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Tensionamentos acerca do Autoconhecimento a partir (e além) da BNCC

RESUMO

Este artigo traz reflexões sobre o autoconhecimento na Educação Física Escolar. Para tanto, propõe tensionar seu enquadramento na BNCC, em que é compreendido como competência socioemocional ligada à construção das identidades dos alunos escolares. Deste ponto, aproxima o autoconhecimento à Educação Física e à proposta do Projeto de Vida, depois traça discussões tecidas em aliança com a filosofia oriental, a estilística da existência e a filosofia da diferença. E, por fim, problematiza o autoconhecimento na Educação Física Escolar, buscando evidenciar o protagonismo do movimento corporal na viabilização das inflexões conceituais aqui desencadeadas.

Palavras-chave
Autoconhecimento; Competências Gerais (BNCC); Educação Física Escolar; Estética da Existência; Filosofia da Diferença

ABSTRACT

This article brings reflections on self-knowledge in school physical education. To this end, it proposes to tighten its framework within the BNCC, which is understood as a socio-emotional competence linked to the construction of school students' identities. From this point, it brings self-knowledge closer to physical education and the Life Project proposal, then outlines discussions woven in alliance with Eastern philosophy, the stylistics of existence, and the philosophy of difference. And finally, it problematizes self-knowledge in school physical education, seeking to highlight the role of body movement in enabling the conceptual inflections triggered here.

Keywords
Self-knowledge; General Competencies (BNCC); School Physical Education; Aesthetics of Existence; Philosophy of Difference

Introdução

Entre as dez competências gerais da Educação Básica observadas na BNCC – Base Nacional Comum Curricular – encontra-se o autoconhecimento, mais especificamente na competência 8, intitulada autoconhecimento e autocuidado (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.). Dentro dessa diretriz educacional geral, o autoconhecimento é entendido como uma competência socioemocional, segundo a qual, o trabalho pedagógico deve capacitar o(a) aluno(a) para “[…] conhecer-se, apreciar-se e cuidar da sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e a dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas” (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017., p. 10).

Na esteira dessa lógica capacitativa, observa-se que a BNCC organiza a competência 8 de modo a evidenciar um compromisso firme e explícito com a construção das identidades dos(as) alunos(as). Face a esse enquadre, perguntamos: será que o autoconhecimento cabe plenamente dentro dessa lógica capacitativa? Desta questão, outra acossa: será que o autoconhecimento pode ser entendido como uma competência?

Com essas questões, interessa-nos tensionar o enquadramento atribuído ao autoconhecimento na BNCC, mas, para tanto, será preciso entender, primeiramente, o que estamos aqui chamando de tensionamento.

Quando nos deparamos com o termo tensão e suas derivações, interessa afirmar a dimensão provocativa do termo, que força o pensamento a pensar de maneiras diferentes. Nesse sentido, a palavra tensão sugere uma inflexão da expressão intensidade, amplamente observada na filosofia pós-estruturalista, e se refere à dinâmica dos fluxos que passam em nossas relações com o mundo (Deleuze, 2006DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 2006.). Assim, o termo tensão se ocupa com os movimentos que abalam as formalidades de organização do exercício educativo na dinâmica relacional, na qual essas formalidades são postas à prova, tornando possível a composição e dispersão dos sentidos da ação educacional1 1 Essa tensão que aqui se fala também pode ser observada nos estudos pedagógicos desenvolvidos no contexto das teorias pós-críticas e decoloniais. Quando, por exemplo, os estudos freireanos (Freire, 1996; 2005) questionam a noção de conteúdo como dado universal, passível de ser transmitido de maneira uniforme em qualquer contexto de ensino, situa-se aí também um tensionamento que abala as formalidades que organizam o exercício educativo, forçando sua diferenciação constante. O tensionamento, portanto, marca uma inflexão no trabalho pedagógico, orientando-o na direção dos processos educativos, isto é, das relações que se mobilizam continuamente de acordo com os interesses e necessidades das partes aí envolvidas. .

E para dar encaminhamento a esse tensionamento, investimos primeiramente em uma análise de cunho genealógico2 2 A análise de cunho genealógico que foi empregada neste manuscrito buscou inspiração nos estudos foucaultianos, nos quais a genealogia é entendida como um procedimento de investigação que se ocupa em restituir “[…] as condições de emergência de uma singularidade no interior de uma rede de múltiplos processos e mecanismos heterogêneos” (Muños, 2022, p. 24). Para operar esse intento, a genealogia não busca pelas origens históricas daquilo que está sendo pesquisado e, portanto, se esquiva da busca pela essência das coisas e de uma certa identidade fixa atribuída a tal objeto pesquisado. Ao invés disto, a genealogia: “[…] tem por objetivo assinalar a singularidade dos acontecimentos que, por sua vez, remetem ao acaso, à diversidade, à discórdia, ao erro. Ela busca descontinuidades onde desenvolvimentos contínuos foram encontrados” (Martins, 2000, p. 152). , para diagnosticar3 3 Seguindo a abordagem genealógica assumida nesta parte do texto, a ação diagnóstica aqui empregada buscou respaldo na filosofia foucaultiana, que compreende o exercício filosófico como uma prática de diagnóstico da atualidade. Nesse sentido, diagnosticar significa “interrogar o presente”, marcando o que nele se diferencia continuamente (Castro, 2009, p. 107). Na esteira dessa ideia, cabe ressaltar que, quando situamos a intenção de diagnosticar os termos com os quais a BNCC compreende o autoconhecimento, o que se quer é dar vez e voz para aquilo que se apresenta sob o signo da diferença quando o assunto é se autoconhecer, e que, portanto, interroga continuamente os termos desta diretriz educacional. os termos com os quais a BNCC compreende o autoconhecimento, e como o alinha a uma competência geral de ensino da Educação Básica. Desse alinhamento, aproximamos o autoconhecimento do campo específico da Educação Física e da proposta de construção do Projeto de Vida – que o integra às outras competências gerais da BNCC, particularmente às competências comunicativas. Depois, traçamos discussões heterogêneas e diferenciais4 4 Tomando Deleuze (2006) como referência, podemos dizer que discussões heterogêneas e diferenciais são modos de composição do pensamento tecidos de maneira múltipla, como “casos de resolução” (Deleuze, 2006, p. 260) sempre dinâmicos e provisórios e que, portanto, estão fadados a serem ultrapassados continuamente. Se distinguem das discussões tecidas à luz do modelo da representação. , tecidas em aliança com diferentes entendimentos acerca do autoconhecimento extraído do contexto da filosofia oriental, da estilística da existência foucaultiana e do contexto da Filosofia da Diferença. E, por fim, problematizamos o autoconhecimento no contexto da Educação Física Escolar, buscando evidenciar o protagonismo do movimento corporal na viabilização prática das discussões aqui desencadeadas.

Antes de dar encaminhamento a essa proposta de composição da escrita, convém salientar que a noção de aliança, acima citada, se avizinha do pensamento de Gilles Deleuze, que costumava compor seus estudos em aliança com outros pensadores – seus chamados intercessores. E para se aliar, Deleuze ousava criar zonas de vizinhança entre diferentes intercessores, localizados tanto nas Artes, como nas Ciências e na Filosofia, de modo a mobilizar uma comunicação que se dispersa em diferentes direções, rompendo com a tendência de categorização e hierarquização dos conhecimentos (Deleuze, 1997DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs – capitalismo e esquizofrenia. Volume 4. São Paulo: Editora 34; Série Coleção Trans, 1997.; Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.; Lapoujade, 2015LAPOUJADE, David. Deleuze, os movimentos aberrantes. Tradução: Laymert Garcia dos Santos. São Paulo: n-1 edições, 2015.).

