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O Plano de Ações Articuladas e as políticas de formação de professores na Baixada Fluminense: tensões e acomodações1 1 A pesquisa foi desenvolvida durante o estágio de pós-doutorado de Sonia Regina Mendes dos Santos na Faculdade de Educação da USP, com a supervisão de Belmira Oliveira Bueno, com financiamento do CNPq-PDS. Na fase de elaboração do artigo, contou com a colaboração de Diego Ferreira.

The Plan of Articulated Actions and the teacher education policies in Baixada Fluminense: tensions and adjustments

El Plan de Acciones Articuladas y las políticas de formación docente en la Baixada Fluminense (RJ): tensiones y acomodaciones

Resumo

O trabalho analisa o Plano de Ações Articuladas (PAR) em quatro municípios da Baixada Fluminense focalizando dois programas de formação continuada, o Pró-letramento e o Gestar. Com base em relatórios do Plano e entrevistas com gestores, professores e outros agentes envolvidos, buscou-se identificar as formas de operacionalização adotadas na implementação desses programas e caracterizar a colaboração entre os municípios e o governo federal. Constatou-se a adoção de diferentes dinâmicas na implementação do Plano, decorrentes tanto das perspectivas de cada município a respeito da formação continuada como das dificuldades enfrentadas por cada gestão. A pouca margem de adaptação dos programas federais às condições locais e a impossibilidade de efetivo engajamento dos docentes nos programas apareceram como as principais limitações na implantação do PAR. Concluiu-se que uma efetividade dessa política dependerá do oferecimento de cursos de formatos, dinâmicas e tempos diversos para que os municípios possam ir ao encontro das necessidades de trabalho e formação de seus docentes.

PAR; Baixada Fluminense; Formação continuada de professores

Abstract

This work analyzes the Plan of Articulated Actions (PAR) in four cities in Baixada Fluminense, focusing on the implementation of Pró-letramento and Gestar, two programs of continued teacher education. Based on reports of the Plan and interviews with managers, teachers and other stakeholders, we attempted to identify the ways of operationalization adopted and to characterize the cooperation between the municipalities and the federal government. The different dynamics found were due to the perspectives of each municipality for continued teacher education and the difficulties they had to manage this process. The major limitations in the implementation of PAR were the little margin to adapt the programs to the local conditions and the impossibility for teachers effectively to engage in the federal programs. It was concluded that the effectiveness of this policy will depend on courses with a variety of formats, with different dynamics and schedules so that each municipality can meet the professional needs and training demands of its teachers.

PAR; Baixada Fluminense; Continuing teacher education

Resumen

El artículo analiza el Plan de Acciones Articuladas (PAR) en cuatro municipios de la Baixada Fluminense (RJ - Brasil), haciendo foco en la implantación del Pró-Letramento y del Gestar, programas de formación continuada de docentes. Se basa en informes y entrevistas con gestores y maestros con el objetivo de identificar las formas de ejecución del PAR y los marcos de la colaboración entre los municipios y el gobierno federal. Constatamos que las diferentes dinámicas observadas tienen que ver con las perspectivas de cada localidad con relación a la formación continua y con las dificultades que enfrentaron los municipios en ese proceso. El bajo nivel de adaptación frente a las condiciones locales y la imposibilidad de efectivo compromiso de los docentes, se presentaron como las principales limitaciones en la implantación del PAR. Para que se obtenga mayor éxito, el PAR depende de que se ofrezcan cursos en formas, dinámicas y tiempos diferentes, para que los municipios puedan atender a las necesidades de trabajo y formación de sus docentes.

PAR; Baixada Fluminense; Formación continua de docentes

1 Introdução

Nos últimos dez anos fez-se visível o crescimento das iniciativas do governo federal para o estabelecimento de uma política de formação e valorização dos professores da Educação Básica com base nos princípios de descentralização e colaboração preconizados pela Constituição de 1988. A tarefa tem se mostrado complexa e demandado uma série de mecanismos de participação social, em que se destaca o regime de colaboração como possibilidade de melhor equacionar os numerosos desequilíbrios que há entre os entes federados.

Planos, programas, redes e procedimentos de caráter normativo diverso foram criados e multiplicados com essa finalidade em pequeno lapso de tempo. Na área da educação continuada, tais medidas se fizeram ainda mais incisivas, uma vez que se tratava, também, de imprimir maior organicidade às ações que ocorreram de modo disperso e desarticulado a partir da Lei de Diretrizes e Bases (BRASIL, 1996BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, 23 dez. 1996.), sem que se pudesse até mesmo identificar o número de tais iniciativas, suas modalidades e os setores que as vinham promovendo (GATTI, 2008GATTI, B. A. Análise das políticas públicas para formação continuada no Brasil, na última década. Revista Brasileira de Educação, v. 13, n. 37, p. 57-70, jan./abr. 2008. https://doi.org/10.1590/S1413-24782008000100006
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).

As políticas desencadeadas pelo governo federal nessa direção ganharam corpo a partir de 2007, com o lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e a publicação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (BRASIL, 2007aBRASIL. Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, pela União Federal, em regime de colaboração com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e da comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica. Diário Oficial da União, 25 abr. 2007a.), do qual faz parte integrante o Plano de Ações Articuladas (PAR), objeto de análise no presente artigo.

O PAR foi concebido como um instrumento para viabilizar a elaboração de um diagnóstico da realidade da educação dos entes federados e auxiliar o planejamento multidimensional da política educacional. Com essa finalidade, definiu ações de assistência técnica ou financeira para um período plurianual (2008–2011), sob a responsabilidade do MEC (Ministério da Educação) ou do próprio ente federativo. A coordenação foi prevista para ser feita pela secretaria municipal ou estadual de educação, conforme o caso, sendo que elaboração do Plano deve contar com a participação de gestores, professores e comunidade local. As metas e seu cumprimento por parte dos entes federados pactuantes do Plano de Metas são monitoradas por meio do acompanhamento da execução do convênio através de relatórios ou visitas da equipe técnica do MEC à localidade (Art. 11) e pela evolução do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, IDEB (Arts. 3º e 5º).

O PAR está dividido em quatro dimensões: a) gestão educacional; b) formação de professores e profissionais de serviços e apoio escolar; c) práticas pedagógicas e avaliação; d) infraestrutura física e recursos pedagógicos, cada uma subdividida em áreas compostas por indicadores com critérios de pontuação que totalizam 52 itens.

Em 2007, quando essa política começou a ser posta em prática, foram assinados Termos de Cooperação com 2.078 municípios. Em 2009 esse resultado praticamente dobrou, tendo o PAR recebido a adesão de 25 Estados e 4.015 municípios – cerca de 72% dos 5.563 municípios brasileiros. Esse cenário auspicioso exigiu dos pesquisadores o acompanhamento desse processo por meio de estudos que viessem a analisar as condições em que os programas passaram a ser realizados. Mais ainda, porque esse tipo de iniciativa deixa explícito, como já observado por alguns autores, o caráter ambíguo e contraditório de como o Estado define o seu papel, ao atuar simultaneamente como regulador das políticas nacionais, principalmente da Educação Básica, e como indutor da participação da sociedade (SCHNEIDER; NARDI; DURLI, 2012SCHNEIDER, M. P.; NARDI, E.L.; DURLI, Z. O PDE e as metas do PAR para a formação de professores da educação básica. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, v. 20, n. 75, p. 303-24, abr./jun. 2012. https://doi.org/10.1590/S0104-40362012000200005
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). Essa dualidade do Estado aumenta a responsabilização das unidades subnacionais face aos resultados que se almeja alcançar com a implantação das atuais reformas, como também já apontado por diversos pesquisadores do Brasil e de outros países, há mais de uma década2 2 Schneider, Nardi e Durli (2012) mencionam vários autores que trabalham em tal perspectiva, entre os quais, o português João Barroso (2004; 2005), Barroso e Viseu (2003) e, dentre os brasileiros, Azevedo (2002), Castro (2007), Krawczyk (2005), Martins (2001), e Oliveira (2005), . Em vista de tais mudanças, o papel do Estado tem sido reiteradamente questionado, sobretudo, quanto às relações que passaram a se dar entre a esfera federal e os entes subnacionais no âmbito do regime de colaboração.

