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POLIFONIA EM ENUNCIADOS NEGATIVOS: VOZES QUE HABITAM O DIZER "NÃO"

Polyphony in Negative Utterances

Resumos

O presente artigo centra-se na análise de um questionário aplicado, por ocasião de um programa de treinamento, a um grupo de trabalhadores responsáveis pela supervisão das atividades de operários numa fábrica de produção de pneus situada no Brasil. O questionário deveria revelar o "estilo de liderança" exercido por cada chefe de equipe, sendo consideradas cinco diferentes possibilidades: os estilos autocrata, demagógico, demissionário, mediador e participativo. O perfil participativo é visto pelo autor do questionário como "o mais adequado", uma vez que promoveria a conciliação entre os objetivos pessoais dos operários e os objetivos industriais. Com base numa concepção polifônica dos enunciados negativos, a análise realizada permitiu concluir que, além dos cinco estilos previstos no questionário, um sexto perfil se deixa entrever, o qual parece coincidir com" a voz da empresa". A presença desse sexto perfil explicita a pluralidade e complexidade dos saberes que se atualizam no contexto das interações em situação de trabalho.

Polifonia; Discurso; Questionário; Negação; Interação


This paper focuses on the analysis of a written questionnaire administered to a group of foremen working in a tyre factory in Brazil. The questionnaire is designed to reveal the" style of leadership" carried out by each member of the group, among five possible variants: autocratical, demagogical, resigning, mediative and participative. The participative profile is seen by the author of the questionnaire as "the adequate one", in as much as it harmonises workmen’s personal and organisational interests. On the basis of a polyphonic conception of negative utterances the case is made for a more complex view of the questionnaire: beyond the five profiles critically antecipated, a sixth one is contemplated, which seems to coincide clearly with what we call "the voice of the organisation", putting forward different kinds of knowledge in the context of interactions at work.

Polyphony; Discourse; Questionnaire; Negation; Interactio


POLIFONIA EM ENUNCIADOS NEGATIVOS: VOZES QUE HABITAM O DIZER "NÃO"

(Polyphony in Negative Utterances)

Décio Orlando Soares da ROCHA

(Universidade do Estado do Rio de Janeiro)

ABSTRACT: This paper focuses on the analysis of a written questionnaire administered to a group of foremen working in a tyre factory in Brazil. The questionnaire is designed to reveal the "style of leadership" carried out by each member of the group, among five possible variants: autocratical, demagogical, resigning, mediative and participative. The participative profile is seen by the author of the questionnaire as" the adequate one", in as much as it harmonises workmen’s personal and organisational interests. On the basis of a polyphonic conception of negative utterances the case is made for a more complex view of the questionnaire: beyond the five profiles critically antecipated, a sixth one is contemplated, which seems to coincide clearly with what we call "the voice of the organisation", putting forward different kinds of knowledge in the context of interactions at work.

RESUMO: O presente artigo centra-se na análise de um questionário aplicado, por ocasião de um programa de treinamento, a um grupo de trabalhadores responsáveis pela supervisão das atividades de operários numa fábrica de produção de pneus situada no Brasil. O questionário deveria revelar o "estilo de liderança" exercido por cada chefe de equipe, sendo consideradas cinco diferentes possibilidades: os estilos autocrata, demagógico, demissionário, mediador e participativo. O perfil participativo é visto pelo autor do questionário como "o mais adequado", uma vez que promoveria a conciliação entre os objetivos pessoais dos operários e os objetivos industriais. Com base numa concepção polifônica dos enunciados negativos, a análise realizada permitiu concluir que, além dos cinco estilos previstos no questionário, um sexto perfil se deixa entrever, o qual parece coincidir com" a voz da empresa". A presença desse sexto perfil explicita a pluralidade e complexidade dos saberes que se atualizam no contexto das interações em situação de trabalho.

Palavras-Chave: Polifonia; Discurso; Questionário; Negação; Interação.

Key Words: Polyphony; Discourse; Questionnaire; Negation; Interactio.