Assim, em aliança, pretendemos operar aqui uma escrita acerca da noção de autoconhecimento que, à moda deleuziana, chama a atenção para uma atitude díspar, subversiva e conectiva de composição deste conceito que cresce, se intensifica e se diferencia indefinidamente5 5 Para esclarecer essa operação conceitual que aqui se anuncia (por meio da qual se constituirá a prática da escrita acerca do autoconhecimento), é importante situar a noção de conceito observada por Deleuze e Guattari (1992). Segundo esses autores, “[…] os conceitos são centros de vibrações, cada um em si mesmo e uns em relação aos outros. É por isso que tudo ressoa, em lugar de se seguir ou de se corresponder” (Deleuze; Guattari, 1992, p. 31). Nesse sentido, todo conceito comporta uma atitude díspar que gera uma rede de conexões entre uma multiplicidade de elementos que ressoam entre si, subvertendo continuamente o exercício do pensamento. Na esteira desta ideia, todo conceito é um ato de pensamento que se organiza de modo intensivo, promovendo alianças com outros conceitos que diferenciam continuamente o exercício do pensar (Deleuze; Guattari, 1992). . A escrita acerca do autoconhecimento que é tecida em aliança afirma o caráter processual, compositivo e inacabado deste conceito, além de afirmar um pensamento que está sempre de passagem e em relação direta com aquela dimensão de turbulência (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.), que impede qualquer fixação de uma identidade plena do autoconhecimento.

O Autoconhecimento na BNCC

Como já salientado, a BNCC coloca o autoconhecimento como uma competência socioemocional que, junto às competências cognitivas (que envolvem o conhecimento, a ciência e a cultura) e às competências comunicativas (que envolvem as questões da tecnologia da cultura digital, a argumentação e o desenvolvimento do trabalho Projeto de Vida), ajuda a organizar as dez competências gerais da Educação Básica (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.).

À luz dessa diretriz educacional geral, a orientação e organização do trabalho didático pedagógico acerca dos conteúdos específicos de ensino deve proporcionar a mobilização de diferentes recursos, estratégias e táticas, que capacitem os(as) alunos(as) à resolução de determinados problemas que se apresentam dentro e fora do universo escolar6 6 Na esteira dessa discussão, cabe ressaltar que a BNCC define competência como “a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho”. Assim, neste contexto, delimitado por competências gerais de ensino, “a educação deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservação da natureza, mostrando-se também alinhada à Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU)” (Brasil, 2017, p. 08). .

Convém observar também que o trabalho envolvendo o autoconhecimento na escola precisa estar integrado às outras nove competências gerais. Não obstante, ainda que essa integração seja importante para interconectar as diferentes competências no exercício do ensino, perguntamos: como a BNCC delimita o autoconhecimento para fazê-lo funcionar como uma competência geral que atravessa o contexto geral da Educação Básica?

Para começar a responder a essa questão, cabe salientar que a competência 8 aproxima a noção de autoconhecimento ao conceito de autocuidado, como uma estratégia potente para dar sentido ao exercício do autoconhecimento no contexto da Educação Básica. É essa aproximação, acima sugerida, que nos dá pistas para compreender a atribuição do autoconhecimento como competência geral de ensino. Isso porque, em linhas gerais, o exercício do autocuidado compreende a adoção de uma série de prescrições de natureza preventiva, comportamental, nutricional, higiênica, entre outras, envolvendo a relação entre saúde, o desenvolvimento físico e a prática de atividades físicas que, quando incorporadas pelos(as) alunos(as) regularmente, dariam acesso ao autoconhecimento e à autoaceitação (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.).

Assim, ao apostar em um discurso eminentemente preventivo e prescritivo para tangenciar questões concernentes ao autoconhecimento, notamos que a aproximação entre autoconhecimento e autocuidado, logo no título da competência 8, é muito mais do que a soma de dois diferentes conceitos. Obviamente, eles podem trabalhar em conjunto, uma vez que a competência direciona para um tratamento específico que subjuga o autoconhecimento nos termos possíveis de serem engendrados na lógica preventiva e prescritiva implícita no discurso do autocuidado.

Outra estratégia observada na BNCC para tematizar o autoconhecimento é aproximá-lo à busca pela autoestima, autoconfiança, autoaceitação, autoconsciência e autoimagem dos/das alunos(as). Nesse conjunto de buscas, que envolvem o prefixo auto, o trabalho pedagógico lida com a forma como os(as) alunos(as) percebem a si mesmos para, a partir daí, propor ações afirmativas e construtivas que toquem questões psicológicas e emocionais para a construção das identidades pessoais. Assim, no bojo dessas construções identitárias, os(as) alunos(as) encontram possibilidades interessantes para lidar com suas limitações e potencialidades, além de aprimorar suas habilidades de adequação das condutas para conviverem melhor com as diferenças.

Em que pese a boa e assertiva intenção de trabalho pedagógico implícita nessa empreitada – afinal, a dinâmica relacional de fato precisa ser qualificada para uma maior abertura e acolhimento das diferenças –, o grande problema é que, quando balizamos a construção e qualificação dessa dinâmica relacional dentro de padrões identitários já pré-estabelecidos, deixamos de valorizar as diferenças como elas são em si mesmas. E é aí que o trabalho envolvendo o autoconhecimento se arrefece e se limita sobremaneira.

De acordo com Butler (2015)BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução: Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015., o discurso identitário vigora dentro de uma política de controle e condução da vida, que se fecha dentro de uma lógica dada e já consolidada no contexto sociocultural, definindo à priori o que é ser no mundo7 7 É importante salientar, no entanto, que Butler (2015) não é contra a política identitária, mas chama a atenção para a necessidade de a ultrapassarmos, indo além da dos discursos binários e normativos, de caráter universalizantes, para a afirmação de uma existência tecida na precariedade e no traço de uma perfomatividade em ato nas relações, de onde emerge uma luta mais ampla para a transformação radical da realidade. . Assim, como uma construção já consolidada, o discurso identitário torna a realidade mais aceitável, estável, comparável e associável. Nesse sentido – só para ilustrar o alinhamento com esse discurso – a BNCC chega a recomendar, por exemplo, que o autoconhecimento seja trabalhado através da apresentação de histórias, por meio das quais os(as) alunos(as) poderiam reconhecer-se, identificar-se e, por intermédio desse reconhecimento e identificação, promover o autoconhecimento (Brasil, 2017).

No campo específico da Educação Física, o autoconhecimento aparece no contexto das Ginásticas, que é uma das seis unidades temáticas que organizam os conteúdos e práticas relativas dessa disciplina escolar na BNCC. Nessa delimitação, o autoconhecimento é trabalhado, preferencialmente, no final do Ensino Fundamental (nos 8º e 9º anos) como conteúdo que atravessa exponencialmente as chamadas Ginásticas de Conscientização Corporal 8 8 Só a título de informação, seguem alguns exemplos de práticas que se alocam dentro do contexto das Ginásticas de Conscientização Corporal: Biodança, Bioenergética, Eutonia, Antiginástica, Método Feldenkrais, Ioga, Tai Chi Chuan, dentre outras manifestações também chamadas de práticas Somáticas, Contemplativas ou Holísticas. , que são definidas como:

[…] práticas que empregam movimentos suaves e lentos, tal como a recorrência a posturas ou à conscientização de exercícios respiratórios, voltados para a obtenção de uma melhor percepção sobre o próprio corpo. Algumas dessas práticas que constituem esse grupo têm origem em práticas corporais milenares da cultura oriental

(Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017., p. 218).

Na esteira dessa delimitação, os objetivos de aprendizagem acerca do autoconhecimento focam no ensino de conceitos relacionados a essas práticas, além de se preocupar também com suas origens e contextualizações histórico-sociais, que ajudam a delinear uma identidade específica para essa categoria ginástica (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.).

Ainda que os objetivos de aprendizagem foquem também na vivência dessas práticas de conscientização corporal e no compartilhamento de sensações advindas dessas práticas (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.), nota-se uma clara tendência de se concentrar as estratégias pedagógicas dentro de uma linha de construção identitária mais interessada em definir o autoconhecimento dentro de uma perspectiva histórica já consolidada, do que se abrir ao que o autoconhecimento pode vir a ser, na relação singular que os(as) estudantes operam junto a seus próprios processos de aprendizagem.

Cabe ressaltar que essa opção por delimitar o autoconhecimento dentro de construções históricas já consolidadas é plenamente razoável, pois facilita o exercício da orientação educacional, ao delimitar claramente algumas referências fundamentais, por meio das quais, o autoconhecimento aparece sob o domínio dos termos que orientam a ação pedagógica.

Projeções do Autoconhecimento no Projeto de Vida

Nessa mesma direção de construção identitária, se alicerça também a proposição do Projeto de Vida. Trata-se de uma proposta de trabalho reflexivo, na qual os(as) alunos(as) são incentivados(as) a questionar sobre suas próprias vidas. Assim, analisam situações passadas, mediante os desafios do presente para que assim possam prospectar melhor seus futuros (Pacheco, 2010PACHECO, Eliezer. Os Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica. Natal: IFRN, 2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/insti_evolucao.pdf. Acesso em: 4 ago. 2022.
http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/...
).