Em um dos textos pioneiros a respeito do PAR, Adrião e Garcia (2008)ADRIÃO, T.; GARCIA, T. Oferta educativa e responsabilização no PDE: o Plano de Ações Articuladas. Cadernos de Pesquisa, v. 38, N. 135, p. 779-96, dez. 2008. https://doi.org/10.1590/S0100-15742008000300012
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, ao focalizarem a questão da accountability3 3 O termo accountability apresenta múltiplas dimensões, conforme exposto por diversos autores brasileiros e estrangeiros. As discussões levadas a efeito por Nigel Booke e Luiz Carlos de Freitas num encontro na Fundação Carlos Chagas, em São Paulo, são muito oportunas a esse respeito. Ver o artigo de Freitas (2013) e a síntese de Bauer (2013). , já apontavam vários riscos que poderiam advir da execução desse Plano, mormente, pelo fato de essa política ser orientada pelo princípio da adesão. Sobre esse mesmo aspecto, Oliveira e Souza (2010)OLIVEIRA, R.; SOUSA, S. Z. Introdução. In: OLIVEIRA, R.; SANTANA, W. Educação e federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a Diversidade. Brasília, DF: Unesco, 2010. p. 13-35. chamaram a atenção para a predisposição (ou não) dos entes federados em colaborarem entre si, sem o que a participação poderia não ocorrer. Eis porque, diante da impossibilidade de tornar compulsória a participação, em virtude da autonomia de que gozam os entes federados, o Estado tem se valido das estratégias de indução. Com efeito, o regime de colaboração está condicionado a uma série de fatores que vão desde o reconhecimento das obrigações de cada ente nas práticas de gestão até o propósito de ir ao encontro de uma atuação conjunta que conduza a uma efetiva educação de qualidade. Caminhar nessa direção exige compreensão e vontade política sobre o uso de recursos na correção das disparidades para que as ações em parceria se assentem em princípios de aproximação e identificação entre os entes envolvidos e para que a construção de projetos educacionais comuns seja favorecida.

A partir da publicação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (BRASIL, 2007aBRASIL. Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, pela União Federal, em regime de colaboração com Municípios, Distrito Federal e Estados, e a participação das famílias e da comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando a mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica. Diário Oficial da União, 25 abr. 2007a.), várias pesquisas foram propostas com o intuito de acompanhar as experiências de implantação do PAR, face à necessidade de se conhecer as realidades que começaram a se desenhar no país desde então. Conhecer esses processos tornou-se um imperativo, sobretudo, porque o potencial do Plano de servir de planejamento para a rede de escolas do município depende, como observado por Oliveira e Souza (2010)OLIVEIRA, R.; SOUSA, S. Z. Introdução. In: OLIVEIRA, R.; SANTANA, W. Educação e federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a Diversidade. Brasília, DF: Unesco, 2010. p. 13-35., da forma como essa política é apropriada por cada município.

Dentre os estudos que buscaram acompanhar a execução do PAR em seus primeiros anos e se constituem em referências fundamentais para um primeiro mapeamento dessas experiências, situam-se o artigo de Oliveira, Scaff e Senna (2012)OLIVEIRA, R. T. C.; Scaff, E. A. S.; Senna, E. Elaboração, implementação e acompanhamento do Plano de Ações Articuladas (PAR) em municípios de Mato Grosso do Sul. Série-Estudos, n. 34, p.133-46, jul./dez. 2012., sobre a experiência do PAR no sul-mato-grossense; o de Schneider, Nardi e Durli (2012)SCHNEIDER, M. P.; NARDI, E.L.; DURLI, Z. O PDE e as metas do PAR para a formação de professores da educação básica. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, v. 20, n. 75, p. 303-24, abr./jun. 2012. https://doi.org/10.1590/S0104-40362012000200005
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sobre um conjunto de vinte municípios de Santa Catarina; e os oito artigos que compõem o dossiê “Estudos sobre implementação de planos e programas para a educação básica”, publicado pela Série-Estudos, também em 20124 4 Autores que participam do referido dossiê: Batista et al. (2012), Cunha, Costa e Araujo (2012), Ferreira (2012), Fonseca e Albuquerque (2012), Oliveira, Scaff e Senna (2012), Paccini e Corrêa (2012), Peroni et al. (2012) e Santana e Adrião (2012). O artigo de Ferreira (2015) publicado na revista Ensaio retoma a questão do planejamento municipal no âmbito do PAR, no Espírito Santo. . Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Maranhão, Bahia, Rio Grande do Sul e São Paulo são os Estados contemplados nesses artigos que problematizam o planejamento estratégico e a parceria entre os entes federados no âmbito das políticas instauradas com o PDE.

O presente trabalho foi orientado por preocupações semelhantes com o propósito de contribuir com elementos que se somem a esses diagnósticos e com eles dialoguem. Ao selecionar quatro municípios da Baixada Fluminense – Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Belford Roxo e São João de Meriti – propôs-se a um exame do processo de operacionalização do PAR, em sua segunda dimensão, com foco sobre a formação de professores. Com esse objetivo, a pesquisa realizada tomou para análise o Pró-letramento e o Gestar, dois programas do MEC voltados à formação continuada de docentes da Educação Básica nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática. Teve como propósito examinar formas de apropriação desses programas e identificar as dificuldades enfrentadas por esses municípios no percurso inicial de adesão ao PDE, de modo a caracterizar as formas de colaboração entre os municípios e o governo federal nesse período de implantação do PAR.

2 Método e procedimentos

Conhecer e compreender o regime de colaboração exige uma aproximação com os municípios a fim de ouvir seus gestores e professores, reunir dados e evidências a propósito da recepção das políticas atuais e dos programas propostos pelo governo federal. Ademais, para averiguar se tais programas têm correspondido às necessidades de formação dos docentes das redes públicas municipais. Essa perspectiva levou-nos a realizar uma pesquisa de natureza qualitativa que, no entanto, não pode prescindir de dados fornecidos por fontes oficiais. Nesse sentido, foram consultados os relatórios do PAR produzidos pelos municípios em estudo, sites diversos como os do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para, com base em indicadores demográficos e educacionais sobre cada município, estabelecer relação entre as realidades estudadas e conhecer as propostas dos programas de formação continuada em execução no âmbito do PAR. Os dados estatísticos apresentados neste artigo cumprem a função de contextualizar a região em estudo e oferecer um panorama que permita uma interpretação mais significativa dos dados qualitativos.