0. Introdução

O presente trabalho tem por objetivo analisar a função desempenhada por enunciados negativos na produção do sentido de um texto. Entendida como mecanismo explicitador da polifonia no discurso, a negação constituirá o eixo central de análise do corpus escolhido: um questionário destinado a responsáveis por equipes que trabalham diretamente na produção de pneus (denominados chefes de equipe) em uma indústria situada na região sudeste do Brasil. Tal questionário, que reproduzimos em anexoanexo1 ( ) Eu não gosto de traçar objetivos e por isso espero que me dêem objetivos precisos e bem definidos para que eu possa transmitir aos meus subordinados. 2 ( ) Eu dedico muita atenção em dosar minhas informações em função da personalidade de cada um, de modo que a mensagem seja aceita sem que se criem problemas. 3 ( ) Eu aprendi e sei respeitar uma ordem, portanto, quero que meus subordinados executem perfeitamente as minhas ordens. 4 ( ) Eu faço conscienciosamente o meu trabalho, sem, necessariamente, passar nisso mais tempo que os outros, pois de nada serve querer fazer mais que todo mundo. 5 ( ) Quando há um conflito, eu tento colocar frente-a-frente as partes opostas para "drenar o abscesso" e chegar as verdadeiras soluções. 6 ( ) Aceito as decisões das outras pessoas e evito fazer comentários para não suscitar problemas com as pessoas. 7 ( ) Eu não busco a organização perfeita que conciliaria os imperativos de trabalho e a qualidade das relações humanas, porque essa organização ideal não existe. 8 ( ) Eu tomo cuidado em manter as boas relações entre meus subordinados, porque o que eles buscam, acima de tudo, é um bom ambiente de trabalho. 9 ( ) Qualquer formação deve ser um "investimento com retorno" e deve traduzir-se por uma melhoria das capacidades técnicas. Os resultados devem ser acompanhados e controlados com rigor. 10 ( ) Os objetivos de Formação devem ser negociados com os homens. A Formação deve fornecer aos homens os meios para melhor atingir os objetivos industriais. Os resultados devem ser comentados entre chefe e subordinado. 11 ( ) Eu tento eliminar ao máximo as causas de descontentamento de meus subordinados e despertar cada vez mais o interesse deles pelo trabalho. 12 ( ) Eu evito questionar a funcionalidade da organização para não criar problemas na rotina do trabalho. 13 ( ) Nas minhas decisões, eu dedico atenção ao equilíbrio entre o lado técnico e o lado da aplicação pelos homens. Eu busco decisões viáveis, ainda que imperfeitas, sempre reservando uma margem de segurança. 14 ( ) Eu procuro apaziguar qualquer conflito que surge, e depois reconciliar as pessoas que se afrontaram para manter o clima de boa paz necessário ao bom andamento do serviço. 15 ( ) Eu me entrego e me dedico muito ao meu trabalho, pois o responsável deve dar o exemplo, sendo sempre o mais ativo e o mais competente de sua equipe. 16 ( ) Eu comando mostrando o meu compromisso com sucesso do trabalho, de maneira que meus subordinados se sintam atraídos e levados à ação. 17 ( ) Junto com as informações que eu devo transmitir, eu dou as explicações necessárias para que as pessoas compreendam. 18 ( ) Eu próprio determino os principais objetivos da equipe e os distribuo entre meus subordinados, para que eu tenha certeza de que estamos trabalhando no sentido dos objetivos da Empresa e que eu possa tirar de cada um o máximo de eficácia. 19 ( ) Eu passo as informações que devo transmitir sem fazer muitos comentários e sem abrir discussão para não ficar inseguro em relação ao pessoal. 20 ( ) Eu comando da maneira maisobjetiva possível, fazendo cumprir as diretrizes e o regulamento, dentro de minha equipe de trabalho, sem assumir a responsabilidade pelo conteúdo dessas normas, porque não fui eu quem as redigiu. 21 ( ) Eu faço tudo para estar disponível aos meus subordinados e poder ajudá-los, porque eles têm sempre uma grande carga de trabalho e problemas difíceis. 22 ( ) Como, num conflito, raramente uma só pessoa tem toda a razão, eu chamo separadamente as duas partes para chegar-se a uma solução aceitável por todos. 23 ( ) Quando eu tomo uma decisão, é porque eu conheço o problema e, como é a minha autoridade que está em jogo, eu tomo o cuidado de explicá-la para que ela seja bem compreendida. 24 ( ) Como eu quero que minha organização seja um meio eficaz para atingir nossos objetivos, eu a coloco em prática junto com aqueles que terão que fazê-la funcionar. 25 ( ) Eu supervisiono, ficando o máximo de tempo possível perto de meus subordinados, porque é difícil obter bons resultados se o chefe não está o tempo todo presente para fazer com que o trabalho seja realizado. 26 ( ) Eu envio meus subordinados para fazer formação pelo menos uma vez por ano. Assim, não tenho problemas com ninguém. 27 ( ) Eu discuto com cada um dos meus subordinados sobre a parcela que ele pode realizar dentro dos objetivos globais da Empresa, em função do que lhe interesse e mais o estimule. 28 ( ) Na posição de responsável, sou eu quem dá todas as instruções a fim de que cada um saiba o que ele tem a fazer. 29 ( ) Eu raramente dou ordens, pois prefiro dar um conselho ou pedir um favor de maneira que meus subordinados sintam um compromisso pessoal com minha maneira de relacionar-me com eles. 30 ( ) Eu tomo o cuidado de passar aos Serviços de Apoio os problemas que são ligados a eles, para evitar assumir trabalhos que não sejam da minha estrita competência, mesmo que eu já saiba de antemão como resolvê-los. 31 ( ) Quando ocorre conflito, tento suprimi-lo ou fazer prevalecer a minha posição. 32 ( ) Tomo muito cuidado para que minhas decisões sejam aceitáveis pelos meus subordinados, para que eles não se sintam incomodados com as mesmas. 33 ( ) Eu faço questão de ter uma boa organização porque, é a única maneira de obter o máximo possível dos homens e do material. 34 ( ) Eu procuro dar a cada um a possibilidade de expandir-se em seu trabalho para obter de todos um bom resultado estimulando-os a atingir seus objetivos. 35 ( ) A formação é necessária para o progresso da Empresa e dos homens que a compõem. Ela facilita a tarefa do chefe e dá a todos as mesmas oportunidades. 36 ( ) Para poder dar à minha equipe objetivos que sejam realistas, eu procuro conhecer as previsões da Empresa e adaptá-las às possibilidades reais de meus colaboradores. 37 ( ) Quando eu passo uma informação, tento fazer com que compreendam o ponto de vista da Empresa, mas eu tento também suscitar a discussão. 38 ( ) Eu acho que no mundo atual não se pode mais dar ordens, então eu prefiro orientar sobre o trabalho de meus subordinados, dando-lhes indicações sobre o objetivo a atingir. 39 ( ) Eu não procuro trabalhar mais ou menos que os meus subordinados ou colegas, o que eu procuro é atingir os objetivos com a minha equipe. 40 ( ) Eu faço tudo para evitar os conflitos e, se surge algum, tento manter-me neutro ou não me envolver. 41 ( ) Para que elas sejam criativas e estimulantes, as decisões que eu tomo são o resultado de uma reflexão com aqueles que vão colocá-las em prática. 42 ( ) Eu trabalho para evoluir nossa organização para que ela esteja mais ao serviço dos homens, de modo que a melhoria das relações e do ambiente leve a uma melhoria do trabalho. 43 ( ) Eu peço que o Depto de Pessoal estude bem o salário de meus subordinados, porque, no fundo, as pessoas só vêm trabalhar pelo dinheiro e pela estabilidade do seu emprego. 44 ( ) É preciso dar às pessoas todo o tempo necessário para realizar sua formação para responder à sua expectativa de formação. 45 ( ) Eu atribuo aos meus subordinados a iniciativa e a responsabilidade de definir seus objetivos porque acho que eles aceitariam mal o fato de se mobilizarem por objetivos que não venham deles mesmos. , é parte integrante de uma apostila utilizada em programa de treinamento realizado pela empresa no primeiro semestre de 1993, tendo sido submetido aos referidos chefes de equipe, com o objetivo de proceder ao levantamento do "estilo de liderança" por eles exercido. Inscrevendo-se, deste modo, no campo de investigação das práticas de linguagem em situação de trabalho, nossa preocupação estará voltada para o papel exercido pelas estratégias discursivas no que diz respeito a uma necessidade básica das organizações: conhecer (e controlar?) os diferentes saberes construídos acerca dos fatos que dizem respeito ao cotidiano da empresa pelos um de seus segmentos– saberes estes que se encontram associados à natureza das relações sociais de trabalho.

1. Caracterização e interesse do corpus

O questionário com o qual trabalhamos é formado de 45 enunciados, sendo 5 enunciados para cada um dos 9 "temas" escolhidos para se traçar o perfil de liderança do chefe de equipe. Tal distribuição em temas é explicitada na própria grade de levantamento das respostas que acompanha o questionário, na qual figuram as seguintes rubricas: OBJETIVOS, INFORMAÇÃO / COMUNICAÇÃO, COMANDO, ATIVIDADE, CONFLITOS, DECISÃO, ORGANIZAÇÃO, MOTIVAÇÃO, FORMAÇÃO.

Objetivando a caracterização do perfil de liderança exercida pelo chefe de equipe, o questionário é introduzido com as seguintes instruções: o chefe de equipe é solicitado a indicar, nos parênteses que precedem cada um dos 45 enunciados, o seu grau de adesão ao conteúdo de cada enunciado (numa escala de 0 a 3, na qual 0 representaria a rejeição absoluta do conteúdo do enunciado, 1 a adesão em grau mínimo, 2 a adesão parcial e 3 a adesão total). Esta é, inclusive, a razão pela qual decidimos incluir o corpus com o qual trabalhamos na categoria questionário: através do dispositivo acima descrito, estabelece-se um" diálogo sub-reptício" com os chefes de equipe. A título de ilustração do que expomos, consideremos duas possibilidades diferentes de "resposta" diante do seguinte enunciado:

Quando ocorre um conflito, tento suprimi-lo ou fazer prevalecer a minha posição.

Tendo em vista o referido enunciado, ao chefe de equipe que, manifestando seu grau de adesão, optasse por assinalar 3, seria "dito":" se você dá adesão total ao que se expressa neste enunciado, então seu perfil enquanto chefe de equipe é do tipo x". Diferente seria a" resposta", na hipótese de o chefe de equipe optar por 0: "se você rejeita totalmente o conteúdo do enunciado, então seu perfil enquanto chefe de equipe distancia-se de x, devendo estar mais próximo de um outro perfil qualquer".

Ao final do preenchimento do questionário, é solicitado a cada chefe de equipe que proceda à soma dos escores obtidos em cada uma das 5 colunas verticais (cada coluna correspondendo a um dado "estilo de liderança"). Quanto maior for o somatório de uma dada coluna, maior será a afinidade do chefe de equipe com o referido estilo de liderança, sendo os resultados registrados sob a rubrica totais. Esclarecemos ainda que, no referido treinamento de pessoal em que o questionário foi aplicado, garantiu-se sigilo absoluto dos resultados obtidos por cada chefe de equipe, sendo divulgado apenas um "perfil geral de toda a equipe de chefes" (somatório dos resultados individuais obtidos).

