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Incidência de distúrbios do sono em pacientes com doença de Alzheimer

RESUMO

Objetivo:

Determinar a incidência de distúrbios do sono em seguimento de 1 a 4 anos em pacientes com demência diagnosticada na primeira consulta, além de analisar características demográficas e comorbidades associadas.

Métodos:

Cento e vinte e dois idosos com 60 anos ou mais e com o diagnóstico de demência (Alzheimer e outras) foram seguidos em um centro de referência geriátrico para demência. O protocolo clínico incluiu entrevista com o paciente e o cuidador, exame físico, laboratorial e de imagem. Os critérios para diagnóstico dos distúrbios do sono incluíram queixa de insônia pelo paciente ou cuidador utilizando o item sobre comportamentos noturnos do Inventário Neuropsiquiátrico.

Resultados:

A densidade de incidência de distúrbios do sono foi de 18,7/100 pessoas/ano. O risco de desenvolver distúrbios do sono no primeiro e quarto anos de seguimento foi de 9,8% e 50,9%, respectivamente. Análise multivariada de Cox revelou que o nível educacional menor que 8 anos e a presença de agressividade na primeira consulta foram fatores preditores independentes para desenvolver distúrbios do sono no seguimento, aumentando o risco em 3,1 (IC95%: 1,30-9,22) e 2,1 (IC95%: 1,16-4,17) vezes, respectivamente.

Conclusão:

A incidência de distúrbios do sono em pacientes dementes foi elevada e, neste estudo, particularmente associada ao baixo nível educacional e à agressividade na admissão.

Descritores:
Distúrbios do sono; Idoso; Demência; Doença de Alzheimer; Distúrbios do início e da manutenção do sono

ABSTRACT

Objective:

To determine the incidence of sleep disorder at a follow-up examination from 1 to 4 years, in demented patients diagnosed at first visit, besides analyzing associated demographic and comorbidities characteristics.

Methods:

A total of 122 elderly patients aged 60 years or older and diagnosed with dementia (Alzheimer and other) were followed in a reference geriatric center for dementia. The clinical protocols included interviews with patient and caregiver, complete physical examination, laboratory and imaging tests. Criteria for the diagnosis of sleep disorder included complain of insomnia from the patient or caregiver using the Neuropsychiatric Inventory nighttime.

Results:

The incidence density of sleep disorder among dements was 18.7/100 person/years. The risk of developing sleep disorder within the frst and fourth years of follow-up was 9.8% and 50.9%, respectively. Multivariate Coxregression analysis revealed that educational level less than 8 years and report of aggressiveness at baseline were an independent predictor of sleep disorder, increased risk in 3.1 (95%CI: 1.30-9.22) and 2.1 times (95%CI: 1.16-4.17), respectively.

Conclusion:

The incidence of sleep disorder in demented patients was elevated, and was particularly associated to low educational level and aggressiveness at admission.

Keywords:
Sleep disorders; Aged; Dementia; Alzheimer disease; Sleep initiation and maintenance disorders

INTRODUÇÃO

Os distúrbios do sono (DS) têm grande impacto na vida de pacientes com demência e na de seus cuidadores. Tais distúrbios aumentam o risco de institucionalização(11. Hope T, Keene J, Gedling K, Fairburn CG, Jacoby R. Predictors of institutionalization for people with dementia living at home with a carer. Int J Geriatr Psychiatry. 1998;13(10):682-90.), pioram a gravidade da doença de Alzheimer (DA)(22. Bonanni E, Maestri M, Tognoni G, Fabbrini M, Nucciarone B, Manca ML, et al. Daytime sleepiness in mild and moderate Alzheimers disease and its relationship with cognitive impairment. J Sleep Res. 2005; 14(3):311-7.) e afetam a saúde dos cuidadores(33. Lee D, Morgan K, Lindesay J. Effect of institutional respite care on the sleep of people with dementia and their primary caregivers. J Am Geriatr Soc. 2007;55(2):252-8.).