Convém salientar que o Projeto de Vida se relaciona com o autoconhecimento e com as competências socioemocionais, mas é desenvolvido, segundo a BNCC, no contexto das competências comunicativas, que ampliam o trabalho do autoconhecimento, projetando-o na direção das demandas socioculturais vigentes. Na esteira dessa ideia, observa-se que o Projeto de Vida opera como um dispositivo importante para contribuir na construção das identidades dos(as) alunos(as) (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017.).

De acordo com a análise de Mainardes (2006)MAINARDES, Jefferson. Abordagem do ciclo de políticas: uma contribuição para a análise das políticas educacionais. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, n. 94, p. 47-69, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/NGFTXWNtTvxYtCQHCJFyhsJ/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 28 jan. 2023.
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e Lopez (2022)LOPEZ, Roseli de Paula. Projeto de vida e as dez competências gerais da BNCC inseridas na educação. Porto Alegre: Simplíssimo, 2022. (E-book)., uma das principais motivações para a composição do Projeto de Vida é aquela que o relaciona aos anseios dos(as) alunos(as) pela melhoria das condições de vida. Dessa firma, uma questão de partida, que ajuda na mobilização desse projeto seria: que patamares de melhoria de vida os(as) alunos(as) almejam alcançar? A busca de respostas para essa questão dá a medida do sucesso que os(as) alunos(as) pretendem alcançar.

É preciso reconhecer que a proposta do Projeto de Vida é bastante efetiva no modo como pretende atingir questões concernentes ao autoconhecimento na escola. Trata-se de um projeto que coloca os(as) alunos(as) para pensar sobre suas próprias vidas, ao desafiá-los(as) a traçar metas a serem alcançadas a curto, médio e longo prazo. E para dar respaldo a essas projeções, os(as) alunos(as) professam seus interesses e encontram, na constituição desse projeto, espaços de reflexão sobre as práticas de regramento da existência que precisariam adotar, para alcançar, por fim, a meta desejada. Com isso, o Projeto de Vida ajuda os(as) alunos(as) a buscar e reconhecer, por si mesmos(as) boas escolhas, que dariam as condições favoráveis para tecer o sucesso de seus futuros profissionais (Martins; Pasqualini, 2020MARTINS, Lígia Márcia; PASQUALINI, Juliana Campregher. O currículo escolar sob enfoque histórico-crítico: aspectos ontológico, epistemológico, ético-político e pedagógico. Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 31, n. esp. 1, p. 23-37, 2020. Disponível em: https://revista.fct.unesp.br/index.php/Nuances/article/view/8280. Acesso em: 28 jan. 2023.
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).

O problema dessa engenhosa empreitada é que a busca e o reconhecimento das boas escolhas demandam um movimento ostensivo – e até mesmo subliminar – de regramento, adequação e ajuste das condutas que, quando em excesso, diminui o potencial de ação e expressão dos(as) alunos(as), orientando essa potência sempre para demandas externas aos anseios e necessidades individuais. E, como sabemos, essas demandas externas geralmente concorrem a favor de uma ordem sociocultural pré-estabelecida, a qual se afirma continuamente, moldando como convém as potencialidades individuais.

E para moldar como convém a potencialidade dos(as) alunos(as), o sistema educacional atual se utiliza de uma tática amplamente eficiente, que interfere diretamente na operacionalização do exercício do pensamento dos(as) alunos(as). Tal tática se resume no seguinte: investir no alinhamento da ação do pensar ao exercício do reconhecimento, da identificação, da adequação e de tantas outras operações cognitivas que possam funcionar dentro da lógica de construção das identidades.

À luz dessa lógica identitária, os(as) alunos(as) vão sendo enredados(as), dentro de um domínio de construção da realidade já dado, à qual devem se ajustar continuamente. Para tanto, devem se interessar, acolher e adotar identidades já pré-determinadas, entre as disponíveis na gôndola das possibilidades delineadas no âmbito da cultura e alinhar seus projetos de vida na esteira desse enredamento subliminar.

Cabe ressaltar que o pensamento que opera através da dinâmica do reconhecimento, da identificação e da adequação é altamente culpabilizante, ou seja, trata-se de uma modalidade de construção do exercício do pensar que acaba por culpar os(as) próprios(as) alunos(as) que, sabendo o que devem ou não fazer, acabam sendo os(as) próprios(as) responsáveis por se enquadrar, ou não, dentro de determinadas identidades sociais já consolidadas. Neste sentido, se a competência do autoconhecimento se dá, prioritariamente, nos trilhos desta lógica identitária, a culpa recai sobre os(as) próprios(as) alunos(as) caso não dê certo os Projetos de Vida por eles(as) propostos.

Outras Genealogias acerca do Autoconhecimento na BNCC

Essa discussão acima em pauta, ajuda a evidenciar certa racionalidade na elaboração e implementação do autoconhecimento na BNCC que, por sua vez, organiza subliminarmente uma tecnologia política altamente efetiva e eficiente para o controle dos corpos na escola.

Para dar respaldo a essa ideia, buscamos pela pesquisa desenvolvida por Muños (2022)MUÑOS, Jorge Andrés Jiménez. Educação Física como tecnológica política dos corpos: governamentalidade, biopolítica neoliberal no Brasil e na Colômbia. 2022. 193 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Humano e Tecnologias) – Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2022., em sua tese de doutorado, segundo a qual a definição de habilidades e competências na BNCC é muito mais do que uma simples orientação para melhor direcionamento do trabalho dos(as) professores(as) em sala de aula, na medida em que apresenta um conjunto de estratégias e táticas – isto é, um conjunto de tecnologias biopolíticas – que atinge diretamente os corpos no interior do campo escolar, cerceando-os, moldando-os e controlando-os como convém dentro da política de mercado educacional atual.

Segundo Gadelha (2009)GADELHA, Sylvio. Governamentalidade neoliberal, Teoria do Capital Humano e Empreendedorismo. Educação & Realidade, Porto Alegre, UFRGS, v. 34, n. 2, p. 171-186, 2009. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/8299/5537. Acesso em: 15 maio 2023.
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, esse conjunto de tecnologias biopolíticas produzem condições de existência cada vez mais alinhadas com a lógica neoliberal. Tal lógica, por sua vez, se traduz em “[…] um movimento mais amplo e estratégico que faz dos princípios econômicos (de mercado) os princípios normativos de toda a sociedade” (Gadelha, 2009GADELHA, Sylvio. Governamentalidade neoliberal, Teoria do Capital Humano e Empreendedorismo. Educação & Realidade, Porto Alegre, UFRGS, v. 34, n. 2, p. 171-186, 2009. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/8299/5537. Acesso em: 15 maio 2023.
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, p. 177). Nesse sentido, as tecnologias biopolíticas imprimem nas identidades contemporâneas uma certa “normatividade econômico-empresarial” (Gadelha, 2009GADELHA, Sylvio. Governamentalidade neoliberal, Teoria do Capital Humano e Empreendedorismo. Educação & Realidade, Porto Alegre, UFRGS, v. 34, n. 2, p. 171-186, 2009. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/8299/5537. Acesso em: 15 maio 2023.
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, p. 158) que transforma

[…] o que seria uma sociedade de consumo numa sociedade de empresa (sociedade empresarial, ou de serviços), induzindo os indivíduos a modificarem a percepção que têm de suas escolhas e atitudes referentes às suas próprias vidas e às de seus pares, de modo a que estabeleçam cada vez mais entre si relações de concorrência

(Gadelha, 2009GADELHA, Sylvio. Governamentalidade neoliberal, Teoria do Capital Humano e Empreendedorismo. Educação & Realidade, Porto Alegre, UFRGS, v. 34, n. 2, p. 171-186, 2009. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/8299/5537. Acesso em: 15 maio 2023.
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, p. 177-178).

