora que fala - cansei, eu não quero mais depender de homem, é muito chato, sempre fui independente. Mas Mateus é um bom marido, apesar dos pesares é um bom marido.

O que é um bom marido pra você?

É um bom pai. É um homem que conversa, é compreensivo comigo, às vezes eu estou naqueles dias chatos, ele está entendendo. Um homem que entende que eu decidi ficar três anos me dedicando à minha filha porque tem homem que cobra. Tem homem que fala - você tem que trabalhar pra ajudar em casa. (Iara)

Quanto à divisão de tarefas domésticas, na medida em que Iara passou a se dedicar à maternidade, seu marido se afastou do trabalho doméstico, estabelecendo uma separação espacial e sexual das responsabilidades de cada um: Iara no lar, Mateus no mercado de trabalho. Iara aceita essa divisão, pois acredita que deve ser ela a responsável pelos afazeres domésticos no contexto do casamento e maternidade.

Antes, quando ele morava sozinho ele limpava tudo, a casa dele era impecável, eu falava - meu Deus ele caiu do céu pra mim; era limpinho. Depois que eu casei com ele, ele ainda me ajudava, depois que eu tive a menina acabou. [...] Mas, se for, que nem ele estava de férias, ele lavava a louça, agora passar e lavar roupa não. Ele passava uma vassoura na casa, limpar mesmo não é com ele. Eu acho que é minha obrigação. (Iara)

VALÉRIA E VANESSA

Valéria e Vanessa são gêmeas, pardas e moram na mesma rua, têm 29 anos, nasceram no Estado de Alagoas. Elas compartilham trajetórias semelhantes, passaram por relacionamentos de curta duração que resultaram em filhos, e atualmente coabitam com parceiros com duração mais longa. São caçulas de quatro filhos. A família migrou para São Paulo quando elas ainda eram bebês. Ambas pararam de estudar na terceira série (atual quarto ano fundamental) porque era necessário cuidar da casa, e têm pouca experiência de trabalho. Quando estavam com 12 anos de idade, a família teve dificuldades financeiras por causa da bebida do pai, e a mãe decidiu voltar com os filhos para a cidade de origem, em Alagoas.

Diferente de sua irmã, Valéria recusou-se a acompanhá-los para ficar perto de um menino por quem estava apaixonada. O garoto, no entanto, a ignorou, e ela passou a dormir na rua, até que sua irmã mais velha veio buscá-la. Aos 15 anos, Valéria conheceu um homem de 36 anos com quem teve sua filha. Ele não quis assumir a paternidade, e ela o deixou. Em seguida, conheceu o pai de seu filho maior, relacionamento que "deu certo", até o repentino desaparecimento dele. Apenas sua moto, com a chave no contato foi encontrada; o corpo, nunca. Ela entrou em depressão, não quis mais criar seus filhos. Sua mãe, que já havia voltado para São Paulo, enviou uma pessoa para buscá-la. Sua depressão continuou, até que conheceu seu atual companheiro, Augusto. Ela estava com 20 anos e ele, com 36 anos. Depois de uma semana de namoro, ele a convidou para morar junto. Ele tem uma filha de 17 anos, que vive na mesma casa, mas não há diálogo entre Valéria e sua enteada. Valéria teve mais três filhos com Augusto, atualmente de seis, três e um ano. Os filhos maiores têm onze e nove anos, todos vivem juntos, numa casa construída nos fundos do terreno pertencente à família de Augusto, de dois andares, reformada, e relativamente confortável em comparação às outras residências do mesmo "território" atendido pelo Programa Ação Família.

Valéria quer casar, no civil e no religioso (em uma igreja católica), mas até hoje Augusto se esquiva quando o assunto é casamento, alegando que não possui meios financeiros. Seu salário como funcionário de uma loja de tintas automotivas é de 750 reais (em 2011). Valéria pediu ajuda ao agente de proteção social do Programa Ação Família, que trouxe, do cartório, um formulário para casamento sem ônus. Isso, no entanto, não motivou Augusto para passar ao ato. Valéria é fortemente hostilizada pela família do marido, e não é livre de fazer o que bem entender em casa; sua irmã Vanessa passa pela mesma situação na sua relação com os sogros, o que a impede de reformar a sua casa, fortemente deteriorada.