Quais seriam os 5 estilos de liderança considerados no referido questionário? Desde já esclarecemos que é somente após o preenchimento do questionário que o chefe de equipe tomará conhecimento da existência dos cinco diferentes perfis, tendo em vista a necessidade de que este não se deixe influenciar pelos critérios utilizados para a categorização de suas respostas. Um documento acompanhando o questionário definirá da seguinte forma estes 5 perfis, sendo indicados os enunciados referentes a cada perfil:

  • perfil Autocrata: considera antagônicos os objetivos individuais e os interesses industriais (enunciados 03, 09, 15,18, 23, 25, 28, 31, 33);

  • perfil Empático ou Demagogo: privilegia os interesses individuais, em detrimento dos objetivos industriais (enunciados 02, 08, 14, 21, 29, 32, 42, 44, 45);

  • perfil Mediador: atende apenas parcialmente a ambos os objetivos, uma vez que procura uma "solução mediana" (enunciados 04, 07, 11, 13, 17, 22, 35, 36, 38);

  • perfil Demissionário: procura, acima de tudo, uma situação que lhe seja pessoalmente satisfatória (enunciados 01, 06, 12, 19, 20, 26, 30, 40, 43);

  • perfil Participativo: esforça-se no sentido de fazer convergirem os interesses pessoais e os industriais (enunciados 05, 10, 16, 24, 27, 34, 37, 39, 41).

Como estratégia para a composição do questionário, os 45 enunciados, além de se apresentarem misturados, são sempre construídos em 1a pessoa do singular (eu). Deste modo, os 5 perfis, estrategicamente "igualados" sob a máscara deste eu polifônico, seriam passíveis de distinção apenas pelas posições que assumem com relação aos 9 temas presentes no questionário. Tal procedimento vem atender a uma dupla exigência: por um lado, criar a ilusão de que seu destinatário (o chefe de equipe) estaria diante de um único locutor, com o qual concordaria ou não; por outro, camuflar a presença do autor do questionário, que exercerá posteriormente a função de "juiz" de cada um dos perfis atualizados pelos vários chefes de equipe, devendo, por esta razão, evitar qualquer pista indicativa de sua possível adesão a um dos cinco perfis esboçados.

Cabe ainda ressaltar que, entre os 5 estilos de liderança considerados, os responsáveis pela elaboração do questionário valorizam como" perfil ideal" o Participativo, que corresponderia ao estilo que, com maior habilidade, conseguiria conciliar os objetivos pessoais dos subordinados e os objetivos industriais da empresa, promovendo, deste modo, um estado de harmonia entre a empresa e seus funcionários.

Se é certo que o perfil Participativo corresponde ao perfil valorizado enquanto "estilo de liderança desejável", é igualmente certo que não podemos dispor de quaisquer informações acerca de questões como as que se seguem: o que se entende por "convergência de objetivos industriais e pessoais", tal como é apresentada na descrição do perfil Participativo? em que sentido os demais perfis" fracassariam" na promoção de tal convergência? por que razão a escolha de cinco perfis distintos? que distância separaria cada um dos estilos de liderança apresentados? o que haveria em comum entre os mesmos?

Se tais questões nos parecem revestir-se de um significado especial, isto se deve, pelo menos em parte, a uma das características do próprio questionário: a presença de dois perfis construídos predominantemente através de enunciados afirmativos (perfis Autocrata e Participativo) e de três perfis em cujos enunciados a ocorrência de formas negativas é mais freqüente (perfis Mediador, Demissionário e Demagogo). Tais marcas de negação constituirão uma pista relevante em nossa análise, no que concerne à construção do sentido de tais discursos.

2. Problema e hipótese de trabalho

Como elemento norteador de nossa investigação, formulamos os seguintes problemas de pesquisa:

  • que tipo de relações se estabelecem entre os 5 perfis de liderança traçados?

  • quais as possibilidades e os limites do questionário com o qual trabalhamos enquanto instrumento de apreensão de um saber que se constrói através da linguagem?

Desde já percebemos que as questões ora formuladas trazem em seu bojo uma certa desconfiança com relação ao que é dito no documento de treinamento, a saber, que os 5 perfis variariam unicamente em função da maior ou menor possibilidade de promoverem a convergência entre os objetivos da empresa e os objetivos pessoais. Acreditamos que as relações estabelecidas entre tais perfis sejam na realidade bem mais complexas, o que nos leva à formulação das seguintes hipóteses:

  • os cinco perfis de liderança traçados no questionário estabelecem entre si relações de aliança/oposição que poderemos recuperar através dos enunciados negativos;

  • tais relações de aliança/oposição possibilitarão um acesso às representações que a empresa tem de si mesma e da função de chefia de equipe.

3. Fundamentação teórica: negação e polifonia

No tratamento que dispensaremos aos enunciados negativos, partiremos da posição sustentada por Ducrot (1980), segundo a qual um enunciado do tipo não-p representaria dois atos ilocutórios: por um lado, a afirmação de p por parte de um enunciador E1 que se dirige a um destinatário D1; por outro, a recusa de p, assumida por um enunciador E2 dirigindo-se a um destinatário D2. Para sustentar sua argumentação, Ducrot recorre à própria concepção psicanalítica de negação:

Pour Freud, un énoncé non-p est une sorte de travestissement utilisé pour dire, malgré la censure exercée par le surmoi, un p correspondant à une pensée inconsciente et interdite... (Ducrot, 1980: 50.)

O autor especifica ainda algumas relações que se estabelecem no embate entre enunciador e destinatário: E1 e E2 são necessariamente pessoas diferentes; E2 identifica-se normalmente com o locutor; D2 identifica-se normalmente com o alocutário; E1 pode identificar-se com o alocutário, o que conferirá uma certa agressividade à negação sustentada por E2.

Concebendo, deste modo, o enunciado negativo como uma espécie de" diálogo cristalizado", no qual a produção de um sentido dependeria da explicitação de E1 (o responsável pelo enunciado afirmativo subjacente), Ducrot justifica a posição que assume: haveria uma dissimetria entre enunciados negativos e afirmativos, uma vez que a afirmação estaria implícita na negação de um modo muito mais fundamental que a negação na afirmação, segundo verificamos através do encadeamento de enunciados negativos e afirmativos com a expressão ao contrário. A título de exemplo, consideremos o seguinte enunciado:

Pedro não é baixo; ao contrário, é bem alto.

Como se percebe, "é bem alto" exprimiria uma relação de oposição não a "Pedro não é baixo", mas à afirmativa implícita em tal negação (a saber, a afirmação "Pedro é baixo").

O tratamento conferido por Ducrot à negação sofreu algumas reformulações com o tempo. Em Dire et ne pas dire e em Provar e dizer, eram considerados dois tipos de enunciados negativos: os que implicavam a rejeição de uma afirmativa prévia (negação "polêmica" ou "metalingüística") e os que simplesmente apresentavam uma dada realidade, sem qualquer objetivo de" contradizer" uma afirmativa implícita (negação descritiva). Como se percebe, a própria classificação fornecida pelo autor excluía a negação descritiva do âmbito de uma teoria polifônica.

Foi com o propósito de conciliar sua abordagem dos enunciados negativos com uma visão polifônica da linguagem que Ducrot procedeu a uma revisão teórica do fenômeno, passando a subdividir a antiga negação polêmica em dois tipos distintos (a que denominou negação metalingüística e negação polêmica), redefinindo o conceito de negação descritiva. Em O dizer e o dito, o quadro teórico passa a ser o seguinte: a negação metalingüística coloca em cena um locutor responsável pelo enunciado positivo implícito, agindo sobre seus pressupostos (como seria o caso de "Ela não parou de fumar; na realidade, ela jamais fumou"); a negação polêmica se define como sendo a que coloca em cena não um locutor, mas um enunciador responsável por uma afirmativa virtual implícita; a negação descritiva passa a ser caracterizada como um derivado delocutivo da negação polêmica.

Para finalizar, retomamos uma das contribuições de H. Nølke a respeito da questão. Assumindo que toda negação é essencialmente polêmica, o autor admitirá, contudo, a possibilidade de o contexto exercer um papel relevante na interpretação dos enunciados negativos. Desse modo, o contexto pode efetivamente autorizar uma leitura descritiva de um enunciado negativo. Com efeito, um enunciado como "O muro não é branco" figurando num guia turístico (cuja finalidade é apresentar, descrever uma certa ambiência) seria mais provavelmente interpretado como descritivo, ficando a possibilidade de uma leitura polêmica bastante remota em tal contexto. A referida leitura descritiva do enunciado negativo é resultante de uma derivação descritiva: há contextos que, promovendo o apagamento do enunciado positivo subjacente, isto é, bloqueando a atualização do ponto de vista que desencadearia uma leitura polêmica da negação, favorecem tal derivação.