DS são muito comuns na DA(44. McCurry SM, Logsdon RG, Teri L, Gibbons LE, Kukull WA, Bowen JD, et al. Characteristics of sleep disturbance in community-dwelling Alzheimers disease patients. J Geriatr Psychiatry Neurol. 1999;12(2):53-9.,55. Cohen-Mansfield J, Werner P, Freedman L. Sleep and agitation in agitated nursing home residents: an observational study. Sleep. 1995; 18(8):674-80.). Estudos populacionais têm identificado prevalência de até 40% em vários estágios da DA(44. McCurry SM, Logsdon RG, Teri L, Gibbons LE, Kukull WA, Bowen JD, et al. Characteristics of sleep disturbance in community-dwelling Alzheimers disease patients. J Geriatr Psychiatry Neurol. 1999;12(2):53-9.

5. Cohen-Mansfield J, Werner P, Freedman L. Sleep and agitation in agitated nursing home residents: an observational study. Sleep. 1995; 18(8):674-80.
-66. Carpenter BD, Strauss M, Patterson MB. Sleep disturbances in community-dwelling patients with Alzheimers disease. Clin Gerontologist. 1996; 16(2): 35-49.). Entretanto, não temos evidências de estudos examinando a incidência dos DS com seguimento de pacientes com DA e outras demências.

OBJETIVO

Avaliar a incidência dos DS em uma coorte de pacientes brasileiros com DA e outras demências após 4 anos de seguimento e identificar os riscos associados.

MÉTODOS

Estudo de coorte retrospectivo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Brasília (UnB), CEP FM-UnB 080/2005.

Participantes

Foram incluídos pacientes com diagnóstico de demência que foram acompanhados por pelo menos 12 meses e que, durante esse período, foram examinados pelo menos duas vezes. As consultas de cada paciente em 2008 e os registros das consultas dos anos anteriores desde a primeira consulta foram considerados.

Entre os 250 pacientes acompanhados no Centro de Geriatria Médica em 2008 (Unidade Cognitiva Geriátrica), 128 foram excluídos devido a seguimento por menos de 1 ano (n=39), por possuir alteração cognitiva leve (n=20) e por outras possíveis causas de alteração cognitiva (depressão, hipotireoidismo, sífilis, uso de medicamentos e consumo de álcool).

Na admissão hospitalar, 31,4% (56/178) dos pacientes apresentaram DS. Assim, foram selecionados 122 indivíduos com demência sem DS cujas características estão resumidas na tabela 1. O Centro onde foi realizado o estudo é acreditado pelo Ministério da Saúde como centro de referência para pacientes com DA.

Tabela 1
Valores basais de indivíduos sem distúrbios do sono (n = 122) na avaliação basal

Avaliação

Os dados demográficos e clínicos coletados por entrevista e avaliação incluíram: gênero, idade, nível educacional (iletrado, menos de 4 anos, entre 4 e 8 anos, e mais de 8 anos de estudo), quantidade de medicamento por paciente, funcionalidade, tipo de demência e diagnóstico incorreto (definido como diagnóstico que mudou de DA para outra demência ou vice-versa durante o seguimento).

A agressividade foi considerada quando a resposta foi positiva para as questões: O paciente recusa-se a cooperar ou rejeita a ajuda de outros? O paciente é difícil de lidar? (agressão/agitação, item C, Escala de Avaliação de Comportamento Noturno - ECN)(77. Cummings JL, Mega M, Gray K, Rosenberg-Thompson S, Carusi DA, Gornbein J. The Neuropsychiatric Inventory: comprehensive assessment of psychopathology in dementia. Neurology. 1994;44(12):2308-14.).