Para as duas irmãs, o estudo e o trabalho nem de longe são encorajados pelos maridos. Valéria começou a estudar com uma senhora que oferecia aulas no bairro durante o dia, escondida do marido, mas como não conseguiu alguém para cuidar de seus filhos, não prosseguiu. Participou, também, de uma entrevista de trabalho cujo resultado foi positivo, mas terminou por abrir mão do emprego, pois Augusto não admite que sua companheira trabalhe fora de casa. Como explica, "é um ciúmes doentio, ele não deixa eu estudar, não deixa eu trabalhar, ele acha que se eu trabalhar eu vou arrumar outro, se eu for estudar eu vou namorar com o professor. Eu queria muito voltar a estudar, mas...". Contrariamente, as visitas domiciliares de um agente de proteção social não causam problema, pois segundo Valéria, foi graças a ele que o recebimento do Programa Bolsa Família foi possibilitado (valor de 65 reais mensais, em 2011). Além do benefício do programa de transferência de renda, Valéria frequenta as atividades de uma associação espírita na vizinhança para receber cesta básica a cada quinze dias.

Algo parecido em termos de dificuldades de acesso à formação e ao trabalho aconteceu com sua irmã Vanessa quando ela quis frequentar um curso (privado) de cabeleireiro. Para seu companheiro, Maurício, ela deve priorizar o trabalho doméstico.

É o que eu falo pra ela. Ela tem que ver, querer o seguinte: que tem casa, tem as crianças, eu tenho que trabalhar, hoje estou de folga, mas entro às duas no serviço, tenho que sair de casa no máximo até uma e meia. Então eu falo assim, procure fazer uma coisa que não interfira nas coisas em casa, porque eu acho que ela, como minha esposa, ela tem obrigação em casa, minha obrigação é colocar as coisas aqui. (Maurício)

Seu companheiro admite, no entanto, que ela deve frequentar as oficinas oferecidas pelo Programa Ação Família, pois associa essas atividades ao benefício do programa de transferência de renda, que ele chama aqui de renda mínima.7 7 Para alguns pode ocorrer uma confusão entre o Programa Bolsa Família e o Programa de Renda Mínima do município de São Paulo, mas, segundo Vanessa, ela recebe o Bolsa Família.

Agora quando tem reunião fala ela fala que vai eu não falo nada porque como ajudou no início esse negócio do renda mínima que a gente tem, que ajuda a gente pra caramba, então as vezes tem reunião, eu falo: vai. Ela fala preciso ir pra poder estar ciente do que está acontecendo. Então tá bom, continua. (Maurício )

Assim, tanto Valéria como Vanessa veem suas ações sendo legitimadas pelos seus respectivos maridos somente a partir do momento em que podem ser provedoras de benefícios assistenciais. Constrói-se então uma função para as mulheres pobres por meio dos novos programas sociais que conciliam renda e divisão sexual do trabalho.

CLARA

Clara, que acumula vários fatores de vulnerabilidade social, desde a sua origem familiar até a monoparentalidade com muitos filhos (um deles com problema grave de saúde), passando pela baixa escolaridade, vê o trabalho se tornar alheio ao seu cotidiano. Separada do pai das crianças, cria sozinha suas três filhas (13, 7 e 2 anos) e seu filho bebê (3 meses) com saúde frágil. Ela tem 32 anos, é branca e muito magra. Seus pais são cearenses, mas ela nasceu na capital paulista, como sua irmã, um ano mais nova. Seu pai era gari da prefeitura, e sua mãe, faxineira. Sua mãe faleceu quando Clara tinha 15 anos, de problema no coração. Seu pai morou com ela e sua irmã até quando ela completou 20 anos, já com a filha nascida e depois foi morar com uma outra mulher com quem teve três filhos. Ela diz que nesse período

[...] tive que aprender tudo sozinha, a fazer comida, aprender a cuidar de uma casa, como ser responsável, o horário da janta no horário certo porque meu pai trabalhava, a gente teve que aprender tudo isso, ser responsável pela gente mesmo porque não tinha mãe para ser responsável. (Clara)

A casa onde Clara mora hoje foi adquirida pela mãe quando ela tinha 13 anos. Seu pai, depois do falecimento da esposa, pediu demissão na prefeitura e foi trabalhar em um depósito de material, e depois em uma banca de jornal. Ele e sua irmã moram perto, mas Clara diz que "é a mesma coisa que não estar". "Ao mesmo tempo em que o meu pai e minha irmã estão perto de mim, estão longe porque eles nunca vêm na minha casa".