Em nosso trabalho, não pretendemos investigar qual seria o tratamento mais adequado para a questão: existência de um único tipo de negação sujeito a leituras variadas ou tipos diferenciados de enunciados negativos? Assumiremos, no entanto, que o contexto de ocorrência de um enunciado negativo pode efetivamente representar um fator relevante para sua interpretação como predominantemente descritivo ou polêmico1 1 Tendo em vista a natureza do corpus sobre o qual trabalhamos (questionário destinado à identificação do estilo de liderança predominante, entre vários perfis possíveis), assumiremos como preferentemente polêmicos os enunciados negativos localizados no referido contexto. .

4. Levantamento dosdados

Conforme anunciado anteriormente, procederemos ao levantamento dos enunciados negativos no discurso dos cinco locutores2 2 Ao falarmos de locutor, referimo-nos aos 5 perfis que se alternam na produção dos 45 enunciados que totalizam o questionário. na seguinte ordem: locutores cujos enunciados são predominantemente afirmativos (perfis Autocrata e Participativo); locutores cujos enunciados apresentam uma maior incidência da negação (perfis Mediador, Demissionário e Demagogo).

Antes, porém, justificaremos os critérios que adotamos para o levantamento dos enunciados negativos em nosso corpus. Aos enunciados construídos com o operador não (marca lingüística inequívoca de negação), propomos ainda acrescentar em nossa análise enunciados em que figuravam as seguintes marcas: verbo evitar (+complemento oracional), raramente, nada, sem (+infinitivo) ou sem que (+subjuntivo). A razão de tal inclusão explica-se pelo fato de tais marcas funcionarem como verdadeiros elementos de negação, como se pode verificar através do teste preconizado por Ducrot (encadeamento com ao contrário):

  • Ele

    evita falar em público; ao contrário, permanece quase sempre calado.

  • Ele

    raramente fala em público; ao contrário, permanece quase sempre calado.

  • Ele

    nada disse em público; ao contrário, permaneceu calado.

  • Ele esteve presente

    sem falar em público; ao contrário, permaneceu calado.

  • Ele compareceu

    sem que falasse em público; ao contrário, permaneceu calado.

Em todos os exemplos acima relacionados, o enunciado introduzido pela expressão ao contrário opõe-se não ao que é dito anteriormente, mas a uma afirmativa que lhe estaria implícita: com efeito, o fato de o personagem permanecer quase sempre calado opõe-se não a "evita falar em público" ou "raramente fala em público", mas à afirmativa implícita segundo a qual o referido personagem tomaria a palavra em público.

Concluídas estas observações preliminares, passemos ao exame dos enunciados negativos em nosso corpus.

4.1 Perfis predominantemente afirmativos

4.1.1. Perfil Autocrata:

Entre os 9 enunciados que compõem o estilo de liderança autocrata, há apenas uma ocorrência de enunciado negativo (enunciado 25, referente ao tema MOTIVAÇÃO):

Eu supervisiono, ficando o máximo de tempo possível perto de meus subordinados, porque é difícil obter bons resultados se o chefe não está o tempo todo presente para fazer com que o trabalho seja realizado.

Considerando especificamente o trecho em que aparece a negação no enunciado acima, submetêmo-lo ao teste preconizado por Ducrot (encadeamento com a expressão ao contrário). Para fins de maior clareza, procedemos a uma reformulação do enunciado negativo, eliminando a estrutura condicional verificada no enunciado original. Teríamos, pois:

Para obter bons resultados no trabalho, o chefe não deve (não pode) ausentar-se. Ao contrário, deve permanecer o tempo todo presente.

Como percebemos, o encadeamento com a expressão ao contrário permite-nos depreender a afirmativa implícita no referido enunciado negativo:

Para obter bons resultados no trabalho, o chefe não deve (ou pode) ausentar-se.

A quem poderia ser atribuída a responsabilidade de tal enunciado? Que perfil estaria sendo colocado em cena, cumprindo-se, deste modo, a "vocação polifônica" da negação?

Acreditamos que a afirmativa implícita no referido enunciado negativo esteja bastante próxima das posições sustentadas pelos locutores Mediador e Participativo, no que diz respeito ao mesmo tema MOTIVAÇÃO. Senão, vejamos:

Enunciado 11 - locutor Mediador

Eu tento eliminar ao máximo as causas de descontentamento de meus subordinados e despertar cada vez mais o interesse deles pelo trabalho.

Enunciado 34 - locutor Participativo

Eu procuro dar a cada um a possibilidade de expandir-se em seu trabalho para obter de todos um bom resultado estimulando-os a atingir seus objetivos.

Com efeito, os estilos de liderança Mediador e Participativo parecem corresponder à possibilidade a que se refere a afirmativa implícita acima mencionada: se há alguém que possa admitir a hipótese de não ser necessária (ou mesmo conveniente) a presença do chefe em tempo integral para a realização de um trabalho eficiente, este alguém seria o chefe Mediador (aquele que procura despertar o interesse de seus subordinados pelo trabalho) ou o chefe Participativo (aquele que deseja garantir a todos a possibilidade de expansão no trabalho, estimulando as iniciativas de seus subordinados).

4.1.2 Perfil Participativo:

Com relação ao perfil Participativo, verifica-se igualmente uma única ocorrência da negação nos nove enunciados apresentados (enunciado 39, referente ao tema ATIVIDADES):

Eu não procuro trabalhar mais ou menos que os meus subordinados ou colegas, o que eu procuro é atingir os objetivos com a minha equipe.

Tendo em vista a própria reformulação oferecida pelo locutor Participativo, percebe-se que o enunciado negativo significaria "Eu não me preocupo com o meu mérito pessoal no trabalho ou com resultados individuais que poderia alcançar, mas com o mérito da equipe na qual estou inserido". A afirmativa implícita em tal enunciado negativo estaria, pois, referida a um locutor que valorizasse exclusivamente seu próprio mérito e a qualidade dos resultados que sozinho consegue alcançar. Ora, tal posição vem precisamente corresponder ao que afirma o Autocrata a respeito do mesmo tema ATIVIDADES (enunciado 15):

Eu me entrego e me dedico muito ao meu trabalho, pois o responsável deve dar o exemplo, sendo sempre o mais ativo e o mais competente de sua equipe.

O quadro abaixo vem apresentar os resultados obtidos através da análise dos enunciados negativos dos locutores Autocrata e Participativo:

Quadro 1:
Perfis colocados em cena através das afirmativas implícitas nos enunciados negativos dos locutores Autocrata e Participativo

4.2 Perfis com maior incidência de enunciados negativos

Os mesmos passos adotados para a análise das afirmativas implícitas nos enunciados negativos dos locutores Autocrata e Participativo serão utilizados na investigação dos perfis em que se constata uma maior incidência de enunciados negativos (perfis Mediador, Demissionário e Demagogo), motivo pelo qual dispensaremos os procedimentos analíticos a que recorremos por ocasião da análise dos perfis Autocrata e Participativo.

4.2.1 Perfil Mediador

· Enunciado 38 - Tema: COMANDO - 1 negação

Eu acho que no mundo atual não se pode mais dar ordens ...

Afirmativa implícita: no mundo atual ainda é possível dar ordens.

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 03), que espera que seus subordinados executem perfeitamente suas ordens.

· Enunciado 04 - Tema: ATIVIDADE - 2 negações

Eu faço conscienciosamente o meu trabalho, sem, necessariamente, passar nisso mais tempo que os outros, pois de nada serve querer fazer mais que todo mundo.

Afirmativas implícitas: há quem considere importante a quantidade de tempo que se passa no exercício de uma atividade e o fato de ser o mais ativo de todos.

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 15), que acredita que o responsável deve dar o exemplo, "sendo sempre o mais ativo e o mais competente de sua equipe".