Os dados clínicos foram reunidos por meio de avaliação geriátrica objetiva, um instrumento de triagem desenvolvido para pesquisa e estudo em nosso centro. Os pacientes realizaram exame físico, exames laboratoriais e de imagem. Os critérios utilizados foram: o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fourth Edition (DSM-IV)(88. APA. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4th edition ed. Washington, DC: American Psychiatric Association, 1994.) para diagnóstico de demência; os critérios do National Institute of Neurological and Communicative Diseases and Stroke/Alzheimer's Disease and Related Disorders Association (NINCDS-ADRDA)(99. McKhann G, Drachman D, Folstein M, Katzman R, Price D, Stadlan EM. Clinical diagnosis of Alzheimers disease: report of the NINCDS-ADRDA Work Group under the auspices of Department of Health and Human Services Task Force on Alzheimers Disease. Neurology .1984;34(7):939-44.) para DA (provável); o Instrumental Activities of Daily Living (IADL) para funcionalidade(1010. Lawton M P, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9(3):179-86.) a Escala Clínica de Demência, do inglês Clinical Dementia Rating (CDR) para caracterização do estágio da demência(1111. Hughes C P, Berg L, Danziger WL, Coben LA, Martin RL. A new clinical scale for the staging of dementia. Br J Psychiatry. 1982;140:566-72.) e testes neuropsicológicos para avaliação cognitiva.

A ECN inclui oito itens que são ordenados pela frequência de ocorrência durante o mês anterior(77. Cummings JL, Mega M, Gray K, Rosenberg-Thompson S, Carusi DA, Gornbein J. The Neuropsychiatric Inventory: comprehensive assessment of psychopathology in dementia. Neurology. 1994;44(12):2308-14.). Os DS foram consideradas quando os seguintes critérios ocorreram:

  • queixa de distúrbios durante o sono pelo paciente ou cuidador(1212. Yesavage JA, Friedman L, Ancoli-Israel S, Bliwise D, Singer C, Vitiello MV, et al. Development of diagnostic criteria for defining sleep disturbance in Alzheimers disease. J Geriatr Psychiatry Neurol. 2003;16(3):131-9.) segundo ECN;

  • exaustão do cuidador escore ≥ 2; escala de 0 a 5, com 2 indicando desconforto leve, segundo ECN.

O diagnóstico de DS foi estabelecido de acordo com os critérios anteriores e valores basais durante o período de seguimento de cada consulta.

A polissonografia e actigrafia não foram realizadas. Diários do sono estruturados não foram solicitados devido ao nível baixo de escolaridade dos pacientes ou cuidadores, e pela alta proporção de pacientes com nível avançado de demência.

Análise dos dados

A densidade de incidência foi calculada pela divisão do número de DS com o tempo total de seguimento populacional. A densidade de incidência é medida apropriada para estimar a classificação de ocorrência de vários resultados em uma população dinâmica(1313. Kleinbaum DG, Kupper LL, Morgenstern H. Epidemiologic research, principles and quantitative methods. New York: Van Nostrand Reinhold; 1982.). O modelo de risco proporcional de Cox foi utilizado para determinar o risco de DS. Os grupos de variação relacionados foram estatisticamente significantes em p ≤ 10, em análise de regressão univariada incluída na construção de modelo específico multivariado de Cox. Os preditivos independentes de DS foram significativos em p ≤ 0,05 para cada variação de grupo incluída no modelo final geral multivariado. Foi utilizado para análise estatística o pacote estatístico SAS versão 9.1 (SAS Institute, Inc., Cary, NC).

RESULTADOS

Na avaliação basal, aproximadamente 2/3 dos pacientes (62%) eram mulheres, e a média de idade foi de 78,5 (± 7,6) anos.

Esses 122 indivíduos foram acompanhados por 277,9 indivíduo/ano. Desses pacientes, 58 (42,6%) desenvolveu DS entre a consulta basal até o final do seguimento. Com isso, a densidade de incidência foi de 18,7/100 por indivíduo/ano. O risco de desenvolvimento de DS dentro do primeiro e quarto ano de seguimento foi de 9,8 e 50,9%, respectivamente.