Clara estudou até a quinta série e depois desistiu de estudar. Retomou os estudos em 2010 passando por uma prova do supletivo, e conseguiu ir direto para a sétima série. Mas, como viu que não dava para deixar as três meninas sozinhas, e ficou grávida do bebê, parou de estudar sem terminar a sétima série. A trajetória profissional de Clara é da mesma forma sucinta. Ela começou a trabalhar aos 13 anos, mas passou a ter crises de epilepsia. "Casa de família, quitanda, casa de família, casa de família de novo", nunca registrada. O último trabalho não teve prosseguimento porque quando sua filha ficou doente sua patroa lhe disse que não precisava mais voltar, pois deveria ficar em casa para cuidar dos filhos.

No seu primeiro relacionamento, não chegou a morar junto com o pai da filha mais velha porque a família dele a rejeitou. O pai de Clara tampouco aceitou a gravidez e ficou os nove meses sem falar com ela; voltou a falar apenas no dia do nascimento de sua filha.

Clara afirma seu vínculo religioso com a Igreja Universal do Reino de Deus: "Lá eu me sinto bem, eu me sinto tranquila. Tem pessoas que eu conheço. Tem pessoas que eu posso sentar, conversar, desabafar. Eu me sinto bem.".8 8 A IURD acolhe indivíduos desviantes dos padrões familiares e de conduta moral da sociedade, como as mulheres chefes de família monoparental, indivíduos de famílias desorganizadas, dependentes químicos, que não ocorrem nas igrejas cristãs mais tradicionais. Após o acolhimento, realizam o trabalho de correção de suas condutas (ALTIVO, 2014). São também esses indivíduos que a assistência qualifica como socialmente vulneráveis e constituem em alvo dos programas. Mas sua relação com a Igreja não foi sempre tranquila. Quando sua mãe, também evangélica, morreu, Clara se revoltou contra a religião: "Eu achava que Deus era culpado por ela ter morrido". Mas, "com o passar do tempo eu comecei a amadurecer", e "veio gente, conversou comigo falou - se a sua mãe veio a falecer não é porque Deus é culpado, é porque chegou a hora dela". Hoje ela conversa com os obreiros; um deles, já um senhor, dá também conselhos para sua filha, "para ela não seguir caminho errado". Alguns obreiros passam na casa de Clara para saber se ela necessita de algo, "eles vêm na minha porta, tem uma que vem na minha porta conversar, saber como eu estou, pergunta como é que estão as minhas crianças". Em contraste, Clara não parece simpatizar com a sua agente de proteção social da mesma forma que simpatiza com os obreiros, apesar desta também realizar visitas domiciliares e acompanhar seus problemas familiares.

A situação de saúde do bebê de Clara a faz sempre correr entre o hospital e a Unidade Básica de Saúde. Sua renda é de 254 reais mensais, sendo 134 reais do PBF. Além disso, ela recebe 120 reais da pensão paga pelo pai de sua filha maior. O pai dos outros três filhos, borracheiro, com quem ela viveu durante sete anos, não lhe envia pensão. Ele saiu da casa de Clara depois de uma briga provocada por ciúmes da filha, que estava gostando de um menino. Depois de ter agredido Clara verbalmente, saiu de casa. Ela não o contrariou, mesmo que dessa vez não tenha sido uma agressão física, como ocorreu cinco ano antes: "a surra que ele me deu não doeu tanto quanto as palavras que ele me falou". Clara foi à delegacia da mulher de Itaquera fazer um boletim de ocorrência contra ele, não somente por causa da agressão, mas porque ele não registrou suas duas filhas; apenas o menino. Clara relatou sobre a situação de foragido e depois de preso, de seu ex-companheiro, como se fosse um acontecimento qualquer:

Ele tinha cometido um delito, ele matou o pai dele porque disse que estava cansado de ver o pai dele espancar a mãe dele, aí ele pegou e matou o pai dele, e estava foragido, e eu não sabia, fiquei sabendo sete anos depois quando ele foi preso. Nessa eu fiquei acompanhando ele no presídio, ia visitar ele uma vez por mês, levava as coisas para ele, e depois dessa eu não valia mais nada. (Clara)

Ele obteve a liberdade provisória, o que o permite agora vir para a casa de Clara "atormentá-la", pois quer reatar a relação. Mas Clara não o quer mais de volta.