É no bojo desta transformação, operada pela normatividade econômico-empresarial que se institui a racionalidade biopolítica. Para Muños (2022)MUÑOS, Jorge Andrés Jiménez. Educação Física como tecnológica política dos corpos: governamentalidade, biopolítica neoliberal no Brasil e na Colômbia. 2022. 193 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Humano e Tecnologias) – Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2022., a imposição dessa racionalidade biopolítica opera, por sua vez, sobre as diretrizes educacionais nacionais, adequando-as dentro de uma tendência mundial, de cunho neoliberal, que busca normatizar e mercadorizar o campo da educação, baseando o trabalho educativo na aquisição de competências e habilidades.

Na leitura de Libâneo (2016)LIBÂNEO, José Carlos. School educative aims and internationalization of educational policies: impacts on curriculum and pedagogy. European Journal of Curriculum Studies, Braga, v. 3, n. 2, p. 444-462, 2016. e Libâneo e Silva (2020)LIBÂNEO, José Carlos; SILVA, Eliane. Finalidades educativas escolares e escola socialmente justa: a abordagem pedagógica da diversidade social e cultural. Revista on-line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 24, n. esp. 1, p. 816-840, 2020. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/rpge/article/view/13783. Acesso em: 14 nov. 2022.
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, o grande problema relacionado a essa lógica normatizante e mercadorizante é que ela perde de vista os processos e as singularidades, em função da valorização dos resultados que controlam e limitam os projetos de vida, dando uma falsa impressão para os(as) alunos(as) de que eles(as) detêm a capacidade de auto-gestacionar seus próprios modos de ser e existir no mundo.

No caso das competências socioemocionais, entre as quais destacamos aqui o autoconhecimento, elas estariam à serviço da construção de uma subjetividade mais bem-sucedida, dentro do cenário neoliberal9 9 O cenário neoliberal se refere ao contexto, no qual eclodem os interesses do neoliberalismo, à saber: o Estado mínimo, a prática do livre mercado e a meritocracia constitucional (Muños, 2022). É nesse cenário neoliberal que as tecnologias biopolíticas são mobilizadas para transformar cidadãos e empregados em auto empreendedores. e mercadológico no qual vivemos, e menos afeita à admissão de comportamentos antissociais, o que representaria menos chances de envolvimento dos(as) alunos(as) bem-sucedidos(as) com problemas de conduta (Muños, 2022).

Em última análise – compondo a leitura de Muños (2022) com os estudos de Libâneo (2016)LIBÂNEO, José Carlos. School educative aims and internationalization of educational policies: impacts on curriculum and pedagogy. European Journal of Curriculum Studies, Braga, v. 3, n. 2, p. 444-462, 2016. e Libâneo e Silva (2020)LIBÂNEO, José Carlos; SILVA, Eliane. Finalidades educativas escolares e escola socialmente justa: a abordagem pedagógica da diversidade social e cultural. Revista on-line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 24, n. esp. 1, p. 816-840, 2020. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/rpge/article/view/13783. Acesso em: 14 nov. 2022.
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–, poderíamos dizer que as competências socioemocionais servem para a promoção de mudanças comportamentais capazes de moldar e monitorar os(as) alunos(as) como se deve, de forma a se garantir melhores condições de trabalho e consumo, que dependem diretamente da incorporação de certos padrões/hábitos de saúde e bem-estar – devidamente emoldurados como produtos de mercado e consumo – sem os quais a formação de futuros indivíduos empreendedores bem-sucedidos não se sustenta.

Nota-se, portanto, que a BNCC cumpre muito mais do que uma simples função referencial. Nela estão contidas estratégias e táticas políticas eficientes de controle dos corpos na escola. E muito dessa eficiência passa pela valorização das competências socioemocionais – tal como destaca Muños (2022)MUÑOS, Jorge Andrés Jiménez. Educação Física como tecnológica política dos corpos: governamentalidade, biopolítica neoliberal no Brasil e na Colômbia. 2022. 193 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Humano e Tecnologias) – Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2022. em seus estudos – que, quando integradas às outras competências, ajudam a edificar a formação de futuros indivíduos empreendedores bem-sucedidos.

Tensionamentos acerca do Autoconhecimento

Neste momento, ousamos deixar, por um momento, o alinhamento atribuído ao autoconhecimento na BNCC, para pensá-lo de maneira diferente.

E, para começar, poderíamos dizer que o autoconhecimento se distingue de todo conhecimento puramente teórico, objetivo e racional, justamente por sua característica vívida e singular, que escapa a todo e qualquer esforço de abstração e universalização. Assim, quando tangenciamos questões concernentes ao autoconhecimento, acendemos para um domínio distinto daquele em que vigoram os termos, em suas formalidades estáticas. E é aí, nessa ascensão – sempre episódica, provisória e performativa –, que escapamos à ótica das competências, dando passagem para um movimento intensivo e dinâmico de construção dos pensamentos.

É nesse movimento intensivo e dinâmico de construção dos pensamentos que tangenciamos o autoconhecimento em sua irredutibilidade, como expressão fulgurante que se confunde com o exercício do próprio viver. Assim, como um movimento intensivo e dinâmico, que se diferencia enquanto ainda houver vida, o autoconhecimento reclama sempre por um ponto de clivagem, isto é, por um agente disparador só tangível pelo sujeito do conhecimento quando ele sente o acossar de certa urgência, ou, ainda, de uma certa necessidade inquietante, que emerge em si, traçando os sulcos de um autoconhecimento sempre em processo de elaboração na existência10 10 No centro desse processo de elaboração da existência, pulsa o princípio do cuidado de si mesmo, que Foucault foi buscar lá na antiguidade clássica, em seus últimos estudos acerca da estilística da existência. Para Foucault (2006a), o princípio do cuidado dota os sujeitos de coragem que é o motor de partida de todas as nossas realizações. É a atitude corajosa que desloca o exercício do autoconhecimento para além de uma função puramente intelectiva e estática, impedindo que o princípio de ação do cuidado se torne passível de ser replicado e universalizado amplamente. .

Talvez, essa mesma urgência e necessidade inquietantes aproximem as tradições filosóficas orientais e ocidentais quando às voltas com o autoconhecimento. Em que pesem as evidentes distinções como essas diferentes culturas trataram do tema, o acossar de uma urgência, e de uma necessidade inquietante, parecem se constituir como fatores comuns a ambas tradições, que dão passagem ao autoconhecimento.

Foi assim, por exemplo, com o guerreiro Arjuna, no poema épico indiano Bhagavad Gita11 11 Bhagavad Gita significa Cântico do Senhor, trata-se de uma escritura indiana antiga que faz parte da epopeia Mahabharata. O Gita, como é chamado, consiste de 18 capítulos, apresentados sob a forma de um diálogo entre Krishna, o mestre, e seu discípulo Arjuna na eminência da histórica batalha de Kurukshetra. Muito mais do que um texto religioso, o Gita é considerado um tratado de yoga e também uma alegoria que encena a batalha interna que todos nós devemos travar entre nós e nós mesmos, confrontando permanentemente as boas e as más tendências que atravessam nossas existências humanas (Vyãsa, 2018). e também com o jovem aristocrata grego, Alcebíades, no diálogo socrático Alcebiades I, retratado por Platão, na antiguidade clássica. No primeiro caso, Arjuna, em frente ao campo de batalha, na iminência de um confronto mortal e sangrento entre pares – que deveriam conviver entre si –, vê-se inundado pela necessidade de ultrapassar a capacidade intelectiva e, assim, abrandar seu sofrimento. E é justamente aí, no despontar dessa dramática e inevitável urgência, que Arjuna pede o conhecimento à Krishna12 12 Bhagavan Krishna, foi um grande mestre que viveu na Índia antiga, antes da era cristã. Foi membro de uma família de monarcas de um grande reino no norte da Índia. O termo Krishna, como Cristo, é um título espiritual, que denota a sua grandeza divina (Vyãsa, 2018). , que só então o transmite como sabedoria sutil, só mobilizada quando permitimos nos recolher em nós mesmos, na busca pelo ser divino em nós.