O trabalho empírico centrou-se na consulta aos relatórios do PAR produzidos por cada município e na coleta de depoimentos orais por meio de entrevistas com os vários gestores e agentes educacionais, a saber: os secretários municipais de Duque de Caxias e Nova Iguaçu; os dois assessores municipais de educação deste segundo município; e em Belford Roxo, o subsecretário da educação. Em São João de Meriti, o único depoimento colhido foi o do Coordenador Geral de Programas. Além desses gestores, foram entrevistados os seguintes agentes vinculados à execução dos programas em análise: os coordenadores locais responsáveis pelo PAR em Duque de Caxias, Nova Iguaçu e Belford Roxo; os professores tutores do Pró-letramento desses três municípios; o professor tutor do Gestar de Matemática de Duque de Caxias; quatro professores tutores do Gestar de Língua Portuguesa. No total, foram realizadas 17 entrevistas, todas gravadas e transcritas.5 5 Nas citações, os entrevistados e os programas serão identificados conforme as seguintes abreviações: Secretário de Educação: SE; Assessor de Secretário de Educação: ASE; Subsecretário da Educação: SSE; Coordenador Geral de Programas: CGP; Coordenador Local: CL; Língua Portuguesa: LP; Pró-Letramento: PL. Em três casos não foram adotadas abreviações: Gestar 1; Gestar 2; Professor tutor: Tutor

3 A Baixada Fluminense: breve perfil geodemográfico e educacional

Com o propósito de oferecer uma visão de conjunto sobre os municípios aqui focalizados, são apresentados nesta seção alguns dados estatísticos importantes no exame das políticas de colaboração iniciadas nessa região por meio do PAR. Ao tomar para análise alguns programas direcionados à formação de professores e profissionais da educação, entendemos que esses dados podem ajudar a melhor compreender os desafios da Educação Básica enfrentados pelos sistemas de ensino dos quatro municípios em estudo.

Nessa direção, o primeiro dado a ser aqui destacado diz respeito às dimensões populacionais da Baixada Fluminense, uma região formada por 13 municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. A população aí concentrada é aproximadamente de 3,6 milhões de pessoas, conforme estimativas baseadas no censo brasileiro de 2013 (IBGE, 2013INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Estimativas populacionais para os municípios brasileiros em 01.07.2013. Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/estimativa2013/default.shtm />. Acesso em: 15 jan. 2014.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
). Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Belford Roxo e São João de Meriti são os municípios mais populosos da Baixada, os dois primeiros próximos da casa dos 800 mil habitantes e os dois últimos com aproximadamente 500 mil habitantes. Compostos com outros dados como o número de eleitores (TSE, 2013TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL - TSE. Estatísticas do eleitorado 2013. Brasília, DF, 2013. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/consulta-por-municipio-zona>. Acesso em: 10 maio 2014.
http://www.tse.jus.br/eleitor/estatistic...
), o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano (IBGE, 2013INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Estimativas populacionais para os municípios brasileiros em 01.07.2013. Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/estimativa2013/default.shtm />. Acesso em: 15 jan. 2014.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
) e, ainda, com os valores repassados pelo Fundeb a esses municípios (BRASIL, 2014BRASIL. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE. Apresentação. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/fnde-sistemas/sistema-siope-apresentacao>. Acesso em: 20 ago. 2014.
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) chega-se a uma visão de conjunto da situação geopolítica dessa região, fortemente marcada pelo contraste entre alta densidade demográfica e baixo IDH (Tabela 1).

Tabela 1
Baixada Fluminense: dados geopolíticos de quatro municípios.

Ao se levar em conta o IDEB dos municípios nas últimas avaliações, nota-se uma situação educacional de risco, em que quase todas as avaliações situam-se abaixo das médias do Estado do Rio de Janeiro e do Brasil, conforme dados obtidos no portal do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (BRASIL, 2014BRASIL. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE. Apresentação. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/fnde-sistemas/sistema-siope-apresentacao>. Acesso em: 20 ago. 2014.
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) e expostos na Tabela 2.

Tabela 2
Baixada Fluminense: distribuição do IDEB em quatro municípios.

A densidade de alunos na região é outro dado que merece ser registrado. No período em que a pesquisa foi realizada, as matrículas situavam-se, em São João de Meriti e Belford Roxo, entre 60 e 80 mil alunos; e, em Nova Iguaçu e Duque de Caxias, entre 130 e 150 mil. Tais dados nos dão uma ideia dos desafios enfrentados por esses quatro maiores municípios em sua tarefa de oferecer Educação Básica a essa população de alunos. No entanto, não é demais lembrar que no dia a dia os maiores desafios recaem sobre os professores, particularmente, pelas tensões que eles vivenciam no ensino da Alfabetização e da Matemática. Esse cenário, ainda que apenas brevemente descrito, pode explicar as opções que os quatro municípios fizeram por ocasião da elaboração de seus planos de adesão ao PAR.

Nas próximas seções, buscamos descrever mais detalhadamente os meandros desse percurso com base nos depoimentos de gestores municipais, coordenadores e tutores dos programas escolhidos para análise.

4 Antes e após o PAR: as políticas de formação em serviço na Baixada Fluminense

As análises produzidas pelos relatórios do PAR, publicadas em 2007 pelo MEC, permitiram constatar que as políticas de formação de professores desses municípios antes da execução desse Plano diferiam bastante entre si. Esse dado foi corroborado nos depoimentos obtidos, os quais permitiram identificar as diferentes fases em que cada município se encontrava no momento da adesão ao PAR. Em Duque de Caxias, tais políticas encontravam-se em implementação naquele momento, enquanto em Belford Roxo registravam-se algumas iniciativas isoladas. São João de Meriti não havia iniciado empreendimentos nessa direção, diferentemente de Nova Iguaçu que já registrava algumas ações ligadas a seu programa de educação integral, o bairro-escola, ainda que de forma não estruturada. Essas diferenças acabaram por se refletir na condução das propostas que apareceram nos termos de cooperação assinados por cada município no âmbito do PAR, a partir de 2009.

Duque de Caxias, com uma política de formação já definida e em fase de execução, encaminhou propostas que pudessem fortalecer suas políticas locais tal como capacitar pela Rede Nacional de Formação Continuada (Renafor) diretores de escolas com curso de aperfeiçoamento e especialização, disponibilizar recursos para o PDE Escola e capacitar professores para a diversidade (educação do campo e educação inclusiva). Além disso, assumiu o compromisso de criar um programa de correção de fluxo e de formação de professores na área de currículo e avaliação.

Belford Roxo elaborou por ocasião do acordo propostas que dessem continuidade às iniciativas já tomadas pelo município, quais sejam, formação de professores que atuavam na Educação Infantil, formação em nível superior de docentes das séries iniciais, e capacitação pelos programas Praler, Pró-letramento e Gestar I, com ênfase nos anos iniciais e na formação em relações étnico-raciais.

São João de Meriti, cujos gestores reconheciam não ter ainda uma política para a formação de professores, optou por investir na formação de vários grupos de profissionais da Educação Básica: servidores vinculados ao fortalecimento dos conselhos escolares e da metodologia do PDE Escola, capacitação de diretores de escolas, habilitação do corpo docente das escolas em nível superior (Pedagogia e outras Licenciaturas), oferecimento de cursos de especialização em educação infantil pela UAB e, ainda, aproveitar a formação oferecida pelo Pró-Infantil e Gestar II.

A continuidade dos programas Pró-letramento e Gestar nos quatro municípios nos anos de 2009 e 2010 foi o critério principal que adotamos nesta pesquisa para a escolha desses dois programas, visando analisar suas repercussões nessa fase inicial do PAR. Nessa escolha pesou também o fato de que tais programas têm a perspectiva de formação pautada no modelo de professores reflexivos e cargas horárias mais intensas: 120 horas para o Pró-letramento e 300 horas para o Gestar I e o Gestar II.

Todavia, cabia perguntar: em que medida as opções feitas por cada município no momento da adesão ao PAR foram viabilizadas? O PAR permitiu que esses municípios, de fato, elaborassem um diagnóstico de suas respectivas realidades na área de Educação Básica? De que forma os auxiliou no planejamento multidimensional da política educacional? Esse conjunto de questões orientou a condução das entrevistas realizadas com vista a acompanhar e analisar as vicissitudes enfrentadas por cada um dos quatro municípios no período de adoção e implementação do PAR. A seguir, buscamos descrever o cenário que se desenhou em cada um dos quatro municípios focalizados.