· Enunciado 22 - Tema: CONFLITOS - 1 negação

... num conflito, raramente uma só pessoa tem toda a razão ...

Afirmativa implícita: há quem atribua a razão a uma pessoa apenas.

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 31), que faz prevalecer a sua opinião quando há um conflito.

· Enunciado 07 - Tema: ORGANIZAÇÃO - 2 negações

Eu não busco a organização perfeita que conciliaria os imperativos de trabalho e a qualidade das relações humanas, porque essa organização ideal não existe.

Afirmativa implícita: há quem busque a organização perfeita por acreditar em sua existência.

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 33), que faz questão de" ter uma boa organização"; secundariamente, indicaríamos ainda o Participativo (enunciado 24), que deseja que sua organização "seja um meio eficaz" para que os objetivos sejam atingidos3 3 Esclarecemos que consideramos a oposição do locutor Mediador ao locutor Participativo como secundária porque ambos compartilham uma mesma concepção de" organização ideal" (aquela que seria responsável pela convergência dos objetivos individuais e industriais), ao passo que o locutor Autocrata tende a valorizar exclusivamente os objetivos industriais. .

Eis, deste modo, os resultados do levantamento das negativas presentes no discurso do locutor Mediador: 6 enunciados negativos, todos em oposição ao que afirma o Autocrata, sendo duas negações responsáveis por colocar secundariamente em cena o Participativo. O perfil Mediador parece, pois, construir-se essencialmente em oposição ao perfil Autocrata.

4.2.2 Perfil Demissionário

· Enunciado 01 - Tema: OBJETIVOS - 1 negação

"Eu não gosto de traçar objetivos ..."

Afirmativa implícita: há quem goste de traçar objetivos.

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 18), que traça os objetivos ele mesmo.

· Enunciado 19 - Tema: INFORMAÇÃO/COMUNICAÇÃO - 3 negações

"Eu passo as informações que devo transmitir sem fazer muitos comentários e sem abrir discussão para não ficar inseguro em relação ao pessoal."

Afirmativas implícitas: há quem transmita informações fazendo comentários e abrindo discussão, e tal procedimento é fator de insegurança para o chefe.

Locutores em cena: Mediador (enunciado 17), que transmite informações dando as explicações necessárias; Participativo (enunciado 37), que tenta" suscitar a discussão"; no entanto, o tema da necessidade de segurança do chefe frente a seus subordinados (e, por extensão, a eventual insegurança gerada por ocasião da transmissão de uma informação), não é abordado por nenhum dos locutores, o que nos leva a crer que a afirmativa implícita na terceira negação só poderia ser assumida por um "outro enunciador"4 4 Ao falarmos aqui de "outro enunciador", assumimos a definição formulada por O. Ducrot em O dizer e o dito, p. 192 (grifos nossos): "Chamo‘ enunciadores’ estes seres que são considerados como se expressando através da enunciação, sem que para tanto se lhes atribuam palavras precisas". .

· Enunciado 20 - Tema: COMANDO - 2 negações

Eu comando da maneira mais objetiva possível, fazendo cumprir as diretrizes ... , sem assumir a responsabilidade pelo conteúdo dessas normas, porque não fui eu quem as redigiu.

Afirmativas implícitas: há quem assuma a responsabilidade pelo conteúdo das normas a serem seguidas; alguém redige as normas de trabalho (e este alguém não é o Demissionário).

Locutores em cena: Participativo (enunciado 16), que, ao comandar, mostra seu compromisso com o sucesso do trabalho; quanto à autoria das normas de trabalho, nenhum dos locutores assume tal responsabilidade. Um "outro enunciador" deve assumir tal ponto de vista.

· Enunciado 30 - Tema: ATIVIDADE - 2 negações5 5 Em nossa análise, consideraremos em bloco as duas marcas lingüísticas indicadoras de negação no presente enunciado, tendo em vista que "evitar assumir trabalhos que não sejam da minha estrita competência" corresponderia a "não assumir trabalhos que sejam da competência de outros"..

Eu tomo o cuidado de passar aos Serviços de Apoio os problemas que são ligados a eles, para evitar assumir trabalhos que não sejam da minha estrita competência, ...

Afirmativas implícitas: há quem assuma os trabalhos que sejam da competência de outros setores da empresa.

Locutor em cena: nenhum dos locutores assume a autoria de tal afirmativa (presença de um "outro enunciador").

· Enunciado 06 - Tema: DECISÃO - 2 negações

Aceito as decisões das outras pessoas e evito fazer comentários para não suscitar problemas com as pessoas.

Afirmativas implícitas: há quem comente as decisões tomadas por outros, o que pode vir a suscitar problemas com as pessoas.

Locutores em cena: Participativo (enunciado 41), que se propõe a refletir sobre as decisões com seus subordinados; quanto ao tema dos problemas suscitados por tais comentários, nenhum dos locutores assume a afirmativa que estaria implícita (presença de um "outro enunciador").

· Enunciado 12 - Tema: ORGANIZAÇÃO - 2 negações

Eu evito questionar a funcionalidade da organização para não criar problemas na rotina do trabalho.

Afirmativas implícitas: há quem questione a funcionalidade da organização, o que cria problemas no trabalho.

Locutores em cena: Demagogo (enunciado 42), que trabalha para" evoluir" a organização, isto é, para que a mesma "esteja mais ao serviço dos homens"; nenhum dos locutores assume que tal procedimento criaria problemas na rotina de trabalho (presença de um "outro enunciador").

· Enunciado 26 - Tema: FORMAÇÃO - 1 negação

Eu envio meus subordinados para fazer formação pelo menos uma vez por ano. Assim, não tenho problemas com ninguém.

Afirmativa implícita: há quem tenha problemas com seus subordinados (e os programas de formação poderiam representar uma solução para tais dificuldades).

Locutor em cena: Mediador (enunciado 35), que acredita que a formação, além de cumprir outros objetivos, "facilita a tarefa do chefe".

Uma vez concluído o levantamento dos enunciados negativos no discurso do locutor Demissionário, eis o resultado a que chegamos: dos 12 enunciados negativos, 5 não podem ser referidos a nenhum dos outros quatro locutores (remetendo, portanto, a um" outro enunciador"); 4 se opõem ao que é afirmado pelo locutor Participativo (sendo 2 referidas simultaneamente ao locutor Mediador); 1 exclusivamente ao locutor Mediador; 1 ao locutor Autocrata; 1 ao locutor Demagogo.

4.2.3 Perfil Demagogo:

· Enunciado 45 - Tema: OBJETIVOS - 1 negação

... acho que eles [os subordinados] aceitariam mal o fato de se mobilizarem por objetivos que não venham deles mesmos.

Afirmativa implícita: os subordinados aceitam mobilizar-se por objetivos que venham de outros.

Locutor em cena: nenhum dos locutores explicitamente designados assume tal afirmativa (presença de "outro enunciador" em cena).

· Enunciado 02 - Tema: INFORMAÇÃO/COMUNICAÇÃO - 1 negação

Eu dedico muita atenção em dosar minhas informações em função da personalidade de cada um, de modo que a mensagem seja aceita sem que se criem problemas.

Afirmativa implícita: há quem transmita informações, criando-se, porém, problemas.

Locutor em cena: nenhum dos locutores assume tal afirmativa (presença de um "outro enunciador").

· Enunciado 29 - Tema: COMANDO - 1 negação

Eu raramente dou ordens, ...

Afirmativa implícita: há quem dê ordens (com alguma freqüência).

Locutor em cena: Autocrata (enunciado 03), que deseja que seus subordinados executem perfeitamente suas ordens.

· Enunciado 32 - Tema: DECISÃO - 1 negação

Tomo muito cuidado para que minhas decisões sejam aceitáveis pelos meus subordinados, para que eles não se sintam incomodados com as mesmas.

Afirmativa implícita: há decisões que incomodam os subordinados.

Locutor em cena: nenhum dos quatro locutores assume tal afirmativa (presença de "outro enunciador").