Já em Alcebíades I, na tradição antiga ocidental, evidencia-se uma outra urgência que, é claro, não se compara à de Arjuna, mas, ainda assim, é igualmente inquietante. Na iminência de ocupar um cargo no governo grego e assim assumir aquilo que nasceu para fazer, como rico e influente aristocrata que era, Alcebíades pede o conhecimento a seu mestre Sócrates, indagando-o: “Mestre, o que devo fazer para bem governar?”. E Sócrates, por sua vez, como aquele que se sensibiliza ao acossar da urgência, responde: “Cuide de si mesmo! Ocupe-se consigo mesmo!”13 13 A citação do diálogo socrático Alcebíades I é aqui resgatada a partir dos estudos foucautianos, portanto, se faz de maneira indireta. No curso ministrado em 1982, no Collège de France – o qual foi posteriormente transcrito e editado em formato de livro, dando origem à obra A hermenêutica do sujeito (2006a), Foucault atribui a esse diálogo o aparecimento da primeira formulação filosófica do princípio do cuidado de si mesmo, em meio ao qual o autoconhecimento irrompe, como motor de partida da existência. (Foucault, 2006aFOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2006a., p. 91). E é essa mesma urgência e necessidade inquietantes que sondam os bastidores das nossas escolhas que, uma a uma, vão trilhando os caminhos da existência.

Aliando-se aqui com a análise que Foucault faz acerca da estilística da existência, poderíamos dizer que é no bojo dessa urgência e necessidade inquietantes que o autoconhecimento irrompe como motor de partida de todas as nossas realizações, dando encaminhamento para um “treino de si sobre si mesmo” (Foucault, 2006bFOUCAULT, Michel. A escrita de si. In: FOUCAULT, Michel. Ditos e Escritos: Ética, Sexualidade, Política. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006b. P. 144-162., p. 146) que escapa indefinidamente do simples reconhecimento, identificação e adequação dos Projetos de Vida, de modo a traçar os sulcos de um movimento ascético, laborioso e visceral, em meio ao qual, lapidamos a arte/técnica de viver.

Somando-se a essa ideia, gostaríamos aqui de aproximar outra: se o autoconhecimento não é um movimento gratuito que se dá a todo aquele que, por boa vontade quer, simplesmente se autoconhecer; se o autoconhecimento nasce de uma necessidade inquietante e de uma urgência que acossa, pedindo passagem; o autoconhecimento é também aquilo que nos provoca, que nos desacomoda. Em outras palavras, o autoconhecimento é aquele movimento que força o pensamento a pensar e que, portanto, nos convoca a pensar em nossos próprios termos, sem referência a qualquer outro.

É nesse domínio, de um pensamento que é forçado a pensar, que se torna descabida, ou, ao menos, limitada a função referencial do autoconhecimento como uma competência geral de ensino na BNCC. Portanto, o autoconhecimento é sempre outro, indefinidamente, ultrapassando os discursos identitários e as lógicas preventivas e prescritivas de construção do exercício de se autoconhecer.

Pensar o autoconhecimento nesse outro domínio de construção do pensamento – que escapa às suas funções referenciais pré-estabelecidas – é pensá-lo, à moda foucaultiana, como um exercício de invenção estilística da existência. Assim, como invenção e arte de viver, o autoconhecimento não tem uma imagem pressuposta, pois é pura diferenciação no traço performativo dos sujeitos que elaboram e lapidam permanentemente suas existências. Nesse enfoque diferencial, o autoconhecimento escapa ao modelo da representação que, em última análise, baliza a organização das competências e das habilidades que edificam as metas do exercício educacional.

Para entender melhor esse movimento conceitual que aqui se esboça, será preciso voltar um passo atrás e perguntar: o que significa pensar dentro dessa lógica inventiva e compositiva aqui atribuída ao autoconhecimento? É no bojo desta discussão que buscamos também, nestas alturas, uma aliança com os estudos Deleuzianos.

O Autoconhecimento como Pensamento e Criação

Para Deleuze (1999)DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. Tradução: Luiz Orlandi. São Paulo: Editora 34, 1999., o exercício do pensar se confunde com o movimento da própria vida e, se há uma característica peculiar que pode ser atribuída à vida, tal característica seria a sua diferenciação continua: tentamos controlá-la, tentamos organizá-la, tentamos regulamentá-la e adequá-la continuamente, mas a vida sempre escapa e se modifica14 14 É importante ressaltar aqui, a influência de Henri Bergson nesta leitura vitalícia de Deleuze atribuída ao exercício do pensar. Para Deleuze, a filosofia bergsoniana apresenta a vida como um movimento que vaza continuamente ao enquadre das regularidades, criando-se e recriando-se indefinidamente. Assim pontua: “A vida é o processo da diferença […] a diferenciação vem da resistência encontrada pela vida do lado da matéria, mas, inicialmente, ela vem sobretudo da força explosiva interna que a vida traz em si […]. A vida difere de si mesma” (Deleuze, 1999, p. 106-107). . É nessa direção diferencial de afirmação da vida que Deleuze ousa explorar seus estudos acerca do exercício do pensamento, de modo a afirmar sua natureza criativa, inventiva e compositiva, por meio da qual intensificamos o exercício do viver.

Ao contrário dessa afirmação da vida, a tradição filosofia ocidental, de maneira geral, optou por um outro caminho afirmativo, que tenta recobrir de todas as maneiras possíveis essa natureza criativa do ato de pensar, para validar outras funções do pensamento, pautadas pelo modelo da representação15 15 O modelo da representação sustenta imagens hegemônicas que operam tal como um juiz, definindo o que é certo do que é errado, o que é bom, do que é mal e, assim, demarcando sempre as distinções e dicotomias. Nesse domínio intelectivo, a construção do pensamento assume uma função judicativa, que pressupõe certa vontade de verdade, de cunho amplamente dogmático, sem a qual não erige o pensamento representativo (Schöpke, 2012). .

E para sustentar esse enfoque baseado na representação, a tradição filosófica ocidental precisou afirmar pelo menos três pressupostos básicos. O primeiro deles reza que é preciso pressupor que o pensamento é um exercício natural, que parte da boa vontade do sujeito pensante. Em segundo lugar, é preciso pressupor que o corpo, os afetos e as sensações nos levam ao erro, consequentemente, esses fatores nos distanciam da verdade – o que nos leva à necessidade de buscar sempre a retidão do pensar, só garantida pela razão. E, por fim, dentro da tradição filosófica ocidental, é preciso garantir a priori a afirmação de um método devidamente legitimado pela ciência, sem o qual o sujeito que pensa à luz dessa tradição não é capaz de produzir conhecimento (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012., p. 25-26). Seguindo à risca esses três pressupostos, o sujeito pensante chega a um conhecimento legitimamente neutro, imparcial e objetivo, válido para qualquer lugar e para qualquer tempo16 16 Para Deleuze, esses pressupostos básicos – também chamados de “postulados implícitos” (Schöpke, 2012, p. 26) vigoram na chamada filosofia da identidade, que se ocupa com a análise, a compreensão e a reflexão de tudo aquilo que não muda ao longo do tempo e que, portanto, se afina com uma questão identitária, através da qual se organiza a composição de pensamentos universais. O grande problema desta fórmula de construção do pensamento é que se trata de uma ilusão, haja vista que tudo está fadado a ser transformado e diferenciado continuamente, ainda que o nosso apego e a nossa sensação de tempo dificultem a percepção da impermanência. . Ao apostar todas as fichas no modelo da representação, a tradição filosófica ocidental tornou sedentário o exercício do pensamento.

Mas, o que seria um pensamento sedentário? Trata-se de um tipo de pensamento que torna equivalente a ação do pensar e o ato de representar. Nesta equivalência, ao invés de afirmar sua função inventiva, compositiva e diferencial – que dá leveza, fluência e liberdade ao exercício do pensar – opta-se pela afirmação de uma imagem do pensamento já dada e, por isso mesmo, pesada, estática e sedentária (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.).

Em detrimento dessa função sedentária do pensamento, Deleuze ousa indagar: seria possível pensar sem afirmar imagens dogmáticas? Dito de outro modo: seria possível pensar em um pensamento sem imagem? Se assumirmos que a resposta para essas questões for sim; o que seria, então, um pensamento sem imagem?

Para responder essas questões, Deleuze precisou conceber outra lógica filosófica, alheia àquela entendida como ciência das leis do pensamento17 17 A ciência das leis do pensamento se ocupa com as regularidades, as quais devemos obedecer para pensar corretamente. À luz dessa ciência a única questão que realmente importa é a seguinte: quais são as leis que o pensamento obedece? Na esteira dessa questão fundamental, a retidão do pensamento se alicerça, só garantida quando assentada sobre os trilhos da razão clássica (Schöpke, 2012). . E para alcançar essa outra lógica, Deleuze se avizinha de algumas pistas observadas em Spinoza – filósofo do século XVII – acerca dos afetos, para destacar o seguinte: a função sedentária diminui a potência de ação e expressão do pensamento, gerando tristeza; por outro lado, quando o pensamento ousa romper com sua função sedentária, a ação do pensar se desacomoda, isto é, sai do seu lugar comum, forçando o pensamento a pensar diferentemente. Como efeito dessa desacomodação, produzimos afetos alegres, que ampliam nossa potência de ação e expressão (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.).