SANDRA

A situação de Sandra, cuja mobilidade física tem se tornado limitada nos últimos anos é mais vulnerável quando se consideram as possibilidades de reinserção no mercado de trabalho. Logo que eu e a agente comunitária de saúde Noemi entramos em sua casa, Sandra, católica assídua, perguntou à sua agente, evangélica, se já tinha lido o livro Agape do Padre Marcelo Rossi. Com o livro nas mãos, estava empolgada com os dizeres do padre. Sandra tem 43 anos, é branca, filha de lavrador e dona de casa do estado de Piauí. Seus pais tiveram oito filhos (três meninas e cinco meninos), e Sandra é a do meio. Ela conta que sua infância foi muito difícil porque seu pai teve muitos filhos, e o que ele plantava - feijão, milho, mamona - não era suficiente para alimentar a todos. Sandra morou na fazenda onde seu pai trabalhava até os doze anos de idade; depois, a família mudou-se para a cidade, mas seu pai continuou a trabalhar na roça como assalariado. Sandra estudou num colégio particular que oferecia curso de magistério, e se formou.

Depois de se formar, aos 21 anos, foi contratada por uma escola municipal de uma cidade vizinha, e lá lecionou durante três anos, entre 1989 e 1992. Não conseguiu fazer carreira porque ficava muito nervosa na aula, vomitava e tinha dores de estômago. Pediu demissão (ela não tinha vínculo empregatício formal, como as demais professoras) e veio para São Paulo para fazer exames, ficando hospedada em Diadema, onde morava um dos seus dois irmãos que vieram trabalhar na capital paulista. Seus sintomas foram diagnosticados como os de gastrite nervosa. Sandra permaneceu em São Paulo para realizar o tratamento. Para se sustentar, trabalhou como babá durante quatro anos com carteira de trabalho registrada, residindo no local de trabalho. Em seguida, trabalhou como cuidadora de uma mulher idosa. Nesse interim, Sandra mudou-se para a casa de sua prima, no bairro de Vila Maria, e lá permaneceu cinco anos.

Foi em Vila Maria que Sandra conheceu seu marido, apresentado por uma amiga em comum. Hoje, estão casados há seis anos. Ele se junta à entrevista. É negro, alto e robusto, o que contrasta com a sua timidez. Quando eu lhe fazia perguntas, era quase sempre Sandra que respondia. Luciano é dez anos mais jovem do que ela e seu nível de instrução, inferior (quinto ano do ensino fundamental). Ele veio de Pernambuco quando tinha 21 anos, atrás de emprego. Depois de ter trabalhado numa lavanderia, trabalha como porteiro há seis anos, no período noturno.

Sandra continuou a cuidar da idosa, mas quando engravidou, sua patroa a demitiu. Seu filho, hoje com três anos, nasceu, depois de uma gestação de alto risco, no hospital do bairro. Um ano e meio depois do parto, foi descoberto que Sandra sofria de hérnia de disco, o que tem deteriorado francamente nos últimos meses, limitando cada vez mais sua mobilidade. Hoje é tratada por remédios, e aguarda, há mais de um ano e meio, por sessões de fisioterapia. Mancando, com a perna atrofiada, Sandra praticamente não possui condições físicas adequadas para cuidar do filho sozinha. Ele vai à creche de transporte privado, e quando tem problemas de saúde, Luciano acompanha à Unidade Básica de Saúde-UBS. Ela diz ter crises de ansiedade, chora e sua mão fica fria "de tanto não conseguir sair". Indagado sobre o que faz quando ela tem crises de choro, Luciano diz "eu fico na minha", e espero passar. Ela é acompanhada por psiquiatra da ESF e participa de sessões de terapia de grupo de mulheres oferecido pelo Núcleo de Apoio à Saúde da Família - Nasf - uma vez por semana. Antes, participava de um grupo de artesanato, que a agradava bastante, mas não teve mais como se locomover para um curso. Luciano quer ter mais filhos, mas admite não ser possível em razão do problema de saúde da esposa e de sua idade avançada para uma nova gestação.

Quanto ao arranjo dos afazeres domésticos, é Sandra que assume a maior parte do trabalho, principalmente cotidiano. Dobrando a perna em cima de uma cadeira, ela cozinha, lava, passa, e cuida do filho. Ele faz a limpeza do banheiro e às vezes, da cozinha. Depois de voltar do trabalho, resolve as coisas que devem ser resolvidas fora de casa, como as idas ao banco e compras, e dorme depois do almoço. Depois de passar um tempo com a família, sai para o serviço.