5 O PAR e a formação de professores na Baixada Fluminense: adesões e desistências

Entre os programas desenvolvidos pela Renafor figuram, desde fins de 2006, dois programas com foco sobre a melhoria da aprendizagem da Leitura e Escrita e da Matemática, ambos para o Ensino Fundamental na modalidade semipresencial o Pró-letramento – mobilização pela qualidade da educação, voltado a docentes do Ensino Fundamental I (EF-I) com duração de 120 horas; e o Gestão da Aprendizagem Escolar (Gestar I e Gestar II) oferecido para professores dos dois níveis: EF-I, com 240 horas e EF-II, com 300 horas, sendo 120 horas presenciais e 180 horas a distância (estudos individuais) para cada área temática.

Entre as características comuns desses programas idealizados pela Renafor, está a adoção do modelo reflexivo-prático, claramente explicitado em dois documentos de base dos Programas: Guia Geral do Gestar (BRASIL, 2007cBRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Programa Gestão da Aprendizagem Escolar Gestar I: guia geral. 2007. Brasília, DF, 2007c. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/img/gestar/guia_gestar.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2010.
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, p.14) e Guia Geral do Pró-letramento (BRASIL, 2007bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Pró-letramento: programa de formação continuada de professores da educação básica: alfabetização e linguagem. Brasília, DF, 2007b., p. 2):

A formação continuada deve ser compreendida como uma ferramenta de profissionalização capaz de proporcionar aos professores espaços sistemáticos de reflexão conjunta e de investigação no contexto da escola, acerca das questões enfrentadas pelo coletivo da instituição.

[…]

A formação continuada de caráter reflexivo considera o professor o sujeito da ação, valoriza suas experiências pessoais, suas incursões teóricas, seus saberes da prática e possibilita-lhe que, durante o processo, atribua novos significados a ela, compreenda e enfrente as dificuldades com as quais irá se defrontar no dia a dia. [...]

Essa concepção, não obstante seja cada vez mais reconhecida por seu potencial formador dos professores em exercício, abre questionamentos sobre sua viabilidade nas propostas postas em ação pela Renafor, sobretudo pelas condições nem sempre favoráveis em que os programas vêm sendo desenvolvidos. Os depoimentos colhidos nos quatro municípios estudados permitiram identificar várias dificuldades encontradas por seus gestores e tutores na execução de tais políticas, bem como algumas soluções e as formas mediante as quais foram efetivadas tanto a adesão ao PDE como a elaboração das propostas, ambas necessárias para se ter acesso aos programas de formação.

O Pró-Letramento e o Gestar começaram a ser implantados em Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Belford Roxo e São João de Meriti a partir de 2008, ano de eleições municipais. Alguns governos tiveram mudança de partido no poder, entretanto, os programas foram mantidos – uma situação bastante incomum no Brasil. Esse foi um dos pontos positivos na execução do PAR na Baixada Fluminense, mas insuficiente para dar o impulso necessário a esse Plano na região, como poderá ser visto logo adiante.

Apenas Nova Iguaçu aderiu por completo aos programas federais, pelo fato de identificar objetivos convergentes e complementares no que se refere à qualificação de seu corpo docente e por contemplar seu próprio projeto de educação integral. Conforme o relato do secretário municipal,

com a implementação do horário integral houve a necessidade de avançar realizando atividades também no contraturno. Nesse sentido, as propostas ofertadas pelo Governo Federal traduzem uma busca semelhante àquela do governo municipal no que diz respeito a nossas necessidades (SE, Nova Iguaçu).

Nos outros três municípios – Duque de Caxias, Belford Roxo e São João de Meriti – as adesões se deram primeiramente ao Pró-letramento e, só mais adiante, ao Gestar. O critério principal levado em conta na escolha dos programas foi ditado pelos interesses pedagógicos de suas respectivas redes de ensino. No entanto, desde o início isso trouxe certo desencontro e insatisfação, uma vez que os Programas do MEC não iam ao encontro do conjunto das necessidades prioritárias desses municípios. Isso acabou levando a várias desistências e o retorno às propostas locais.

[Em Duque de Caxias] o Pró-letramento começou na outra gestão, atendendo algumas turmas e escolas. O Gestar, com um material tão rico para professores de Português e Matemática, nos levou a questionar por que foi direcionado apenas a professores dessas duas áreas? (SE).

[São João de Meriti] foi um município pioneiro em relação ao Pró-letramento. Nós o utilizamos dentro de um programa próprio – o Prosa – para finalmente ficarmos com esse programa local.[...] O Gestar também contém um material riquíssimo, mas muito fechado. Por isso, optamos por não mais realizá-lo.[...] Atrela-se a isso o fato de boa parte dos professores já terem cursado uma faculdade e a procura por esses cursos ficou cada vez menor (CG).

Com efeito, após uma fase de certa estabilidade na manutenção dos programas nos municípios analisados, com variações em relação ao tempo e às propostas que foram mantidas, os primeiros entraves começaram a surgir.

Em Duque de Caxias, o Pró-letramento foi descontinuado e, em São João de Meriti, rompeu-se com os dois cursos inicialmente escolhidos optando-se pelo investimento em cursos do próprio governo local. A queixa dos professores cursistas referente à carga horária dos programas federais, considerada excessiva, foi a justificativa que mais pesou nessa tomada de decisão. Uma visão curiosa, já que no campo da formação sempre foi criticada a ligeireza dos cursos de capacitação comumente oferecidos (SANTOS, 2004SANTOS, S. R. M. A universidade e a formação continuada de professores: dialogando sobre a autonomia profissional. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 27., Caxambu: Anped, 2004; Caxambu, MG. Rio de Janeiro: Anped; 2004. Disponível em: <http://27reuniao.anped.org.br/gt08/t0820.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.
http://27reuniao.anped.org.br/gt08/t0820...
, p. 14; SCHEIBE, 2010SCHEIBE, L. Valorização e formação dos professores para a educação básica: questões desafiadoras para um novo Plano Nacional de Educação. Educação & Sociedade, v. 31, n. 112, p. 981-1000, set. 2010. https://doi.org/10.1590/S0101-73302010000300017
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201000...
, p. 991).

Outras dificuldades emergiram ao longo desses anos iniciais de parceria, sobretudo em decorrência das contrapartidas exigidas pelo MEC. No âmbito do PAR (dimensão 2, formação continuada de professores) as redes municipais devem arcar com dois tipos de cessão: dos professores que, formados pelas universidades parceiras, vão atuar como tutores dos programas na formação de docentes de sua rede de origem; e dos espaços físicos, normalmente auditórios e salas de aula, ou nas sedes das próprias secretarias de educação.

Como os municípios não se dispõem a contratar professores substitutos – seja porque tal medida onera seus orçamentos, seja porque não é viável burocraticamente – isso acabou por inviabilizar a manutenção dos tutores junto aos programas. Além disso, percebeu-se que houve dificuldade por parte das secretarias de educação em liberar os docentes dentro do horário de trabalho para que pudessem frequentar os cursos. Isso contribuiu fortemente com o esvaziamento das turmas e a interrupção dos programas federais, fazendo com que Duque de Caxias e São João de Meriti viessem a optar pelos programas locais, como atestam os depoimentos.

Nós estamos reformulando a nossa proposta [local] de formação para os novos professores do segundo segmento, porque o Gestar teve que deixar de acontecer esse ano, por exemplo, porque não tínhamos professores participando (SE, Duque de Caxias).