É nessa direção vitalícia, alegre e diferencial de composição do exercício do pensar que Deleuze concebe sua lógica filosófica. Em última análise, ela é uma lógica que coloca o pensamento em movimento, ao afirmar sua dimensão aberta e sensível ao acolhimento de interferências e ao encadeamento das mutações que deslocam o pensamento continuamente.

Preambulações (In)conclusivas

Avizinhando-nos dessa discussão filosófica, tecida a partir do pensamento do filósofo Gilles Deleuze, ousamos afirmar que o autoconhecimento escapa à lógica sedentária, forçando o pensamento a pensar nas entrelinhas da representação. Dito de outro modo, poderíamos dizer que o autoconhecimento se confunde com o movimento de diferenciação do pensamento que, por sua vez, só é alcançado quando ousamos operar o exercício do pensar fora da lógica das competências gerais de ensino.

Assim, quando insistimos na leitura do autoconhecimento à luz das competências, evidencia-se aí certa ausência daquilo que o autoconhecimento pode vir a ser e modificar. Tal ausência não desqualifica o enfoque formal das competências gerais, haja vista que é inegável sua ampla eficiência e efetividade quando a ideia é afirmar uma função referencial que, no caso da competência 8, pretende organizar a priori as estratégias e táticas de abordagem e tratamento do autoconhecimento na escola.

Não obstante, vale ressaltar que essa função referencial está longe de figurar como um ponto de partida neutro, objetivo e puramente inocente de organização do trabalho educativo. Conforme constatamos, a partir do percurso genealógico desenvolvido neste presente manuscrito, o enfoque atribuído ao autoconhecimento na BNCC (e, de maneira geral, o enfoque dado às competências gerais de ensino) assume mais compromisso com funções relacionadas ao controle e organização biopolítica dos corpos escolares, do que com a ação educativa efetivamente constituída em sala de aula.

Ora, se o autoconhecimento se encontra fora do enquadre das competências, para tangenciá-lo será preciso ultrapassar os termos – que organizam as competências gerais de ensino – e deslocar a atenção na direção das relações que efetivamente colocam o autoconhecimento em cena no contexto escolar. E é justamente aí – nesse deslocamento atencional que se orienta para o fora – que tangenciamos um domínio de mobilização do autoconhecimento mais aberto, em meio ao qual se instala um nível de percepção da realidade educativa mais micropolítico e intensivo, que nos força a pensar no autoconhecimento de maneiras diferentes.

Como guisa à uma melhor compreensão desse movimento conceitual, acima delineado, talvez fosse interessante retomar brevemente algumas alianças que Deleuze faz com seus intercessores, para pensar acerca deste fora acima citado e reiteradamente destacado. Ao se aliar com Nietzsche e sua filosofia, Deleuze (2001, p. 85-89)DELEUZE, Gilles. Nietzsche e a filosofia. Portugal: Rés-Editora, 2001. pontua:

O pensamento nunca pensa sozinho […]. Pensar depende das forças que se apoderam do pensamento […]. Pensar, como atividade, é […] um extraordinário acontecimento no próprio pensamento, para o próprio pensamento. Pensar é uma enésima potência do pensamento […]. É preciso que uma violência se exerça sobre ele enquanto pensamento, é preciso que um poder force-o a pensar, lance-o num devir-ativo.

Somando-se a esse pensamento, cabe ressaltar também outro, que Deleuze vai buscar aliando-se com Proust, no qual observa o seguinte: “Sem algo que force a pensar, sem algo que violente o pensamento, este nada significa. Mais importante do que o pensamento é o que ‘dá que pensar’; […] o essencial está fora do pensamento, naquilo que força a pensar” (Deleuze, 2010DELEUZE, Gilles. Proust e os signos. Tradução: Antonio Piquet e Roberto Machado. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010., p. 90).

Ao afirmar que o pensamento nunca pensa sozinho, e que é preciso que uma violência se exerça no exercício de construção do pensamento para que, assim, no acossar dessa desacomodação, a ação do pensar se erija, Deleuze chama a atenção para o fora, isto é, para os fatores extrínsecos que desencadeiam o trabalho inventivo e compositivo de construção dos pensamentos.

Por fim, outra aliança pede aqui passagem, na qual Deleuze vai buscar uma alegoria observada em Spinoza, filósofo do século XVII, para dizer que esses fatores extrínsecos são como os ventos que chegam por trás, impelindo-nos a seguir adiante, de modo a traçar os sulcos de uma trajetória errante, que não sabemos muito bem onde vai dar, a não ser que aceitemos o desafio de nos deixarmos levar pelo rumo dos ventos que sopram (Deleuze, 2002DELEUZE, Gilles. Espinosa– filosofia prática. Tradução: Daniel Lins e Fabien Pascal Lins. São Paulo: Editora Escuta, 2002.).

Ousamos dizer que é no soprar desses ventos que se aninha a parcela que falta ao autoconhecimento quando observado à luz das competências. Convém salientar, no entanto, que a presença insondável desse sopro não desqualifica a função referencial do autoconhecimento, mas chama a atenção para a necessidade de ultrapassá-la indefinidamente nas relações educativas efetivamente constituídas junto aos(às) alunos(as), em meio às quais, os ventos sopram, animando os processos de ensino e aprendizagem. Assim, entre ventos que vêm e que vão, ultrapassamos os termos que enquadram o autoconhecimento e deixamos de nos apoiar excessivamente nas lógicas identitária e prescritiva, que o alinham com o exercício da identificação, adequação e ajustamento das condutas individuais.

Como desdobramento desse sopro dos ventos, aparecem furtivas e inacabadas outras possibilidades de expressão do autoconhecimento que, em vez de referendar aquilo que já sabemos acerca do processo de se autoconhecer, ousam intensificar a potência criativa, díspar e singular das sensibilidades, no encontro e no acolhimento com as diferenças, em si mesmo e nos outros, para a composição de modos de vida mais flexíveis, vívidos e abertos.

Inflexões para a Educação Física Escolar

Partindo dessas discussões observadas nas seções acima, perguntamos: como estar sensível à passagem dos ventos que nos impele para frente no contexto da Educação Física Escolar? Ou, dito de outro modo: como estar sensível às expressões diferenciais do autoconhecimento no contexto escolar?

Não interessa aqui apresentar respostas cabais a essas questões supracitadas, tampouco transformar essa discussão em uma espécie de teoria geral acerca do autoconhecimento na escola; no entanto, cabe constatar um fato que talvez possa oferecer pistas para lidar com essas questões de maneira mais aberta, livre e potente. E o fato é o seguinte: nós, na Educação Física, somos continuamente atravessados pelo movimento em todos os conteúdos e práticas que gravitam ao redor dessa disciplina escolar. Poderíamos dizer, inclusive, que o movimento é uma das grandes paixões da Educação Física, dentro e fora da escola!

Para Deleuze (2006, p. 93), o movimento “[…] implica uma pluralidade de centros, uma superposição de perspectivas, uma imbricação de pontos de vista, uma coexistência de momentos que deformam essencialmente a representação”. É desse lugar movente e pluricêntrico que pulsam as expressões diferenciais do autoconhecimento, para além de toda e qualquer imagem dogmática que ouse representá-lo.

Talvez esse conceito de movimento, apresentado por Deleuze, cause certo estranhamento, pois no campo da Educação Física há uma tendência histórica de olhar para o movimento dentro de uma perspectiva totalmente outra, que tende a privilegiar o enquadre das regularidades, ao invés dessa dimensão pluricêntrica destacada por Deleuze.

Esse enquadre regularizado e regularizante alimentou os enfoques higienistas, militaristas e esportivistas, que recobrem grande parte da história da Educação Física Escolar, e que ainda hoje se afirmam na prática pedagógica. Não obstante, quando damos abertura ao lúdico, ao trabalho sensível, criativo, expressivo e a outras tantas propostas abertas que demandam pela atuação cooperativa e colaborativa tanto dos(as) alunos(as) quanto do(a) próprio(a) professor(a), encontramos uma via de acesso a esse movimento que deforma essencialmente a representação.