Católica, Sandra ouve as orações do Padre Marcelo Rossi da Renovação Carismática Católica e encontra coragem em suas falas. Afirmou que o best seller do Padre a ajuda muito a diminuir sua ansiedade. Ela diz que é forte, e que não se deixa abater. Seu marido é católico também, mas segundo diz, "ele tem preguiça de pegar".

ROSALINA

A religião ajuda Rosalina na reorganização, em primeiro lugar, de sua própria vida e, em segundo lugar, de sua vida conjugal moderando a atitude do seu marido, antes violento. Ela tem 45 anos, é branca, alta e forte (afirma estar pesando 100 quilos). Sua mãe é pernambucana e seu pai, doze anos mais velho, mato-grossense. Rosalina nasceu no interior de São Paulo, e mais tarde a família se mudou para a capital. Seu pai já tinha uma filha do casamento anterior, que sua mãe criou conjuntamente. Seu pai foi um homem agressivo que batia muito em sua mãe. Da mesma forma, abusou sexualmente de sua filha maior, o que causou a saída dela de casa. Rosalina nunca mais viu sua irmã. Quando Rosalina estava com oito anos, sua mãe fugiu com ela deixando os dois filhos menores, temendo que sua filha fosse abusada como a enteada. A mãe passou a trabalhar como doméstica e morar na residência de seus empregadores, escondendo Rosalina, até ser descoberta pela patroa. Depois disso, Rosalina passou a trabalhar junto com sua mãe. Desde então, sempre trabalhou como empregada doméstica ou faxineira; ela numa família, e sua mãe em outra.

Com 16 anos, Rosalina relacionou-se com uma pessoa e constituiu sua primeira família, dando à luz dois meninos (atualmente com 28 e 25 anos). O relacionamento não durou. Sem condições de criar dois filhos, sua ex-cunhada encarregou-se de criar seu filho maior. Rosalina continuou trabalhando na área de limpeza, dessa vez combinando faxina em residências, de manhã, e numa empresa pública, por intermédio de uma firma terceirizada, à noite. Foi nessa época que teve sua filha Lola de outro relacionamento, também curto. A limitação de conciliar trabalho e família como mãe chefe de família monoparental sem nenhum recurso para conseguir que seus filhos fossem cuidados por adultos resultou num acidente doméstico que fez sua filha perder a visão de um olho. Rosalina julga ter sido uma "mãe má" nesse período difícil, a pressão tendo sido especialmente voltada para o filho de hoje 25 anos. Ela explica sobre o que é ser mãe má, sob o ponto de vista dos valores adquiridos após seu ingresso na igreja evangélica:

Sabe uma pessoa sem Deus, uma pessoa má? Eu não dava o carinho que os meus filhos precisavam, não dava a atenção que os meus filhos precisavam. Eu jogava o meu stress em cima dos meus filhos, então eu era uma mãe ruim; os meus filhos não tinham culpa dos meus problemas e eu despejava em cima principalmente em cima do de 25 anos. Então eu era uma mãe muito agressiva, gritava muito, então era uma mãe ruim. Hoje eu me culpo muito, já pedi perdão pro meu filho várias vezes pelo jeito que eu era. [...] Aí é como eu te falei, depois que eu vim a conhecer realmente o Deus verdadeiro, tirando aquela coisa ruim do meu coração, aquelas coisas ruins mesmo, eu fui me tornando uma pessoa melhor. (Rosalina)

Dois meses depois desse acontecimento, Rosalina conheceu seu marido, Agnaldo, lustrador numa loja de móveis. Para ela, esse encontro foi resultado de muitas orações.

Um certo dia dobrei o joelho na minha cama e falei pra Deus, que Deus colocasse uma pessoa honesta, trabalhadora no meu caminho e que me ajudasse a criar os meus filhos. E pela misericórdia de Deus eu conheci o Agnaldo mais ou menos uns dois meses assim que eu fiz esse pedido pra Deus, e estamos juntos até hoje, isso já tem 18 anos. (Rosalina)

Rosalina diz ter sofrido durante dez anos o alcoolismo e a violência do marido. Era como passar pela mesma experiência de violência doméstica que sua mãe sofreu com o seu pai. (Agnaldo também era 12 anos mais velho do que Rosalina, como a diferença de idade que existia entre seus pais). A presença de Agnaldo em casa causava medo nela e nas crianças: "tudo tinha que estar que nem robozinho". Para Rosalina, sua conversão para a Igreja Universal trouxe um efeito tal que seu marido mesmo sem se converter se transformou para nunca mais aterrorizar a família.