Eis o resultado obtido através do levantamento das negações presentes no discurso do locutor Demagogo: dos 4 enunciados negativos, apenas 1 poderia ser considerado como colocando em cena um locutor explicitamente designado (enunciado 29, que remete às posições assumidas pelo locutor Autocrata); as outras 3 negações colocam em cena um "outro enunciador".

quadro 2

O

No de enunciados negativos

Perfil em cena através das afirmativas implícitas

Mediador

4

Autocrata

2

Autocrata(Participativo)6 6 Os parênteses indicam que apenas secundariamente seria colocado em cena o locutor Participativo

Demissionário

5

"outro enunciador"

2

Participativo

2

Participativo / Mediador

1

Mediador

1

Autocrata

1

Demagogo

Demagogo

3

"outro enunciador"

1

Autocrata

Quadro 2: Perfis colocados em cena através das afirmativas implícitas nos enunciados negativos dos locutores Mediador, Demissionário e Demagogo

5. Análise e interpretação dos dados

No levantamento dos dados referentes à presença de enunciados negativos em nosso corpus, partimos dos textos predominantemente afirmativos, a saber, os perfis Autocrata e Participativo. Como nos revelam os dados apresentados no Quadro 1, o locutor Autocrata vem colocar em cena, através da negação, o Mediador e o Participativo; por sua vez, o locutor Participativo parece construir-se em oposição ao Autocrata.

Tal sistema de oposições parece confirmar-se ao passarmos à análise dos enunciados em que há uma maior incidência de negativas. Com efeito, diante dos dados reunidos no Quadro 2, percebemos que o perfil Mediador se constrói em oposição quase exclusiva ao perfil Autocrata, enquanto o perfil Demissionário se contrapõe ao Participativo (considerando-se apenas os 5 locutores cujos discursos se atualizam em nosso corpus).7 7 Como veremos mais adiante, a oposição manifestada pelos locutores Demissionário e Demagogo ao que denominamos "outro enunciador" colocará em cena outros elementos para a presente reflexão

Tendo em vista tal jogo de oposições, parece-nos lícito afirmar que o perfil Mediador (em franca oposição ao perfil Autocrata) estaria mais próximo do perfil Participativo, da mesma forma que o perfil Demissionário (em franca oposição ao Participativo) se aproximaria do perfil Autocrata. Teríamos, portanto, a constituição de dois grandes "blocos", que poderíamos representar da seguinte forma: um perfil autocrata-demissionário em oposição a um perfil participativo-mediador.

Que sentido atribuir a tal sistema de "alianças" que pudemos apreender através do levantamento da negação, entendida como expressão da dimensão polifônica dos enunciados sobre os quais trabalhamos? Como explicar a maior afinidade verificada entre, por um lado, os locutores Autocrata e Demissionário e, por outro, os locutores Participativo e Mediador?

Uma primeira resposta a tal questão poderia ser localizada no problema colocado ao início de nosso trabalho: a necessidade expressa pela própria empresa no sentido de conciliar os objetivos que deve alcançar ("objetivos industriais") e os objetivos de cada um de seus funcionários ("objetivos pessoais"). Deste modo, o perfil Participativo é apresentado como sendo o que corresponderia à possibilidade máxima de conciliação destas duas ordens de objetivos, vistos pela empresa como antagônicos. É precisamente nesta perspectiva que entendemos a aliança feita com o locutor Mediador, que também lograria – ainda que em menor grau – tal conciliação. Da mesma forma, explica-se a oposição frente aos locutores Autocrata (aquele que valoriza exclusivamente os objetivos industriais) e Demissionário (aquele que parece excluir-se de tal situação conflitiva, não favorecendo a consecução de nenhum dos objetivos).

Como se dá a entrada do locutor Demagogo em tal cenário? Que lugar viria ele ocupar no jogo de alianças/oposições até então configurado?

Acreditamos que uma possível resposta a tal questionamento seja possibilitada através da discussão do papel desempenhado pelo "outro enunciador" a que nos referimos no levantamento de nossos dados. Trata-se, com efeito, da presença de uma voz que não chega a se materializar num perfil de locutor, sendo recuperada apenas através das afirmativas implícitas no discurso dos locutores Demissionário e Demagogo. No entanto, apesar de sua ausência enquanto "locutor atualizado", sua presença é incontestável, chegando mesmo a configurar uma nova articulação de alianças/oposições: um perfil demissionário-demagogo X "outro enunciador".

Ora, se este "outro enunciador" se faz presente apenas através das afirmativas implícitas nos enunciados negativos dos locutores Demissionário e Demagogo, um breve exame de tais afirmativas poderia revelar-se produtiva para a compreensão desta nova articulação:

  • afirmativa implícita no enunciado 19 (locutor Demissionário): "Fico inseguro em relação ao pessoal";

  • afirmativa implícita no enunciado 20 (locutor Demissionário): "Redijo as normas de trabalho";

  • afirmativa implícita no enunciado 30 (locutor Demissionário): "Assumo trabalhos que sejam da competência de outros";

  • afirmativa implícita no enunciado 06 (locutor Demissionário): "Suscito problemas com as pessoas";

  • afirmativa implícita no enunciado 12 (locutor Demissionário): "Crio problemas na rotina do trabalho";

  • afirmativa implícita no enunciado 45 (locutor Demagogo): "Os subordinados aceitam mobilizar-se por objetivos estabelecidos por outros";

  • afirmativa implícita no enunciado 02 (locutor Demagogo): "Crio problemas na transmissão de informações";

  • afirmativa implícita no enunciado 32 (locutor Demagogo): "Há decisões (ou tomo decisões) que incomodam os subordinados".

O perfil deste "outro enunciador" não parece, com efeito, coincidir com um perfil conciliador de objetivos industriais e pessoais. Antes, parece muito mais propenso a valorizar exclusivamente a empresa (característica que justifica sua oposição aos perfis Demissionário e Demagogo, os que mais se distanciam dos objetivos industriais). Deste modo, a entrada deste "outro enunciador" vem colocar em cena uma outra dimensão até então não explorada: não se trata mais de saber qual o perfil que conseguiria, com maior eficiência, conciliar as duas ordens de objetivos (industriais e pessoais). Com efeito, nenhum destes três perfis lograria tal conciliação, segundo a análise a que procedemos. A possibilidade que entrevemos de justificar este novo sistema de alianças/oposição seria, pois, a seguinte: os locutores Demagogo e Demissionário parecem compartilhar uma posição de maior distância frente aos objetivos industriais; ora, este "outro enunciador", por sua vez, parece aproximar-se do que poderíamos denominar "a voz da empresa"8 8 Esta "voz da empresa" parece-nos suficientemente clara na afirmativa implícita no enunciado negativo 20. Com efeito, ao "outro enunciador" corresponderia a perspectiva de quem assume redigir as normas de trabalho. . Assim sendo, o novo critério em jogo seria o grau de adesão aos objetivos industriais: o Demissionário e o Demagogo seriam os perfis que mais se distanciariam dos objetivos industriais, ao passo que o "outro enunciador" tenderia a manifestar uma adesão máxima.