Os pacientes com DS mostraram maior taxa de DS com 47% (34/76), seguidos por demência vascular com 42,8% (3/7) e demência mista com 37,5% (6/16).

Menos de 8 anos de educação [taxa de risco (TR): 3,1; IC95%: 1,30-9,22] e relato de agressividade (TR: 2,1; IC95%: 1,16-4,17) houve aumento do risco de DS. Nenhuma outra variável foi preditiva para DS quer na avaliação basal ou no seguimento.

DISCUSSÃO

Até onde conhecemos, este é o primeiro estudo de coorte retrospectivo sobre DS em pacientes com demência (Alzheimer e outras).

Observou-se taxa de 18,7/100 por indivíduo/ano relevante, considerando o impacto que os DS podem ter em pacientes com demência e em seus cuidadores. Um seguimento por 3 anos de idosos sem demência revelou que 15% dos que não relataram dificuldade para dormir na avaliação basal veio a apresentar DS, o que sugere um taxa de incidência anual de aproximadamente 5%(1414. Foley DJ, Monjan AA, Brown SL, Simonsick EM, Wallace RB, Blazer DG. Sleep complaints among elderly persons: an epidemiologic study of three communities. Sleep. 1995;18(6):425-32.). Outros estudos similares observaram que a incidência anual foi de 2,8%(1515. Quan SFMD, Katz R P, Olson J, Bonekat W, Enright PL, Young T, et al. Factors associated with incidence and persistence of symptoms of disturbed sleep in an elderly cohort: the cardiovascular health study. Am J Med Sci. 2005;329(4):163-72.).

Outras investigações observaram alta prevalência de DS entre pacientes com demência(44. McCurry SM, Logsdon RG, Teri L, Gibbons LE, Kukull WA, Bowen JD, et al. Characteristics of sleep disturbance in community-dwelling Alzheimers disease patients. J Geriatr Psychiatry Neurol. 1999;12(2):53-9.

5. Cohen-Mansfield J, Werner P, Freedman L. Sleep and agitation in agitated nursing home residents: an observational study. Sleep. 1995; 18(8):674-80.
-66. Carpenter BD, Strauss M, Patterson MB. Sleep disturbances in community-dwelling patients with Alzheimers disease. Clin Gerontologist. 1996; 16(2): 35-49.,1616. Moran M, Lynch CA, Walsh C, Coen R, Coakley D, Lawlor BA. Sleep disturbance in mild to moderate Alzheimers disease. Sleep Med. 2005;6(4):347-52.,1717. Grace JB, Walker M P, McKeith IG. A comparison of sleep profiles in patients with dementia with lewy bodies and Alzheimers disease. Int J Geriatr Psychiatry. 2000;15(11):1028-33.), porém o presente estudo foi o primeiro de coorte sobre DS entre pacientes com demência (DA e outras). A alta incidência de DS pode refletir em maior gravidade dos distúrbios observados no nosso Centro. Apesar dos cuidadores dos participantes queixarem-se com regularidade da dificuldade de manter o sono, está além do escopo deste estudo avaliar a frequência ou categorizar a intensidade de DS dos pacientes. Tais dados poderiam ser melhor determinados por meio de avaliações utilizando a polissonografia e a actigrafia.

Distúrbio ou desregulação do sono é comum entre pacientes com diferentes tipos de demência. Um estudo recente com pacientes não institucionalizados portadores de demência fronto-temporal mostrou distúrbios sono/vigília, com eficiência reduzida e redução do tempo do sono(1818. Anderson KN, Hatfield C, Kipps C, Hastings M, Hodges JR. Disrupted sleep and circadian patterns in frontotemporal dementia. Eur J Neurol. 2009; 16(3):317-23.). Grace et al.(1717. Grace JB, Walker M P, McKeith IG. A comparison of sleep profiles in patients with dementia with lewy bodies and Alzheimers disease. Int J Geriatr Psychiatry. 2000;15(11):1028-33.) identificaram baixa qualidade do sono em 8 (53%) pacientes com demência com corpos de Lewy e em 3 (15%) com DA. Os fatores que contribuem para aumento da variação da prevalência dos DS nesse grupo de pacientes podem estar relacionados aos índices de demência e ao tipo de DS avaliado. Outro fator importante que complica o diagnóstico dos DS é a associação com distúrbios comportamentais e doenças diagnosticadas incorretamente como demência.