Mesmo quando abrimos espaços para a competitividade nas aulas de Educação Física esses afetos alegres podem aparecer amplamente, desde que a expressão dessa competitividade seja sempre vigiada e dosada na mobilização das relações coletivas, em função da produção de uma dinâmica relacional que amplie a potência de ação dos agentes envolvidos. Nesse tocante, cabe salientar que essa versão da competição passa pela noção de Esporte Educacional18 18 O Esporte Educacional é uma das definições do esporte definidas pela Lei Pelé n. 9.615, de 24 de Maio de 1998. Surge do entendimento que a prática esportiva é um fenômeno plural que possui diferentes sentidos e significados, a depender de quem, onde, quando e a forma na qual é praticado. Segundo o Esporte Educacional, a seletividade e a hipercompetitividade devem ser evitadas entre os participantes, de modo a focar no desenvolvimento integral e na formação para a cidadania (Gonzáles; Darido; Oliveira, 2014). , que se refere à uma prática de mobilização do esporte regida pelos princípios da participação, da inclusão, da emancipação, do cooperativismo, do regionalismo e da coeducação, ou seja, por princípios que nos tornam sujeitos mais sensíveis ao rumo insondável dos ventos que nos passam nas relações em curso dentro de um encontro educativo.

Estamos cientes de que essa discussão referente aos esportes também aciona mecanismos de representação e identificação subjetiva quando trabalhados na escola, incorrendo, portanto, nos mesmos perigos que o autoconhecimento enfrenta quando observado à luz das regularidades. No entanto, o que se quer evidenciar aqui, é o potencial do esporte na intensificação das relações entre os(as) alunos(as) escolares, que pode alterar a percepção dos envolvidos na direção de outros domínios ainda não plenamente regularizados.

Tal alteração pode acontecer, por exemplo, quando relaxamos as regras do jogo, adaptando-as conforme as demandas vigentes, ou ainda, quando abrimos possibilidades de negociação das regras com os(as) alunos(as), para atender situações problema captadas pelos(as) próprios(as) alunos(as) no transcorrer da relação coletiva. Na vigência desses outros domínios perceptivos, a intensificação pode se constituir em diferentes frentes, além da competitiva que já é tão característica das práticas esportivas.

Além disso, o que se quer evidenciar aqui é o potencial do esporte de se constituir de outras maneiras, que podem admitir, inclusive, a emergência de outros princípios, além daqueles já delineados pelo contexto do Esporte Educacional. Com isso, a possibilidade de inclusão do esporte nessa discussão heterogênea e diferencial não se sustenta a partir daquilo que já sabemos sobre o esporte, mas sim a partir daquilo que ele pode vir a ser e se modificar indefinidamente, em resposta às demandas situacionais instaladas na prática do jogo esportivo.

Com essa discussão sobre o esporte, o que se quer evidenciar aqui é que quando damos vez e voz àqueles movimentos que se diferenciam continuamente nas relações, encontramos sempre uma via de acesso aos ventos, isto é, aos fatores que apontam para expressões diferenciais acerca do autoconhecimento nas aulas de Educação Física. E uma pista importante para pousar nossa atenção aí, nesse fora, é focar na qualidade das relações, em que esses diferentes trabalhos (sejam eles lúdicos, sensíveis, criativos, expressivos, cooperativos, colaborativos e, até mesmo, competitivos) crescem e se intensificam.

Resta-nos, como educadores, instigar em nós habilidades relacionais, que estimulem a composição de uma atitude de abertura, humildade, afetividade, amorosidade e gentileza, que são essenciais para estar sensível ao rumo dos ventos que nos chegam por trás impelindo-nos para frente. E uma dica importante, para estimular o desenvolvimento dessas habilidades relacionais, é se atentar ao fato de que essas habilidades só se avizinham nos encontros, projetando-se em diferentes níveis que consideram tanto o encontro de si sobre si mesmo, como a dinâmica relacional que estabelecemos com o espaço e com os outros durante as aulas de Educação Física.

Essa característica amplamente relacional atribuída ao autoconhecimento faz pensar que o trabalho pedagógico envolvendo esse conceito tem mais a ver com o modo pelo qual o exercício educativo é instalado – com sua qualidade afetiva e com o quanto de intensificação da experiência educativa este modo suporta, para ampliar a potência de ação dos agentes envolvidos – do que com o conteúdo em si, em sua superficialidade temática e referencial.

Por fim, cabe ressaltar que, sabemos o quão confuso e desestabilizante pode ser essa discussão, que pede passagem aos ventos e ao fora, isto é, para um domínio relacional só tangível na ultrapassagem dos termos de organização do trabalho educativo, mas é justamente nessa confusão e desestabilização que o autoconhecimento vaza à sua função referencial. E para tangenciar o autoconhecimento dessa maneira indagamos: que tal sentir o rumo dos ventos que chegam por trás nos encontros educativos? Talvez aí possamos encontrar outros direcionamentos mais inconclusivos, inventivos e diferenciais acerca do autoconhecimento na Educação Física Escolar.