O Pró-Letramento é um curso muito bom, mas é muito fechado principalmente na questão da linguagem, da alfabetização. [...] Eles trabalham a psicogênese em uma aula, o que é insuficiente. Então, nós percebíamos a angústia dos implementadores em trabalhar o conteúdo em duas aulas e isso atrasava o cronograma. [...] Os programas foram bem aceitos pela rede, mas pecam por serem muito fechados, com um cronograma rígido e pouco espaço para a reflexão, por isso, tivemos a necessidade ampliá-lo partindo para programas próprios. No ano passado chegamos a trabalhar com o Pró-Letramento dentro do Prosa usando o material do primeiro e emitindo certificação de ambos.[...] Mas, no final do ano passado, conversando com a equipe, chegamos à conclusão de que seria melhor abrir mão do Pró-Letramento para trabalhar [somente] com o Prosa, que oferece um leque de 18 cursos, tais como: autismo, o corpo em movimento, educação pedagógica, educação especial, rotina na educação infantil, além de duas temáticas diretamente ligadas à alfabetização (CG, São João de Meriti).

Como estratégias próprias de formação e alternativa aos programas federais, os municípios elaboram propostas com formatos diferentes quanto à duração (cargas horárias de 40 horas com formação presencial); alternativa de horários (manhã, tarde e noite ou concentrando um curso numa jornada de oito horas); metodologias de formação, por exemplo, realização de oficinas e incorporação do uso de novas tecnologias de comunicação e informação. Para estes empreendimentos, há grupos de formadores que são docentes da rede lotados nas Secretarias Municipais de Educação a fim de cuidarem da estruturação dos seus próprios programas locais de formação continuada, como podemos notar nos relatos de dois gestores.

Nós acreditamos na formação, até porque a nossa rede tem uma história [nessa área]. Estou vendo isso se perder, [...] nós precisamos resgatar essa proposta, ver outras possibilidades e garantir pelo menos uma parte dessa formação dentro da carga horária do professor. Talvez algo semipresencial, com encontros bimestrais, mês sim mês não, nós teríamos uma atividade de estudo individual nesse nível. [...] Já começamos a primeira formação EaD, vamos inaugurar outra com o tema “Violência no Cotidiano Escolar” [..]. Então, nossa proposta é conciliar a falta de tempo do professor com a necessidade de formação e verificar qual caminho podemos conseguir. Mas vamos ter que abrir mão de parte da carga horária, se não teremos que desistir [de oferecer] a formação (SE, Duque de Caxias).

O Prosa pretende investir na relação teoria e prática, um ponto diferencial em relação às propostas do governo federal, além de que nos aproxima das escolas. A ideia inicial era que o implementador fizesse uma parte da formação aqui e outra na escola, o que não funcionou. O que deu certo foram as oficinas realizadas [..]. Os implementadores são da rede e têm uma prática diferenciada, daí sua identificação e reconhecimento [...]. Temos cursos funcionando pela manhã, à tarde, à noite e aos sábados[...]. Não tem desculpa, o professor pode fazer quando desejar (CG, São João de Meriti).

Os municípios que mantiveram a execução do Gestar apontaram aspectos que consideraram vantajosos na manutenção das parcerias, como a elevação do curso ao nível de uma especialização, em geral oferecidos com a chancela de alguma universidade. Entretanto, a não liberação de ponto para a realização dos cursos pelos professores permaneceu como um dos aspectos negativos na relação entre as secretarias e seus profissionais, conforme os depoimentos dos tutores entrevistados.

A adesão ao Pró-Letramento é um pouco maior do que para o Gestar, mas há um complicador que é o professor fazer [o curso] fora do horário de trabalho (CL-LP, Belfort Roxo).

O que acontece é que o contratado pode fazer [o curso] no contraturno, já o efetivo é mais difícil. Mas, o contratado sai da rede e nós o perdemos (CL-PL, Belfort Roxo).

As entrevistas realizadas com os professores coordenadores dos programas e tutores levaram a perceber que a implantação dos programas teve de enfrentar vários obstáculos, a começar pela falta de apoio de uma ou outra Secretaria na divulgação dos cursos, com isso, comprometendo a adesão dos docentes na condição de cursistas, bem como provocou a perda de tutores já formados e a desistência de muitos docentes cursistas em virtude da não liberação das atividades de sala de aula.

O Gestar começou em 2009. Nós passamos pela formação, primeiramente em Niterói oferecida pela UnB [...].Voltando da formação tivemos uma dificuldade muito grande para divulgar o curso entre os professores da rede. Não tivemos quase apoio para essa divulgação por parte da própria Secretaria, então, o único artifício que nós tínhamos era enviar ofícios para os Diretores (Tutor, Duque de Caxias).

As alternativas para atrair a participação dos docentes foram várias, desde o oferecimento de uma aula inaugural à oferta de horários alternativos. Os entrevistados destacam que ocorreram desistências em virtude de expectativas não atendidas pelos programas quanto às certificações, como cursos de especialização, as quais poderiam ser utilizadas na ascensão funcional em planos de carreira. Isso ocorreu em Duque de Caxias e Nova Iguaçu, municípios que contam com políticas bem estabelecidas nesse aspecto. Mas, como mostram os depoimentos, os obstáculos iam se somando ou mesmo se superpondo.

Nós vimos que até março as chamadas não tinham surtido efeito. Tínhamos um número de inscrições muito baixo e resolvemos, por isso, adiar o início [o curso] convidando-os para uma Aula Inaugural. [...]. Depois dessa Aula, nós conseguimos montar quatro turmas de Matemática. Começou bem, mas depois foi diminuindo (Tutor, Duque de Caxias).

No Gestar I de Língua Portuguesa, nós tivemos 35 inscritos, um número considerável; mas como eram quatro turmas diferentes, uma vez que os 35 não podiam frequentar no mesmo dia e horário, nós decidimos oferecer [alternativamente] turmas à noite, à tarde e aos sábados (Tutor, Duque de Caxias).

As dificuldades de participação dos professores cursistas que iniciam e desistem são justificadas principalmente pela jornada excessiva de trabalho. Para os tutores do Gestar, a dificuldade para acompanhar o conteúdo da formação por parte dos docentes cursistas é outro elemento que entra em jogo no processo de permanecer ou não nos cursos. Eles afirmam que a manutenção do número de participantes nas turmas e no processo como um todo é facilitada quando a formação ocorre no horário de trabalho e, em alguns casos, quando abrange os professores temporários.

Como formadoras, nós percebemos que quando o professor vem fazer a formação dentro do horário de trabalho, ele entende que já está dedicando seu tempo à rede, que vem estudar para se preparar melhor para sala de aula e já está com a carga horária cumprida. Para que ele venha fora do horário surge um complicador, porque ele não trabalha só aqui, também trabalha em outra rede (Tutor LP, Nova Iguaçu).

Em suma, pode-se dizer, com base nos dados dos quatro municípios selecionados para esta pesquisa, que na Baixada Fluminense a adesão ao PAR foi positiva, mas, devido a um processo de implantação feito com muita rapidez, não houve tempo nem condições de os municípios vencerem as dificuldades encontradas. Como visto, essa situação acabou por provocar a descontinuidade dos programas federais e a retomada dos programas locais em dois municípios. É importante e justo registrar que as desistências somente ocorreram após várias tentativas de ajustes realizadas durante a execução do Plano. Um olhar mais detido sobre as tentativas de ajustamento dos programas permite melhor compreender e aquilatar os esforços empreendidos em nível local pelos entes municipais aqui focalizados.

6 Os municípios redimensionam suas propostas

Com os cursos iniciados, os professores coordenadores e tutores realizaram adaptações para ajustar os programas às realidades locais, principalmente, no que tange à metodologia de formação, ora alterando a organização das tarefas previstas ora incorporando as atividades de estudo e leitura previamente aos encontros. Os dados colhidos permitiram verificar que as mudanças ocorreram mais intensamente no desenvolvimento do programa Gestar.