6. Conclusões

Em breve retrospectiva da análise a que procedemos, havíamos depreendido dois planos distintos de oposições:

  • um plano referente à possibilidade de conciliação de objetivos pessoais e industriais. Tal plano se constrói em dois momentos sucessivos: num primeiro momento, apresentam-se dois locutores que se distinguem a partir da maior ou menor habilidade na conciliação dos objetivos pessoais e industriais (locutores Participativo e Autocrata, respectivamente);

  • num segundo momento, criam-se seus "reversos" (locutores Demissionário e Mediador), oposição que será responsável pelo estabelecimento de uma aliança entre os perfis Autocrata e Demissionário, de um lado, e, de outro, entre os perfis Participativo e Mediador. Deste modo, teríamos então o seguinte sistema de alianças/oposições:

Demissionário + Autocrata x Mediador + Participativo

  • um plano referente ao grau de adesão de cada um dos perfis aos objetivos industriais. Tal plano é construído através de um novo sistema de alianças/oposição que já se deixava entrever nos enunciados do locutor Demissionário e que é ratificado pelo locutor Demagogo: a oposição feita por estes dois perfis a um "outro enunciador". Teríamos, então, o seguinte esquema ilustrativo:

Demissionário + Demagogo x "outro enunciador"

Gostaríamos de sinalizar que, em função do novo critério colocado em jogo através da oposição feita pelos locutores Demissionário e Demagogo ao" outro enunciador", torna-se possível repensar a posição ocupada por todos estes perfis de liderança em ação no questionário analisado, através do seguinte esquema:

Leia-se: no questionário apresentado aos chefes de equipe, o perfil Demagogo representaria o grau de distância máxima frente aos interesses da empresa; todos os demais locutores – incluindo-se em parte o locutor Demissionário – expressariam, em graus variados, sua adesão aos objetivos industriais.

Se considerarmos que os diferentes locutores sobre cujos enunciados trabalhamos representam uma "ficção" criada pelo responsável pela elaboração do questionário, ou seja, seu autor, poderemos explicitar algumas das posições que parecem caracterizar o lugar construído discursivamente pelo mesmo. Em outras palavras, o que nos parecia de início constituir um "monólogo desinteressado" (o eu que se manifestava em cada um dos 45 enunciados) vem revelar, através da análise a que procedemos, sua real condição de "diálogo polêmico" que se trava entre a empresa e os chefes de equipe:

  • no exercício da função de chefia de equipe na empresa considerada, vários são os perfis de liderança que efetivamente se atualizam;

  • o perfil de um chefe de equipe será sempre resultante de uma combinação, em graus variados, de diferentes estilos de liderança;

  • considerando os diferentes estilos de liderança verificados, é preciso que cada chefe de equipe tenha acesso à imagem com a qual predominantemente se identifica;

  • a empresa valoriza o perfil Participativo, não tanto pelo fato de este minimizar os embates entre empresa e subordinados mas, mais fundamentalmente, por manifestar sua adesão aos objetivos industriais;

  • sob a condição de poder contar com a adesão (em graus variados) do chefe de equipe na defesa dos objetivos industriais, a empresa é capaz de conviver com diferentes níveis de conflito (chefe de equipe X subordinados, no caso do perfil Autocrata; empresa X subordinados, no caso do perfil Mediador);

  • a empresa pode aceitar (ainda que com restrições) um perfil de chefia que não deseje assumir uma aliança explícita com os objetivos industriais, contanto que este chefe também não lhe faça uma oposição declarada (perfil Demissionário);

  • a empresa não pode aceitar um perfil de liderança que se oponha abertamente aos objetivos industriais, como é o caso do perfil Demagogo.

Como vimos, o questionário, entendido inicialmente como instrumento de acesso ao saber construído por um dado segmento da empresa (no caso, o segmento representado pelos chefes de equipe), vem ainda colocar em cena saberes de outra ordem– as representações da empresa sobre cada um dos perfis de liderança, bem como os critérios subjacentes ao julgamento que emite sobre estes diferentes perfis –, explicitando, desta forma, sua dimensão interacional na gestão dos diferentes papéis que se atualizam na empresa. É neste sentido que julgamos pertinente o ponto de vista defendido por J. Richard-Zappella (1993): o questionário seria, enquanto meio destinado a apreender um determinado saber construído socialmente, pelo menos tão "rico" quanto as respostas produzidas.

(Recebido em 04/04/97. Aprovado em 05/07/97)

Referências bibliográficas

DUCROT, O. (1972) Dire et ne pas dire. Paris: Hermann,.

__________. (1980) Les mots du discours. Paris: Minuit

__________. (1981) Provar e dizer. São Paulo: Global.

__________. (1987)O dizer e o dito. Campinas: Pontes.

FAÏTA, D. (1995) Dialogue entre expert et opérateur: contribution à la connaissance de l’activité par l’analyse des pratiques langagières, em Connexions 65. Paris: ARIP.

NÆLKE, H. (1992) Ne ... pas: négation descriptive ou polémique? Contraintes formelles sur son interprétation, Langue française 94, Paris: Larousse.

RICHARD-ZAPPELLA, J. (1990) Variations interrogatives dans la question de sondage, em Mots 23. Paris: Fondation Nationale des Sciences Politiques.

__________. (1993) "Lorsque les questions en disent peut-être autant que les réponses", em Mots 34, Paris, Fondation Nationale des Sciences Politiques.

SOUZA E SILVA, M. C. P. de. (1994) Os efeitos da não negociação nas relações de trabalho, The ESPecialist 15 1/2: 107-111

__________. (1997) "Construção da realidade profissional no cotidiano da empresa", In KOCH, I.G.V. & K.S MONTEIRO DE BARROS. (Org.) Tópicos em lingüística de texto e análise da conversação. Natal: Ed. da UFRN.

EXERCÍCIOS

  • DUCROT, O. (1972) Dire et ne pas dire Paris: Hermann,.
  • __________. (1980) Les mots du discours Paris: Minuit
  • __________. (1981) Provar e dizer Săo Paulo: Global.
  • __________. (1987)O dizer e o dito Campinas: Pontes.
  • FAĎTA, D. (1995) Dialogue entre expert et opérateur: contribution ŕ la connaissance de lactivité par lanalyse des pratiques langagičres, em Connexions 65 Paris: ARIP.
  • RICHARD-ZAPPELLA, J. (1990) Variations interrogatives dans la question de sondage, em Mots 23 Paris: Fondation Nationale des Sciences Politiques.
  • __________. (1993) "Lorsque les questions en disent peut-ętre autant que les réponses", em Mots 34, Paris, Fondation Nationale des Sciences Politiques.
  • SOUZA E SILVA, M. C. P. de. (1994) Os efeitos da năo negociaçăo nas relaçőes de trabalho, The ESPecialist 15 1/2: 107-111
  • __________. (1997) "Construçăo da realidade profissional no cotidiano da empresa", In KOCH, I.G.V. & K.S MONTEIRO DE BARROS. (Org.) Tópicos em lingüística de texto e análise da conversaçăo Natal: Ed. da UFRN.

anexo

1

( )

Eu não gosto de traçar objetivos e por isso espero que me dêem objetivos precisos e bem definidos para que eu possa transmitir aos meus subordinados.

2

( )

Eu dedico muita atenção em dosar minhas informações em função da personalidade de cada um, de modo que a mensagem seja aceita sem que se criem problemas.

3

( )

Eu aprendi e sei respeitar uma ordem, portanto, quero que meus subordinados executem perfeitamente as minhas ordens.

4

( )

Eu faço conscienciosamente o meu trabalho, sem, necessariamente, passar nisso mais tempo que os outros, pois de nada serve querer fazer mais que todo mundo.

5

( )

Quando há um conflito, eu tento colocar frente-a-frente as partes opostas para "drenar o abscesso" e chegar as verdadeiras soluções.

6

( )

Aceito as decisões das outras pessoas e evito fazer comentários para não suscitar problemas com as pessoas.

7

( )

Eu não busco a organização perfeita que conciliaria os imperativos de trabalho e a qualidade das relações humanas, porque essa organização ideal não existe.

8

( )

Eu tomo cuidado em manter as boas relações entre meus subordinados, porque o que eles buscam, acima de tudo, é um bom ambiente de trabalho.

9

( )

Qualquer formação deve ser um "investimento com retorno" e deve traduzir-se por uma melhoria das capacidades técnicas. Os resultados devem ser acompanhados e controlados com rigor.

10

( )

Os objetivos de Formação devem ser negociados com os homens.

A Formação deve fornecer aos homens os meios para melhor atingir os objetivos industriais.

Os resultados devem ser comentados entre chefe e subordinado.

11

( )

Eu tento eliminar ao máximo as causas de descontentamento de meus subordinados e despertar cada vez mais o interesse deles pelo trabalho.