Notas

  • 1
    Essa tensão que aqui se fala também pode ser observada nos estudos pedagógicos desenvolvidos no contexto das teorias pós-críticas e decoloniais. Quando, por exemplo, os estudos freireanos (Freire, 1996FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.; 2005FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.) questionam a noção de conteúdo como dado universal, passível de ser transmitido de maneira uniforme em qualquer contexto de ensino, situa-se aí também um tensionamento que abala as formalidades que organizam o exercício educativo, forçando sua diferenciação constante. O tensionamento, portanto, marca uma inflexão no trabalho pedagógico, orientando-o na direção dos processos educativos, isto é, das relações que se mobilizam continuamente de acordo com os interesses e necessidades das partes aí envolvidas.
  • 2
    A análise de cunho genealógico que foi empregada neste manuscrito buscou inspiração nos estudos foucaultianos, nos quais a genealogia é entendida como um procedimento de investigação que se ocupa em restituir “[…] as condições de emergência de uma singularidade no interior de uma rede de múltiplos processos e mecanismos heterogêneos” (Muños, 2022MUÑOS, Jorge Andrés Jiménez. Educação Física como tecnológica política dos corpos: governamentalidade, biopolítica neoliberal no Brasil e na Colômbia. 2022. 193 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Humano e Tecnologias) – Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2022., p. 24). Para operar esse intento, a genealogia não busca pelas origens históricas daquilo que está sendo pesquisado e, portanto, se esquiva da busca pela essência das coisas e de uma certa identidade fixa atribuída a tal objeto pesquisado. Ao invés disto, a genealogia: “[…] tem por objetivo assinalar a singularidade dos acontecimentos que, por sua vez, remetem ao acaso, à diversidade, à discórdia, ao erro. Ela busca descontinuidades onde desenvolvimentos contínuos foram encontrados” (Martins, 2000, p. 152).
  • 3
    Seguindo a abordagem genealógica assumida nesta parte do texto, a ação diagnóstica aqui empregada buscou respaldo na filosofia foucaultiana, que compreende o exercício filosófico como uma prática de diagnóstico da atualidade. Nesse sentido, diagnosticar significa “interrogar o presente”, marcando o que nele se diferencia continuamente (Castro, 2009CASTRO, Edgardo. Vocabulário de Foucault: um percurso pelos seus temas, conceitos e autores. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009., p. 107). Na esteira dessa ideia, cabe ressaltar que, quando situamos a intenção de diagnosticar os termos com os quais a BNCC compreende o autoconhecimento, o que se quer é dar vez e voz para aquilo que se apresenta sob o signo da diferença quando o assunto é se autoconhecer, e que, portanto, interroga continuamente os termos desta diretriz educacional.
  • 4
    Tomando Deleuze (2006)DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 2006. como referência, podemos dizer que discussões heterogêneas e diferenciais são modos de composição do pensamento tecidos de maneira múltipla, como “casos de resolução” (Deleuze, 2006DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 2006., p. 260) sempre dinâmicos e provisórios e que, portanto, estão fadados a serem ultrapassados continuamente. Se distinguem das discussões tecidas à luz do modelo da representação.
  • 5
    Para esclarecer essa operação conceitual que aqui se anuncia (por meio da qual se constituirá a prática da escrita acerca do autoconhecimento), é importante situar a noção de conceito observada por Deleuze e Guattari (1992)DELEUZE Gilles; GUATARI Félix. O que é a Filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.. Segundo esses autores, “[…] os conceitos são centros de vibrações, cada um em si mesmo e uns em relação aos outros. É por isso que tudo ressoa, em lugar de se seguir ou de se corresponder” (Deleuze; Guattari, 1992DELEUZE Gilles; GUATARI Félix. O que é a Filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34, 1992., p. 31). Nesse sentido, todo conceito comporta uma atitude díspar que gera uma rede de conexões entre uma multiplicidade de elementos que ressoam entre si, subvertendo continuamente o exercício do pensamento. Na esteira desta ideia, todo conceito é um ato de pensamento que se organiza de modo intensivo, promovendo alianças com outros conceitos que diferenciam continuamente o exercício do pensar (Deleuze; Guattari, 1992DELEUZE Gilles; GUATARI Félix. O que é a Filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.).
  • 6
    Na esteira dessa discussão, cabe ressaltar que a BNCC define competência como “a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho”. Assim, neste contexto, delimitado por competências gerais de ensino, “a educação deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservação da natureza, mostrando-se também alinhada à Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU)” (Brasil, 2017BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017., p. 08).
  • 7
    É importante salientar, no entanto, que Butler (2015)BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução: Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015. não é contra a política identitária, mas chama a atenção para a necessidade de a ultrapassarmos, indo além da dos discursos binários e normativos, de caráter universalizantes, para a afirmação de uma existência tecida na precariedade e no traço de uma perfomatividade em ato nas relações, de onde emerge uma luta mais ampla para a transformação radical da realidade.
  • 8
    Só a título de informação, seguem alguns exemplos de práticas que se alocam dentro do contexto das Ginásticas de Conscientização Corporal: Biodança, Bioenergética, Eutonia, Antiginástica, Método Feldenkrais, Ioga, Tai Chi Chuan, dentre outras manifestações também chamadas de práticas Somáticas, Contemplativas ou Holísticas.
  • 9
    O cenário neoliberal se refere ao contexto, no qual eclodem os interesses do neoliberalismo, à saber: o Estado mínimo, a prática do livre mercado e a meritocracia constitucional (Muños, 2022MUÑOS, Jorge Andrés Jiménez. Educação Física como tecnológica política dos corpos: governamentalidade, biopolítica neoliberal no Brasil e na Colômbia. 2022. 193 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Humano e Tecnologias) – Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2022.). É nesse cenário neoliberal que as tecnologias biopolíticas são mobilizadas para transformar cidadãos e empregados em auto empreendedores.
  • 10
    No centro desse processo de elaboração da existência, pulsa o princípio do cuidado de si mesmo, que Foucault foi buscar lá na antiguidade clássica, em seus últimos estudos acerca da estilística da existência. Para Foucault (2006a)FOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2006a., o princípio do cuidado dota os sujeitos de coragem que é o motor de partida de todas as nossas realizações. É a atitude corajosa que desloca o exercício do autoconhecimento para além de uma função puramente intelectiva e estática, impedindo que o princípio de ação do cuidado se torne passível de ser replicado e universalizado amplamente.
  • 11
    Bhagavad Gita significa Cântico do Senhor, trata-se de uma escritura indiana antiga que faz parte da epopeia Mahabharata. O Gita, como é chamado, consiste de 18 capítulos, apresentados sob a forma de um diálogo entre Krishna, o mestre, e seu discípulo Arjuna na eminência da histórica batalha de Kurukshetra. Muito mais do que um texto religioso, o Gita é considerado um tratado de yoga e também uma alegoria que encena a batalha interna que todos nós devemos travar entre nós e nós mesmos, confrontando permanentemente as boas e as más tendências que atravessam nossas existências humanas (Vyãsa, 2018VYÃSA, Krsna Dvaipayana. Bhagavad Gita. Tradução e notas: Carlos Eduardo G. Barbosa – versão bilíngue (sânscrito/português). São Paulo: Mantra, 2018.).
  • 12
    Bhagavan Krishna, foi um grande mestre que viveu na Índia antiga, antes da era cristã. Foi membro de uma família de monarcas de um grande reino no norte da Índia. O termo Krishna, como Cristo, é um título espiritual, que denota a sua grandeza divina (Vyãsa, 2018VYÃSA, Krsna Dvaipayana. Bhagavad Gita. Tradução e notas: Carlos Eduardo G. Barbosa – versão bilíngue (sânscrito/português). São Paulo: Mantra, 2018.).
  • 13
    A citação do diálogo socrático Alcebíades I é aqui resgatada a partir dos estudos foucautianos, portanto, se faz de maneira indireta. No curso ministrado em 1982, no Collège de France – o qual foi posteriormente transcrito e editado em formato de livro, dando origem à obra A hermenêutica do sujeito (2006a), Foucault atribui a esse diálogo o aparecimento da primeira formulação filosófica do princípio do cuidado de si mesmo, em meio ao qual o autoconhecimento irrompe, como motor de partida da existência.
  • 14
    É importante ressaltar aqui, a influência de Henri Bergson nesta leitura vitalícia de Deleuze atribuída ao exercício do pensar. Para Deleuze, a filosofia bergsoniana apresenta a vida como um movimento que vaza continuamente ao enquadre das regularidades, criando-se e recriando-se indefinidamente. Assim pontua: “A vida é o processo da diferença […] a diferenciação vem da resistência encontrada pela vida do lado da matéria, mas, inicialmente, ela vem sobretudo da força explosiva interna que a vida traz em si […]. A vida difere de si mesma” (Deleuze, 1999DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. Tradução: Luiz Orlandi. São Paulo: Editora 34, 1999., p. 106-107).
  • 15
    O modelo da representação sustenta imagens hegemônicas que operam tal como um juiz, definindo o que é certo do que é errado, o que é bom, do que é mal e, assim, demarcando sempre as distinções e dicotomias. Nesse domínio intelectivo, a construção do pensamento assume uma função judicativa, que pressupõe certa vontade de verdade, de cunho amplamente dogmático, sem a qual não erige o pensamento representativo (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.).
  • 16
    Para Deleuze, esses pressupostos básicos – também chamados de “postulados implícitos” (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012., p. 26) vigoram na chamada filosofia da identidade, que se ocupa com a análise, a compreensão e a reflexão de tudo aquilo que não muda ao longo do tempo e que, portanto, se afina com uma questão identitária, através da qual se organiza a composição de pensamentos universais. O grande problema desta fórmula de construção do pensamento é que se trata de uma ilusão, haja vista que tudo está fadado a ser transformado e diferenciado continuamente, ainda que o nosso apego e a nossa sensação de tempo dificultem a percepção da impermanência.
  • 17
    A ciência das leis do pensamento se ocupa com as regularidades, as quais devemos obedecer para pensar corretamente. À luz dessa ciência a única questão que realmente importa é a seguinte: quais são as leis que o pensamento obedece? Na esteira dessa questão fundamental, a retidão do pensamento se alicerça, só garantida quando assentada sobre os trilhos da razão clássica (Schöpke, 2012SCHÖPKE, Regina. Por uma filosofia da diferença: Gilles Deleuze, o pensador nômade. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.).
  • 18
    O Esporte Educacional é uma das definições do esporte definidas pela Lei Pelé n. 9.615, de 24 de Maio de 1998. Surge do entendimento que a prática esportiva é um fenômeno plural que possui diferentes sentidos e significados, a depender de quem, onde, quando e a forma na qual é praticado. Segundo o Esporte Educacional, a seletividade e a hipercompetitividade devem ser evitadas entre os participantes, de modo a focar no desenvolvimento integral e na formação para a cidadania (Gonzáles; Darido; Oliveira, 2014GONZÁLES, Fernando Jaime; DARIDO, Suraya Cristina; OLIVEIRA, Amauri Aparecido Bássoli (Org.). Práticas Corporais e a organização do conhecimento –volume 3: Ginástica, dança e atividades circenses. Maringá: Eduem, 2014.).

Disponibilidade dos dados da pesquisa

O conjunto de dados de apoio aos resultados deste estudo está publicado no próprio artigo.

Referências

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Editado por

Editor responsável: Luís Armando Gandin

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2023
  • Aceito
    31 Maio 2023
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