Em 2009, nós tentamos seguir à risca o que era proposto, mas percebemos que não dava certo porque o índice de evasão era tremendo, pois a quantidade de coisas que o professor tinha que aplicar, escrever e apresentar era muito grande. Para conseguir manter, resolvemos formalizar esses trabalhos e no segundo semestre de 2009, os que permaneceram, teriam que apresentar um trabalho formal por escrito a cada professor tutor (Tutor, Duque de Caxias).

De modo geral, o material é muito bom, mas algumas atividades não estavam no nível do nosso aluno, então, os professores tinham a liberdade de fazer as adequações. Eles submetiam a nós, mas sempre aprovávamos porque era o professor que estava em sala de aula e ele sabia das necessidades e limitações dos alunos. Por isso o Gestar foi a nossa cara e quando nós íamos para as apresentações com o grupo da UnB, eles gostavam do que havíamos feito (Tutor, Duque de Caxias).

Tinha um material do grupo com seis blocos de Análise Linguística e nós criticamos como ela havia sido feita superficialmente; apontamos como ela poderia ter trabalhado, fizemos essa complementação para a Rede e colocamos tudo isso em relatório, tudo detalhado e eles gostaram (Tutor, Nova Iguaçu).

O Pró-letramento buscou seguir mais de perto as orientações do MEC. Os entrevistados mostraram a preocupação em zelar pela manutenção da metodologia prevista pelo programa, valendo-se, para tal, do suporte das assessorias oferecidas aos professores cursistas em suas escolas, pelas secretarias de educação.

Na avaliação dos cursistas, o conteúdo do curso é de grande valor. Foi muito importante, porque puderam ter outro olhar com relação a esse aluno, outra prática na sala de aula. Nós íamos à escola para uma assessoria ao professor (Tutor, Nova Iguaçu).

As propostas apresentadas às cursistas devem ser trabalhadas em sala de aula e elas têm que trazer os resultados registrados em fotos. Nós fazemos o relatório e encaminhamos à UFRJ para arquivamento. Selecionamos as atividades a serem enviadas porque eles pedem algumas [que se situam] acima e outras abaixo da expectativa (Tutor, Duque de Caxias).

Somente em Nova Iguaçu ficou evidente que os programas Pró-letramento e Gestar foram oferecidos de acordo com a disponibilidade de tempo dos professores, durante os seus horários de trabalho. Nos momentos de formação, os docentes foram apoiados por professores que exercem outras funções na própria escola, como o Coordenador Político Pedagógico (CPP), Coordenador de Aprendizagem. Os programas têm sido executados do modo como foram concebidos, conforme atestou um dos gestores entrevistados em seu comentário sobre a suficiência e adequação do material oferecido pelo MEC. Segundo ele,

não [houve] mudanças no formato porque para mudar a infraestrutura haverá demanda de material além do que já é necessário, e o material enviado é bom. O Gestar exige do tutor todo um estudo porque ele tem que adequar o texto recebido [do MEC] e acrescentar outro. Então, isso já é muito (SE, Nova Iguaçu).

A despeito dos desafios e dificuldades, constatou-se haver uma perspectiva positiva entre os gestores e coordenadores para receberem outros programas voltados à formação em serviço, justamente porque vislumbram uma abertura para procederem a ajustes e adaptações às realidades locais, assim como para a inclusão de novos temas a serem tratados.

Os programas [de formação em serviço] sempre foram muito bem-vindos com a possibilidade de adequá-los às nossas demandas, colocar um pouco da nossa realidade, das nossas questões... (AS, Nova Iguaçu).

O governo federal, nesses últimos oito anos, investiu muito em educação. Podem ter sido negativos os dados expostos pela mídia, mas eu acho que o lado bom é o investimento realizado, como o Mais Educação, esses programas relacionados ao IDEB e à formação continuada [...]. Nosso sonho era que pudéssemos parar a escola e fazer uma formação com todos os professores do ciclo básico de alfabetização (SE, Duque de Caxias).

Eu acho uma iniciativa excelente [os programas de formação em serviço]. Na verdade, eu acho que seria mais interessante que o município não precisasse aderir a esses programas, porque quanto mais adesão, significa que não estamos tão bem [em relação ao atrelamento aos indicadores do IDEB]. Mas tirando esse olhar, os programas são maravilhosos. Nós percebemos a diferença nos professores quando chegam e quando saem do curso (CL, PL, Belfort Roxo).

Acho que o que falta ainda é a inclusão de discussões aprofundadas de EJA [Educação de Jovens e Adultos] e alterações nos programas de formação em alfabetização (CG, São João de Meriti).

No que tange especificamente à parceria com o governo federal e ao trabalho coletivo entre os municípios, somente o secretário da educação de Duque de Caxias abordou essa questão ao lembrar que em outras épocas era possível participar ativamente de fóruns e encontros nos quais se buscava uma construção coletiva dos programas. Conforme seu depoimento:

Não quero ser saudosista, mas quando nós lembramos do PCN Ação, lá havia uma proposta de integração dos municípios, nosso município era o Polo da Baixada. Um de nossos professores assumiu recentemente a presidência da UNCME, a União dos Conselhos Municipais de Educação, e ele faz esse trabalho de integração com os Conselhos Municipais de Educação do estado. Então, acontecem muitos encontros em várias regiões e esse trabalho reúne as pessoas, o que é importante, porque conseguimos fazer muita coisa juntos (SE, Duque de Caxias).

O não pronunciamento dos demais gestores sobre a participação do ente municipal na proposição de uma política para a formação de professores pode ser devido ao entendimento de que eles deveriam se ajustar aos papéis previstos, em que o governo federal é o propositor dos programas e os municípios, seus executores. Como observado anteriormente, apenas Nova Iguaçu assimilou os programas federais de modo alinhado e ajustado a seus objetivos locais.

7 Considerações finais

O caráter inusitado da política instituída pelo PAR e as expectativas geradas pelo repasse de recursos do governo federal para os Estados e municípios estimularam a realização deste estudo que, na linha de outros que o antecederam, permitiu acompanhar de modo mais próximo esse processo. Desde o início do PDE, tornou-se importante analisar os possíveis ganhos dessa política, assim como identificar os entraves e dificuldades enfrentados pelas experiências locais. Buscamos, por isso, nestas análises conclusivas, ressaltar alguns aspectos que se mostraram relevantes no que diz respeito à formação continuada de professores (dimensão 2) bem como às ações dirigidas à concretização da política de colaboração entre o governo federal e os municípios.

O exame realizado apontou que a despeito das várias similaridades entre os municípios em estudo – todos populosos, com acentuado padrão de pobreza, alta densidade de alunos, baixo índice no IDEB – várias singularidades puderam ser identificadas na execução do PAR. Como visto, tais diferenças não decorreram apenas dos variados estágios nos quais se encontravam os quatro municípios quanto à formulação de suas políticas de formação de professores, no momento da adesão ao PAR, mas, também, de suas diferentes experiências com os programas de formação. A escolha dos cursos – se Gestar ou Pró-letramento – gerou modos peculiares de cada município fazer a gestão desses programas federais, sobretudo, em virtude das motivações e necessidades específicas de cada um.

Se esse aspecto era mais ou menos esperado, a ocorrência de desistências dos programas por parte de dois municípios, Duque de Caxias e São João de Meriti, que retornaram aos programas locais, constituiu uma surpresa. O repasse de verbas do governo federal para os municípios não foi suficiente, portanto, para a manutenção do acordo. A decisão de retomar os programas locais evidenciou que a formação continuada permaneceu relevante para os municípios, porém, desde que feita em moldes ajustados às condições de trabalho dos professores. Com efeito, um dos maiores entraves à continuidade dos programas nesses dois municípios foi a impossibilidade de dispensar os professores de suas aulas para que pudessem realizar os cursos. Isso causou uma tensão: de um lado, a contratação de professores substitutos pesava aos cofres municipais, de outro, a frequência aos cursos sem a dispensa das aulas pesava fortemente para os docentes.