A agressividade é comum entre esses pacientes(55. Cohen-Mansfield J, Werner P, Freedman L. Sleep and agitation in agitated nursing home residents: an observational study. Sleep. 1995; 18(8):674-80.). A combinação de alterações cognitivas, funcionais ou comportamentais foram associadas com DS em pacientes com DA em outro estudo(44. McCurry SM, Logsdon RG, Teri L, Gibbons LE, Kukull WA, Bowen JD, et al. Characteristics of sleep disturbance in community-dwelling Alzheimers disease patients. J Geriatr Psychiatry Neurol. 1999;12(2):53-9.). Moran et al. avaliaram 215 pacientes com DA, mostrando que os DS foram associadas com outros sintomas comportamentais, notavelmente agressividade (p=0,009)(1616. Moran M, Lynch CA, Walsh C, Coen R, Coakley D, Lawlor BA. Sleep disturbance in mild to moderate Alzheimers disease. Sleep Med. 2005;6(4):347-52.). Sedentarismo e quantidade de sono noturno foram preditivos significantes de comportamento agressivo durante os banhos em residências para pacientes com demência(1919. Whall AL, Colling KB, Kolanowski A, Kim H, Son Hong GR, DeCicco B, et al. Factors associated with aggressive behavior among nursing home residents with dementia. Gerontologist. 2008;48(6):721-31.). É provável que distúrbios respiratórios durante o sono estejam associados com algumas formas de agitação em pacientes com DA, principalmente comportamento agressivo, movimentação durante o dia e agitação verbal durante a noite(2020. Gehrman PR, Martin JL, Shochat T, Nolan S, Corey-Bloom J, Ancoli-Israel S. Sleep-disordered breathing and agitation in institutionalized adults with Alzheimer disease. Am J Geriatr Psychiatry. 2003;11(4):426-33.). Mais estudos são necessários para estabelecer a relação dos DS em DA e sintomas comportamentais.

Há discussões na literatura relacionadas ao papel do nível educacional em DS. Na Tailândia, por exemplo, não houve associação de educação formal com insônia em idosos com grau leve a moderado de habilidades cognitivas deficientes(2121. Assantachai P, Aekplakorn W, Pattara-Archachai J, Porapakkham Y. Factors associated with insomnia in older people with a mild to moderate degree of poor cognitive ability in Thailand. Geriatr Gerontol Int. 2011;11(1):16-23.). Por outro lado, utilizando-se o Inventário de Distúrbios do Sono, um escore ruim não se mostrou associado ao nível educacional de indivíduos com DA(2222. Tractenberg RE, Singer CM, Cummings JL, Thal LJ. The Sleep Disorders Inventory: an instrument for studies of sleep disturbance in persons with Alzheimers disease. J Sleep Res. 2003;12(4):331-7.). O mecanismo de relação entre DS e nível educacional não é claro, porém Marchi et al. avaliaram 215 brasileiros (não apenas idosos) e encontraram que o grupo sem escolaridade e de indivíduos com pouca escolaridade se mostrou mais predisposto à insônia (valor de p=0,001). Os autores desse estudo concordaram que indivíduos com baixa escolaridade normalmente correspondem àqueles com menor poder de consumo e maior propensão para desemprego e, consequentemente, mais exposição para angústia(2323. Marchi NSA, Reimão R, Tognola WA, Cordeiro JA. Analysis of the prevalence of insomnia in the adult population of São José do Rio Preto, Brazil. Arq Neuro-Psiquiatr. 2004;62:764-8.).