12

( )

Eu evito questionar a funcionalidade da organização para não criar problemas na rotina do trabalho.

13

( )

Nas minhas decisões, eu dedico atenção ao equilíbrio entre o lado técnico e o lado da aplicação pelos homens. Eu busco decisões viáveis, ainda que imperfeitas, sempre reservando uma margem de segurança.

14

( )

Eu procuro apaziguar qualquer conflito que surge, e depois reconciliar as pessoas que se afrontaram para manter o clima de boa paz necessário ao bom andamento do serviço.

15

( )

Eu me entrego e me dedico muito ao meu trabalho, pois o responsável deve dar o exemplo, sendo sempre o mais ativo e o mais competente de sua equipe.

16

( )

Eu comando mostrando o meu compromisso com sucesso do trabalho, de maneira que meus subordinados se sintam atraídos e levados à ação.

17

( )

Junto com as informações que eu devo transmitir, eu dou as explicações necessárias para que as pessoas compreendam.

18

( )

Eu próprio determino os principais objetivos da equipe e os distribuo entre meus subordinados, para que eu tenha certeza de que estamos trabalhando no sentido dos objetivos da Empresa e que eu possa tirar de cada um o máximo de eficácia.

19

( )

Eu passo as informações que devo transmitir sem fazer muitos comentários e sem abrir discussão para não ficar inseguro em relação ao pessoal.

20

( )

Eu comando da maneira maisobjetiva possível, fazendo cumprir as diretrizes e o regulamento, dentro de minha equipe de trabalho, sem assumir a responsabilidade pelo conteúdo dessas normas, porque não fui eu quem as redigiu.

21

( )

Eu faço tudo para estar disponível aos meus subordinados e poder ajudá-los, porque eles têm sempre uma grande carga de trabalho e problemas difíceis.

22

( )

Como, num conflito, raramente uma só pessoa tem toda a razão, eu chamo separadamente as duas partes para chegar-se a uma solução aceitável por todos.

23

( )

Quando eu tomo uma decisão, é porque eu conheço o problema e, como é a minha autoridade que está em jogo, eu tomo o cuidado de explicá-la para que ela seja bem compreendida.

24

( )

Como eu quero que minha organização seja um meio eficaz para atingir nossos objetivos, eu a coloco em prática junto com aqueles que terão que fazê-la funcionar.

25

( )

Eu supervisiono, ficando o máximo de tempo possível perto de meus subordinados, porque é difícil obter bons resultados se o chefe não está o tempo todo presente para fazer com que o trabalho seja realizado.

26

( )

Eu envio meus subordinados para fazer formação pelo menos uma vez por ano. Assim, não tenho problemas com ninguém.

27

( )

Eu discuto com cada um dos meus subordinados sobre a parcela que ele pode realizar dentro dos objetivos globais da Empresa, em função do que lhe interesse e mais o estimule.

28

( )

Na posição de responsável, sou eu quem dá todas as instruções a fim de que cada um saiba o que ele tem a fazer.

29

( )

Eu raramente dou ordens, pois prefiro dar um conselho ou pedir um favor de maneira que meus subordinados sintam um compromisso pessoal com minha maneira de relacionar-me com eles.

30

( )

Eu tomo o cuidado de passar aos Serviços de Apoio os problemas que são ligados a eles, para evitar assumir trabalhos que não sejam da minha estrita competência, mesmo que eu já saiba de antemão como resolvê-los.

31

( )

Quando ocorre conflito, tento suprimi-lo ou fazer prevalecer a minha posição.

32

( )

Tomo muito cuidado para que minhas decisões sejam aceitáveis pelos meus subordinados, para que eles não se sintam incomodados com as mesmas.

33

( )

Eu faço questão de ter uma boa organização porque, é a única maneira de obter o máximo possível dos homens e do material.

34

( )

Eu procuro dar a cada um a possibilidade de expandir-se em seu trabalho para obter de todos um bom resultado estimulando-os a atingir seus objetivos.

35

( )

A formação é necessária para o progresso da Empresa e dos homens que a compõem.

Ela facilita a tarefa do chefe e dá a todos as mesmas oportunidades.

36

( )

Para poder dar à minha equipe objetivos que sejam realistas, eu procuro conhecer as previsões da Empresa e adaptá-las às possibilidades reais de meus colaboradores.

37

( )

Quando eu passo uma informação, tento fazer com que compreendam o ponto de vista da Empresa, mas eu tento também suscitar a discussão.

38

( )

Eu acho que no mundo atual não se pode mais dar ordens, então eu prefiro orientar sobre o trabalho de meus subordinados, dando-lhes indicações sobre o objetivo a atingir.

39

( )

Eu não procuro trabalhar mais ou menos que os meus subordinados ou colegas, o que eu procuro é atingir os objetivos com a minha equipe.

40

( )

Eu faço tudo para evitar os conflitos e, se surge algum, tento manter-me neutro ou não me envolver.

41

( )

Para que elas sejam criativas e estimulantes, as decisões que eu tomo são o resultado de uma reflexão com aqueles que vão colocá-las em prática.

42

( )

Eu trabalho para evoluir nossa organização para que ela esteja mais ao serviço dos homens, de modo que a melhoria das relações e do ambiente leve a uma melhoria do trabalho.

43

( )

Eu peço que o Depto de Pessoal estude bem o salário de meus subordinados, porque, no fundo, as pessoas só vêm trabalhar pelo dinheiro e pela estabilidade do seu emprego.

44

( )

É preciso dar às pessoas todo o tempo necessário para realizar sua formação para responder à sua expectativa de formação.

45

( )

Eu atribuo aos meus subordinados a iniciativa e a responsabilidade de definir seus objetivos porque acho que eles aceitariam mal o fato de se mobilizarem por objetivos que não venham deles mesmos.

  • 1
    Tendo em vista a natureza do corpus sobre o qual trabalhamos (questionário destinado à identificação do estilo de liderança predominante, entre vários perfis possíveis), assumiremos como preferentemente polêmicos os enunciados negativos localizados no referido contexto.
  • 2
    Ao falarmos de
    locutor, referimo-nos aos 5 perfis que se alternam na produção dos 45 enunciados que totalizam o questionário.
  • 3
    Esclarecemos que consideramos a oposição do locutor Mediador ao locutor Participativo como secundária porque ambos compartilham uma mesma concepção de" organização ideal" (aquela que seria responsável pela convergência dos objetivos individuais e industriais), ao passo que o locutor Autocrata tende a valorizar exclusivamente os objetivos industriais.
  • 4
    Ao falarmos aqui de
    "outro enunciador", assumimos a definição formulada por O. Ducrot em
    O dizer e o dito, p. 192 (grifos nossos): "Chamo‘ enunciadores’ estes seres que são considerados como se expressando através da enunciação, sem que para tanto se lhes atribuam palavras precisas".
  • 5
    Em nossa análise, consideraremos em bloco as duas marcas lingüísticas indicadoras de negação no presente enunciado, tendo em vista que "evitar assumir trabalhos que não sejam da minha estrita competência" corresponderia a "não assumir trabalhos que sejam da competência de outros"..
  • 6
    Os parênteses indicam que apenas secundariamente seria colocado em cena o locutor Participativo
  • 7
    Como veremos mais adiante, a oposição manifestada pelos locutores Demissionário e Demagogo ao que denominamos "outro enunciador" colocará em cena outros elementos para a presente reflexão
  • 8
    Esta "voz da empresa" parece-nos suficientemente clara na afirmativa implícita no enunciado negativo 20. Com efeito, ao "outro enunciador" corresponderia a perspectiva de quem assume redigir as normas de trabalho.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 1998
    • Data do Fascículo
      Fev 1998

    Histórico

    • Aceito
      05 Jul 1997
    • Recebido
      04 Abr 1999
    Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP PUC-SP - LAEL, Rua Monte Alegre 984, 4B-02, São Paulo, SP 05014-001, Brasil, Tel.: +55 11 3670-8374 - São Paulo - SP - Brazil
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