Entre a concepção dos programas e sua realização, encontram-se ainda várias barreiras e tensões. Uma delas liga-se à condição efetiva de dedicação ao estudo por parte dos docentes. Os professores são seduzidos tanto pela promessa de eventuais aportes que a frequência a tais cursos podem trazer para suas práticas pedagógicas como pelo discurso de que precisam se renovar, pois, não podem “estagnar” na formação inicial. A palavra “reciclagem”, mesmo démodé, marca ainda presença no vocabulário dos gestores. Uma vez por outra, os docentes são obrigados pelo diretor escolar a “representar” a escola no curso, mas, eis que surge um problema: o poder público solicita que eles frequentem as turmas disponibilizadas em dias e horários que não correspondem àqueles para os quais foram contratados, o que resulta no esvaziamento dos cursos. Com isso, uma parcela diminuta de profissionais inicia o programa, outra ainda menor o conclui.

Há que se reconhecer que a implantação do PAR se deu de certo modo improvisado, sem que fossem levadas em conta as condições locais. Assim, não se deu atenção aos princípios da autonomia e da descentralização, tal como requerido pelo MEC. Na esfera federal, o financiamento parece ter sido pensado como uma “moeda de troca” para que seus objetivos fossem atingidos pelos municípios, com isso fazendo vingar mais a verticalização do que a autonomia na produção das ações. Os quatro municípios estudados não tiveram, de fato, oportunidade de apresentar suas peculiaridades locais enfraquecendo muito precocemente a própria adesão que fizeram ao Plano. Disso resultaram a desistência e o abandono dos programas federais em favor dos programas locais.

Teria o governo federal considerado esse aspecto quando da aprovação do PDE? Chegaram os municípios a avaliar as consequências da sobrecarga de trabalho para os professores que decorreria da adesão ao PAR? Parece que nem de um lado nem de outro houve essa reflexão, talvez, por se julgar que o repasse de verbas seria suficientemente sedutor para assegurar a continuidade da adesão ao PAR.

O cenário analisado remete a um tipo de verticalização bastante presente nas políticas educacionais no Brasil, em que uma diminuta parte dos atores participa de sua elaboração. Em especial, no caso da dimensão 2 do PAR, pode-se dizer que seus modelos são pouco discutidos com as equipes formadoras na fase de elaboração dos projetos. Os conflitos de interesse aparecem quando da execução das políticas, o que, em certa medida, contribui para que as SME (Secretaria Municipal de Educação) interrompam as parcerias e retomem os modelos convencionais de formação docente (cursos rápidos, oficinas, palestras, etc.) marcados pela difusão de teorias e técnicas que, em geral, não consideram a diversidade dos professores e seus contextos locais.

A recuperação do debate sobre os pressupostos ideológicos e as implicações político-filosóficas da adoção de modelos da formação seriam medidas importantes na constituição de equipes locais. Elas poderiam organizar a formação em serviço, referenciando a adoção de propostas locais e a criação de experiências singulares. Sem o tempo necessário para pensar e discutir a introdução dos programas nos municípios, assim como seus modelos formativos e os desdobramentos possíveis no âmbito local, muito se perde pelo caminho.

Existe ainda o desafio de se reconhecer que os cursistas estão em níveis diferentes de conhecimento profissional, o que, de certa forma, interfere na consecução das propostas de formação em que os professores se constituiriam em autores dos processos investigativos da sua prática. As próprias equipes de coordenação e tutoria (professores formadores) se mostraram não suficientemente preparadas para atuar nessa perspectiva, porquanto, estão em processo de aproximação e familiarização das novas propostas originárias do MEC. Ou seja, a metodologia é nova para todos eles.

Os poucos formadores locais que analisaram os aspectos curriculares dos projetos de formação conseguem apontar as dissonâncias com a perspectiva curricular local. De modo geral, observam que os programas foram construídos em função de uma proposta arrojada de currículo integrado, cujo domínio e compreensão dependem de um tempo de elaboração, de estudo, que não foi oferecido aos docentes. Tal situação inviabiliza o desenvolvimento das competências necessárias para que os professores se sintam confiantes na organização diferenciada do currículo escolar, outra ação possível em decorrência do desenvolvimento de sua reflexão e autonomia.

Os aspectos sinalizados dão conta, portanto, da quase inexistente preocupação ou discussão entre os gestores locais e os idealizadores dos programas sobre aspectos presentes nas propostas. Por isso, seus ideários pedagógicos são vistos como pertencentes a “outro lugar”, como se fosse impossível delimitar os pontos de vista da esfera local e do governo federal e os rumos da formação continuada.

A despeito das orientações sobre a descentralização e autonomia dos municípios como entes federados, é possível perceber que eles guardam uma relação de dependência com os projetos do governo federal. Em determinadas situações esta dependência é financeira, em outros, é de ordem técnica e em algumas administrações as duas formas de dependência podem ser encontradas. Ficou claro que a colaboração exige muito mais do que a indução de programas pré-concebidos, uma vez que se dá em um equilíbrio tênue entre os limites e responsabilidades de cada um. Exige um aprendizado constante capaz de aprimorar propostas e de superar os controles frágeis sobre os resultados alcançados.

Do ponto de vista pedagógico, a pesquisa nos alertou sobre vários aspectos importantes, sobretudo, a partir do olhar arguto dos tutores durante o compartilhamento de suas experiências, as quais precisam ser levadas em conta quando novas políticas de formação estão em pauta. Assim sendo, queremos registrar aqui tão-somente as reflexões que nos pareceram mais relevantes para o prosseguimento do PAR no que tange às políticas de formação de professores formuladas com base nos pressupostos do regime de colaboração.

No momento da adesão aos programas, os municípios deveriam ter tido a chance de integrar suas propostas e necessidades locais àquelas do MEC. Para tanto, lhes incumbiria uma detida apreciação dos modelos formativos propostos pelo governo federal através de suas políticas, tanto no que se refere aos seus pressupostos como sobre o ensino e a concepção curricular.

A busca da superação de problemas complexos, como propiciar aos professores condições para a formação diante da intensificação do trabalho docente e da carga horária efetiva nas redes de ensino, exige uma experimentação de práticas de planejamento e de gestão da formação em serviço pelas secretarias municipais, fazendo-se necessário contar com escolas que disponham de tempo, espaço e colaboração entre seus docentes. Nessa direção, é importante que se mantenham atentos para o descompasso que há entre as propostas do governo federal e as políticas municipais, a fim de que seja possível identificar o nível dos programas em relação à rede, se aquém ou além de suas experiências e expectativas.

Os municípios devem ainda dedicar especial atenção a suas realidades locais com vista à efetivação dos programas de formação em serviço. Entre outros aspectos, é recomendável liberar parcialmente das aulas os professores inscritos em programas de formação, assim como estabelecer critérios para indicar docentes e outros profissionais para atuarem como tutores. Ressalte-se que esse trabalho deve ser feito de modo cooperativo, em prol dos empreendimentos formativos preconizados pela dimensão 2, o que compreende a efetividade dos objetivos propostos para o Pró-letramento, o Gestar e demais programas especiais da Renafor. Não será demais reiterar que um programa de formação não é meramente um curso para certificação. Antes, constitui-se como um espaço de trocas de experiências, de sedimentação do corpus profissional, aprimoramento e enriquecimento de práticas, valorização docente, melhoria de suas condições de trabalho.