Então começou a se repetir quase a mesma coisa que aconteceu com a minha mãe. E quando eu vim pra cá eu já tive o entendimento de Deus, eu já fui buscar Deus, e hoje, graças a Deus, hoje o Agnaldo é outra pessoa. Ele não vai pra igreja, mas embora tem muita gente que não acredita, mas foi através de muita oração, e foi Deus que fez essa obra na vida dele e vai fazer muito mais porque ele bebia muito, muito. E aí pela misericórdia de Deus ele foi largando a bebida um pouco, hoje ele bebe, mas socialmente, não é de ficar agressivo. (Rosalina)

Na última vez que aconteceu uma agressão doméstica, há oito anos, Rosalina foi para a Delegacia da Mulher. "De lá pra cá ele nunca mais encostou a mão em mim porque ele saiu daqui algemado. É uma pessoa trabalhadora, honesta, mas ele precisava desse susto". A mais recente conquista de Rosalina - "uma grande vitória" - foi o casamento com o seu marido, há quatro anos, que conseguiu com "muito custo", pois do ponto de vista dele, ela não seria digna de usar o seu sobrenome. Para Rosalina, o casamento formal era importante para ser batizada na Igreja Universal; em regime de coabitação, ela seria uma pecadora.

REORGANIZAÇÃO DA VIDA E O PAPEL DA RELIGIÃO E DA ASSISTÊNCIA

Alguns relatos deixam evidente a importância da religião na vida das mulheres. Ela aparece espontaneamente nas expressões das entrevistadas, como um local de conforto e fonte de força, como se viu nas afirmações de Clara e de Sandra. Ela aparece também com um poder reparador e transformador das relações sociais de gênero. À primeira vista, encontramos dificuldade de compreender a razão pela qual Rosalina atribuiu à sua fé a explicação da diminuição da agressão do seu marido, em vez de buscá-la na conquista de um empoderamento que a levou a denunciá-lo à polícia.

De acordo com Linda Woodhead (2002), em certas sociedades (que ela chama de semidiferenciadas, não ocidentais e pós-coloniais) as mulheres se dedicam à religião por nela encontrar a capacidade de renovar - e mesmo realizar "uma revolução delicada" - no espaço privado. Trata-se mais precisamente do Cristianismo Carismático que tem crescido impetuosamente no Brasil, principalmente por meio do aumento dos fiéis das igrejas neopentecostais como a IURD. Seu propósito, longe dos objetivos feministas, não é o de reverter a relação hierárquica de gênero, mas, por submeter as relações conjugais e familiares aos poderes transformadores do Espírito, termina por possibilitar mudanças, podendo até questionar o machismo. Assim, o Cristianismo Carismático, católico ou protestante, oferece "um espaço para as mulheres não só por oferecer-lhes o poder divino do espírito, mas também por converter os homens a posturas menos machistas" (WOODHEAD, 2002, p. 9).

As mulheres da camada popular parecem aderir a tal vertente religiosa, pois não as incita a questionar a superioridade masculina, evitando a tensão conjugal, e lhes permite ao mesmo tempo "docilizar" o homem (a violência é condenada) e construir um lar respeitável onde as funções de gênero são exercidas conforme a "moral dos pobres". Nesse sentido, as religiões cumprem um papel normatizador para as mulheres e homens da camada pobre que buscam a respeitabilidade social. Os papeis conservadores de gênero são principalmente reforçados nas religiões de cunho neopentecostal, na normatização da função feminina como "cuidadora espiritual do lar" (BIRMAN, 1996). O neopentecostalismo passou a ser a nova instituição de referência para muitos moradores da periferia urbana, por saber lidar com a reorganização da vida (depois de um processo migratório, ou uma crise familiar, por exemplo) e da sobrevivência deste, e mais especificamente por saber tratar as questões privadas que dizem respeito a vícios, relações conjugais e sexualidade (MARIANO, 2012; MACHADO, 2005; COUTO, 2002).9 9 A ascensão dos evangélicos (ultrapassando 22% da população, segundo o Censo 2010) coincide com a institucionalização dos movimentos sociais na era pós-1988 e o declínio da Teologia da Libertação. Atuando como militantes dos clubes de mães e do movimento pela saúde, as mulheres da periferia "descobriram" a política entre os anos 1970 e 1990, passando a ser sujeitos das reivindicações por direitos (SADER, 1995). Porém a institucionalização dos movimentos sociais e a crise proveniente da restruturação produtiva ao longo dos anos 1990 fragilizou as mobilizações comunitárias, dando brecha para o crescimento dos evangélicos. Assim, podemos relacionar a coragem que Rosalina encontrou para denunciar seu marido à participação na religião que a levou a se tornar uma agente de transformação dentro do lar. Ela não tinha a intenção de modificar a relação com o marido, mas queria lhe "dar um susto" iniciativa que modificou definitivamente a postura dele e tornou o ambiente menos tenso dentro da família.