Acreditamos que os DS em pacientes com demência são pouco reconhecidos e, portanto, é importante enfatizá-los aos médicos. Talvez a incidência e a prevalência dos DS possam ser maiores. Analisando em conjunto, os problemas comportamentais podem parecer maiores e guiam o tratamento, normalmente com antipsicóticos. Além disso, os DS são comuns nos sintomas comportamentais e psicológicos da demência(2424. Boddy F, Rowan EN, Lett D, O,Brien JT, McKeith IG, Burn DJ. Subjectively reported sleep quality and excessive daytime somnolence in Parkinsons disease with and without dementia, dementia with Lewy bodies and Alzheimers disease. Int J Geriatr Psychiatry. 2007;22(6):529-35.,2525. Liperoti R, Pedone C, Corsonello A. Antipsychotics for the treatment of behavioral and psychological symptoms of dementia (BPSD). Curr Neuropharmacol. 2008;6(2):117-24.). Na verdade, os cuidadores queixam-se com regularidade de que os DS ocorrem em pacientes com sintomas comportamentais e psicológicos da demência, e os questionários não captam a diferença entre aqueles e estes. Muitas vezes, tais DS são aparentes somente como sonolência diurna e os questionários não podem capturar tal informação.

Portanto, é importante que os DS em portadores de demência sejam reconhecidos e tratados apropriadamente. Reconhecer os sintomas associados pode auxiliar na determinação da causa dos DS em pacientes com demência(1616. Moran M, Lynch CA, Walsh C, Coen R, Coakley D, Lawlor BA. Sleep disturbance in mild to moderate Alzheimers disease. Sleep Med. 2005;6(4):347-52.). O tratamento efetivo dos DS em DA provavelmente melhora a qualidade de vida tanto para o paciente quanto para o cuidador, além de prevenir a institucionalização. Os antidepressivos constituem uma opção viável para o tratamento de doenças do sono em pacientes com demência(2626. Camargos E F, Pandolfi MB, Freitas M P, Quintas JL, Lima J de O, Miranda LC, et al. Trazodone for the treatment of sleep disorders in dementia: an open-label, observational and review study. Arq Neuropsiquiatr. 2011;69(1):44-9.).

Uma limitação importante de um estudo retrospectivo é que a base de dados pode incluir somente informações originais coletadas nos prontuários dos pacientes. Não se sabe sobre aqueles que vêm a falecer, se apresentam ou não DS. Entre outras limitações, ainda estão a pouca confiabilidade nas informações coletadas de cuidadores, a predominância de um gênero e a frequência de pacientes com baixo nível educacional.

O impacto de medicações psicoativas não foi analisado. Apesar das dificuldades já discutidas, a falta de dados de polissonografia para identificar os DS, tais como apneia obstrutiva do sono, pode ser considerada uma limitação, superestimando consequentemente os resultados. Porém, o uso de procedimentos diagnósticos complexos não é aplicável para estudos de incidência como este. As informações provenientes dos cuidadores nem sempre é acurada. O fardo do cuidador pode ser reduzido caso o paciente fique muito tempo adormecido ou em estado de calma relativa(44. McCurry SM, Logsdon RG, Teri L, Gibbons LE, Kukull WA, Bowen JD, et al. Characteristics of sleep disturbance in community-dwelling Alzheimers disease patients. J Geriatr Psychiatry Neurol. 1999;12(2):53-9.). Os cuidadores, talvez, podem solicitar medicação para induzir o sono no paciente.

CONCLUSÃO

A incidência de DS nesta coorte foi elevada. Neste estudo, os DS durante o período de seguimento foram associados com nível educacional de menos de 8 anos de estudo e agressividade. Estudos como este oferecem diretrizes para pesquisas longitudinais e definição de parâmetros mais específicos desse relacionamento.

  • Estudo realizado na Universidade de Brasília – UnB, Brasília (DF), Brasil.

AGRADECIMENTOS

Estudo financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), processo 193.000.449/2008.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2011

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2011
  • Aceito
    01 Nov 2011
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