Finalmente, pode-se afirmar que o PAR é capaz de, em diferentes realidades, instituir uma cultura e introduzir novas práticas, como as técnicas de planejamento. Isto ocorreu nos municípios da Baixada Fluminense analisados. A despeito de suas limitações, há que se reconhecer que o PAR ofereceu aos municípios a oportunidade de adotarem uma estratégia de ação político-pedagógica inédita no país. Por isso, entendemos que essa experiência precisa ser aprimorada e ajustada continuamente a fim de evitar o risco de ser perdida.

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  • 2
    Schneider, Nardi e Durli (2012)SCHNEIDER, M. P.; NARDI, E.L.; DURLI, Z. O PDE e as metas do PAR para a formação de professores da educação básica. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, v. 20, n. 75, p. 303-24, abr./jun. 2012. https://doi.org/10.1590/S0104-40362012000200005
    https://doi.org/10.1590/S0104-4036201200...
    mencionam vários autores que trabalham em tal perspectiva, entre os quais, o português João Barroso (2004BARROSO, J. Os novos modos de regulação das políticas educativas na Europa: da regulação do sistema a um sistema de regulações. Educação em Revista, n. 39, p. 19-28, jul. 2004.; 2005BARROSO, J. O Estado, a educação e a regulação das políticas públicas. Educação & Sociedade, v. 26, n. 92, p. 725-51, out. 2005. https://doi.org/10.1590/S0101-73302005000300002
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200500...
    ), Barroso e Viseu (2003)BARROSO, J.; VISEU, S. A emergência de um mercado educativo no planejamento da rede escolar: de uma regulação pela oferta a uma regulação pela procura. Educação & Sociedade, v. 24, n. 84, p. 897-921, set. 2003. https://doi.org/10.1590/S0101-73302003000300008
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200300...
    e, dentre os brasileiros, Azevedo (2002)AZEVEDO, J. M. L. Implicações da nova lógica de ação do Estado para a educação municipal. Educação & Sociedade, v. 23, n. 80, p. 49-71, set. 2002. https://doi.org/10.1590/S0101-73302002008000004
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200200...
    , Castro (2007)CASTRO, A. M. D. A. Gerencialismo e educação: estratégias de controle e regulação da gestão escolar. In: CABRAL, A. et al. (Org.). Pontos e contrapontos da política educacional: uma leitura contextualizada de iniciativas governamentais. Brasília, DF: Liber Livro, 2007. p. 115-44., Krawczyk (2005)KRAWCZYK, N. R. Políticas de regulação e mercantilização da educação: socialização para uma nova cidadania? Educação & Sociedade, v. 26, n. 92, p. 799-819, out. 2005. https://doi.org/10.1590/S0101-73302005000300005
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200500...
    , Martins (2001)MARTINS, A. M. A descentralização como eixo das reformas do ensino: uma discussão da literatura. Educação & Sociedade, v. 22, n. 77, p. 28-48, dez. 2001. https://doi.org/10.1590/S0101-73302001000400003
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200100...
    , e Oliveira (2005)OLIVEIRA, D. A. Regulação das políticas educacionais na América Latina e sua consequências para os trabalhadores docentes. Educação & Sociedade, v. 26, n.92, p. 753-75, out. 2005. https://doi.org/10.1590/S0101-73302005000300003
    https://doi.org/10.1590/S0101-7330200500...
    ,
  • 3
    O termo accountability apresenta múltiplas dimensões, conforme exposto por diversos autores brasileiros e estrangeiros. As discussões levadas a efeito por Nigel Booke e Luiz Carlos de Freitas num encontro na Fundação Carlos Chagas, em São Paulo, são muito oportunas a esse respeito. Ver o artigo de Freitas (2013)FREITAS, L. C. Políticas de responsabilização: entre a falta de evidência e a ética. Cadernos de Pesquisa. v. 43, n. 148, p. 348-65, abr. 2013. https://doi.org/10.1590/S0100-15742013000100018
    https://doi.org/10.1590/S0100-1574201300...
    e a síntese de Bauer (2013)BAUER, A. Apresentação. Cadernos de Pesquisa, v. 43, n. 148, p. 330-335, jan./abr. 2013. http://doi.org/10.1590/S0100-15742013000100016
    http://doi.org/10.1590/S0100-15742013000...
    .
  • 4
    Autores que participam do referido dossiê: Batista et al. (2012)BATISTA, N. C. et al. Análise da implementação do Plano de Ações Articuladas em municípios do Rio Grande do Sul. Série-Estudos, n. 34, p. 75-92, jul./dez. 2012., Cunha, Costa e Araujo (2012)CUNHA, M. C.; COSTA, J. M. A.; ARAÚJO, R. B. M. O Plano de Ações Articuladas: percepções e expectativas na gestão da educação municipal. Série-Estudos, n. 34, p. 93-110, jul./dez. 2012., Ferreira (2012)FERREIRA, E. B. Planejamento educacional e tecnocracia nas políticas educacionais contemporâneas. Série-Estudos, n. 34, p. 45-59, jul./dez. 2012., Fonseca e Albuquerque (2012)FONSECA, M.; ALBUQUERQUE, S. V. O PAR como indutor do planejamento da educação municipal. Série-Estudos, n. 34, p. 61-74, jul./dez. 2012., Oliveira, Scaff e Senna (2012)OLIVEIRA, R. T. C.; Scaff, E. A. S.; Senna, E. Elaboração, implementação e acompanhamento do Plano de Ações Articuladas (PAR) em municípios de Mato Grosso do Sul. Série-Estudos, n. 34, p.133-46, jul./dez. 2012., Paccini e Corrêa (2012)PACCINI, J. L. V.; CORRÊA, N. M. Planejamento da política para a educação especial nos Planos de Ações Articuladas (PAR) de municípios sul-mato-grossenses. Série-Estudos, n. 34, p.147-64, jul./dez. 2012., Peroni et al. (2012)PERONI, V. M. et al. Relação público privado na educação básica: notas sobre o histórico e o caso do PDE-PAR: guia de tecnologias. Série-Estudos, n. 34, p. 31-44, jul./dez. 2012. e Santana e Adrião (2012)SANTANA, L. T.; ADRIÃO, T. M. F. Plano de Ações Articuladas em municípios paulistas prioritários: o exercício cooperativo em análise. Série-Estudos, n. 34, p. 111-32, jul./dez. 2012.. O artigo de Ferreira (2015)FERREIRA, E. B. Gestão dos sistemas municipais de educação: planejamento e equilíbrio federativo em questão. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, v. 23, n. 88, p. 545-66, jul./set. 2015. https://doi.org/10.1590/S0104-40362015000300001
    https://doi.org/10.1590/S0104-4036201500...
    publicado na revista Ensaio retoma a questão do planejamento municipal no âmbito do PAR, no Espírito Santo.
  • 5
    Nas citações, os entrevistados e os programas serão identificados conforme as seguintes abreviações: Secretário de Educação: SE; Assessor de Secretário de Educação: ASE; Subsecretário da Educação: SSE; Coordenador Geral de Programas: CGP; Coordenador Local: CL; Língua Portuguesa: LP; Pró-Letramento: PL. Em três casos não foram adotadas abreviações: Gestar 1; Gestar 2; Professor tutor: Tutor
  • 1
    A pesquisa foi desenvolvida durante o estágio de pós-doutorado de Sonia Regina Mendes dos Santos na Faculdade de Educação da USP, com a supervisão de Belmira Oliveira Bueno, com financiamento do CNPq-PDS. Na fase de elaboração do artigo, contou com a colaboração de Diego Ferreira.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2017
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2015
  • Aceito
    03 Nov 2016
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