Podemos entender que a religião organiza a vida conjugal e familiar das mulheres assistidas para que possam exercer o papel de "boa" esposa e mãe, em contraponto às trajetórias familiares de origem que foram, em grande medida, sentidas como fracasso, marcadas pela separação (como foi o caso de Clara, Iara, Jessica, Rosalina, Valéria), solidão (Clara e Rosalina) e violência (Clara e Rosalina). Ao manter a ordem social de gênero esperada para a classe trabalhadora, elas constroem para elas uma vida familiar com laços sólidos e digna de respeito.

Ao mesmo tempo em que o status de esposa e mãe é importante para a dignidade das mulheres, tal posição social as coloca em profunda desigualdade em relação aos seus parceiros em termos econômicos e sociais. Contudo, desafiar e transgredir a ordem social e moral estabelecida aos gêneros encontra obstáculos impostos em primeiro lugar pelos parceiros, como foi possível observar a partir das dificuldades das irmãs Valéria e Vanessa para lograr uma ocupação produtiva. Da mesma forma, o fato de não haver mais ninguém que possa substituir a tarefa doméstica das mulheres faz com que elas assumam o "trabalho inestimável" do cuidado, ou trabalho incontornável, pois alguém tem que fazer, gostem elas ou não. Nessa limitação que as mulheres encontram em termos de mobilidade, espacial, social e econômica, alguns setores vêm lhes oferecer o espaço legítimo da fala e da escuta. A religião é um deles, por meio das idas à igreja e do contato com os obreiros. Da mesma forma, embora não com a mesma intensidade da religião, os novos programas assistenciais e outros espaços de assistência fornecem também um lugar legítimo de atuação feminina onde elas podem receber orientações dos trabalhadores sociais em domicílio e sair de casa pra frequentar as oficinas e outras atividades socioeducativas. São, porém, espaços que reproduzem as relações sociais de gênero baseadas na divisão sexual do trabalho. De modo concomitante, os programas de transferência de renda fazem com que as mulheres pobres possuam um capital social a mais, o de serem titulares do benefício do Estado. Isso é apreciado pelos membros da família, principalmente os maridos (como os de Valéria e Vanessa), que preferem que sua esposa permaneça em casa em vez de trabalhar fora de casa.

CONCLUSÃO

A pesquisa qualitativa com sete mulheres assistidas revelou que elas possuem significativa agência para construir uma família respeitável, rompendo com o seu passado difícil; mas essa construção é frustrante porque a rígida divisão sexual do trabalho, assim como a limitação de suas qualificações não permitem que possam se realizar como indivíduos, algo que passa a ser caro para elas também, na semelhança com as mulheres da classe média. Assim, a conquista de uma família respeitável tanto aos olhos do Estado como da religião vem acompanhada da renúncia, porém não definitiva, das atividades não reprodutivas como os estudos, a formação e o trabalho. Nessa lógica baseada na divisão sexual do trabalho, com o respaldo das religiões de cunho neopentecostal dominantes entre a camada pobre, a distância em termos de autonomia econômica e social em relação ao cônjuge se amplia na medida em que o tempo passa, levando a uma dependência cada vez maior das mulheres em relação ao companheiro. Elas enfrentam o dilema de permanecer no lugar esperado e transgredir, ora pela via de uma "reforma" nas relações conjugais por meio da religião, ora por via de busca de estratégias por canais institucionais oferecidos pelos programas sociais, ora via enfrentamento e rompimento do casamento ao custo de permanecer sozinhas com seus filhos.

Na lógica da moral dos pobres, o trabalho das mulheres em vida conjugal nunca deve ser prioridade, mas deve apenas complementar a o trabalho doméstico. A assistência social contemporânea, prevista na Política Nacional de Assistência Social - PNAS - , tem como princípio a garantia dos direitos dos cidadãos, intervindo nas suas situações de risco de violação (MDS). No entanto, não considera o exercício do trabalho das mulheres um direito, o que dá lugar à problematização sobre a imposição da divisão sexual do trabalho como violação do direito ao trabalho das mulheres.

Recebido em: junho 2014

Aprovado para publicação em: 2014

O artigo baseia-se na pesquisa de pós-doutorado da autora, realizada no Centro de Estudos da Metrópole - CEM - , entre 2009 e 2011, com financiamento do Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp.

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  • ______. Decreto n. 7.492, de 2 de junho de 2011. Institui o Plano Brasil Sem Miséria. Brasília, DF, 2011.
  • ______. Ministério da Saúde. Atenção básica e a saúde da família Brasília, DF, s.d. Disponível em: <http://dab.saude.gov.br/atencaobasica.php>. Acesso em: jan. 2014.
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  • Família, trabalho e religião das mulheres assistidas em São Paulo

    Family, work and religion of women in social programs at São Paulo
  • 1
    Criado em 1994 como Programa Saúde Família - PSF - , o ESF é um serviço que promove a prevenção e a identificação de doenças, assim como a educação sanitária (OLIVEIRA, 2004, p. 47). O serviço é oferecido nas Unidades Básicas de Saúde por meio de equipes médicas constituídas por um(a) médico(a), um enfermeiro(a), dois(duas) auxiliares de enfermagem e cinco agentes comunitários(as) de saúde (BRASIL, s.d.).
  • 2
    O Bolsa Família é um programa de transferência de renda, instituído em 2004, destinado a famílias com renda igual ou menor a 70 reais
    per capita. Em contrapartida, os responsáveis pelo recebimento da renda devem cumprir as condicionalidades nas áreas da saúde, educação e assistência social (BRASIL, 2004).
  • 3
    Criado em 2004, o PAIF visa a auxiliar as famílias em situação de vulnerabilidade social na rede socioassistencial em espaços denominados Centros de Referência de Assistência Social - CRAS - , cujas atribuições foram definidas na Resolução n. 109 do Conselho Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2009). De modo semelhante à ESF, opera com uma equipe de profissionais especializados na área de assistência social como assistentes sociais e psicólogos(as).
  • 4
    O Plano Brasil Sem Miséria foi instituído em 2011 para combater a extrema pobreza. Por meio de uma concepção multidimensional da pobreza e realizando uma busca ativa, adota três eixos de intervenção: garantia de renda, acesso aos serviços públicos e inserção produtiva. O Programa Brasil Carinhoso integra o eixo garantia de renda e realiza transferências monetárias às famílias com crianças e adolescentes (BRASIL, 2011).
  • 5
    A pesquisa de campo foi realizada entre abril de 2010 e junho de 2011, em parceria com Isabel Georges, do Institut de Rercherches pour le Dévelopement - IRD - e Universidade Federal de São Carlos - UFSCar.
  • 6
    O conceito de vulnerabilidade social tem sido empregado na recente construção do regime de proteção social pelo Estado brasileiro em geral e pelo Município de São Paulo, especificamente. Baseia-se no entendimento de que a pobreza compreende dimensões de carência que não se limitam ao nível de renda, mas incluem também o acesso à educação, saúde, moradia e outros direitos sociais.
  • 7
    Para alguns pode ocorrer uma confusão entre o Programa Bolsa Família e o Programa de Renda Mínima do município de São Paulo, mas, segundo Vanessa, ela recebe o Bolsa Família.
  • 8
    A IURD acolhe indivíduos desviantes dos padrões familiares e de conduta moral da sociedade, como as mulheres chefes de família monoparental, indivíduos de famílias desorganizadas, dependentes químicos, que não ocorrem nas igrejas cristãs mais tradicionais. Após o acolhimento, realizam o trabalho de correção de suas condutas (ALTIVO, 2014). São também esses indivíduos que a assistência qualifica como socialmente vulneráveis e constituem em alvo dos programas.
  • 9
    A ascensão dos evangélicos (ultrapassando 22% da população, segundo o Censo 2010) coincide com a institucionalização dos movimentos sociais na era pós-1988 e o declínio da Teologia da Libertação. Atuando como militantes dos clubes de mães e do movimento pela saúde, as mulheres da periferia "descobriram" a política entre os anos 1970 e 1990, passando a ser sujeitos das reivindicações por direitos (SADER, 1995). Porém a institucionalização dos movimentos sociais e a crise proveniente da restruturação produtiva ao longo dos anos 1990 fragilizou as mobilizações comunitárias, dando brecha para o crescimento dos evangélicos.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Set 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2014

    Histórico

    • Aceito
      2014
    • Recebido
      Jun 2014
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